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Ser de esquerda é não aceitar as injustiças, sejam elas quais forem, como um fato natural. É não calar diante da violação dos Direitos Humanos, em qualquer país e em qualquer momento. É questionar determinadas leis – porque a Justiça, muitas vezes, não anda de mãos dadas com o Direito; e entre um e outro, o homem de esquerda escolhe a justiça.
É ser guiado por uma permanente capacidade de se estarrecer e, com ela e por causa dela, não se acomodar, não se vender, não se deixar manipular ou seduzir pelo poder. É escolher o caminho mais justo, mesmo que seja cansativo demais, arriscado demais, distante demais. O homem de esquerda acredita que a vida pode e deve ser melhor e é isso, no fundo, que o move. Porque o homem de esquerda sabe que não é culpa do destino ou da vontade divina que um bilhão de pessoas, segundo dados da ONU, passe fome no mundo.
É caminhar junto aos marginalizados; é repartir aquilo que se tem e até mesmo aquilo que falta, sem sacrifício e sem estardalhaço. À direita, cabe a tarefa de dar o que sobra, em forma de esmola e de assistencialismo, com barulho e holofotes. Ser de esquerda é reconhecer no outro sua própria humanidade, principalmente quando o outro for completamente diferente. Os homens e mulheres de esquerda sabem que o destino de uma pessoa não deveria ser determinado por causa da raça, do gênero ou da religião.
Ser de esquerda é não se deixar seduzir pelo consumismo; é entender, como ensinou Milton Santos, que a felicidade está ancorada nos bens infinitos. É mergulhar, com alegria e inteireza, na luta por um mundo melhor e neste mergulho não se deixar contaminar pela arrogância, pelo rancor ou pela vaidade. É manter a coerência entre a palavra e a ação. É alimentar as dúvidas, para não cair no poço escuro das respostas fáceis, das certezas cômodas e caducas. Porém, o homem de esquerda não faz da dúvida o álibi para a indiferença. Ele nunca é indiferente. Ser de esquerda é saber que este “mundo melhor e possível” não se fará de punhos cerrados nem com gritos de guerra, mas será construído no dia-a-dia, nas pequenas e grandes obras e que, muitas vezes, é preciso comprar batalhas longas e desgastantes. Ser de esquerda é, na batalha, não usar os métodos do inimigo.
Fernando Evangelista

segunda-feira, maio 21, 2012

OAB-RJ apoia projeto de lei que batiza de Betinho nome da ponte Rio-Niterói


O presidente da OAB do Rio de Janeiro (OAB-RJ), Wadih Damous considerou hoje (21) “ um marco histórico, um legado à cidadania, à democracia com justiça social e ao resgate da verdade e da memória”, o projeto de lei 3388, de 2012, de autoria do deputado federal Chico Alencar (Psol-RJ) que dá à ponte Rio-Niterói o nome do sociólogo Herbert de Souza, mais conhecido como Betinho, no lugar de Presidente Costa e Silva. Segundo Damous, a mudança é fundamental dentro do contexto da instalação da Comissão da Verdade, como mais uma forma de “passar a limpo muitos aspectos da nossa história recente, sem revanchismos, mas com senso de justiça e de verdade conosco mesmos, nossos filhos e netos”.
- Costa e Silva lembra o período da ditadura. Lembra o período mais obscuro da história do Brasil. Betinho lembra liberdade e solidariedade, esperança para o Brasil, afirmou Damous. Para ele, é inaceitável que a popularmente chamada Ponte Rio-Niterói seja oficialmente denominada Ponte Presidente Costa e Silva, em homenagem a um chefe de Estado que foi um dos artífices do golpe militar, responsável por momentos dos mais sombrios da história brasileira como o que se inicia com a edição do famigerado Ato Institucional nº 5 (AI-5).
A proposta de alteração da denominação da ponte Rio-Niterói, localizada do Km 321 ao 334, na BR 101, teve origem, segundo o deputado Chico Alencar, na solicitação de vários movimentos de direitos humanos encaminhadas aos membros da Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados, em dezembro de 2011. Propõe nova denominação à ponte presidente Costa e Silva (Rio-Niterói) para ponte Herbert de Souza – Betinho (1935 – 1997), que dedicou sua vida à luta pela democracia e pela justiça social.
 A Lei nº 6.682, de 27 de agosto de 1979, dispõe sobre a denominação de vias e estações do Plano Nacional de Viação – PNV, estabelece em seu art. 2º que qualquer via pública “poderá ter, supletivamente, a designação de um fato histórico ou de nome de pessoa falecida que haja prestado relevantes serviços à Nação ou à Humanidade”. Além disso, O terceiro Plano Nacional de Direitos Humanos (PNDH-3) prevê que não mais sejam homenageados, a partir do batismo de logradouros públicos com seus respectivos nomes, indivíduos que notadamente tenham cometido crimes e perpetrado violações dos direitos humanos no período da Ditadura Civil Militar de 1964-1985.  
Diante dos fatos apresentados, o deputado Chico Alencar decidiu acolher a argumentação dos vários movimentos de direitos humanos que lutam pela alteração da denominação da mais famosa ponte do Rio de Janeiro. “Homenagear a ditadura é torturar a memória; homenagear Betinho é fazer justiça”!, destacou o parlamentar. A escolha do nome de Betinho, deve-se à sua incansável luta pelos direitos humanos no período ditatorial, e pela sua condição de símbolo dos exilados e da anistia. Retornando ao país, Betinho empenhou-se pela dignidade das populações vulneráveis com a criação do Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas – IBASE, em 1981, além do lançamento da Ação da Cidadania contra a Fome, a Miséria e pela Vida em 1993, tendo recebido, inclusive, indicação ao Prêmio Nobel da Paz. < span style="line-height: 115%; font-size: 16pt;">
Betinho nasceu em Bocaiúva, em Minas Gerais, no dia 3 de janeiro de 1935 e morreu no Rio de Janeiro em 9 de agosto de 1997. Foi o quarto filho de uma família de oito irmãos, entre os quais o cartunista Henfil e o músico Chico Mário. Sua infância foi marcada por fatos incomuns. Já nos primeiros dias de vida, teve hemofilia, uma doença no sangue que impede a coagulação. Herbert de Sousa começou a sua militância política na Juventude Católica, em Belo Horizonte. Estudou na Universidade de Minas Gerais e formou-se em sociologia em 1962. Depois do golpe militar de 1964, Betinho engajou-se na resistência contra a ditadura. Passou sete meses no Uruguai e depois, de volta ao Brasil, foi trabalhar como operário na cidade paulista de Mauá.
Em 1971, Herbert de Sousa partiu para o exílio. Morou em diversos países. No Chile, deu aulas na Faculdade Latino-americana de Ciências Sociais e assessorou o presidente Salvador Allende, deposto em 1973 pelo general Augusto Pinochet. Escapando da ditadura chilena, Betinho exilou-se no Canadá e depois no México. Fez doutorado e foi professor na Universidade Autônoma do México. Com a anistia política, em 1979, retornou ao Brasil. Tornou-se um dos símbolos da resistência política. Dois anos depois, fundou o IBASE (Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas). Em 1990, o movimento Terra e Democracia, que Betinho liderava, reuniu no Aterro do Flamengo, no Rio de Janeiro, milhares de pessoas para lutar pela democratização da terra.
Herbert de Sousa teve confirmado o diagnóstico de sua contaminação pelo HIV, o vírus causador da Aids, em 1985, contraído numa de suas inúmeras transfusões de sangue no tratamento da hemofilia. No ano seguinte, fundou a ABIA, uma associação para lutar pelos direitos das pessoas portadoras do HIV ou dos doentes com Aids. Betinho dirigiu essa organização por onze anos. A doença atingiu também sua família: no período de um ano, Betinho perdeu dois irmãos vítimas da Aids. A maneira de lidar com a doença foi falar sobre ela. Herbert de Sousa iniciou uma grande campanha nos meios de comunicação para esclarecer as pessoas sobre a doença. 
Em 1992, Betinho liderou o movimento pela Ética na Política, que culminou com o impeachment do então presidente Fernando Collor, em setembro do mesmo ano. Esse movimento plantou os alicerces do movimento Ação da Cidadania contra a Miséria e pela Vida. A partir da participação de Betinho, o problema da fome e da miséria tornou-se visível e concreto para todos os brasileiros. Herbert de Sousa abriu várias frentes de trabalho, principalmente no seu relacionamento com a mídia. Em 1993, foi considerado "homem de ideias do ano", pelo Jornal do Brasil.
Depois de muito lutar contra a doença, Betinho faleceu em 1997, aos 61 anos, em sua casa, no bairro do Botafogo.
*JB

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