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Ser de esquerda é não aceitar as injustiças, sejam elas quais forem, como um fato natural. É não calar diante da violação dos Direitos Humanos, em qualquer país e em qualquer momento. É questionar determinadas leis – porque a Justiça, muitas vezes, não anda de mãos dadas com o Direito; e entre um e outro, o homem de esquerda escolhe a justiça.
É ser guiado por uma permanente capacidade de se estarrecer e, com ela e por causa dela, não se acomodar, não se vender, não se deixar manipular ou seduzir pelo poder. É escolher o caminho mais justo, mesmo que seja cansativo demais, arriscado demais, distante demais. O homem de esquerda acredita que a vida pode e deve ser melhor e é isso, no fundo, que o move. Porque o homem de esquerda sabe que não é culpa do destino ou da vontade divina que um bilhão de pessoas, segundo dados da ONU, passe fome no mundo.
É caminhar junto aos marginalizados; é repartir aquilo que se tem e até mesmo aquilo que falta, sem sacrifício e sem estardalhaço. À direita, cabe a tarefa de dar o que sobra, em forma de esmola e de assistencialismo, com barulho e holofotes. Ser de esquerda é reconhecer no outro sua própria humanidade, principalmente quando o outro for completamente diferente. Os homens e mulheres de esquerda sabem que o destino de uma pessoa não deveria ser determinado por causa da raça, do gênero ou da religião.
Ser de esquerda é não se deixar seduzir pelo consumismo; é entender, como ensinou Milton Santos, que a felicidade está ancorada nos bens infinitos. É mergulhar, com alegria e inteireza, na luta por um mundo melhor e neste mergulho não se deixar contaminar pela arrogância, pelo rancor ou pela vaidade. É manter a coerência entre a palavra e a ação. É alimentar as dúvidas, para não cair no poço escuro das respostas fáceis, das certezas cômodas e caducas. Porém, o homem de esquerda não faz da dúvida o álibi para a indiferença. Ele nunca é indiferente. Ser de esquerda é saber que este “mundo melhor e possível” não se fará de punhos cerrados nem com gritos de guerra, mas será construído no dia-a-dia, nas pequenas e grandes obras e que, muitas vezes, é preciso comprar batalhas longas e desgastantes. Ser de esquerda é, na batalha, não usar os métodos do inimigo.
Fernando Evangelista

quinta-feira, junho 09, 2011

Natal ferve: #foraMicarla





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Fica a pergunta, porque não adotarmos o mandato revogatório, como a Bolívia o fez? Se a prefeita goza de mais de 70% de reprovação, porque o povo que lá a colocou não a pode tirar? Por que não regulamentar o referendo e o plebiscito, para que antes de privatizacoes e outras decisões de afronta ao interesse nacional tenhamos o pronunciamento da vontade popular?
O povo nas Ruas: #ForaMicarla
Daniel Valença*
O Rio Grande do Norte e sua capital se notabilizaram nacionalmente, nos últimos anos, por não seguir a tendência no Nordeste de perda de poder das antigas oligarquias e expansão de setores de esquerda e centro-esquerda. Fomos o único estado do NE a garantir a eleição do DEM em 2010 e de um senador que remonta aos períodos ditatoriais – José Agripino Maia. Na Assembléia Legislativa e na Câmara da capital, contam-se nos dedos os parlamentares de esquerda e centro-esquerda. Porém, destas veias já jorraram a Intentona Comunista – por poucos dias, é verdade, mas revolucionária em 1935 – ; o governo Djalma Maranhão e o início do processo educacional revolucionário de Paulo Freire, dentre vários outros momentos históricos para o país.
Em um momento em que o Oriente Médio e a Europa fervem, aqui em Natal, estudantes, militantes políticos, partidários ou de movimentos sociais, cidadãos descontentes, ocuparam a Câmara Municipal da cidade desde a tarde do dia 07 de junho, recuperando a história de luta e deixando claro às elites locais que nosso povo não se constitui em uma massa amorfa, sem rosto e sem voz, como em algum momento lhes pareceu.
O movimento #ForaMicarla #XoInseto acumula as lutas contra os aumentos de passagens, abusivos e realizados na calada da noite, os ataques ao SUS, à educação e outras áreas sociais protagonizados pela prefeita, os debates travados nas redes sociais e a rejeição popular à prefeita do PV, que apresenta índices comparáveis à imbatível Ieda Crusius-PSDB do nosso outro Rio Grande. Após vários atos, finalmente ocupou-se a Câmara Municipal com a reivindicação do impeachment da mandatária. A ocupação estava sendo transmitida pelo twitter, www.foramicarla.com, mas o sinal perdeu-se… ou foi cortado? Do outro lado, a grande mídia majoritariamente tem abordado o movimento de maneira negativa.
Para além dos rumos que o movimento tomará, já é possível indicar alguns elementos essenciais desse processo:
1.Ao contrário das     mobilizações populares espanholas recentes, em nosso processo há     um diálogo entre as “novas formas de militância” (nas redes     sociais) e as históricas em movimentos sociais e partidos de     esquerda – diálogo tenso, às vezes beirando o rompimento,     inclusive ainda não dado, porém, que manteve a unidade de     ação até o momento;
2.Mais uma vez,     comprova-se que a mídia comercial não nos contempla e não exerce     sua função democrática – Micarla de Sousa, por exemplo, detém     a filial do SBT no RN, herdada de seu pai, ex-senador. E, de outro     lado, é latente que precisamos organizar nacionalmente uma rede de     comunicações alternativas – e a esquerda tem que buscar ao     máximo a unificação para tanto – em que cada militante, cada     movimento social possa acessar e difundir rapidamente os     acontecimentos, por mais que o twitter já cumpra em parte     esse papel;
3.A gestão da     Prefeitura do Natal não mudará se Micarla for derrubada – ela     apenas representa uma aliança empresarial que tomou para si o     Estado, como ficou claro, à época, em editorial do Jornal de Hoje,     que afirmava terem os empresários derrotado o prefeito Carlos     Eduardo. Advindos dos setores empresariais da saúde, dos     transportes, da construção civil e da educação, é este arco que     explica o porquê da Prefeita terceirizar/privatizar o SUS; aumentar     as passagens em finais de expedientes, vésperas de feriados e sem     debate púbico sobre a planilha de gastos das empresas; ter tentando     alterar o Plano Diretor por decreto, dentre outras medidas. Não foi     sua incompetência, apenas, mas tudo isso é o resultado das     forças que a financiaram e ela as representa. Em uma democracia     fundada na representatividade, são esses setores que devem ser     derrotados em 2012 para que ocorram mudanças reais na cidade;
4.Os últimos     acontecimentos na Europa e no Brasil – veja-se o caso da aprovação     do Código Florestal – revelam que a democracia representativa     está falida. Tanto o movimento #ForaMicarla como os demais de todo     o país têm que se unificar para uma alteração não apenas das     regras eleitorais – e aí é um grande passo o financiamento     público de campanha, que não apenas diminuirá o lobby e a     corrupção de empresas financiadoras de campanhas multimilionárias,     como proporcionará que, para além de empresários, latifundiários     e oligárquicos, estudantes, sindicalistas, ativistas e outras     lideranças tão legítimas, quanto as primeiras, também tenham     boas chances eleitorais, e fidelidade partidária/voto em lista -     como também uma refundação da democracia baseada na participação     popular direta – ou seja, que o povo realmente decida seus caminhos.
Fica a pergunta, porque não adotarmos o mandato revogatório, como a Bolívia o fez? Se a prefeita goza de mais de 70% de reprovação, porque o povo que lá a colocou não a pode tirar? Por que não regulamentar o referendo e o plebiscito, para que antes de privatizacoes e outras decisoes de afronta ao interesse nacional tenhamos o pronunciamento da vontade popular?
Que o povo decida.

*Daniel Araújo Valença, professor de Ciência Política do curso de Direito da Universidade Federal Rural do Semi-Árido.

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