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Ser de esquerda é não aceitar as injustiças, sejam elas quais forem, como um fato natural. É não calar diante da violação dos Direitos Humanos, em qualquer país e em qualquer momento. É questionar determinadas leis – porque a Justiça, muitas vezes, não anda de mãos dadas com o Direito; e entre um e outro, o homem de esquerda escolhe a justiça.
É ser guiado por uma permanente capacidade de se estarrecer e, com ela e por causa dela, não se acomodar, não se vender, não se deixar manipular ou seduzir pelo poder. É escolher o caminho mais justo, mesmo que seja cansativo demais, arriscado demais, distante demais. O homem de esquerda acredita que a vida pode e deve ser melhor e é isso, no fundo, que o move. Porque o homem de esquerda sabe que não é culpa do destino ou da vontade divina que um bilhão de pessoas, segundo dados da ONU, passe fome no mundo.
É caminhar junto aos marginalizados; é repartir aquilo que se tem e até mesmo aquilo que falta, sem sacrifício e sem estardalhaço. À direita, cabe a tarefa de dar o que sobra, em forma de esmola e de assistencialismo, com barulho e holofotes. Ser de esquerda é reconhecer no outro sua própria humanidade, principalmente quando o outro for completamente diferente. Os homens e mulheres de esquerda sabem que o destino de uma pessoa não deveria ser determinado por causa da raça, do gênero ou da religião.
Ser de esquerda é não se deixar seduzir pelo consumismo; é entender, como ensinou Milton Santos, que a felicidade está ancorada nos bens infinitos. É mergulhar, com alegria e inteireza, na luta por um mundo melhor e neste mergulho não se deixar contaminar pela arrogância, pelo rancor ou pela vaidade. É manter a coerência entre a palavra e a ação. É alimentar as dúvidas, para não cair no poço escuro das respostas fáceis, das certezas cômodas e caducas. Porém, o homem de esquerda não faz da dúvida o álibi para a indiferença. Ele nunca é indiferente. Ser de esquerda é saber que este “mundo melhor e possível” não se fará de punhos cerrados nem com gritos de guerra, mas será construído no dia-a-dia, nas pequenas e grandes obras e que, muitas vezes, é preciso comprar batalhas longas e desgastantes. Ser de esquerda é, na batalha, não usar os métodos do inimigo.
Fernando Evangelista

domingo, junho 05, 2011

O fracasso do euro


 

Luis Carlos Bresser-Pereira, 
Países com altas dívidas privadas estão em uma armadilha; a única solução racional é abandonar o euro
A CRISE financeira europeia se agrava dia a dia. Agora é a Espanha que está sendo desafiada pelos especuladores, e são os jovens espanhóis desempregados que se reúnem nas praças públicas para protestar.

Eles não apresentam soluções para o problema, mas as oferecidas pelo Banco Central Europeu, a Comunidade Europeia, o FMI, e a Alemanha tampouco estão logrando acalmar o mercado financeiro.

A única ideia que fazia algum sentido para o país mais atingido do bloco -a Grécia- era a reestruturação de sua dívida, como sugeriu a Alemanha, mas as burocracias conservadoras do BCE e do FMI não a aceitaram.

Agora, com a crise da Espanha, que é uma crise da dívida privada, o que está em questão não é mais saber se a Grécia ou qualquer outro dos países ameaçados poderá sair desta crise sem impor aos credores do respectivo Estado um desconto substancial.

Como não é tão simples impor prejuízos aos credores de dívida privada, a questão é saber se é possível salvar o euro.

Foram duas as causas da crise europeia: a política fiscal expansiva que os países foram obrigados a praticar diante da crise bancária de 2008, e a sobreapreciação implícita do euro ocorrida no transcorrer dos últimos dez anos nos países do Sul da Europa mais a Irlanda, e que estão hoje em crise.

A primeira causa deu origem a uma grande dívida pública, a segunda, a uma grande dívida privada. O caso mais grave de dívida pública -o da Grécia- poderia ser resolvido pela reestruturação.

DÍVIDA PRIVADA

Já quando a dívida é privada, como a situação da Espanha, só há duas soluções: ou uma profunda recessão que reduza os salários reais, ou a saída do euro e a depreciação direta da moeda.

A solução proposta pelos credores foi a do ajuste fiscal, da recessão, do desemprego, da diminuição dos salários. Depreciar-se-ia, assim, a taxa de câmbio implícita e o equilíbrio da conta corrente dos países endividados poderia ser restaurado.

Como a origem da dívida privada foi a apreciação do euro causada pelo aumento da produtividade dos países do Norte da Europa sem que aumentassem os salários, enquanto nos países do Sul a produtividade aumentava menos e os salários mais, a solução pode parecer razoável para os credores.

E os devedores a acusarão de injusta. A questão, entretanto, não é de razoabilidade nem de justiça; é de viabilidade econômica.

O desequilíbrio da conta corrente e a dívida já acumulada dos países do Sul são altos demais para serem resolvidos por política de austeridade, desemprego e diminuição de salários. Os países com altas dívidas privadas, a começar pela Espanha, estão em uma armadilha.

A única solução racional para eles é depreciar sua moeda, e, portanto, sair do euro.

Terão eles coragem e determinação para fazê-lo? Restabelecer a autoridade de seus bancos centrais e enfrentar os riscos da inflação? É a solução menos custosa para eles, mas exige coragem.

O próprio euro sobreviverá? Creio que sim. Mas está claro que o euro fracassou, não obstante seja uma moeda forte. Fracassou porque criou mais problemas do que soluções para a União Europeia.
*esquerdopata

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