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Ser de esquerda é não aceitar as injustiças, sejam elas quais forem, como um fato natural. É não calar diante da violação dos Direitos Humanos, em qualquer país e em qualquer momento. É questionar determinadas leis – porque a Justiça, muitas vezes, não anda de mãos dadas com o Direito; e entre um e outro, o homem de esquerda escolhe a justiça.
É ser guiado por uma permanente capacidade de se estarrecer e, com ela e por causa dela, não se acomodar, não se vender, não se deixar manipular ou seduzir pelo poder. É escolher o caminho mais justo, mesmo que seja cansativo demais, arriscado demais, distante demais. O homem de esquerda acredita que a vida pode e deve ser melhor e é isso, no fundo, que o move. Porque o homem de esquerda sabe que não é culpa do destino ou da vontade divina que um bilhão de pessoas, segundo dados da ONU, passe fome no mundo.
É caminhar junto aos marginalizados; é repartir aquilo que se tem e até mesmo aquilo que falta, sem sacrifício e sem estardalhaço. À direita, cabe a tarefa de dar o que sobra, em forma de esmola e de assistencialismo, com barulho e holofotes. Ser de esquerda é reconhecer no outro sua própria humanidade, principalmente quando o outro for completamente diferente. Os homens e mulheres de esquerda sabem que o destino de uma pessoa não deveria ser determinado por causa da raça, do gênero ou da religião.
Ser de esquerda é não se deixar seduzir pelo consumismo; é entender, como ensinou Milton Santos, que a felicidade está ancorada nos bens infinitos. É mergulhar, com alegria e inteireza, na luta por um mundo melhor e neste mergulho não se deixar contaminar pela arrogância, pelo rancor ou pela vaidade. É manter a coerência entre a palavra e a ação. É alimentar as dúvidas, para não cair no poço escuro das respostas fáceis, das certezas cômodas e caducas. Porém, o homem de esquerda não faz da dúvida o álibi para a indiferença. Ele nunca é indiferente. Ser de esquerda é saber que este “mundo melhor e possível” não se fará de punhos cerrados nem com gritos de guerra, mas será construído no dia-a-dia, nas pequenas e grandes obras e que, muitas vezes, é preciso comprar batalhas longas e desgastantes. Ser de esquerda é, na batalha, não usar os métodos do inimigo.
Fernando Evangelista

sábado, agosto 31, 2013

O catastrofismo não sabe o que dizer diante da alta do PIB

O catastrofismo não sabe o que dizer diante da alta do PIB

pibmundo

O catastrofismo não sabe o que dizer diante da alta do PIB

Os jornais de hoje bem que mereciam ser edições comemorativas de um hipotético “Dia do Sorriso Amarelo”.
Diante da alta – mais que inesperada, chocante – do PIB, formou-se um coro quase unìssono de que “não se animem, a coisa já está piorando”, enquanto se buscavam “especialistas” para prever como vai se dar, amanhã, a catástrofe tão desejada.
Dilma terá o terceiro pior PIB entre 30 presidentes, brada a Folha, usando a voz de um economista que, não surpreende, também coloca na rabeira os anos de desenvolvimento de Lula, situando-o em décimo-nono.
O Globo chega a fazer um editorial dizendo que o resultasdo nao autoriza otimismo, pedindo mais cortes nos gastos públicos – que já foram decepados, como mostra o resultado analítico do PIB pelo IBGE – e a continuidade do arrocho no crédito: “O importante é não subordinar o BC ao calendário eleitoral.”
Tradução: folga para quem ganha com arbitramento de juros, aqui e lá fora, e travas para quem precisa investir, produzir e consumir, o que é, afinal, o que põe a rodar a economia real, aquela que existe fora dos terminais de computador dos bancos.
Claro que nada autoriza a supor que o bom desempenho do segundo semestre se repita, mecanicamente, no terceiro e no quarto trimestres. Mas igualmente nada faz supor que vá ser inferior. E, com toda a certeza, será significativamente superior que o segundo semestre de 2012, inegavelmente ruim.
Mas a elite brasileira parece amofinar-se diante de qualquer perspectiva de progresso quando a sabe inclusiva socialmente. Afinal, o Brasil do atraso não lhe era tão mal, porque nada lhe faltava, excento uma nação. Da qual, aliás, ela não se sente parte.
Por isso, talvez, o chinês Yin Mingshan, de um grupo chinês que fabrica automóveis no Uruguai e vende aqui diz, numa entrevista à Folha que só um idiota não investiria no Brasil.
E que ele não sabe que há muitos idiotas por aqui.

Por: Fernando Brito
 
Do Blog TIJOLAÇO

Canhedo é preso por sonegar. E a Globo?


Altamiro Borges, Blog do Miro

 ‘O empresário Wagner Canhedo, ex-proprietário da Vasp, foi preso na manhã deste sábado (31) em Brasília. Segundo o UOL, "a prisão foi determinada pela Justiça de Santa Catarina e o motivo foi a sonegação de impostos. Ele terá de cumprir pena de quatro anos e cinco meses de prisão em regime semi-aberto. Por não ter curso universitário, ele terá de dividir cela com outros presos, mas, pela idade avançada, a cela não terá muitos encarcerados... Canhedo foi detido por volta das 6h30 deste sábado e levado a Delegacia de Capturas e Polícia Interestadual (DCPI), na capital federal".
O caloteiro Wagner Canhedo "comprou" a Viação Aérea São Paulo (Vasp) no criminoso processo de privatização das estatais dos anos 1990. Em pouco tempo, o empresário destruiu a empresa, demitiu milhares de trabalhadores e deixou pesadas dívidas. Investigações comprovaram que ele sonegou impostos e não pagou direitos trabalhistas e previdenciários aos funcionários. A mídia privatista, que adora criticar a "ineficiência" das estatais e de bajular a "eficiência" da iniciativa privada, sempre evitou dar maior destaque aos crimes promovidos por Wagner Canhedo. Agora, ele foi preso - provavelmente por pouco tempo, já que no Brasil só ladrão de galinha fica na cadeia.
Mesmo assim, fica uma ponta de esperança - ela é a última que morre, mas morre! Será que agora também será investigada sonegação bilionária promovida pela poderosa Rede Globo? Será que algum dos filhos de Roberto Marinho irá para a prisão, caso seja comprovada a fraude fiscal? O escândalo da sonegação, que já ultrapassaria R$ 600 milhões em valores atualizados e cobranças de multas, foi denunciado pela blogosfera - com destaque para os blogueiros Miguel de Rosário e Fernando Brito. Com exceção da TV Record, que por motivos óbvios repercutiu a denúncia, o restante da mídia nada fala sobre o assunto. Será que as coisas estão mudando no Brasil?”

Carta aos médicos cubanos

Atualização de status
De Bob Fernandes





DAVID OLIVEIRA DE SOUZA,
38 anos, é médico e professor do Instituo de Ensino e Pesquisa do Hospital Sírio Libanês. Foi diretor médico do Médicos Sem Fronteiras no Brasil (2007-2011)

Bem-vindos, médicos cubanos. Vocês serão muito importantes para o Brasil. A falta de médicos em áreas remotas e periféricas tem deixado nossa população em situação difícil. Não se preocupem com a hostilidade de parte de nossos colegas. Ela será amplamente compensada pela acolhida calorosa nas comunidades das quais vocês vieram cuidar.

A sua chegada responde a um imperativo humanitário que não pode esperar. Em Sergipe, por exemplo, o menor Estado do Brasil, é fácil se deslocar da capital para o interior. Ainda assim, há centenas de postos de trabalho ociosos, mesmo em unidades de saúde equipadas e em boas condições.

Caros colegas de Cuba, é correto que nós médicos brasileiros lutemos por carreira de Estado, melhor estrutura de trabalho e mais financiamento para a saúde. É compreensível que muitos optemos por viver em grandes centros urbanos, e não em áreas rurais sem os mesmos atrativos. É aceitável que parte de nós não deseje transitar nas periferias inseguras e sem saneamento. O que não é justo é tentar impedir que vocês e outros colegas brasileiros que podem e desejam cuidar dessas pessoas façam isso. Essa postura nos diminui como corporação, causa vergonha e enfraquece nossas bandeiras junto à sociedade.

Talvez vocês já saibam que a principal causa de morte no Brasil são as doenças do aparelho circulatório. Temos um alto índice de internações hospitalares sensíveis à atenção primária, ou seja, que poderiam ter sido evitadas por um atendimento simples caso houvesse médico no posto de saúde.

Será bom vê-los diagnosticar apenas com estetoscópio, aparelho de pressão e exames básicos pais e mães de família hipertensos ou diabéticos e evitar, assim, que deixem seus filhos precocemente por derrame ou por infarto.

Será bom vê-los prevenindo a sífilis congênita, causa de graves sequelas em tantos bebês brasileiros somente porque suas mães não tiveram acesso a um médico que as tratasse com a secular penicilina.

Será bom ver o alívio que mães ribeirinhas ou das favelas sentirão ao vê-los prescrever antibiótico a seus filhos após diagnosticar uma pneumonia. O mesmo vale para gastroenterites, crises de asma e tantos diagnósticos para os quais bastam o médico e seu estetoscópio.

Não se pode negar que vocês também enfrentarão problemas. A chamada "atenção especializada de média complexidade" é um grande gargalo na saúde pública brasileira. A depender do local onde estejam, a dificuldade de se conseguir exame de imagem, cirurgias eletivas e consultas com especialista para casos mais complicados será imensa. Que isso não seja razão para desânimo. A presença de vocês criará demandas antes inexistentes e os governos serão mais pressionados pelas populações.

Para os que ainda não falam o português com perfeição, um consolo. Um médico paulistano ou carioca em certos locais do Nordeste também terá problemas. Vai precisar aprender que quando alguém diz que está com a testa "xuxando" tem, na verdade, uma dor de cabeça que pulsa. Ou ainda que um peito "afulviando" nada mais é do que asia. O útero é chamado de "dona do corpo". A dor em pontada é uma dor "abiudando" (derivado de abelha).

Já atuei como médico estrangeiro em diversos países e vi muitas vezes a expressão de alívio no rosto de pessoas para as quais eu não sabia dizer sequer bom dia Ðsituação muito diferente da de vocês, já que nossos idiomas são similares.

O mais recente argumento contra sua vinda ao nosso país é o fato de que estariam sendo explorados. Falou-se até em trabalho escravo. A Organização Pan-americana de Saúde (OPAS) com um século de experiência, seria cúmplice, já que assinou termo de cooperação com o governo brasileiro.

Seus rostos sorridentes nos aeroportos negam com veemência essas hipóteses. Em nome de nosso povo e de boa parte de nossos médicos, só me resta dizer com convicção: Um abraço fraterno e muchas gracias.

 

DAVID OLIVEIRA DE SOUZA

Jovens fazem ato pela democratização da mídia e “devolvem” merda à Globo


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O 2º ato contra o monopólio da mídia reuniu 600 pessoas em protesto na frente da Rede Globo, no bairro Brooklin, em São Paulo, na noite desta sexta-feira (30/8).A manifestação foi organizada por movimentos de juventude, de mulheres e de democratização da comunicação, como o Levante Popular da Juventude, a Marcha Mundial das Mulheres, o Coletivo Intervozes e o Centro de Estudos Barão de Itararé. Cerca de 40 adeptos do Black Bloc participaram do protesto.”Devolvemos à Globo a merda que a emissora joga para o povo brasileiro todo dia em seus jornais”, disse Juliane Furno, militante do Levante Popular da Juventude, que articulou uma jornada nacional pela democratização da mídia, com manifestações em frente à emissora também no Rio de Janeiro, Sergipe, Salvador, Paraíba, Porto Alegre, Santa Maria e Belém (veja mais informações abaixo).
Duas faixas com as expressões “Fora Globo” e “Abaixo a Mídia Machista” foram jogadas da Ponte Estaiada (veja fotos: https://www.facebook.com/media/set/?set=a.587909691274589.1073741832.162474053818157&type=1&l=a28e2ea564).
Os manifestantes protestaram contra o monopólio no sistema de comunicação eletrônico (TV e rádio), cobraram o cumprimento da Constituição que proíbe concessões a políticos e defenderam a democratização da mídia.”A Globo é o símbolo da ditadura da comunicação. Os nossos protestos contra a Rede Globo colocam em pauta a necessidade da democratização da comunicação, para acabar com os monopólios da informação e da cultura”, disse Thiago Pará Wender, diretor da União Nacional dos Estudantes (UNE).
“A sonegação de impostos da Globo deixa claro que o ‘Criança Esperança’ é uma hipocrisia.  A Globo é uma empresa corrupta, desviou mais de R$ 600 milhões do país, ao deixar de pagar impostos e multas. Se ela quisesse mesmo ajudar as crianças, a primeira atitude era pagar em dia seus impostos”, denunciou Juliane.
A placa da ponte Octávio Frias de Oliveira foi rebatizada pela segunda vez com o nome de Vladimir Herzog, em homenagem ao jornalista que foi torturado até a morte no DOI-CODI em São Paulo, em 1975, pelo regime militar. Frias de Oliveira foi fundador do Grupo Folha, acusado de contribuir com a repressão durante da ditadura.Os jovens saíram em marcha da Praça General Gentil Falcão em torno das 20h, passou pela Rede Globo e retornou ao local da concentração. O protesto terminou às 22h e não houve conflitos com a Polícia Militar.
AÇÕES EM TODO O PAÍS

Marx, Lênin, Gramsci e a imprensa

Por Altamiro Borges
Diante do poder alcançado pela mídia hegemônica e das ilusões ainda existentes sobre seu papel, revisitar as idéias de intelectuais marxistas sobre o tema é da maior importância e causam surpresa por sua enorme atualidade. Marx, Lênin e Gramsci, entre outros pensadores revolucionários, sempre destacaram o papel dos meios de comunicação. Exatamente por entenderem a importância da luta de idéias, do fator subjetivo na transformação da sociedade, fizeram questão de desmascarar o que chamavam, sem meias palavras, de “imprensa burguesa” e de realçar a necessidade da construção de veículos alternativos dos trabalhadores. 

Estes dois elementos, a denúncia do caráter de classe da imprensa capitalista e a defesa dos instrumentos próprios dos explorados, são as marcas principais destes intelectuais marxistas. Marx, Lênin e Gramsci dedicaram enorme energia ao trabalho jornalístico, escrevendo centenas de artigos e ajudando a construir vários jornais democráticos e proletários. Foram jornalistas de mão-cheia, produzindo textos que entraram para a história. Sempre estiveram sintonizados com o seu tempo, pulsando a evolução da luta de classes; nunca se descuidaram da forma, da linguagem, para melhor difundir os seus conteúdos revolucionários.
Defesa da liberdade de expressão 
Vítimas da violenta perseguição das classes dominantes, os revolucionários nunca toleraram a censura dos opressores e foram os maiores defensores da verdadeira liberdade de expressão. A própria ampliação da democracia foi decorrência das lutas dos trabalhadores, já que nunca interessou à reacionária burguesia. Mas os revolucionários nunca confundiram esta exigência democrática com a proclamada “liberdade de imprensa”, tão alardeada pela burguesia que controla os meios de produção e usa todos os recursos, legais e ilegais, ardilosos e cruéis, para castrar a própria democracia e o avanço das lutas emancipadoras. 
Numa fase ainda embrionária do movimento operário-socialista, Karl Marx logo se envolveu na atividade jornalística. Após concluir seu doutorado em filosofia, em 1841, ele pretendia seguir a carreira acadêmica e ingressar na Universidade de Bonn, mas a brutal repressão do governo prussiano inviabilizou tal projeto e o jovem filósofo alemão manteve seu sustento através do jornalismo. Em 1842, ingressou na equipe do jornal Gazeta Renana e virou o seu redator-chefe. Sob sua direção, este periódico democrático triplicou o número de assinantes e ganhou prestígio, mas durou poucos meses e foi fechado pela ditadura prussiana. 
Sem ilusões na imprensa burguesa 
Na seqüência, entre 1848/49, passou a escrever no jornal Nova Gazeta Renana, que se transformou numa trincheira de resistência ao regime autoritário. Em menos de dois anos, Marx escreveu mais de 500 textos e tornou-se um articulista de sucesso. O combate ao código de censura do governo prussiano resultou na proibição do jornal. Marx ainda escreveu para o Die Press e o New York Tribune sobre política, economia e história. “Era um jornalismo que revelava a minuciosa leitura de Marx, seu alto grau de informação não apenas sobre os fatos e conflitos, como também sobre os atores individuais e a própria imprensa”, relata José Onofre, na apresentação do livro recém-lançado “Karl Marx e a liberdade de imprensa”. 
Em sua defesa da liberdade de expressão, ele nunca vacilou na denúncia da ditadura burguesa. Para ele, o jornal deveria ser uma arma de combate à opressão e à exploração e não um veículo neutro. “A função da imprensa é ser o cão-de-guarda, o denunciador incansável dos opressores, o olho onipresente e a boca onipresente do espírito do povo que guarda com ciúme sua liberdade”. Em outro texto, afirma: “O dever da imprensa é tomar a palavra em favor dos oprimidos a sua volta. O primeiro dever da imprensa é minar todas as bases do sistema político existente”. Por estas idéias libertárias, ele foi processado e perseguido. 
Poder do capital sobre a imprensa 
Outro que nunca se iludiu foi Vladimir Lênin. Atuando num período da ascensão revolucionária, ele foi ainda mais duro no combate aos jornais burgueses. Num texto intitulado “a liberdade de imprensa do capitalismo”, ele desnuda esta falácia. “A ‘liberdade de imprensa’ é também uma das principais palavras de ordem da ‘democracia pura’. Os operários sabem e os socialistas de todos os países reconheceram-no milhares de vezes que esta liberdade é um engano enquanto as melhores impressoras e os estoques de papel forem açambarcados pelos capitalistas, e enquanto subsistir o poder do capital sobre a imprensa”. 
“Com vista a conquistar a igualdade efetiva e a verdadeira democracia para os trabalhadores, é preciso começar por privar o capital da possibilidade de alugar escritores, de comprar editoriais e de subornar jornais, mas para isso é necessário destruir o jugo do capital... Os capitalistas chamam sempre ‘liberdade’ à liberdade para os ricos de manterem seus lucros e liberdade para os operários de morrerem à fome. Os capitalistas denominam de liberdade de imprensa a liberdade de suborno da imprensa pelos ricos, a liberdade de usar a riqueza para forjar e falsear a chamada opinião pública”. Nada mais atual! 
Numa outra fase histórica, em que o setor da comunicação ainda não era um poderoso ramo da economia, Lênin chegou a se contrapor à participação dos comunistas na imprensa burguesa. “Poder-se-á admitir que colaborem nos jornais burgueses? Não. A semelhante colaboração se opõe tanto as razões teóricas como a linha política e a prática da social-democracia... Dir-nos-ão que não há regra sem exceção. O que é indiscutível. Não se pode condenar o camarada que, vivendo no exílio, escreve num jornal qualquer. É por vezes difícil criticar um social-democrata que, para ganhar a vida, colabora numa seção secundária de um jornal burguês”. Mas, para ele, tais casos deveriam ser encarados como exceção e com princípios. 
“Boicote, boicote, boicote” 
Para encerrar este bloco, que evidencia que os marxistas nunca nutriram ilusões sobre o caráter de classe da imprensa burguesa e nem se embasbacaram com o seu poder de sedução, vale reproduzir uma longa citação de Antonio Gramsci, o revolucionário italiano de padeceu onze anos nos cárceres. No texto “Os jornais e os operários”, escrito em 1916, ele faz uma conclamação aos trabalhadores que bem poderia servir para uma campanha contra a revista Veja e outros veículos da mídia brasileira na atualidade: 
Para ele, a assinatura de jornal burguês “é uma escolha cheia de insídias e de perigos que deveria ser feita com consciência, com critério e depois de amadurecida reflexão. Antes de mais, o operário deve negar decididamente qualquer solidariedade com o jornal burguês. Deveria recordar-se sempre, sempre, sempre, que o jornal burguês (qualquer que seja sua cor) é um instrumento de luta movido por idéias e interesses que estão em contraste com os seus. Tudo o que se publica é constantemente influenciado por uma idéia: servir à classe dominante, o que se traduz sem dúvida num fato: combater a classe trabalhadora. E, de fato, da primeira à última linha, o jornal burguês sente e revela esta preocupação”. 
“Todos os dias, pois, sucede a este mesmo operário a possibilidade de poder constatar pessoalmente que os jornais burgueses apresentam os fatos, mesmo os mais simples, de modo a favorecer a classe burguesa e a política burguesa em prejuízo da política e da classe operária. Rebenta uma greve! Para o jornal burguês os operários nunca têm razão. Há uma manifestação! Os manifestantes, apenas porque são operários, são sempre tumultuosos e malfeitores. E não falemos daqueles casos em que o jornal burguês ou cala, ou deturpa, ou falsifica para enganar, iludir e manter na ignorância o público trabalhador. Apesar disso, a aquiescência culposa do operário em relação ao jornal burguês é sem limites”. 
“É preciso reagir contra ela e despertar o operário para a exata avaliação da realidade. É preciso dizer e repetir que a moeda atirada distraidamente é um projétil oferecido ao jornal burguês que o lançará depois, no momento oportuno, contra a massa operária. Se os operários se persuadirem desta elementar verdade, aprenderiam a boicotar a imprensa burguesa, em bloco e com a mesma disciplina com que a burguesia boicota os jornais operários, isto é, a imprensa socialista. Não contribuam com dinheiro para a imprensa burguesa que vos é adversária: eis qual deve ser o nosso grito de guerra neste momento, caracterizado pela campanha de assinatura de todos os jornais burgueses: Boicotem, boicotem, boicotem!”. 
Construtores da imprensa revolucionária 
Exatamente por não nutrirem ilusões na imprensa burguesa, Marx, Lênin e Gramsci sempre investiram na construção de instrumentos próprios das forças contrárias à lógica do capital. Segundo o biógrafo David Riazanov, “a Nova Gazeta Renana tratava de todas as questões importantes, de sorte que o jornal pode ser considerado um modelo de periódico revolucionário. Nenhum outro periódico russo nem europeu chegou à altura da Nova Gazeta... Seus artigos não perderam nada de sua atualidade, de seu ardor revolucionário, de sua agudeza na análise dos acontecimentos. Ao lê-los, sobretudo os de Marx, acreditamos assistir à história da revolução alemã e da revolução francesa, tão vivo é o estilo, como profundo é o sentido”. 
Já Lênin, que viveu numa fase de efervescência revolucionária, dedicou boa parte das suas energias para construção de jornais socialistas – dos mais diferentes tipos, sempre sintonizados com a evolução da luta de classes. Iskra, Vperiod, Pravda, Proletari, Rabotchaia Pravda, Nievskaia Svesdá, entre outros jornais organizados e dirigidos por ele, servirão para agregar as forças de esquerda, fazer agitação nas fábricas, aprofundar os debates ideológicos e construir o partido. Na sua mais célebre definição, Lênin sintetizou: 
“O jornal não é apenas um propagandista coletivo e um agitador coletivo. Ele é, também, um organizador coletivo. Neste último sentido, ele pode ser comparado com os andaimes que são levantados ao redor de um edifício em construção, que assinala os contornos, facilitam as relações entre os diferentes pedreiros, ajudam-lhes a distribuírem tarefas e a observar os resultados gerais alcançados pelo trabalho organizado”. A reacionária burguesia russa logo entendeu o perigo representado por estes jornais, tanto que os reprimiu ferozmente. No caso do Pravda, de um total de 270 edições, 110 foram objeto de ações judiciais e os seus redatores foram condenados a um total de 472 anos de prisão. Mas isto não abrandou o seu vigor! 
Atualidade das noções marxistas 
No caso de Gramsci, o longo período de cárcere dificultou a sua atividade jornalística e castrou seu desejo de organizar a imprensa operária. Antes da prisão, ele editou vários jornais de fábrica e empenhou-se na difusão do Ordine Nuovo. Na sua rica elaboração sobre o papel dos intelectuais e a luta pela hegemonia, ele chega a afirmar que, em momentos de crise, o jornal pode funcionar como partido político, ajudando a desnudar a ideologia dominante e a construir a ação contra-hegemônica do proletariado. Para ele, o momento da desconstrução do velho é, ao mesmo tempo, o da construção do novo. 
As contribuições de Gramsci servem para desmistificar o papel da mídia hoje, mantendo impressionante atualidade. Para ele, a imprensa burguesa é um “aparelho privado de hegemonia”, capaz de disputar os rumos da sociedade por meio de uma verdadeira guerra de posições em todas as “trincheiras ideológicas”. Através da imprensa privada e mercantil, que objetiva o lucro e que faz da notícia uma mera mercadoria, a burguesia tenta se aparentar como representante da esfera pública. Além disso, em momentos de crise da ideologia dominante e de fratura dos partidos burgueses, a imprensa se apresenta como “o partido do capital”, que organiza e amalgama os interesses das várias frações de classe da burguesia.

Às vésperas de uma guerra obscena

Às vésperas de uma guerra obscena

por Tariq Ali*


Aliados a monarquias medievais, EUA querem ampliar seu poder geopolítico no Oriente Médio: eis o real motivo da escalada contra Damasco 


Navio da frota dos EUA no Mediterrâneo, equipada com mísseis Tomahawk e deslocada para as proximidades da Síria na quinta-feira, 29/8/2013.

O objetivo da “guerra limitada” organizada pelos EUA e seus vassalos europeus é simples. O regime sírio estava lentamente restabelecendo seu controle sobre o país, contra a oposição armada pelo Ocidente e seus Estados tributários na região (Arábia Saudita e Qatar). Essa situação exigia correção. Nessa deprimente guerra civil, era preciso fortalecer militar e psicologicamente a oposição.

Desde quando Obama afirmou que as armas químicas era a “linha-limite”, era claro que elas seriam utilizadas. Cui prodest? como costumavam perguntar os romanos. Quem se beneficia? Claramente, não o regime sírio.

Há várias semanas, dois jornalistas do Le Monde já tinham descoberto as armas químicas. A questão é: de fato foram usadas, quem as lançou? O governo Obama e seus seguidores gostariam que acreditássemos no seguinte enredo: Assad permitiu que os inspetores de armas químicas da ONU entrassem na Síria; então, anunciou a chegada deles lançando um ataque de armas químicas contra mulheres e crianças, a mais ou menos 15 quilômetros do hotel onde estavam hospedados. Isso simplesmente não faz sentido. Quem, então, cometeu a atrocidade?

No Iraque, sabemos que foram os EUA a utilizar “fósforo branco” em Fallujah, em 2004 (não havia “linhas-limites” exceto aquelas traçadas no chão por sangue iraquiano). Portanto, a justificativa é tão turva quanto nas guerras anteriores.

Desde a invasão e guerra no Iraque, o mundo árabe está dividido entre sunitas e xiitas. Apoiando a invasão à Síria estão dois velhos conhecidos: Arábia Saudita e Israel. Ambos querem o regime do Irã destruído. Os sauditas, por disputas de facção; os israelenses, por estarem desesperados para acabar com o Hezbollah. Esse é o grande objetivo que têm em mente e Washington, após resistir por um tempo, está voltando a considerá-lo. Bombardear a Síria é o primeiro passo. (…)

Os iranianos reagiram fortemente e ameaçaram retaliação apropriada. Pode ser um blefe, mas o que isso revela é que até o novo líder “moderado”, prestigiado pela mídia ocidental, assumiu posição não distinta à de Ahmadinejad. Teerã compreende bem o que está em jogo e por quê. Cada uma das intervenções ocidentais no mundo árabe e seus arredores tornou as condições piores. Os ataques que estão sendo planejados pelo Pentágono e suas filiais na OTAN provavelmente terão o mesmo padrão.

Enquanto isso, no Egito, um Pinochet árabe está restaurando a “ordem” da velha maneira violenta já consagrada e com o apoio dos líderes, ligeiramente constrangidos, do conglomerado EUA/Europa.

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* Original do London Review of Books, tradução de Vinícius Gomes.

- Recomendamos ainda a excelente conversa entre Tariq Ali e Noam Chomsky , Esta democracia está com problemas muito sérios .
*Tecedora

MEDICOS CUBANOS AGRADECEM O ATO DE SOLIDARIEDADE