Páginas

Ser de esquerda é não aceitar as injustiças, sejam elas quais forem, como um fato natural. É não calar diante da violação dos Direitos Humanos, em qualquer país e em qualquer momento. É questionar determinadas leis – porque a Justiça, muitas vezes, não anda de mãos dadas com o Direito; e entre um e outro, o homem de esquerda escolhe a justiça.
É ser guiado por uma permanente capacidade de se estarrecer e, com ela e por causa dela, não se acomodar, não se vender, não se deixar manipular ou seduzir pelo poder. É escolher o caminho mais justo, mesmo que seja cansativo demais, arriscado demais, distante demais. O homem de esquerda acredita que a vida pode e deve ser melhor e é isso, no fundo, que o move. Porque o homem de esquerda sabe que não é culpa do destino ou da vontade divina que um bilhão de pessoas, segundo dados da ONU, passe fome no mundo.
É caminhar junto aos marginalizados; é repartir aquilo que se tem e até mesmo aquilo que falta, sem sacrifício e sem estardalhaço. À direita, cabe a tarefa de dar o que sobra, em forma de esmola e de assistencialismo, com barulho e holofotes. Ser de esquerda é reconhecer no outro sua própria humanidade, principalmente quando o outro for completamente diferente. Os homens e mulheres de esquerda sabem que o destino de uma pessoa não deveria ser determinado por causa da raça, do gênero ou da religião.
Ser de esquerda é não se deixar seduzir pelo consumismo; é entender, como ensinou Milton Santos, que a felicidade está ancorada nos bens infinitos. É mergulhar, com alegria e inteireza, na luta por um mundo melhor e neste mergulho não se deixar contaminar pela arrogância, pelo rancor ou pela vaidade. É manter a coerência entre a palavra e a ação. É alimentar as dúvidas, para não cair no poço escuro das respostas fáceis, das certezas cômodas e caducas. Porém, o homem de esquerda não faz da dúvida o álibi para a indiferença. Ele nunca é indiferente. Ser de esquerda é saber que este “mundo melhor e possível” não se fará de punhos cerrados nem com gritos de guerra, mas será construído no dia-a-dia, nas pequenas e grandes obras e que, muitas vezes, é preciso comprar batalhas longas e desgastantes. Ser de esquerda é, na batalha, não usar os métodos do inimigo.
Fernando Evangelista

quinta-feira, outubro 06, 2011

Capitalismo repudiado nos EUA

Barack e Michelle Obama se casaram no dia 03 de outubro de 1992, em Chicago. Completaram, portanto, na última segunda-feira, 19 anos de casados. Mas a comemoração aconteceu no último sábado.
Mal terminou o discurso em um evento promovido por uma organização de direitos dos gays, em Washington, Obama se apressou em buscar sua Michelle, que o esperava prontinha na porta de casa, para levá-la ao luxuoso restaurante Eva, em Alexandria, Virginia, a sete milhas da Casa Branca.
O preço médio do Eva – um restaurante exclusivo, para apenas 34 pessoas - é de 150 dólares por cabeça. Caro para nós, pobres mortais, mas não para o presidente dos EUA.
O dono do restaurante prefere não divulgar o prato que o primeiro casal degustou, mas jornalistas apuraram que eles comeram salada de tomate com manjericão, contendo legumes cultivados com exclusividade, queijo gruyere,  lagosta do Maine, cozida na manteira, com milho do Eastern Shore, servida com molho tártaro e basil, e otras cositas más.
Feliz da vida, Michelle disse que o segredo da longevidade do casamento é rir e não levar as coisas muito a sério em casa.
No mesmo sábado em que o presidente e a mulher comiam lagosta do Maine, 700 pessoas eram presas em Nova York no protesto chamado  "Occupy Wall Street" (Ocupar Wall Street), que está entrando em sua terceira semana.
Os manifestantes, que protestam contra a ganância do sistema financeiro e a acumulação da riqueza nas mãos de poucos, resolveram marchar sobre a Ponte do Brooklin. A marcha ia bem até que os manifestantes fecharam a ponte ao tráfego,  provocando a intervenção da polícia que efetuou centenas de prisões.
O objetivo dos ativistas é ocupar a área sul de Manhattan, onde está a famosa Wall Street, com 20 mil pessoas. Todos estão dormindo nas ruas e prometem ficar acampados durante meses, se for preciso.
Depois de vários enfrentamentos com a polícia, um dos líderes do movimento destacou que "este não é um protesto contra a polícia de Nova York. É um protesto de 99% da população contra o poder desproporcional de 1% que controla 50% da riqueza do país". E incentivou a polícia a juntar-se aos manifestantes.
“Occupy Wall Street”, que começou com meia dúzia de gatos pingados, na verdade gatas pingadas, porque o movimento partiu de mulheres preocupadas com o destino dos filhos, que acabariam a universidade e não teriam onde se empregar, transformou-se em uma extraordinária manifestação contra o sistema capitalista, mesmo que a maioria dos participantes não tenha consciência do que isso significa.
Da desorganização inicial e da sabotagem da mídia tradicional, o movimento ganhou força a cada dia.  Conquistou o apoio de artistas e intelectuais de pensamento  progressista, como o cineasta Michael Moore e a atriz Susan Sarandon. Já tem até um jornalzinho, o `The Occupied Wall Street Journal` .
O curioso é que o movimento – que hoje se espalha por cidades importantes, como Chicago e Boston – não é aparentemente partidário ou especificamente contra o governo Obama.  A raiva dos manifestantes, a maioria jovem, é contra o sistema que socorre bancos, enquanto faz vistas grossas para o crescimento da pobreza, como provam os  números do Censo. O povão está nas ruas pedindo que "não alimentem os bancos" e "taxem os ricos".
O descontentamento popular repudia o sistema tributário – denunciado outro dia pelo bilionário Warren Buffett – que privilegia os ricos com isenções e deduções que não estão ao alcance dos assalariados. No fim, o imposto pago pelos mais ricos é, percentualmente,  menor do que o que é tomado à força de quem vive de salário.
Até agora a classe política prefere ignorar o movimento. Os republicanos se desgastam em debates televisivos para definir os nomes dos que serão levados à Convenção do partido que vai escolher o adversário de Obama no ano que vem. E este, com poucas chances de tirar a economia do buraco em que se encontra, tenta conquistar o apoio da classe média, dos pobres e das minorias.
Mas voltando à ocupação de Wall Street, cá pra nós,  creio que nem o mais empedernido comunista do século passado poderia imaginar que surgiria uma revolta contra o sistema capitalista de distribuição da riqueza dentro dos Estados Unidos, melhor ainda, em Wall Street, o templo da ganância, da especulação e do desprezível capitalismo selvagem.
Agora, é aguardar os próximos passos do movimento e até onde vai sua força.

Nenhum comentário:

Postar um comentário