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Ser de esquerda é não aceitar as injustiças, sejam elas quais forem, como um fato natural. É não calar diante da violação dos Direitos Humanos, em qualquer país e em qualquer momento. É questionar determinadas leis – porque a Justiça, muitas vezes, não anda de mãos dadas com o Direito; e entre um e outro, o homem de esquerda escolhe a justiça.
É ser guiado por uma permanente capacidade de se estarrecer e, com ela e por causa dela, não se acomodar, não se vender, não se deixar manipular ou seduzir pelo poder. É escolher o caminho mais justo, mesmo que seja cansativo demais, arriscado demais, distante demais. O homem de esquerda acredita que a vida pode e deve ser melhor e é isso, no fundo, que o move. Porque o homem de esquerda sabe que não é culpa do destino ou da vontade divina que um bilhão de pessoas, segundo dados da ONU, passe fome no mundo.
É caminhar junto aos marginalizados; é repartir aquilo que se tem e até mesmo aquilo que falta, sem sacrifício e sem estardalhaço. À direita, cabe a tarefa de dar o que sobra, em forma de esmola e de assistencialismo, com barulho e holofotes. Ser de esquerda é reconhecer no outro sua própria humanidade, principalmente quando o outro for completamente diferente. Os homens e mulheres de esquerda sabem que o destino de uma pessoa não deveria ser determinado por causa da raça, do gênero ou da religião.
Ser de esquerda é não se deixar seduzir pelo consumismo; é entender, como ensinou Milton Santos, que a felicidade está ancorada nos bens infinitos. É mergulhar, com alegria e inteireza, na luta por um mundo melhor e neste mergulho não se deixar contaminar pela arrogância, pelo rancor ou pela vaidade. É manter a coerência entre a palavra e a ação. É alimentar as dúvidas, para não cair no poço escuro das respostas fáceis, das certezas cômodas e caducas. Porém, o homem de esquerda não faz da dúvida o álibi para a indiferença. Ele nunca é indiferente. Ser de esquerda é saber que este “mundo melhor e possível” não se fará de punhos cerrados nem com gritos de guerra, mas será construído no dia-a-dia, nas pequenas e grandes obras e que, muitas vezes, é preciso comprar batalhas longas e desgastantes. Ser de esquerda é, na batalha, não usar os métodos do inimigo.
Fernando Evangelista

terça-feira, janeiro 10, 2012

Os vendilhões dos templos eletrônicos em tempos de espertalhões da fé


A estrela do Show da Fé, R. R. Soares | Marcos AC/R.R. Soares/Flickr
Luiz Cláudio Cunha *

Incapaz de vender a alma ao diabo, a Rede Bandeirantes acaba de revender seu santo horário da noite para o pastor R.R. Soares, o líder da Igreja Internacional da Graça de Deus. O seu ‘Show da Fé’ de 20 minutos, que começava religiosamente às 21h, agora vai durar uma hora inteira, a partir das 20h30. Não se sabe ainda quanto custou esse novo e triplicado milagre, mas pelo contrato antigo o bom pastor já pagava R$ 5 milhões mensais à Band.  O vil metal falou mais alto para a TV de Johnny Saad, que anunciava a devolução do horário nobre da noite a seriados consagrados, como o 24 Horas, para concorrer com as novelas da Globo e as séries do SBT, todas com melhor audiência.
De 20 minutos para uma hora diária na Band | Marcos AC/R.R. Soares/Flickr
A novidade escangalhou os planos do argentino Diego Guebel, que assumiu a direção artística da Band em outubro passado com a promessa de recuperar o espaço nobre e caro da noite para atrações mais mundanas do que a prosopopeia de Soares. A bíblica derrota de Guebel na Band é apenas outro indício da onda avassaladora do dinheiro que afoga a TV brasileira deste Brasil cínico que finge ser laico e imune à força econômica da religião e seus falsos profetas. Os canais de rádio e TV são concessões públicas, supostamente alheias aos credos e seitas religiosas que transformaram estúdios, igrejas, templos e estádios em púlpitos eletrônicos cada vez mais invasivos e escancarados.
Não existe ninguém no Governo ou no Congresso brasileiros com coragem para frear essa flagrante ilegalidade, sancionada por verbas, dízimos, patrocínios e uma farta hipocrisia. A irrestrita capitulação aos padres e pastores que lideram milhões de fiéis (e eleitores) ficou escancarada na última eleição presidencial, em 2010, quando os dois principais candidatos com raízes na esquerda — Dilma Rousseff e José Serra — sucumbiram vergonhosamente à chantagem das correntes mais atrasadas das igrejas, frequentando missas e cultos com o gestual mal ensaiado de pios devotos que não sabiam nem metade da missa, nem qualquer salmo dos evangelhos. Encenaram um constrangedor teatro de conversão medida para não ofender o eleitor mais ortodoxo. Para não perder votos, Dilma e Serra caíram na armadilha do falso debate religioso sobre o aborto — um tema que um e outro, por mera consciência política ou formação acadêmica, sabem que nos países mais evoluídos não passa de um grave e secular problema de saúde pública.
Os evangélicos detêm 80 rádios e quase 280 emissoras de TV | Edir Macedo/Facebook
A submissão das instâncias do Estado secular ao poder cada vez maior das igrejas pode ser medida pela intrusão cada vez mais descarada da fé nos meios eletrônicos do Brasil, que deturpam a concessão pública pelo proselitismo religioso vetado pela Constituição. A igreja católica brasileira agrupa hoje mais de 200 rádios e quase 50 emissoras de TV, contra 80 rádios e quase 280 emissoras de TV de oito braços do crescente ramo evangélico. É um domínio que se fortalece cada vez mais, embora adaptando seu perfil para fórmulas mais agressivas e despudoradas de avanço sobre o bolso das populações mais pobres, mais desesperadas, menos instruídas.
Comer ou dormir
Em agosto de 2011, a Fundação Getúlio Vargas divulgou o Novo Mapa das Religiões, um denso estudo realizado pelo Centro de Políticas Sociais da FGV, com base em 200 mil entrevistas formuladas pelo IBGE em 2009 a partir de sua Pesquisa de Orçamento Familiar (POF). O trabalho mostrou que o Brasil deixará de ser a maior nação católica do mundo nos próximos 20 anos, mantida a queda progressiva que sofre a Igreja no país. Ela representava 83,24% da população em 1991 e caiu para 68,43% em 2009. “As mudanças que antes ocorriam em 100 anos agora acontecem em 10. Se esta perda de 1% de católicos por ano continuar, a Igreja católica terá em 20 anos menos da metade da população brasileira”, destacou o coordenador da pesquisa, Marcelo Côrtes Neri, economista-chefe do Centro de Políticas Sociais da FGV.
A economia é um forte indutor desta transformação, diz Neri. Ele lembra que as chamadas ‘décadas perdidas’ de 1980 e 1990 foram demarcadas pela queda do catolicismo em contraste com a ascensão dos grupos evangélicos, especialmente seus ramos mais belicosos e vorazes — os neopentecostais. O período de 2003 a 2009, compreendido entre duas graves crises econômicas, observa uma segunda explosão evangélica, passando de 17,9% para 20,2%. A primeira explosão, ainda maior, ocorreu nas últimas seis décadas do Século 20, quando os evangélicos aumentaram seu rebanho em sete vezes: passaram de 2,6% em 1940 para 15,4% em 2000. A FGV foi buscar no alemão Max Weber (1864-1920), o pai da moderna sociologia, o fundamento teórico que explica o avanço arrebatador dos evangélicos, a partir de sua obra mais conhecida — A ética protestante e o ‘espírito’ do capitalismo, publicada em 1904-05. Ali, Weber explica o maior desenvolvimento capitalista nos países protestantes no Século 19 e a maior proporção desses fiéis entre empresários e trabalhadores mais qualificados. “A tese de Weber era que o estilo de vida católico jogava para outra vida a conquista da felicidade. A culpa católica inibiria a acumulação de capital e a lógica da dívida de trabalho, motores fundamentais do desenvolvimento capitalista”, escreve Neri.
Weber: Melhor comer que dormir em paz
Weber repetia um ditado da época: “Entre bem comer ou bem dormir, há que escolher. O protestante quer comer bem, enquanto o católico quer dormir sossegado”. O pensador alemão constrói seu texto em cima de máximas do inventor e calvinista americano Benjamin Franklin (1706-1790), um dos líderes da Independência dos Estados Unidos, que dizia que “tempo é dinheiro” e “dinheiro gera mais dinheiro”. Era uma notável conversão justamente aos argumentos opostos que levaram ao grande cisma do cristianismo, no início do Século 16, quando um atrevido padre agostiniano alemão, Martinho Lutero, pregou nos portões da igreja de Wittenberg as suas 95 teses que desafiavam a autoridade do Papa e quebravam a hegemonia de Roma sobre o mundo cristão. Na época, Lutero denunciava justamente o que seria o âmago da Reforma Protestante: o desvio do caminho de fé da igreja primitiva para o atalho da corrupção, da indulgência, da simonia e da luxúria de papas e cardeais rodeados de amantes e concubinas, antecessores lascivos dos bispos e padres que comem criancinhas.
Teologia do bolso
Lutero e sua radical volta às origens, estimulando o protesto aos desvios éticos de Roma e o retorno à palavra original dos evangelhos, geraram os dois termos que identificam os segmentos mais prósperos da dissidência cristã: os protestantes e os evangélicos, onde brilha sua facção mais agressiva e endinheirada — o pentecostalismo, que hoje abriga no mundo cerca de 600 milhões de seguidores, pulverizados em 11 mil seitas e subgrupos. Ali viceja sua parcela mais faustosa: a corrente neopentecostal, a que pertencem o abonado bispo R.R. Soares e seus parceiros mais ricos, os também bispos Edir Macedo, Silas Malafaia e Valdemiro Santiago, cada um chefiando sua própria seita, sempre na condição suprema de ‘apóstolos’.  Todos mostram uma devoção especial pela alma e pelo bolso de seus seguidores, a quem não se acanham de pedir contribuições financeiras a que, recatadamente, chamam de ‘oferta’.
Apóstolo sertanejo Valdemiro Santiago | Eduardo Pinto/impd.org.br
Para não atormentar ainda mais a vida de sua aflita freguesia, os quatro chefes religiosos tratam de facilitar ao máximo as ofertas financeiras. Na tela da TV de seus animados cultos, sempre se oferece o número das contas bancárias, a bandeira dos cartões de crédito ou o telefone para informações extras que permitam a oferta, rápida e facilitada. Nenhum deles fica ruborizado pela insistência do pedido de ajuda, porque todos são pios devotos da ‘Teologia da Prosperidade’, uma doutrina pecuniária que faria o velho Lutero engolir cada uma das 95 teses que vomitou contra a cupidez da velha Roma.
A ideia nasceu, evidentemente, no coração do capitalismo, os Estados Unidos, no início do Século 20. O pai dessa fé sonante é o americano Essek William Kenyon (1867-1948), um evangelista de origem metodista nascido em Saratoga, Estado de Nova York. Descobriu o milagre do rádio e plantou ali a sua “Igreja no Ar”, a ancestral eletrônica dos R.R.Soares e Malafaias da vida. Espalhou então aos quatro ventos o lema que explica as benesses divinas da fartura: “O que eu confesso, eu possuo”.
Kenyon passou o bastão da prosperidade para um conterrâneo, Kenneth Erwin Hagin (1917-2003), um jovem texano com deficiência cardíaca, que caiu de cama quando adolescente. Garantiu ter ido e voltado ao inferno e ao céu não uma, nem duas, mas três (três!) vezes. Com este desempenho singular, até para campeões de esportes radicais, o jovem naturalmente converteu-se. Dizendo-se ungido para ser mestre e profeta, Hagin garantia ter tido oito (oito!) visões de Cristo na década de 1950, além de acumular alguns passeios extracorpóreos. Tudo isso acrescido pela divina revelação de que os verdadeiros fiéis deviam gozar de uma excelente saúde financeira e que o caminho da fortuna passava, inevitavelmente, pela prosperidade de seus profetas aqui na Terra. Foi sopa no mel, e a teologia da prosperidade conquistou corações e mentes — e bolsos.
Na conta do santo
O dono da Record, bispo Edir Macedo, segunda maior audiência do país / Facebook
A primeira semente deste ostensivo neopentecostalismo brotou no Brasil com a Igreja Universal do Reino de Deus, fundada em 1977 pelo bispo Edir Macedo. Três anos depois, o pastor R.R. Soares, casado com Magdalena, irmã de Macedo, saiu do ninho da Universal para fundar sua própria igreja, a Internacional da Graça de Deus, que acaba de alugar a tela do horário nobre da Band graças ao verbo divino e a verba milionária do pastor. Uma década depois, o bispo Macedo, ainda mais próspero do que o cunhado, comprou a sua própria rede de TV, a Record, hoje a segunda maior audiência do país (4,7 pontos) no horário nobre das noites de dezembro passado, embora ainda distante da Globo (13,8).
Os televangelistas brasileiros aparentemente compõem um paraíso na terra e no ar rico em mirra, incenso e ouro, muito ouro. Há tempos, quatro grupos evangélicos rondam o empresário Sílvio Santos, que topa tudo por dinheiro, na esperança de amealhar o espaço das madrugadas do SBT por módicos R$ 20 milhões mensais. Em 2009, o próprio Edir Macedo alvejou sua maior concorrente: ofertou R$ 545 milhões para alugar o espaço das madrugadas da Rede Globo para a sua Igreja. A Globo piscou, não respondeu, e o bispo voltou à carga em agosto passado, disposto a mover céus e terras. Nada feito.
A contabilidade desses pastores, pelo jeito, oscila entre o inferno e o paraíso. O bispo que oferecia milhões para comprar um naco do maior concorrente era o mesmo dono da Igreja que fazia um descarado apelo em seu blog, em abril passado, para que os fieis juntassem alguns trocados para ajudá-lo a pagar a conta salgada de seu site. Coisa miúda, apenas R$ 107.622 mensais, que o pobre bispo diz gastar com despesas mundanas como hospedagem do servidor, salário dos funcionários, água, luz e gastos administrativos da manutenção do site. “Se o Espírito Santo lhe tocar, nos ajude a carregar essa responsabilidade”, escreveu o bispo, implorando por uma doação mínima de R$ 20.
Um novo dia de um novo tempo começou para a Globo e os evangélicos | Foto: Divulgação
O espírito santo, aparentemente, tocou a Rede Globo. A emissora dos Marinho odeia o bispo Macedo, mas adora os evangélicos. Na véspera do Natal de 2011, 18 de dezembro, a maior rede desta vasta nação católica rasgou o hábito e transmitiu o seu primeiro evento evangélico, gravado uma semana antes no Aterro do Flamengo, no Rio. O público presente, apenas 20 mil pessoas, foi uma heresia para as ambições bíblicas da Globo, mas a fiel audiência na telinha na tarde do domingo seguinte foi uma bênção divina.  Ao longo dos 75 minutos do programa, condensado de quase oito horas de gravação ao vivo (entre 14h e 21h30), apresentaram-se nove artistas no ‘Festival Promessas 2011′, sob o comando do astro global Serginho Groisman. Um dos mais festejados foi o cantor Regis Danese, 39 anos, que vendeu um milhão de cópias com um único disco gospel, “Compromisso”, o único a conquistar o primeiro lugar em rádios e TVs seculares do país e que lhe garantiu a indicação para o prêmio Grammy Latino em 2009.
A conversão da Globo
Antes desse sucesso, Danese já era consagrado como artista do “Só Pra Contrariar”, um grupo de pagode que ainda ostenta o 27º lugar do ranking brasileiro, com 8 milhões de discos vendidos. Apesar disso, com problemas no casamento, converteu-se ao protestantismo no início do século. Salvou o matrimônio com Kelly, sua parceira musical, e engordou ainda mais o bolso. O álbum “Compromisso”, que conquistou o ‘Disco de Diamante’ pela venda de 500 mil cópias em apenas quatro meses de 2008, traz o seu maior sucesso, Faz um Milagre em Mim.  O jornalista Tom Phillips, do diário britânico The Guardian, anotou que, logo após sua triunfal apresentação no festival da Globo, Danese foi indagado na entrevista coletiva sobre os fundamentos deste milagre musical: “O senhor escutou a voz de Deus? O que ele disse?”, perguntavam-lhe. O ex-pagodeiro explicava e, embevecido, o isento repórter da revista Nova Jerusalém ressoava a cada resposta: “Amém. Louvado seja o Senhor!”
O CD "Compromisso". Sucesso absoluto. | Foto: Divulgação
A genuflexão da Globo não representa uma súbita conversão da emissora ao credo evangélico da música: “A Globo não é um canal católico, e sim secular e republicano. Apenas documentamos um festival gospel por sua crescente importância na vida cultural do Brasil”, esquivou-se Luiz Gleizer, diretor da TV, ao jornalista britânico que ecoou o festival sob uma manchete embalada pela típica ironia inglesa: “O Gospel começa a dar o tom no Brasil, a casa da bossa nova”.
Os profetas da Globo não sabem entoar um único salmo, mas como os apóstolos eletrônicos da concorrência também têm um ouvido afinado pelo doce tilintar das moedas do templo. Isso não é contado nem no confessionário, mas os querubins globais sussurram nos corredores da ‘Vênus Platinada’ que os direitos de comercialização e os espaços publicitários do festival renderam à Globo algo entre R$ 35 milhões a R$ 55 milhões, o suficiente para remir muitos pecados, dúvidas e dívidas, aqui na terra e lá no céu. O grupo é dono da gravadora Som Livre e de um catálogo religioso onde brilham ídolos como o padre católico Fábio de Melo, que já vendeu quase 2 milhões de CDs pelo selo global.
O olho cúpido e republicano da Globo está mirando um mercado de música gospel que o The Guardian estima em R$ 1,5 bilhão, um paraíso econômico onde se irmanam crentes, artistas, emissoras laicas, pastores, espertalhões, vigaristas e políticos de todas as crenças, devotos todos do santo dinheiro que cai do céu diretamente em seus bolsos. O fluminense Arolde de Oliveira, deputado federal pelo PSD — aquele diabólico partido nascido da costela do prefeito Gilberto Kassab e que garante não pertencer nem ao paraíso, nem ao inferno, nem ao purgatório —, é dono da rádio 93 FM e do Grupo MK Music, que ele jura ser o maior selo de música gospel do continente. “Mais de 60 milhões de brasileiros estão direta ou indiretamente ligados à Igreja Evangélica”, lembra o deputado Oliveira. A Globo, como se vê, tem a inspiração divina e o ouvido apurado.
Pastor Silas Malafaia: "A Globo abre espaço para o louvor e adoração a Deus" | vitoriaemcristo.org
O festival Promessas abriu as portas de uma terra prometida para os profetas globais. No domingo gospel, a audiência da Globo subiu aos céus, dando-lhe a indulgência de miraculosos 13 pontos no Ibope (cada ponto representa 58 mil aparelhos ligados), bem mais do que os 7 humildes pontos habituais do horário. O pastor Silas Malafaia, inimigo da Universal do bispo Macedo, aproveitou e tripudiou no seu site: “A Record não acreditou nos evangélicos, a Globo acreditou e arrebentou na audiência! Enquanto a Record fala mal dos cantores e da igreja, a Globo abre espaço para o louvor e adoração a Deus”. E arrematou com um desajeitado elogio que deve ter sobressaltado as almas globais: “Quando os que deveriam abrir as portas fecham, Deus usa os ímpios para glorificá-lo”. Iluminada pela santa promessa do Ibope, a ímpia Rede Globo prepara mais três edições do sucesso gospel para 2012 — duas versões regionais e uma nacional, evitando cuidadosamente o Rio de Janeiro, que já padece a praga de um congestionamento evangélico todo santo ano.
O golpe do martelinho
O lider da Igreja Mundial do Poder de Deus, Valdemiro Santiago | Eduardo Pinto/impd.org.br
Valdemiro Santiago é outro desgarrado da Universal. Depois de ser considerado um virtual sucessor de Edir Macedo, brigou com ele e saiu para fundar em 1998 a sua seita, a Igreja Mundial do Poder de Deus. Começou com 16 membros e hoje o apóstolo Valdemiro chefia mais de dois mil templos, alguns na África e em Portugal, e um jornal mensal, Fé Mundial, com tiragem de 500 mil exemplares — além de um maçante trololó diário de 22 horas na Rede 21, uma subsidiária da Rede Bandeirantes, que administra as duas horas restantes.
Sua marca registrada é um chapéu de boiadeiro, o que reforça sua imagem de astro sertanejo, que costuma ganhar espaço até no Jornal Nacional da Globo, uma devota do divisionismo que Valdemiro poderia provocar nas legiões de seu arqui-inimigo Edir Macedo. Quando enfrenta problemas de caixa, Valdemiro confia no santo gogó. Em 2010, chorou diante das câmeras de TV ao convocar 150 mil fiéis para ofertarem R$ 153, o número de peixes de um alegado milagre de Cristo. Faturou cerca de R$ 23 milhões.
Empolgado, o bispo sertanejo imaginou outra forma esperta de arrecadar dinheiro fácil, mas desta vez sem choro. Criou a campanha do “Martelinho da Justiça”, um pequeno, baratinho malho de madeira capaz de quebrar mandingas, maus-olhados e “as pedras que atravessam os seus caminhos”. A clava fajuta de Valdemiro, que despertaria a inveja do grande Thor, devia ser canonizada como a mais cara do mundo: cada oferta pelo martelinho tinha o mínimo de R$ 1 mil e Valdemiro esperava que 10 mil de seus seguidores o abençoassem com a compra do mimo, o que rechearia seu chapelão com R$ 10 milhões.
No reclame da Igreja Mundial na TV, o pastor de português trôpego, voz rouca, terno e gravata mostrava a certeza das favas divinas e muito bem calculadas: “Ainda hoje ou amanhã, na primeira hora, você vai até a agência bancária e faz esta ‘ofertinha’ de R$ 1 mil. Depois, mandaremos o martelinho pelo correio”. Para esse milagre acontecer, bastava ao crente fazer o depósito nas contas indicadas na tela e disponíveis no Banco do Brasil, Bradesco ou Caixa Econômica Federal. “De preferência no BB, como o nosso apóstolo tem nos orientado”, aconselhava o pastor, com ar compungido.
A atrevida igreja de Valdemiro já vendeu garrafinhas Pet de 400 ml com ‘água ungida’, entregues por ‘ofertas’ de R$ 100, R$ 200 ou até R$ 1.000, prometendo resultados espantosos: “Uma única gota dessa água será o suficiente para mudar a história de sua vida, para lhe abençoar de uma forma poderosa”, jurava o santo homem, escoltado por outros oito pastores calados e sisudos, todos de gravata e terno escuro. Se usassem óculos pretos iria parecer uma paródia do CQC, sem a divina graça do programa humorístico da Band que sucede o show religioso do pastor R.R. Soares nas noites da segunda-feira.
O trovão homofóbico
O bizarro merchandising da Mundial tem produzido bons resultados, pelo menos para as finanças da igreja de Valdemiro. No primeiro dia de 2012 ele inaugurou em Guarulhos, SP, a ‘Cidade Mundial’, um megatemplo de 240 mil metros quadrados e capacidade para acolher 150 mil fieis da Igreja Mundial do Poder de Deus — mais de duas vezes a lotação prevista do Itaquerão (68 mil lugares), o estádio que o Corinthians está construindo para a Copa do Mundo de 2014. Para erigir o templo, Valdemiro viu a igreja aumentar seus gastos mensais em R$ 30 milhões, prova de que o martelinho e a garrafinha são realmente miraculosos.
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Malafaia: Na santa cruzada contra a proposta de lei que combate a homofobia | Foto: Valter Campanato/ABr
O pastor Silas Malafaia, chefe supremo da AVEC, sigla da associação que mantém a Igreja Vitória em Cristo, é a voz mais trovejante desse abusado mercado da fé ancorado nos fundamentos pétreos da Teologia da Prosperidade. Embora tenha os mesmos instrumentos de redenção econômica de Edir Macedo, Malafaia é um inimigo mortal do dono da Universal. Divergiram até na eleição presidencial de 2010: ele primeiro apoiou Marina Silva, depois fulminou sua opção pelo plebiscito no debate sobre o aborto (“cristão não tergiversa nesse tema”), e acabou fazendo campanha por Serra, adversário de Dilma, apoiada justamente pelo rival bispo Macedo. Malafaia é figura fácil no Congresso Nacional, em Brasília, onde veste a armadura de sua santa cruzada contra a proposta de lei que combate a homofobia: “O projeto [que garante a livre orientação sexual] é a primeira porta para a pedofilia”, reza, com a fúria dos justos. Numa entrevista a uma revista religiosa, crucificou como “idiotas” todos os pastores que, ao contrário dele, não apostam suas fichas, martelinhos e garrafinhas na Teologia da Prosperidade.
Ele não poupa a garganta e fala muito: quase todo santo dia, Malafaia se esparrama por cinco horas de programas variados em redes nacionais como CNT, Rede TV, Boas Novas e Bandeirantes e ocupa os sábados de emissoras regionais em outros 15 Estados. Seu programa se espalha pelos Estados Unidos e Canadá e, desde meados de 2010, Malafaia atinge 142 milhões de lares em 127 países da África, Ásia, Oriente e Médio e Europa, com o apoio da americana Inspiration Network, que faz a dublagem para o inglês.
Para tornar mais veraz sua pregação, às vezes importa dos Estados Unidos especialistas nesta riqueza material. No ano passado, junto com o pastor americano Mike Murdock, Malafaia lançou o projeto do “Clube de 1 Milhão de Almas”. Alma, sabem os televangelistas, custa caro. Ele pretendia arrebanhar um milhão de crentes para sua grei e seus programas de TV, mediante a ‘oferta’ (voluntária, claro) de R$ 1 mil — ou seja, um martelinho de madeira, pelo generoso chapéu do bispo Valdemiro. Na conta do lápis, uma bolada plena de R$ 1 bilhão, capaz de pagar mais do que cinco Mega-Senas da Virada, que bateu em R$ 177 milhões no réveillon de 2011. Os ofertantes ganhariam o livro 1001 Chaves da Sabedoria, do pastor Murdock, e um certificado do clube milionário, em todos os sentidos.
Para inspirar o seu rebanho, Malafaia teve a feliz ideia de colocar um contador de acessos na página da igreja para que todos acompanhassem a adesão em catadupa do milhão de almas. Algo deu errado, ou o martelinho não funcionou. Lançado em abril do ano passado, o contador da igreja Vitória em Cristo virou uma estátua de sal, como a mulher de Lot em Gênesis (19,26) e estagnou num número pífio: miseráveis 58.875 almas era a contagem de quinta-feira passada, 5 de janeiro. Um inferno de faturamento que não chegou a R$ 60 milhões, muito distante do paraíso do R$ 1 bilhão arquitetado pelo diabólico Malafaia. Faltam portanto ainda 941.125 almas para Malafaia inaugurar, sob as trombetas de Jericó, o seu clube milionário. Haja martelinho!
O supermercado da fé
O bravo Malafaia não desiste facilmente. Em 2009 ele lançou a campanha de uma Bíblia por módicos R$ 900, pouco menos que um martelinho. Era a tarifa da Bíblia da Batalha Espiritual e Vitória Financeira, sacada genial de outro gênio da prosperidade, o pastor americano Morris Cerullo. Desta vez, a garrafinha deve ter funcionado, pois antes do final do ano ele viajou à Flórida, nos Estados Unidos, e lá viu se materializar, em nome da Vitória em Cristo, um jato executivo Cessna quase novo, modelo Citation Excel, pela bagatela de 12 milhões — de dólares !
Pastor Silas Malafaia: adepto dos "Programas de Fidelidade" | vitoriaemcristo.org
Se alguém tiver alguma restrição a Bíblia, martelinho ou garrafinha, nem assim terá qualquer constrangimento para auxiliar o empreendimento celestial de Malafaia. Na sua página na Internet (www.vitoriaemcristo.org), o bom pastor dá a boa notícia de que todos podem participar de sua jornada, tornando-se seu ‘Parceiro Ministerial’, um programa de fidelidade da Igreja que arrecada fundos para manter seus programas de TV. A porta está aberta a “qualquer pessoa que receba de Deus a visão de abençoar vidas, proclamando o Evangelho por meio das mensagens do pastor Malafaia”, explica o dono do site e da igreja. Dependendo do tamanho da carteira, seu título de parceiro também cresce: o ‘Especial’ paga R$ 15 mensais, o ‘Fiel’ doa R$ 30 e o ‘Gideão’ entra na cota de sacrifício do martelinho: R$ 1 mil mensais, com direito a um exemplar por mês da revista Fiel, livros, Bíblias e um cartão para 10% de descontos nos produtos da Editora Central Gospel comprados pelo telemarketing, “desde que não esteja em promoção”.
Virar parceiro do pastor é fácil, pagar é muito mais. A organização abençoada de Malafaia trabalha com o ganhoso instrumental financeiro de uma grande loja de departamentos, como convém a este éden da prosperidade.  A igreja Vitória em Cristo opera, sem preconceitos, com cartões Visa, Master, Diners, Amex ou Hipercard e tem contas abertas, sem discriminação, com o Banco do Brasil, HSBC, Bradesco ou Itaú, além de trabalhar com boletos bancários ou cheques nominais. Malafaia aceita boletos antecipados para o ano todo, mas nenhuma contribuição abaixo de R$ 15. Acima, pode.
Abobrinhas e beterraba
Agora, esse mundo dourado de riquezas, promessas, ofertas, obras e fartura vai ganhar outro e inesperado púlpito: um espaço de brilho, luzes e discussões mundanas, terrenas, insinuantes, quase lascivas. Começa na terça-feira (10/1) a 12º edição do ‘Big Brother Brasil’, o reality showda Globo que arrebata o país por 12 semanas no seu jogo canalha de perfídias, traições, intrigas e sensualidade explícitas, onde garotas curvilíneas e garotos musculosos, todos transbordantes de hormônios e carentes de neurônios, desfilam suas abobrinhas em diálogos patetas e reflexões idiotas. O jornalista Eugênio Bucci, professor de Ética Jornalística da ECA-USP e da ESPM, de São Paulo, tatuou o BBB como “o mais deseducativo programa da TV brasileira, onde a fama justifica qualquer humilhação”.
Na TV, onde nada se cria e tudo se copia, a Record também tem sua versão BBB, “A Fazenda”, com mais roupa e a mesma dose intragável de papo imbecil. A personal trainer Joana, a vencedora da versão 4 da Fazenda, que acabou em outubro passado, arrebatou R$ 2 milhões após encontrar uma beterraba premiada, entre outros sofisticados desafios intelectuais.
Apesar dessa crônica indigência, mais de 130 mil jovens brasileiros se inscreveram para o BBB12, ao longo de sete meses, filtrados em seletivas regionais em 10 capitais. É uma febre televisiva que pode parar até a maior cidade brasileira, São Paulo, onde chega a bater em 40% do Ibope, o que significa quase dez milhões de telespectadores, metade da população da Grande SP.
"Ela não é recatada", informa o pai de Jakeline | Divulgação
A vencedora do BBB de 2011, a modelo paulista Maria Helena, 27 anos, de São Bernardo do Campo, faturou um cheque de R$ 1,5 milhão ganhando o voto por telefone de 51 milhões de pessoas. Se fosse candidata a presidente em 2010, Maria Helena, capa da edição de junho de 2011 da revista Playboy, teria derrotado José Serra por mais de sete milhões de votos e perderia para Dilma Rousseff por menos de cinco milhões.
Boninho, o diretor do BBB, apimentou a receita em 2012, para horror do pastor Malafaia, infiltrando quatro homossexuais entre os doze sarados concorrentes. “Três dos quatro gays são mulheres”, adiantou o lúbrico Boninho no seu tuíter.  Ele não disse, mas o programa de 2012 terá também a atração extra de duas evangélicas, a assistente comercial mineira Kelly, 28 anos, e a zootécnica baiana Jakeline, 22. O empresário Danilo Leal, 45 anos, pai de Jakeline, acha que a filha vai resistir bem ao paredão impiedoso do BBB, apesar de evangélica: “Ela não é recatada. Espero que Jakeline aproveite bem seus 15 minutos de fama e faça o pé de meia”, reza o empresário, dando sua sanção paternal para o que der e vier.
A assistente comercial evengélica Kelly Medeiros | Divulgação
Não se sabe ainda o tamanho do fio-dental que as duas evangélicas vão exibir na casa mais vigiada do Brasil, nem o salmo que irão recitar debaixo do edredom, cercadas por tantas câmeras indiscretas. Não deixa de ser simbólico que, cinco séculos após ser cravado nos portões da igreja de Wittenberg, o credo rigorosamente puritano e austero fundado pelo cisma de Luterano infiltre duas crentes assanhadas e iconoclastas no cenário conspícuo do programa mais ímpio da maior rede brasileira de TV aberta. A explicação, certamente, não está nas páginas lambidas da Bíblia dos templos e igrejas desta terra supostamente laica, mas nas cédulas louvadas do dinheiro ungido pela graça divina e pela licença dos homens neste país tropical, que Jorge Ben resumiu como “abençoado por Deus e bonito por natureza”.
A louvação ecumênica ao dinheiro pintado pela hipocrisia de todos os credos esclarece, em parte, a progressiva invasão destes templos cada vez mais eletrônicos, escancarados por vendilhões cada vez mais acessíveis a espertalhões cada vez mais abusados no assalto à boa fé de sempre dos desesperados.
O velho evangelista Kenyon, profeta dessa cínica doutrina da prosperidade, poderia traduzir este Armagedom moral com o mantra invertido da religião de resultado que inventou: o que eu possuo, não confesso.
* Luiz Cláudio Cunha é jornalista.
[cunha.luizclaudio@gmail.com]

Quem nasceu para ser Aécio nunca será Brizola

Aécio Neves (PSDB/MG) escreveu um artigo na Folha de São Paulo, na segunda-feira, sobre a tragédia das chuvas, onde pergunta a certa altura:
A pergunta que precisa ser feita a todo governante não é "por que não resolveu tudo antes?", mas, sim, se fez, no seu tempo, tudo o que estava ao seu alcance. 
O objetivo do demo-tucano era atacar o governo federal, tirando a responsabilidade dele e de seus pupilo Anastasia (PSDB/MG).

Mas a melhor resposta à pergunta dele aparece nas fotos abaixo:

Prioridades de Aécio:
R$ 1,5 bi em Centro Administrativo. O gabinete do Palácio do Governador tem o tamanho de 5 quadras de volei e heliponto.
Perto dali, o abandono: Mangabeiras sofre com deslizamentos, e Brumadinho debaixo d'água.
Aécio foi um governador medíocre de Minas.
Atribuía como sua grande obra um tal de "choque de gestão". A velha imprensa local cobria de elogios falando das maravilhas do "choque de gestão". 
O povo não consegue ver que "maravilha" é essa que a velha imprensa tanto propagandeia. Com o "choque

segunda-feira, janeiro 09, 2012

Bolivia Rompe Relaciones Diplomáticas con Israel y Denunciará Ante la Corte Penal Internacional


*laligadelainjustiça

Por que Serra é tão detestado

Paulo Nogueira 

Por que Serra é tão detestado?

Me chamou a atenção a alegria com que muita gente recebeu as controvertidas  denúncias contra Serra no livro A Privataria Tucana. Me parece que para muitos a principal virtude do livro consiste em atacar Serra.

É irônico vê-lo no papel de privatizador, ele que sempre pareceu contrariado com as privatizações e que jamais se identificou com o ideário neoliberal. Serra é o clássico ‘dirigista’, alguém que acha que o país deve ser guiado de cima para baixo por um Estado forte. Há, aí, uma comunhão de idéias entre ele e o que foi o mais esclarecido presidente nos anos militares, Ernesto Geisel.

Os jornalistas não gostam de Serra por um motivo óbvio: se puder, ele liga para os donos para tentar suspender uma reportagem que ele suspeite que não o tratará como herói. Caso saia um artigo que o irrite, ele também responde com ligações privadas para os donos ou os chefes do autor. Até em bobagens. Uma vez, quando trabalhava na Exame, dei a um texto sobre mais uma derrota eleitoral de Serra um título extraído de um poema de Gonçalves Dias: “Ainda uma vez, adeus”. Meu chefe na época, Antonio Machado, me avisou que Serra tinha ligado para se queixar de mim.

Muitos jornalistas atribuem sua demissão a pedidos de Serra. Em minha carreira, só vi alguém com o mesmo perfil: Delfim Netto, o czar da economia em boa parte do regime militar. Os jornalistas sabíamos que Delfim não hesitava em pedir cabeças quando contrariado com algum texto.

Sabemos, então, por que Serra é rejeitado pelos jornalistas.  E pelos demais?

Bem, Serra parece reunir todas as características que fazem as pessoas desgostar de alguém. Tem um claro ar de superioridade, sem que haja razões para isso. Serra é, por formação, economista, mas jamais produziu um livro original, com idéias econômicas inovadoras. Sua arrogância se sustenta muito mais num caráter ególatra do que em bases de realidade, e isso incomoda duplamente. Se é difícil suportar um gênio difícil, pior ainda é aturar uma pessoa normal que se comporta como gênio.

Serra é, também, invejoso. Ele não participou da equipe que fez o Plano Real, e por isso jamais reconheceu nele a importância histórica de devolver aos brasileiros uma moeda que não se corroía continuamente.
Também não é grato. Em 2002, em sua campanha fracassada, jamais deixou claro aos brasileiros que se alinhava com o homem que viabilizara sua candidatura: Fernando Henrique Cardoso. Compare com a atitude de Dilma perante Lula. Dilma, numa cartinha recente a FHC, disse muito mais sobre a importância dele como presidente do que Serra em toda uma vida em que ambos estiveram na mesma trincheira.
A todos os atributos negativos, Serra acrescentou na última campanha um outro: a hipocrisia. Ele quis parecer um homem do povo, alguém que gosta de estar no meio das pessoas numa feira comendo pastel e falando do último capítulo de novela.

Não colou.

Nem vou remeter ao farisaísmo presente na patética tentativa de transformar uma bolinha de papel num atentado na última campanha. Numa hipótese benevolente, isso foi fruto ao mesmo tempo do marqueteiro de Serra e de seu próprio desespero diante das pesquisas que já o davam como morto. Foi um horror, é verdade, mas com atenuantes. Por isso passemos por cima do falso atentado. Fiquemos com a essência: antipatizar com Serra é uma das raras coisas comuns aos brasileiros.

Dizer que o brasileiro não sabe votar é um clichê. Mas não ter levado Serra ao Planalto por duas vezes é uma evidência de que o brasileiro sabe pelo menos em quem não votar.

Por Que Lula É Tão Querido


Paulo Nogueira 
“Difícil não é subir”, escreveu o historiador francês Jules Michelet. “Difícil é, subindo, você permanecer o mesmo.”
Acho que essa frase explica a razão pela qual todos gostam de Lula, excetuada uma parcela retrógrada da classe média que tem preconceito contra pobres e nordestinos, sobretudo se eles ascendem.
Escrevi, no artigo anterior, sobre o oposto: por que Serra é tão amplamente detestado. Decidi ir para o inverso. Pessoalmente, tenho por Lula uma admiração moderada e distante. Entrevistei-o algumas vezes no começo dos anos 1980, quando os metalúrgicos do ABC sob seu comando articulavam as primeiras greves desde 1964. Nessa época, eu era repórter de economia da Veja. Achei-o vivamente inteligente: jamais confundi QI com a aquisição de diplomas.
Raras vezes votei em Lula. A ocasião em que tive mais convicção para votar nele foi quando seu adversário era Fernando Collor de Mello. Tive, na juventude, alguns problemas com o PT. Meu pai disputou a presidência do Sindicato dos Jornalistas de São Paulo no final da década de 1970 contra uma chapa formada por pessoas que depois estariam no PT. O candidato rival de meu pai era Rui Falcão, de quem guardo uma imagem lhana e delicada. Jogou limpo e perdeu com dignidade. Mas muitos dos jornalistas que apoiavam Rui me pareceram arrogantes e grosseiros nas assembléias em que se debatia a greve. Alguns chamaram meu pai de “a voz dos patrões” porque ele antevira com presciência as enormes dificuldades que a greve enfrentaria para funcionar. Daí meu incômodo com o PT, que seria fundado em 1980, pouco depois da eleição do Sindicato de Jornalistas vencida por papai.
Lula, talvez por não ser um intelectual, jamais foi o típico petista que vê (ou via) o mundo de cima para baixo.  Num determinado momento, muitos suspeitaram de que ele seria manipulado pelos intelectuais que o cercavam e o educavam. O tempo mostrou que isso jamais aconteceria. Lula, por sua extraordinária liderança, sempre comandou seus professores. Em nenhum momento foi teleguiado.
À medida que foi ganhando estatura, mexeu na aparência, mas não no conteúdo. Aparou a barba, colocou paletó e gravata. Mas não se vendeu. No começo de minha carreira, circulou uma história que, verdadeira ou não, mostra como Lula era visto. Uma montadora, no final do ano, teria deixado um carro na frente da casa de Lula como um presente. O objetivo era conquistar a aliança de Lula para que as reivindicações dos metalúrgicos fossem contidas. O carro, segundo a história, foi prontamente devolvido.
Lula é simples sem ser simplório. Fala como o brasileiro das ruas genuinamente. Se numa campanha vai a uma feira comer pastel com os eleitores, parece que está em seu habitat. Com Serra é o oposto: vê-se que ele, como o general Figueiredo, o último presidente militar, não gosta muito do “cheiro do povo”. Serra, para o brasileiro médio, jamais será o “Zé” de suas campanhas.
Lula, sob contínuos ataques da mídia no final de seu primeiro mandato, não vergou – o que é um sinal de força interior. Rumores afirmavam que ele estaria bebendo cada vez mais, e a ponto de renunciar ou cair como Collor. Vistas as coisas em retrospectiva, tais rumores soam como piada.
Um estadista tem que ter musculatura para suportar estoicamente as agressões. Conta-se que Fouquet, revolucionário francês, dormiu na sessão da Convenção em que era julgado e corria o risco de ser condenado à guilhotina.
No poder, Lula foi essencialmente o mesmo de sempre. Mudou o foco da administração para o combate à miséria – um ato que lhe dá um lugar de honra na história do Brasil. Ao mesmo tempo, foi pragmático o bastante para ajudar as empresas brasileiras – sobretudo as exportadoras. Jorge Paulo Lehman contou uma vez numa conversa da qual participei que Lula pegou o telefone e ligou para a embaixada brasileira em Buenos Aires ao saber que a Ambev de Leman enfrentava dificuldades burocráticas na Argentina. “Em situações parecidas, o Fernando Henrique dizia que ia resolver o problema e depois não fazia nada”, disse Leman. Vi também uma vez o então presidente da Vale do Rio Doce Roger Agnelli contar uma história parecida.
Lula subiu sem deixar de ser o mesmo, uma coisa rara como dizia Michelet. Por isso, acima de todos os outros motivos, é tão amado — e é também em consequência disso sobretudo que milhões de brasileiros, entre os quais me incluo, fecham o ano torcendo para que ele se recupere do câncer na garganta tão usada para defender os trabalhadores.

*esquerdopata

Dois homens baixos na cracolândia



A chamada cracolândia, lugar onde os miseráveis da cidade reúnem-se enquanto aguardam a morte, foi proscrita. Mal findo o ano, os soldados ordenaram que todos dispersassem, prenderam alguns e espalharam-se em destacamentos para que ninguém mais voltasse.
A iniciativa coincide com o início do calendário eleitoral, quando os partidos governantes na capital e no estado irão novamente às urnas para renovarem o mandato que lhes concedeu há 4 anos os paulistanos para que resolvessem a chaga da miséria crônica e do abandono a que foi relegada uma parte da  população a quem foi roubada a cidadania.
A fim de que não tivessem de assumir a desfaçatez de uma abordagem assim tão fácil e até inconstitucional do problema da desassistência, porque a todos é dado direito de reunião e do acesso aos serviços de saúde, prefeito e governador simularam desentendimentos para que a ação passasse por expedição punitiva contra a delinquência e o tráfico de drogas.
Mesmo sabendo que a iniciativa faria apenas deslocar a indigência por toda a metrópole, confiavam que aos olhos do cidadão incauto uma miséria pulverizada constituisse uma miséria de menor impacto eleitoral, capaz de dissimular a anomia das políticas sociais no estado mais rico da federação.
Porque a cracolândia traduz o fracasso a que se chegou na missão essencial de qualquer governo de assistir a todos sem distinção, é que se resolveu encobri-la com o pano fétido da força bruta e da negação.
A falsa solução da ocupação militar do centro da cidade de São Paulo não foi medida intempestiva ditada pela intenção do poder público de preservar a lei e a ordem. Vinha sendo ensaiada desde quando Andrea Matarazzo comandava com mão de ferro a Secretaria das Subprefeituras do Município e fez de Daniel Salatti a musculatura de seu braço covarde na violência perpetrada contra moradores de rua da zona central.
Daniel Salatti é um homem pequeno, atarracado, pele que descama e cujos olhos flamejam ódio e violência. Esconde-se detrás da identidade de ex-professor da Unesp (universidade do interior paulista) e de ex- diretor de meio ambiente da CESP, empresa de energia privatizada durante o governo Covas.
Pois foi a esse homem sádico que Matarazzo entregou o comando da política higienista que moveu contra os moradores de rua na zona central da cidade. Como coordenador da guarda municipal, Salatti comandava grupos de paramilitares mobilizados para desalojar moradores de rua sob pontes e viadutos.
As ações comandadas por Salatti envolviam o disparo de rojões nos locais em que sem-teto usavam como abrigo, seguido de agressões a golpes de cassetetes e soco-inglês.  Acompanhava as “razzias” pessoalmente e apenas sob seu comando as agressões contra homens e mulheres, inclusive grávidas, eram cessadas. No dia seguinte caminhões de limpeza pública eram mobilizados para remover vestígios de sangue.
Salatti foi caixa de campanha de Covas na região de Americana, onde tem propriedades, e por ele foi nomeado na CESP para que comandasse o esquema de desapropriações das áreas que seriam inundadas pela barragem de ilha solteira. Lá conheceu Andrea, também ele caixa de Serra em São Paulo e indicado pelo ex-ministro de FHC presidente da mesma estatal, com a incumbência de prepará-la para a privatização.
Reunidos na prefeitura de São Paulo depois que Serra tornou-se prefeito, Andrea Matarazzo e Salatti uniram esforços para limpar o pedaço da cidade onde até hoje a família do conde falido parece ter propriedades ocupadas por moradores de rua, algumas delas recentemente calcinadas por incêndio de causas desconhecidas.
Agora Matarazzo quer ser prefeito da cidade. Confirmada a hipótese, os cidadãos paulistanos não teriam sorte melhor da que tiveram os romanos sob Nero.


Em imagem, o jogo expulsa e volta entre a PM e usuários de crack


Em imagem, o jogo expulsa e volta entre a PM e usuários de crack

Terra Magazine
Usuários vagam pelas ruas do centro de São Paulo
Usuários vagam pelas ruas do centro de São Paulo
Ana Cláudia Barros
Dayanne Sousa
Imagens feitas por um cinegrafista amador, obtidas com exclusividade por Terra Magazine, flagraram policiais militares dispersando usuários de crack no centro da capital paulista. Desde terça-feira (3), a PM e a Prefeitura de São Paulo atuam na região, conhecida como Cracolândia, numa ação, que, segundo fontes oficiais, tem o intuito de "abafar o tráfico de drogas".
Desorientados, cerca de cem dependentes químicos vagam pela área, em meio a gritos dos policiais de "vai, vai, vai". Os grupos caminham pela Avenida Duque de Caxias, sentido Avenida São João. Depois, retornam para a Duque de Caxias, sentido Luz. Passam pela Conselheiro Nébias, travessa da Rua Helvética, endereço conhecido com Cracolândia, no sentido Ipiranga. Na sequência, voltam da Conselheiro Nébias, em direção à Avenida Duque de Caxias.
As cenas, que mostram o jogo expulsa e volta entre os usuários e a PM, foram gravadas na quinta-feira (5), por volta das 22h.

A arte imita a vida ou a vida imita a arte.
Terá sido apenas uma mera coincidência as locações do filme "Ensaio sobre a cegueira" term sido feitas em São Paulo?
Ou uma premonição de Fernando Meirelles?

ENSAIO SOBRE A CEGUEIRA

(Blindness, 2008)
Nota Cineclick
1744
Este filme estreou em: 12 de Setembro de 2008

Uma inexplicável epidemia chamada de "cegueira branca" atinge, sem explicações, pessoas que passam a ver uma superfície leitosa. Pouco a pouco, se espalha pelo país. À medida que os afetados são colocados em quarentena e os serviços oferecidos pelo estado começam a falhar as pessoas passam a lutar por suas necessidades básicas, expondo seus instintos primários. Nesta situação, a única pessoa que ainda consegue enxergar é a mulher de um médico (Julianne Moore), que juntamente com um grupo de internos tenta encontrar a humanidade perdida.

TRAILER 1   TRAILER 2 
CRÍTICA 1   CRÍTICA 2 
NAS LOCADORAS 
*Brasilmobilizado