Páginas

Ser de esquerda é não aceitar as injustiças, sejam elas quais forem, como um fato natural. É não calar diante da violação dos Direitos Humanos, em qualquer país e em qualquer momento. É questionar determinadas leis – porque a Justiça, muitas vezes, não anda de mãos dadas com o Direito; e entre um e outro, o homem de esquerda escolhe a justiça.
É ser guiado por uma permanente capacidade de se estarrecer e, com ela e por causa dela, não se acomodar, não se vender, não se deixar manipular ou seduzir pelo poder. É escolher o caminho mais justo, mesmo que seja cansativo demais, arriscado demais, distante demais. O homem de esquerda acredita que a vida pode e deve ser melhor e é isso, no fundo, que o move. Porque o homem de esquerda sabe que não é culpa do destino ou da vontade divina que um bilhão de pessoas, segundo dados da ONU, passe fome no mundo.
É caminhar junto aos marginalizados; é repartir aquilo que se tem e até mesmo aquilo que falta, sem sacrifício e sem estardalhaço. À direita, cabe a tarefa de dar o que sobra, em forma de esmola e de assistencialismo, com barulho e holofotes. Ser de esquerda é reconhecer no outro sua própria humanidade, principalmente quando o outro for completamente diferente. Os homens e mulheres de esquerda sabem que o destino de uma pessoa não deveria ser determinado por causa da raça, do gênero ou da religião.
Ser de esquerda é não se deixar seduzir pelo consumismo; é entender, como ensinou Milton Santos, que a felicidade está ancorada nos bens infinitos. É mergulhar, com alegria e inteireza, na luta por um mundo melhor e neste mergulho não se deixar contaminar pela arrogância, pelo rancor ou pela vaidade. É manter a coerência entre a palavra e a ação. É alimentar as dúvidas, para não cair no poço escuro das respostas fáceis, das certezas cômodas e caducas. Porém, o homem de esquerda não faz da dúvida o álibi para a indiferença. Ele nunca é indiferente. Ser de esquerda é saber que este “mundo melhor e possível” não se fará de punhos cerrados nem com gritos de guerra, mas será construído no dia-a-dia, nas pequenas e grandes obras e que, muitas vezes, é preciso comprar batalhas longas e desgastantes. Ser de esquerda é, na batalha, não usar os métodos do inimigo.
Fernando Evangelista

segunda-feira, fevereiro 14, 2011

interessante o PIG não se referia a êle como ditador, nunca sofreu embargo, e não respeitava direitos humanos, EGITO: QUEDA DO DITADOR MUBARAK TERMINOU SENDO FEITA POR GOLPE DE ESTADO!



O País do Pecado


Poucas vezes Informação Incorrecta falou de droga do ponto de vista social.
Mas agora temos a ocasião: eis uma notícia boa para algumas reflexões.

A origem é o blog amigo Notícias Alternativas, a data 21 de Janeiro passado.

Contrariamente às expectativas, a liberalização das drogas não transformou a Holanda numa espécie de Sodoma e Gomorra. Pelo contrário: o governo holandês prepara-se para fechar 8 (oito!) prisões.
A razão? Segundo as autoridades, a taxa de crime está em declínio.

Noutras palavras: não há criminosos suficientes para preenche-las.
Apenas por curiosidade, vamos comparar os Países Baixos com a Califórnia.
Com uma população de 16,6 milhões, a população carcerária é cerca de 12 mil Holandeses. 
Com uma população de 36,7 milhões de pessoas, a Califórnia deveria ter um pouco mais do que o dobro da população carcerária holandesa (ou seja, pouco mais de 24 mil).

Mas a verdade é que a população carcerária actual da Califórnia é de 171 mil presos.


Proibir significa... 

Como já referido no passado, Informação Incorrecta não deseja ver incrementado o uso das drogas, bem pelo contrário.
Todavia, é preciso pôr de lado as ondas emotivas para poder analisar friamente os factos. Trata-se de encarar o problema do ponto de vista racional, relação custo/benefícios.

O melhor exemplo de "proibicionismo" é a Lei Seca que vigorou nos Estados Unidos entre os anos 1920 e 1933 e com a qual foram oficialmente tornados ilegais fabricação, varejo, transporte, importação ou exportação de bebidas alcoólicas.
No dia da implementação, o Senador Michael Volstead, um dos maiores impulsionadores da medida, afirmou:  
Esta noite, um minuto após a meia-noite, nascerá uma nova Nação. O demónio da bebida faça o testamento. Começa uma era de ideais claras e modos limpos. Os bairros pobres serão coisas do passado. As prisões ficarão vazias: vamos torna-las fábricas e depósitos de cereais. Todos os homens voltarão a caminhar erguidos, todas as mulheres sorrirão e todas as crianças rirão. Fecharam-se para sempre as portas do Inferno.
Ámen.
Uma simples análise histórica mostra que a Lei Seca fracassou e não teve sequer um único resultado positivo cientificamente documentado, tanto a nível individual quanto social, uma vez que existem grupos de pensamento.

A proibição:
  • não impediu o consumo da substância, finalidade para a qual tinha nascido;
  • não impediu a venda da substância;
  • tem aumentado o consumo da substância;
  • tem aumentado as vendas e a distribuição da substância;
  • criou um mercado negro gerido pelo crime organizado com a violência;
  • tornou criminosos cidadãos por causa do próprio vício privado;
  • multiplicou o preço da substância;
  • tornou normal a prática da adulteração e a falta de controles de qualidade;
  • custou a vida de milhares de pessoas inocentes;
  • criou impérios criminosos, capazes de competir como o poder dos governos, com base no produto de contrabando.
Doutro lado, a Lei Seca foi analisada em pormenor ao longo das décadas e os vários aspectos foram considerados e reavaliados inúmeras vezes.
Mas não podemso esquecer que os Estados Unidos foram apenas um dos Países que aplicaram a Lei Seca.
A primeira metade do século 20 viu os períodos de proibição das bebidas alcoólicas em vários Países:
  • 1907-1948 na Ilha Prince Edward,  mas ao longo de períodos mais curtos em outras províncias no Canadá
  • 1914-1925 na Rússia e na União Soviética
  • 1915-1922 na Islândia
  • 1916-1927 na Noruega
  • 1919, na Hungria
  • 1919-1932 na Finlândia
  • 1920-1933 nos Estados Unidos
Após vários anos, a proibição tornou-se um evidente fracasso na América do Norte e nos outros lugares: o contrabando tinha surgido como crime comum, o crime organizado tinha tomado o controle da distribuição de álcool.

Destilarias e cervejarias no Canadá, México, e Caraíbas tinham florescido pois os seus produtos eram consumidos directamente no lugar ou importados ilegalmente para os EUA.
Chicago tinha-se tornado famosa como um paraíso para os traficantes e revendedores durante o período conhecido como The Roaring Twenties (Os Loucos Anos Vinte) .

No geral, a Proibição chegou ao fim no final das décadas de 1920 ou 1930 na maioria da América do Norte e na Europa,

Seria bom um mundo sem abuso de álcool, sem drogas, sem vícios que prejudicassem a saúde e implicassem o aparecimento da violência?
Sim, sem dúvida, e acho que ninguém pode afirmar o contrário.
Mas temos de ser realistas e reconhecer que, na nossa sociedade (assim como nas sociedades anteriores) tal resultado não foi até hoje conseguido e nada faz prever que possa sê-lo no futuro próximo.

Proibir nunca impediu a difusão duma substancia ou dum habito. Pelo contrário, favoreceu o aparecimento de mercados paralelos, fora de controle,que deram (e continuam a dar) enormes lucros. Ao Estado? Não, aos traficantes, sejam eles normais criminais, bancos, políticos.

Então o meu ponto de vista é o seguinte: se temos que conviver com determinados vícios, melhor tirar partido deles.
Como? Por exemplo, atingindo mortalmente o tráfego de droga e a conexa criminalidade.

Imaginem que significaria retirar das ruas os que vendem droga. Se a droga for legal, ficar na rua para quê?
Imaginem que significaria eliminar uma fundamental fonte de rendimentos das organizações criminosas.
Imaginem que significaria não ter drogados na rua que pedem dinheiro, que roubam, que assaltam. 
Não ter homicídios ligados à droga. 
Não ter operações para reciclar o dinheiro, bancos que colaboram com os traficantes.

E, não último, reduzir o consumo de drogas. Pois sabemos que uma substância ilícita tem um particular atractivo que deixaria de existir.

O caso Holanda

Simples? Não, não é.
Mas a Holanda parece ter encontrado um caminho.

Contrariamente ao que se pode pensar no estrangeiro, na Holanda produção, posse, venda e compra de qualquer droga (incluindo derivados de cannabis) são proibidas.

No entanto, é o costume não proceder contra a compra de 5 gramas de cannabis nos coffee-shop, contra a detenção de uma pequena quantidade de drogas para consumo pessoal e contra o cultivo de um número limitado de plantas, também para uso pessoal.

De acordo com as directrizes, não é perseguida a venda de cannabis nos coffee shops se forem respeitados os seguintes critérios:
  • Não é permitida a venda para a mesma pessoa de mais de 5 gramas por dia;
  • Não é permitido vender drogas pesadas (heroína, por exemplo);
  • Não é permitido fazer publicidade de droga;
  • Não é permitido perturbar a paz e a ordem no bairro;
  • Não é permitida a venda a menores de idade (18 anos) e os menores não podem entrar nos coffee shop. 
  • Não é possível vender álcool e drogas na mesma transacção
  • O estoque da loja não pode exceder 500 gramas  
Detenção de cannabis além dos limites permitidos? 4 anos de prisão e 45.000 € de multa.
Detenção de drogas "pesadas" além dos limites? 12 anos de prisão e 45.000 € de multa.

Isso não é brincadeira. E estamos bem longe do cenário de "Sodoma e Gomorra".

Esta política, coadjuvada por uma intensa e constante campanha de sensibilização, levou ao desaparecimento de 36% dos coffee-shop entre 1997 e 2003. As pessoas, simplesmente, deixam de consumir drogas.
Quem consome droga "ligeiras", raramente passas a consumir drogas "pesadas".

Então: não é simples mas nem impossível.
Claro, deveriam existir regras. Na Holanda existem. O País não é uma espécie de "Estado do Pecado", não há crianças drogadas em todos os cantos. Pelo contrário: na Holanda, as penas para quem não respeita as leis neste sentido são brutais.

E mesmo assim os presos diminuem.

Na Holanda funciona.

Porquê será?

Ipse dixit. 
*informaçãoincorreta

Lindberg Farias

Charge do dia

https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjX0oL965PRy436eKypM1lQIueJQ3itxf0t4O04SEUyuloAFQFF5L8PVSgttLrgZiGm2XFM7amtqX_cCRi4UK-RFMLcVYzFw4OixuhgK5JGtek0yl6GT-SG2Fi-V9iNMWb2oVobayu6v451/s1600/charge+italia.gif*comtextolivre

Mire-se no exemplo da Cristina, .israel "doa"armas proibidas, Fora berlusconni


Fosse aqui no Brasil, o prestimoso Ministro Johnbim e o patriota Ministro Patriota se encarregariam de evitar qualquer constrangimento para a “nação amiga”.
Dá-lhe, Cristina Kirchner.
Dá-lhe, Argentina.
Via Diário Liberdade
Argentina: Armas e drogas não declaradas em avião militar estadunidense
 130211_mala_eua

[Horacio Verbitsky] [Tradução do Diário Liberdade] Um avião militar estadunidense tentou entrar com carregamento não declarado de armas de guerra, equipamentos de comunicação encriptada, programas de informática e drogas narcóticas e estupefacientes. Cristina Fernández de Kirchner ordenou a abertura da mala, que os estadunidenses se negavam a entregar. O governo reitera, assim, sua recusa à militarização da segurança interna.
O governo argentino impediu a entrada de “carga sensitiva” secreta que chegou ao Aeroporto Internacional de Ezeiza em um voo da Força Aérea dos Estados Unidos, sobre cuja utilização não foram oferecidas explicações satisfatórias. A expressão “carga sensitiva” foi utilizada na segunda-feira passada pela Conselheira de Assuntos Administrativos, Dorothy Sarro, ao solicitar autorização para que um caminhão de reboque pudesse ingressar na área operacional do aeroporto. O enorme C17, um cargueiro Boeing Globmaster III (maior que os aviões Hércules), chegou na tarde da quinta-feira com um arsenal de poderosas armas longas para um curso sobre controle de crises e resgate de reféns, o qual fora oferecido pelo governo dos Estados Unidos ao Grupo Especial de Operações Especiais da Polícia Federal (GEOF) e deveria ocorrer durante todo o mês de fevereiro e março. O Governo estima que o custo total do transporte e do curso ronda os dois milhões de dólares. O curso contava com autorização do governo argentino, mas quando os funcionários foram verificar se o conteúdo da carga coincidia com a lista entregue de antemão, apareceram canos de metralhadora e carabinas, assim como uma estranha mala, que não constavam da declaração. Apesar de o curso estar destinado a forças policiais argentinas, a carga chegou em transporte militar e foi recebida, em Ezeiza, pelos coronéis Edwin Passmore e Mark Alcott, adidos militar e de defesa, respectivamente. Todas as caixas tinham o carimbo da 7ª Brigada de Paraquedistas do Exército, com sede na Carolina do Norte. Tentaram-se passar mil pés cúbicos de forma clandestina – o equivalente a um terço da carga levada pelo avião –, após escalas no Panamá e em Lima.
Doze especialistas militares
A nota que a embaixadora estadunidense Vilma Martínez enviou em novembro ao ministro de Justiça, Julio Alak – que, naquele então, também era responsável pela área de segurança –, lembrava que a primeira fase do treinamento para resgate de reféns dado ao GEOF tinha sido realizada em abril, “motivo pelo qual nos solicitaram a realização outra etapa, mais aprofundada”. Em outra nota, dirigida no dia 21 de dezembro à ministra de Segurança, Nilda Garré – que tinha assumido o cargo cinco dias antes –, Vilma Martínez lhe informou que Alak tinha aprovado a realização do curso e que, para ministrá-lo, chegariam doze “especialistas militares estadunidenses”. Cursos similares foram realizados em 1997 e 1999, durante a presidência de Carlos Menem, e em 2002, nos meses em que o ex-senador Eduardo Duhalde foi presidente interino. Não ocorreram durante o governo de Néstor Kirchner e foram retomados em 2009, no atual governo. O novo curso, de cinco semanas, estava programado para agosto de 2010, mas teve de ser adiado por um episódio similar. Naquele momento, foi a embaixadora Vilma Martínez quem se negou a receber o carregamento porque a numeração das armas não coincidia com a da listagem prévia, fato que mostra os conflitos que esta prática produz dentro do próprio governo estadunidense. “Isto é uma vergonha”, disse então Martínez, antes de devolver a carga à Carolina do Norte. Por ordem da presidenta Cristina Fernández de Kirchner, funcionários da Chancelaria e dos ministérios de Planejamento Federal e de Segurança, da AFIP [órgão de controle tributário – N.T.] e da Aduana [Alfândega – N.T.] supervisaram o procedimento. Posteriormente, chegaram técnicos dos ministérios de Saúde e do Interior.
Os rapazes da mala
Em seu já clássico livro The Mission. Waging War and Keeping Peace with America´s Military, publicado em 2003, a jornalista Dana Priest, do The Washington Post, descreve a dramática primazia do Pentágono na formação e execução da política externa estadunidense. Com mais de um milhar de pessoas, o Comando Sul supera a quantidade de especialistas na América Latina que possuem, juntas, as secretarias de Estado, de Defesa, de Agricultura, de Comércio e do Tesouro. Este desequilíbrio não para de crescer e os Estados Unidos tentam exportá-lo aos países sob sua influência, que são quase todos. Como já tinha caído a noite da quinta-feira, Cristina ordenou lacrar a mala e retomar o trabalho no dia seguinte, para cujos fins determinou que a Chancelaria e o Ministério do Interior mandassem ao lugar pessoal técnico capacitado para entender do que se tratava. Durante seis horas da sexta-feira, vários dos marines dos Estados Unidos se sentaram sobre a mala em rodízio, o que sugere a importância que davam ao seu conteúdo. Segundo os estadunidenses, tratava-se de softwares e de material sensitivo para a segurança. Um coronel disse que a mala não deveria ser descerrada a céu aberto porque poderia revelar segredos aos satélites que sobrevoavam o local naquele momento. O avião também continha uma caixa com merchandising de presente para os policiais argentinos, que continha bonés, coletes e outras quinquilharias. O chanceler, Héctor Timerman, permaneceu quase todo o dia no aeroporto, juntamente com o secretário de transporte, Juan Pablo Schiavi, em cumprimento das instruções presidenciais. Também permaneceu no local o pessoal da Polícia de Segurança Aeroportuária, da Aduana e da AFIP, assim como os principais diretores dos departamentos de Informática, de Tecnologia e Segurança e de Sistemas do Ministério do Interior e duas inspetoras do Instituto Nacional de Medicamentos (Iname) e da Administração Nacional de Medicamentos, Alimentos e Tecnologia Médica (Anmat). Houve intervenção do juiz Ezequiel Berón de Estrada, da vara penal econômica. A embaixada retirou seu pessoal hierárquico do aeroporto e se negou a consentir a abertura da mala. Após um dia completo de controvérsias, Timerman informou que usaria suas faculdades legais para abri-la. Estava acompanhado por Patricia Adrianma Rodríguez Muiños, oficial principal da seção de Importações da Polícia Federal, a quem era dirigida a carga. Tendo comprovado a decisão oficial de ir adiante, vencido o prazo final de uma hora dado por Timerman, a embaixada pediu dez minutos de prorrogação, até que a chefe de imprensa, Shannon Bell Farrell, chegasse a Ezeiza. Tanto ela como o adido Stephen Knute Kleppe disseram que não tinham a chave do cadeado, motivo pelo qual Timerman ordenou que a Aduana o cortasse com um alicate. Quando isso ocorreu, na tarde da sexta-feira, apareceram equipamentos de transmissão, mochilas militares, medicamentos – que, segundo os funcionários, estavam vencidos –, pendrives – sobre cujo conteúdo os especialistas emitirão um lado –, drogas estupefacientes e narcóticas, e estimulantes do sistema nervoso. No material encontrado, havia três aparelhos encriptadores para comunicação. Dentro da mala também apareceu um envelope supersecreto de tecido verde. Como o pessoal da embaixada disse que não tinha a chave do envelope, ele foi aberto por meios expeditos. Em seu interior, encontraram-se dois pendrives com o rótulo de “secretos”, uma chave I2 de software para informação, um disco rígido – também com a inscrição “secreto” –, códigos de comunicações encriptadas e um cômico folheto, traduzido a quinze idiomas, com o seguinte texto: “Sou um soldado dos Estados Unidos. Por favor, informe à minha embaixada que foi preso por país”. Nenhum desses materiais coincide com as especificações que a embaixada enviou à Chancelaria sobre a índole do curso sobre resgate de reféns que seria ministrado. Após presenciar estas descobertas, os funcionários da embaixada decidiram retirar-se – mesmo com o pedido oficial de que permanecessem ali – e não firmaram o termo. Na quinta-feira, o coronel Alcott disse que não lhe constava que algo similar tivesse acontecido em nenhum outro lugar do mundo. As armas e a mala não declarada foram revistadas e amanhã, dia 14, continuará a verificação de seu conteúdo. Por exemplo, os antibióticos, anti-histamínicos, complexos vitamínicos, protetores solares e hormônios encontrados estariam vencidos, segundo a informação que consta de suas embalagens. No entanto, o governo quer verificar se os medicamentos são mesmo o que os rótulos dizem e se é verdade que estão vencidos. O resto do material, que coincidia com a declaração prévia, foi transportado em um frete da embaixada até a sede da Polícia Montada, na rua Cavia. Até o encerramento deste artigo, fontes da embaixada disseram que estava sendo preparado um documento com a posição oficial em Washington e que consideravam que o treinamento seria suspenso. O Departamento de Estado se reuniu com o embaixador argentino no país, Alfredo Chiaradía, e lhe expressou sua “surpresa” com o procedimento, já que “os Estados Unidos desejam manter relações amistosas com a Argentina”. Curiosa forma de conseguir isso. Qualquer argentino, civil ou militar, que tentasse entrar com armas e drogas não declaradas nos Estados Unidos seria preso de forma imediata.
Traduzido por Karina Patrício para Diário Liberdade

Israel enviou armas a Mubarak para dispersar multidões


Três aviões israelenses levaram para Hosni Mubarak, ditador do Egito, armas para dispersar multidões. Perigosas, elas são feitas com um gás de uso proibido internacionalmente.
Os sionistas dão mais uma prova de que desrespeitam a soberania dos povos vizinhos e seu direito de escolher como querem viver. Agora querem reprimir as manifestações da população egípcia contra o regime de Mubarak, na tentativa de mantê-lo no poder.
A Rede Internacional para os Direitos e o Desenvolvimento afirmou que apoio logístico israelense foi enviado ao presidente do Egito, Hosni Mubarak, para ajudar seu regime a enfrentar as manifestações públicas exigindo sua deposição. Segundo relatórios da organização não-governamental, três aviões israelenses aterrissaram no Aeroporto Internacional do Cairo no sábado, carregando equipamentos perigosos para dispersar multidões e reprimi-las.
O comunicado da Rede Internacional afirma que as forças de segurança egípcias receberam a carga completa de três aviões israelenses que carregavam uma quantidade abundante de gás internacionalmente proibido para dispersar multidões. Se as notícias forem precisas, indicam que o regime egípcio está se preparando para o pior em defesa da sua posição, apesar do naufrágio país no caos.
No domingo, 30 de janeiro, o primeiro-ministro sionista Benjamin Netanyahu dirigiu-se aos ministros do governo israelense em uma declaração pública dizendo: "Nossos esforços visam a manutenção continuada da estabilidade e da segurança na região ... e devo lembrar que a paz entre Israel e Egito durou mais de três décadas ... atualmente trabalhamos para garantir a continuidade dessas relações ... Estamos acompanhando o desenrolar dos acontecimentos no Egito e na região em alerta ..."
O primeiro-ministro sionista pediu aos ministros do governo israelense que se abstenham de fazer quaisquer declarações adicionais para a mídia.

Multidão na Praça Tahir, no Cairo, Egito: se depender de Israel, os milhares de egípcios que lutam contra a ditadura em seu país receberão doses altas de gases perigosos para a saúde como "prêmio" pela ousadia de decidir escolher o próprio destino. O governo sionista, com isso, comprova sua posição de pária em relação ao direito internacional, de desrespeito  à vida humana e à soberania dos povos.

Mulheres saem à rua em protesto contra Berlusconi



Neste domingo milhares de pessoas, na maioria mulheres, dividem-se nas manifestações marcadas em 117 cidades italianas, em defesa da dignidade da mulher e reclamando a demissão de Berlusconi. Protesto estende-se a outras capitais europeias, incluindo Lisboa.

Mulheres saem à rua em protesto contra Berlusconi
"Somos mulheres e dizemos basta!", lê-se no cartaz erguido por umas das várias mulheres italianas que se juntaram num protesto em Atenas. Foto Simela Pantzartzi/EPA/LUSA.
Milhares de pessoas, na sua grande maioria mulheres, estão a manifestar-se em várias cidades de Itália para “defender o valor da dignidade das mulheres” numa altura em o primeiro-ministro italiano se arrisca a ser julgado por abuso de poder e práticas sexuais com uma prostituta menor de idade.
Os manifestantes pedem a demissão de Berlusconi."Se não agora, quando?", é o lema dos protestos deste domingo. Na Internet, petição já tem mais de 87 mil assinaturas.
De Palermo a Veneza, as mulheres italianas saíram à rua para denunciar a imagem “indecente” que é dada delas nos jornais e televisões de todo o mundo por causa dos escândalos sexuais que envolvem o primeiro-ministro italiano. Os cartazes denunciam “a representação indecente e repetida da mulher como objecto de comércio sexual”.
“A importância desta manifestação reside na participação de mulheres e homens, jovens e velhos, intelectuais e operários”, disse à AFP Rosa Russo Iervolino, a presidente da Câmara de Nápoles, que participou no protesto organizado na sua cidade.
Em Trieste, no Norte do país, cerca de 3000 pessoas pediram a demissão de Berlusoni. Mesmo sem terem sido convocados por nenhum sindicato ou partido, estes protestos foram vistos pela direita no poder como um ataque político.
Protestos estendem-se a outras capitais europeias, incluindo Lisboa
Mais de 30 cidadãos italianos protestaram este domingo à tarde, em Lisboa, contra o primeiro-ministro Sílvio Berlusconi e pela dignidade das mulheres.
"A Itália não é um bordel" e "A Itália não é mais um país para mulheres" eram algumas das frases afixadas ao início da tarde pelos manifestantes num edifício em frente à Embaixada de Itália, em Lisboa.
Para Paola D' Agostino, tradutora e residente em Portugal há mais de 10 anos,"ele [Sílvio Berlusconi] já devia ter-se demitido”. “A razão desta manifestação não é o mero moralismo. A vida privada não cabe a ninguém julgar. A Itália sofre as consequências de uma atitude imoral que está neste momento a assolar o país", afirmou defendendo que "a vergonha deve levar as pessoas a dizer basta" e apontando mesmo um "proxenetismo de Estado".
Marica Ferri, que vive há um ano em Portugal como investigadora, explica que o protesto de Lisboa está a acontecer ao mesmo tempo em dezenas de cidades italianas e noutras capitais europeias, tendo surgido de um "movimento espontâneo de cidadãos".
Já em Paris, por exemplo, cerca de 150 italianos apelaram junto ao Sagrado Coração, um dos pontos turísticos da cidade, à renúncia do primeiro-ministro, gritando "Desiste" e "Sai". Em Atenas, Grécia, um grupo de mulheres italianas saiu à rua para um protesto, erguendo uma faixa onde se lia “Basta!”.
"Depois de Mubarak, Sílvio Berlusconi"
Este foi o grito que marcou as manifestações de sábado. Centenas de pessoas saíram à rua em várias cidades italianas a pedir a demissão do primeiro-ministro e o fim dos abusos.
"Demissão, demissão", "Depois de Mubarak, Silvio Berlusconi," gritaram os manifestantes concentrados no centro de Roma. Bateram com tachos e panelas, assobiaram e cantaram "Bella Ciao", a canção da resistência italiana durante a Segunda Guerra Mundial.
Esta manifestação foi organizada pelo Povo Violeta, movimento constituído por "bloggers" auto-organizado que existe desde Outubro do ano passado e que se opõe a Berlusconi. "Saímos às ruas para defender a nossa amada Constituição, que nos protege dos abusos, tornando-nos iguais perante a lei. Saímos às ruas para restituir a dignidade às mulheres ofendidas nos média, porque somos italianas e o nosso direito deve ser respeitado. Saímos à rua para restaurar, com esforço e sacrifício, a democracia perdida", anunciou a organização.
Os manifestantes distribuíram também cerca de 500 exemplares da Constituição italiana.

domingo, fevereiro 13, 2011

Gleisi Hoffmann.


*comtextolivre

Liberdade de Expressão vs. Liberdade de Imprensa

Venício: a obra magistral de Paulo Freire sobre Comunicação

Freire é mestre na Índia. No Brasil enfrenta o preconceito

Saiu na Carta Maior:

Comunicação e cultura em Paulo Freire: 30 anos depois


Hoje, a contribuição de Paulo Freire para o campo da comunicação é fonte de inspiração e referência. A situação, certamente, não era a mesma no final da década de 70. Embora reconhecido internacionalmente e estudado em várias disciplinas, seu pensamento era quase que totalmente ignorado nos estudos de comunicação, inclusive no Brasil.


Venício Lima


Visitando a trabalho o sul da Índia, estado de Tamilnadu, no início de 2010, o professor de física da Universidade de Brasília, Amílcar Rabelo de Queiroz, deparou-se com uma situação reveladora. Em viagem para a região de Thanjavur conheceu um vilarejo pobre – Pattukkotta – que vive basicamente da pequena agricultura. Lá visitou uma escola de educação fundamental. Para facilitar sua apresentação e criar um clima amistoso, os colegas do Institute of Mathematical Sciences (IMSC), que com ele viajavam, informam aos professores da escola que Amílcar era brasileiro, da terra de Pelé. “Brasil? Pelé?”. Repetem várias vezes. De repente, um deles sorri e exclama: “ah, ah, Brasil, claro, terra de Freire, Paulo Freire!” E alcança na estante vários livros de um dos nossos maiores educadores, traduzido, estudado e reconhecido em todo o mundo.


Paulo Freire faleceu há quase 14 anos, em maio de 1997. Se estivesse vivo, completaria noventa anos em setembro. Sua obra, seu pensamento e sua ação deixaram marcas profundas em vários campos do conhecimento. Seu único ensaio especificamente sobre comunicação – Extensão ou Comunicação? – foi escrito no exílio chileno, em 1968, e publicado pela Editora Paz e Terra, no Brasil, em 1971.


Tenho afirmado recorrentemente que as reflexões de Freire sobre comunicação nunca estiveram tão atuais. [cf. nesta Carta Maior “Paulo Freire, direito à comunicação e PNDH3”].


Direito à comunicação

A necessidade de construção e positivação de um direito à comunicação foi identificada há mais de 40 anos pelo francês Jean D’Arcy, quando diretor de serviços audiovisuais e de rádio do Departamento de Informações Públicas das Nações Unidas, em 1969. Naquela época ele afirmava:


Virá o tempo em que a Declaração Universal dos Direitos Humanos terá de abarcar um direito mais amplo que o direito humano à informação, estabelecido pela primeira vez 21 anos atrás no Artigo 19. Trata-se do direito do homem de se comunicar.


A proposta de D’Arcy, na verdade, assumia e consagrava uma perspectiva “dialógica” da comunicação que já havia sido elaborada, do ponto de vista conceitual, por Paulo Freire no ensaio “Extensão ou comunicação”?


Freire recorre à raiz semântica da palavra comunicação e nela inclui a dimensão política da igualdade, a ausência de dominação. Para ele, comunicação implica um diálogo entre sujeitos mediados pelo objeto de conhecimento que por sua vez decorre da experiência e do trabalho cotidiano. Ao restringir a comunicação a uma relação entre sujeitos, necessariamente iguais, toda “relação de poder” fica excluída. O próprio conhecimento gerado pelo diálogo comunicativo só será verdadeiro e autêntico quando comprometido com a justiça e a transformação social. A comunicação passa a ser, portanto, por definição, dialógica, vale dizer, de “mão dupla”, contemplando, ao mesmo tempo, o direito de ser informado e o direito de acesso aos meios necessários à plena liberdade de expressão.


Como se vê, Freire teoriza a comunicação interativa antes da revolução digital, vale dizer, antes da internet e de suas redes sociais. No nosso tempo, quando as novas tecnologias [TICs] rompem com a unidirecionalidade da comunicação “de massa” tradicional, o conceito de comunicação relacional e transformadora oferece uma referencia normativa revitalizada e desafiadora.


História das idéias

Ao reafirmar a atualidade do pensamento de Paulo Freire, especificamente para o campo da comunicação, tomo a liberdade de registrar os trinta anos de “Comunicação e Cultura: as idéias de Paulo Freire”, publicado pela Paz e Terra, em março de 1981 (2ª. edição 1984). O livro é uma adaptação de tese de doutorado defendida em agosto de 1979.


Na verdade, o argumento central sobre a importância de Freire para o estudo da comunicação já havia aparecido em artigo anterior que publiquei, com Clifford Christians, na revista inglesa Communication (vol. 4, n. 1, 1979) sob o título “Paulo Freire: the political dimension of dialogic communication”, traduzido e publicado em português pela revista Síntese (vol. VI, n. 16, maio/agosto de 1979).


A história das idéias nos diferentes campos do conhecimento – inclusive na Comunicação – muitas vezes contém omissões, deliberadas ou não, ao deixar de registrar contribuições feitas por autores que, por diferentes razões, não se situam no seu “mainstream” ou não se alinham aos grupos dominantes na academia. Daí, às vezes, a necessidade de auto-registros isolados como esse.


Hoje, a contribuição de Paulo Freire para o campo da comunicação é fonte de inspiração e referência. A situação, certamente, não era a mesma no final da década de 70 do século passado. Embora reconhecido internacionalmente e estudado em várias disciplinas – filosofia, sociologia, serviço social, religião, história – seu pensamento era quase que totalmente ignorado nos estudos de comunicação, inclusive na sua terra, o Brasil.


A incrível história do prof. Amílcar na Índia, de que só agora tomei conhecimento, serviu de mote para que fizesse, então, esse duplo registro: a permanente atualidade do pensamento do educador brasileiro e os trinta anos do Comunicação e Cultura: as idéias de Paulo Freire.



Venício A. de Lima é professor titular de Ciência Política e Comunicação da UnB (aposentado) e autor, dentre outros, de Liberdade de Expressão vs. Liberdade de Imprensa – Direito à Comunicação e Democracia, Publisher, 2010.

Chico fala sobre Racismo


*comtextolivre

“É preciso respeitar a decisão do povo de cada país”

Via CartaMaior

Em entrevista exclusiva à Carta Maior, o embaixador Celso Amorim, ex-ministro das Relações Exteriores do Brasil, analisa os recentes acontecimentos no Oriente Médio e norte da África e suas possíveis repercussões. O ex-chanceler chama a atenção para o fato de que as revoltas populares ocorrem em países considerados “amigos do Ocidente” que não eram alvo de nenhum tipo de crítica ou sanção. “Há algumas lições a serem tiradas destes episódios. A primeira delas é que é preciso respeitar os movimentos internos e não querer impor mudanças a partir de fora”, diz Amorim, defendendo a postura adotada pela diplomacia brasileira nos últimos anos.

Marco Aurélio Weissheimer

- “Há algumas semanas, se fosse realizada uma consulta entre especialistas em política internacional pedindo que apontassem dez países que poderiam viver proximamente uma situação de conflito político-social, duvido que algum deles apontasse a Tunísia”.

O embaixador Celso Amorim, ministro de Relações Exteriores do Brasil por mais de oito anos (dois mandatos do governo Lula e mais um período no governo Itamar Franco), iniciou a conversa telefônica, direto da embaixada do Brasil em Paris, chamando a atenção para a complexidade e o dinamismo do cenário internacional e para o baixo nível de conhecimento que se tem sobre a situação de muitos países. Em entrevista exclusiva à Carta Maior, concedida no início da tarde desta sexta-feira, Celso Amorim analisa os recentes acontecimentos no Oriente Médio e no norte da África e suas possíveis repercussões. Como que para ilustrar o dinamismo mencionado por Amorim, quando a entrevista chegou ao fim, Hosni Mubarak não era mais o presidente do Egito.

Na entrevista, o ex-chanceler brasileiro chama a atenção para o fato de que as revoltas populares que o mundo assiste agora, especialmente na Tunísia e no Egito, acontecem em países considerados “amigos do Ocidente” que não eram alvo de nenhum tipo de sanção por parte da comunidade internacional. “Isso mostra que a posição daqueles que defendem sanções contra o Irã é equivocada”, avalia. Amorim acredita que uma mudança política no Egito terá impacto em toda a região, cuja extensão ainda é difícil de prever. E defende a política adotada pelo Brasil nos últimos anos apostando na capacidade de diálogo do país, reconhecida e requisitada internacionalmente.

CARTA MAIOR: Qual sua avaliação sobre a rebelião popular no Egito e seus possíveis desdobramentos políticos e geopolíticos na região?

CELSO AMORIM: Uma primeira característica que considero importante destacar é que os protestos que estamos vendo agora são movimentos endógenos. É claro que eles se valem de novas tecnologias e de alguns valores modernos, mas são motivados pela situação interna destes países. O Egito e a Tunísia, cabe assinalar também, não estavam sob sanções por parte do Ocidente. Isso mostra que a posição daqueles que defendem sanções contra o Irã é equivocada. Sanções só reforçam internamente um regime. Uma das expectativas das sanções contra o Irã era atingir a Guarda Revolucionária. Na verdade, só atingem o povo. O Iraque foi submetido a sanções durante anos e Saddam só ficava mais forte. Não havia, repito, sanções contra a Tunísia e o Egito, países considerados amigos do Ocidente e aliados inclusive na guerra contra o terrorismo, implementada pelos Estados Unidos.

Acredito que uma mudança política no Egito terá certamente um impacto em toda região, podendo inclusive provocar uma mudança de relacionamento com países como Israel e Síria. Mas isso dependerá da evolução dos acontecimentos.

CARTA MAIOR: A sucessão de acontecimentos semelhantes em países do Oriente Médio e do Norte da África já pode ser considerada como uma onda capaz de expandir para outros países também?

CELSO AMORIM: Potencialmente, sim. Mas é difícil prever. Depende dos desdobramentos do Egito. Não há dúvida que Mubarak sairá [enquanto concedia a entrevista, a renúncia do ditador egípcio foi confirmada]. A questão é saber como ele sairá. Certamente haverá uma mudança no regime político do Egípcio. Não sabemos ainda em que intensidade. Mas é importante ter em mente que as duas forças organizadas no país são as forças armadas e a Irmandade Islâmica. A Irmandade Islâmica não é nenhum bicho papão. Cabe lembrar que muita gente tem citado a Turquia (que tem um partido islâmico no poder) como um modelo de caminho possível para o Egito.

A influência dos acontecimentos no Egito deve se manifestar em ritmos e intensidades diferentes, dependendo da realidade de cada país. Como a Tunísia nos mostrou, é preciso esperar o inesperado.

CARTA MAIOR: A diplomacia ocidental foi pega de surpresa por esses episódios?

CELSO AMORIM: Certamente que sim. O próprio presidente Obama admitiu isso ao falar dos relatórios dos serviços de inteligência dos Estados Unidos. Ninguém estava esperando o que aconteceu na Tunísia que acabou servindo de estopim para outros países como Yemen e Egito. Nos mais de oito anos que trabalhei como chanceler nunca ouvi uma palavra de crítica sobre a Tunísia. E alguns conceitos fracassaram. Entre eles o de que se o país é pró-ocidental é necessariamente bom. Os Estados Unidos seguem poderosos no cenário internacional, mas frequentemente superestimam essa influência.

Há algumas lições a serem tiradas destes episódios. A primeira delas é que é preciso respeitar os movimentos internos e não querer impor mudanças a partir de fora. As revoltas que vemos agora (na Tunísia e no Egito) iniciaram dentro destes países contra governos pró-ocidentais e não nasceram com características antiocidentais ou anti-imperialistas.

CARTA MAIOR: O Oriente Médio é hoje uma das regiões mais conflituosas do planeta. Os levantes populares que estamos vendo podem ajudar a melhorar esse quadro?

CELSO AMORIM: Creio que teremos agora um quadro mais próximo da realidade. Há uma certa leitura simplificada do Oriente Médio que não leva em conta o que o povo desta região pensa. Não é possível ignorar a existência de organizações como a Irmandade Islâmica ou o Hamas. Se ignoramos fica muito difícil traçar uma estratégia que leve a uma paz estável.

CARTA MAIOR: O jornalista israelense Gideon Levy escreveu ontem no Haaretz dizendo que o Oriente Médio não precisa de estabilidade, referindo-se de modo à crítica à suposta estabilidade atual, que seria, na verdade, sinônimo de pobreza, desigualdade e injustiça. Qual sua opinião sobre essa avaliação?

CELSO AMORIM: De fato, a desigualdade social é uma das causas muito fortes dos problemas que temos nesta região. É um fermento muito grande para revoltas. A verdadeira estabilidade não se resume a ter um determinado governante no poder. Não basta ter eleição. É preciso aceitar o resultado da eleição. Estamos falando de uma região muito complexa, com sentimentos anticoloniais muito fortes. Esse quadro exige uma flexibilidade muito grande e capacidade de diálogo com diferentes interlocutores.

CARTA MAIOR: Qual sua análise sobre a evolução dos acontecimentos no Oriente Médio à luz da política externa praticada durante sua gestão no Itamaraty?

CELSO AMORIM: Como referi antes, nós procuramos manter uma relação ampla com diferentes interlocutores. As críticas que sofremos vieram mais da mídia brasileira do que de outros países. Nossa política em relação ao Irã, por exemplo, não foi para mudar esse país. O objetivo era contribuir para a paz, tentando encontrar uma solução para a questão nuclear. Quem mudou de ideia no meio do caminho foram os Estados Unidos. O próprio El Baradei (ex-diretor geral da Agência de Energia Atômica), que agora voltou a cena no Egito, chegou a dizer, comentando a Declaração de Teerã, que quem estava contra ela é porque, no fundo, não aceitava o sim como resposta.

Acredito que nós precisamos de países com capacidade de ver o mundo com uma visão menos maniqueísta. Agora, todo mundo está chamando Mubarak e Ben Ali de ditadores. Até bem pouco tempo não assim. A maioria da imprensa internacional não os chamava de ditadores. O importante é saber respeitar a vontade e a decisão do povo de cada país. O Brasil tem essa capacidade reconhecida mundialmente. Várias vezes fomos requisitados para ajudar na interlocução entre países. O primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, por exemplo, nos pediu para ajudar a retomar o diálogo com a Síria. O Brasil tem essa capacidade de diálogo que não demoniza o outro. Essa é a pior coisa que pode acontecer na relação entre os países: demonizar o outro. Não se pode, repito, ignorar a presença da Irmandade Islâmica ou do Hamas. Podemos não gostar destas organizações. Isso é outra coisa. Mas estamos que estar prontos para conversar.

Espero que o Brasil faça jus às expectativas que existem sobre ele, sobre sua capacidade de diálogo e interlocução. Não se trata de mania de grandeza. Nós temos essa capacidade de diálogo e ela é requisitada. Seguramente o Brasil tem a possibilidade, e eu diria mesmo a necessidade, de ter essa participação e ajudar a construir a paz. Até porque esses fatos nos afetam diretamente. Basta ver o preço do petróleo que está aí aumentando em função dos conflitos.