Alckmin corta R$ 355 milhões, mas vende 600 terrenos a R$ 900 milhões
Enquanto governador anuncia 'corte
fiscal' de 0,07% do Orçamento, tucanos votam projeto que aliena até o
Ibirapuera. CUT e Passe Livre dizem que problema é de transparência, e
não de gastos
por Gisele Brito, Eduardo Maretti e João Peres, da RBA
publicado
28/06/2013 19:42,
última modificação
28/06/2013 19:45
Guilherme Lara Campos/Palácio dos Bandeirantes
São Paulo – No mesmo dia em que se vale de
pronunciamento para anunciar cortes de R$ 355,5 milhões que incluem
fechamento de secretaria, fusões e venda de veículos, o governador de
São Paulo, Geraldo Alckmin (PSDB), pede que a Assembleia Legislativa
aprove um projeto de lei que vende 600 terrenos a R$ 900 milhões –
incluindo o local onde fica o Ginásio do Ibirapuera, na zona sul da
capital. Ao mesmo tempo, o tucano investe R$ 226 milhões em publicidade
só neste ano, totalizando quase R$ 2,5 bilhões nos últimos dez anos de
administração do PSDB.
O governador culpou a revogação do aumento de tarifas de trens e
metrô, anunciado no dia 19 após forte mobilização popular, pela
necessidade de cortar de outras fontes, embora conte com ao menos R$ 12
bilhões em caixa e tenha deixado todos os anos de executar parte do
orçamento estadual, que só em 2013 prevê R$ 173 bilhões em despesas.
Foi a mesma posição defendida pelo prefeito de São Paulo, Fernando
Haddad (PT), ao voltar atrás na decisão de elevar o preço da passagem de
ônibus. De lá para cá, o petista cancelou a licitação do sistema de
transporte público e prometeu abrir as planilhas de gastos do setor,
como exigido pelo Movimento Passe Livre (MPL), organizador das
manifestações que resultaram na revogação.
Mayara Vivian, militante do MPL, considera que o governador erra ao
indicar que a revogação do aumento é mera questão de remanejamento
orçamentário. “É uma questão de prioridade. A gente mostrou dados de que
se investia muito mais em transporte individual do que em transporte
público. Então era só uma questão de se inverter prioridades, se vai
fazer Ponte Estaiada ou se vai fazer corredor de ônibus. E, por outro
lado, cortar é cortar o lucro do empresário, que ninguém sabe qual é.”
O vice-presidente da CUT de São Paulo, Douglas Izzo, vai no mesmo
caminho ao pedir que Alckmin exponha à população os contratos do
transporte público. “Tem muitos recursos em que o governo tem
dificuldade na aplicação até para investimento. São várias obras paradas
e ele não consegue colocar essas obras para andar e utilizar os
recursos previstos anualmente. Não tem necessidade de fazer esses
ajustes.”
Os cortes anunciados hoje, chamados pelo governador de “pacote de
ajuste fiscal”, preveem uma redução de custos de R$ 129,5 milhões este
ano, o equivalente a 0,07% do Orçamento, e de R$ 226 milhões em 2014.
Entre as ações está a extinção da Secretaria de Desenvolvimento
Metropolitano, criada pelo próprio Alckmin em 1º de janeiro de 2011. "A
gente pode ter uma secretaria a menos sem nenhum prejuízo para a
população", disse o governador, durante entrevista coletiva no Palácio
dos Bandeirantes, sem explicar por que abriu a estrutura que agora
extingue.
“A secretaria que ele está fechando foi criada para acomodar pessoas
da base governista”, critica o deputado Carlos Giannazi (Psol). “Dos 94
deputados, no mínimo 66 são da base do governo e ele negocia cargos,
distribui secretarias. Tem que alimentar a base. O que ele fez hoje é só
pró-forma para imprensa.”
Outra das medidas anunciadas pelo governo estadual é a fusão de três
autarquias: Centro de Estudos e Pesquisas de Administração Municipal
(Cepam), Fundação do Desenvolvimento Administrativo (Fundap) e Fundação
Seade. O Seade funciona com este nome desde 1978, mas é herança de uma
estrutura criada ainda no século 19 para garantir a formulação de
pesquisas e relatórios fundamentais para o planejamento de ações
governamentais. “A Fundação Seade é importante para quem tem de buscar
dados econômicos e sociais do estado de São Paulo. A gente lamenta e
espera que essa fusão não venha acompanhada de rebaixamento das
condições de trabalho dos funcionários dessas três fundações”, diz Izzo,
da CUT.
O pacote inclui também a redução da frota de veículos, o que, segundo
Alckmin, provocará economia de R$ 3,1 milhões ao ano, acrescidos de R$
6,5 milhões devido à redução no aluguel de veículos. A venda de um
helicóptero resultará em corte de R$ 4,5 milhões ao ano. Outras fontes
serão cortes de água, luz, combustível e telefonia. "Com isso nós não
afetaremos um centavo os investimentos do governo que são necessários
para poder gerar mais emprego e melhorar os serviços públicos",
argumenta o tucano.
No mesmo dia, a base aliada ao governador na Assembleia prepara a
votação do Projeto de Lei 650, de 2012, que autoriza a venda de até 600
imóveis para garantir a aplicação do Programa de Parcerias
Público-Privadas. Trata-se de uma tentativa, na visão do Executivo, de
viabilizar investimentos no metrô, em trens e em rodovias, em um total
de R$ 45 bilhões. “É uma contradição enorme. Vamos votar hoje uma Lei de
Diretrizes do Orçamento antissocial que não investe o suficiente na
educação, saúde. O Alckmin faz isso para inglês ver, para a opinião
pública. Para fazer marketing”, afirma Giannazi. “É um procedimento
administrativo para mostrar que está impondo a moralidade, a
austeridade. É uma perfumaria.”
As bancadas do Psol, do PT e do PSD tentaram barrar a apreciação do
texto e cobraram do governador a realização de audiências públicas para
debater o tema, mas não tiveram sucesso. Para a oposição ao Palácio dos
Bandeirantes, a aprovação equivale a passar um cheque em branco ao
governo para dispor de prédios e terrenos públicos de alto valor
monetário, sem que sejam vendidos pelo montante que realmente valem.
Investimentos
Embora
diga que os cortes visam a não prejudicar os investimentos previstos
para este ano, a realidade da execução orçamentária contraria o tucano.
No metrô, por exemplo, em 2011 e 2012 havia previsão de destinar R$ 9,3
bilhões tanto em melhorias como em expansão do sistema, mas apenas R$
3,4 bilhões foram gastos, menos de 40% do total.
Em modernização e
capacitação das linhas já existentes, o governo também destinou menos do
que o orçamento previa. Por exemplo, a linha 3-Vermelha, que liga
Itaquera, no extremo leste, à Barra Funda, na zona oeste, e que em
horários de pico é a mais superlotada, deveria ter recebido
investimentos de R$ 484 milhões, mas o governo conseguiu aplicar R$ 384
milhões.
A linha 1-Azul, a mais antiga, inaugurada nos anos 1970, teria
recebido R$ 552 milhões se o orçado em 2011 e 2012 fosse aplicado
integralmente, mas o total investido foi de R$ 382 milhões. Na linha
2-Verde, a diferença entre orçado e realizado foi a menor. Eram
previstos R$ 135 milhões e foram investidos R$ 131 milhões. E a linha
5-Lilás, que já previa o menor montante em investimento somados os dois
anos de Geraldo Alckmin, R$ 8,2 milhões, recebeu pouco mais da metade,
R$ 4,8 milhões.
Em educação, novamente o que se nota é uma aplicação inconstante.
Estudo feito pela liderança do PT na Assembleia mostra que as obras de
expansão da rede física escolar, por exemplo, caíram um quarto, de R$
1,002 bilhão, em 2012, para R$ 751 milhões em 2013. A redução é de R$
251,2 milhões.
Em aperfeiçoamento dos profissionais do ensino fundamental e médio,
em relação ao ano passado, o orçamento em vigor registrou queda de
15,34% no primeiro (de R$ 71,4 milhões para R$ 60,4) e 25,8% no segundo,
que diminuiu de R$ 52,9 milhões para R$ 39,2 milhões.
O Programa
Ler e Escrever, lançado em 2007 na gestão de José Serra (PSDB) para
promover a melhoria do ensino em toda a rede estadual, com ações
incluindo apoio aos professores e distribuição de materiais pedagógicos e
outros subsídios, teve recursos e número de alunos beneficiados
reduzidos. Na peça orçamentária de 2012, eram 681.763 alunos, com verbas
de R$ 85,9 milhões. Em 2013, os números caíram para 661.731 (2,9%) e R$
65 milhões (24,3%), respectivamente.
O programa de alimentação
escolar apresenta redução dos recursos (de R$ 368 milhões para R$ 336
milhões), enquanto o número de alunos a ser alcançado aumentou de
2.140.622 para 2.208.489, o que pode representar a diminuição da
qualidade nutricional oferecida aos alunos, segundo o estudo.
O
programa Escola da Família, criado na primeira gestão de Alckmin, que
previa o funcionamento das escolas em fins de semana para atividades das
comunidades onde se localizam, foi reduzido pela metade no governo de
José Serra (2007-2010) e, no segundo mandato de Alckmin, permanece
estagnado. Em 2012, eram 2.390 escolas participantes do programa, número
que permanece igual este ano. Os recursos, porém, aumentaram de R$
103,5 milhões para 119,3 milhões.
*RedeBrasilAtual