Ser de esquerda é não aceitar as injustiças, sejam elas quais forem, como um fato natural. É não calar diante da violação dos Direitos Humanos, em qualquer país e em qualquer momento. É questionar determinadas leis – porque a Justiça, muitas vezes, não anda de mãos dadas com o Direito; e entre um e outro, o homem de esquerda escolhe a justiça.
É ser guiado por uma permanente capacidade de se estarrecer e, com ela e por causa dela, não se acomodar, não se vender, não se deixar manipular ou seduzir pelo poder. É escolher o caminho mais justo, mesmo que seja cansativo demais, arriscado demais, distante demais. O homem de esquerda acredita que a vida pode e deve ser melhor e é isso, no fundo, que o move. Porque o homem de esquerda sabe que não é culpa do destino ou da vontade divina que um bilhão de pessoas, segundo dados da ONU, passe fome no mundo.
É caminhar junto aos marginalizados; é repartir aquilo que se tem e até mesmo aquilo que falta, sem sacrifício e sem estardalhaço. À direita, cabe a tarefa de dar o que sobra, em forma de esmola e de assistencialismo, com barulho e holofotes. Ser de esquerda é reconhecer no outro sua própria humanidade, principalmente quando o outro for completamente diferente. Os homens e mulheres de esquerda sabem que o destino de uma pessoa não deveria ser determinado por causa da raça, do gênero ou da religião.
Ser de esquerda é não se deixar seduzir pelo consumismo; é entender, como ensinou Milton Santos, que a felicidade está ancorada nos bens infinitos. É mergulhar, com alegria e inteireza, na luta por um mundo melhor e neste mergulho não se deixar contaminar pela arrogância, pelo rancor ou pela vaidade. É manter a coerência entre a palavra e a ação. É alimentar as dúvidas, para não cair no poço escuro das respostas fáceis, das certezas cômodas e caducas. Porém, o homem de esquerda não faz da dúvida o álibi para a indiferença. Ele nunca é indiferente. Ser de esquerda é saber que este “mundo melhor e possível” não se fará de punhos cerrados nem com gritos de guerra, mas será construído no dia-a-dia, nas pequenas e grandes obras e que, muitas vezes, é preciso comprar batalhas longas e desgastantes. Ser de esquerda é, na batalha, não usar os métodos do inimigo.
A Boitempo acaba de disponibilizar mais um curso completo em seu canal no YouTube! “A teoria da revolução” oferece um panorama introdutório das concepções de revolução em quatro figuras clássicas do pensamento crítico revolucionário. São aulas longas, de cerca de duas horas e meia cada, conduzidas por professores diferentes, cada um especializado na vida e obra dos respectivos pensadores: Karl Marx, Vladímir Lênin, Mikhail Bakunin e Rosa Luxemburgo. Realizado no contexto do IV Salão do Livro Político, o curso ocorreu entre os dias 18 e 21 de junho, no teatro Tucarena da PUC-SP.
Não deixe de se inscrever no nosso canal para receber nossos conteúdos em primeira mão. Com vídeos novos a cada dois dias, a TV Boitempo reúne cursos exclusivos, gravações de debates, palestras e aulas promovidos pela editora, além de reflexões inéditas de nossos autores sobre temas diversos. Com coordenação de Artur Renzo e assistência de Heleni Andrade, a TV Boitempo se aproxima do marco de cem mil inscritos, consolidando-se como o maior canal de YouTube de todo o mercado editorial brasileiro.
Dodge vai pedir extradição de coronel da reserva que gravou vídeos atacando ministros
Carlos Alves, que está em Portugal, chamou a presidente do TSE Rosa Weber de 'salafrária' e 'corrupta'. Ele também criticou outros integrantes do Supremo e afirmou que a Corte sofrerá consequência caso decida impedir a candidatura de Jair Bolsonaro. A informação é do jornalista Kennedy Alencar, comentarista da CBN.
Quando uma criança krenak nasce, não vai para a creche, fica com a mãe, as avós e as tias. Partilham um quotidiano e um modo de estar na vida. As crianças indígenas não são educadas, mas orientadas. Não aprendem a ser vencedores, porque, para uns vencerem, outros têm de perder. Aprendem a partilhar o lugar onde vivem e o que têm para comer. Têm o exemplo de uma vida onde o indivíduo conta menos do que o coletivo. Este é o mistério indígena, um legado que passa de geração para geração. Ailton carrega no apelido a pertença à sua gente, o povo krenak. E a sua memória mais antiga é muito simples: “Eu não sei viver sozinho.”
Esteve esta semana em Portugal para participar no Fórum Internacional de Festivais de Cinema de Ambiente, em Seia, onde realizadores de mais de 30 países estiveram reunidos e demonstraram preocupação com o rumo político do Brasil e as consequências das eleições presidenciais na preservação da floresta amazónica. Antes de regressar a casa, Ailton Krenak conversou com o Expresso.
Que povo é o seu? Krenak.
O que quer dizer? Numa das línguas nativas do Brasil que restaram, kren quer dizer cabeça, e nak é terra. Logo, nós somos a cabeça da terra. Escutando os velhos e perguntando sobre a nossa história, entendi que somos uma das últimas famílias de um povo que, quando D. João VI chegou ao Brasil, habitava uma região conhecida como a Floresta do Rio Doce. Os viajantes se referem a ela como uma floresta tão impressionante como a Mata Atlântica ou a Floresta Amazónica. Era uma muralha natural no caminho do ouro e dos diamantes que vinham do interior. Mas a Coroa precisava de dinheiro e os colonos não eram bobos e pressionaram D. João VI para que libertasse a entrada na floresta. Os nossos antepassados, chamados botocudos, resistiram bravamente a essa investida e a nossa aldeia foi o último lugar a ser colonizado, já tardiamente, por volta de 1910. Nessa altura ainda havia caçadores e recoletores andando nessa floresta. Para acabar com os botocudos, primeiro esses colonos que estavam expandindo as fronteiras internas do Brasil tiveram de devastar a floresta. Vejo um paralelo muito grande, passados quase 200 anos, com o que os brasileiros estão a fazer [agora], determinados a devastar a última grande floresta da bacia amazónica.
SEGREGADOS “NUM CAMPINHO DE CONCENTRAÇÃO”
A conversa começa assim e segue por muitos percursos, sempre sob a sombra das árvores, no meio da cidade. Rapidamente nos deparamos com as eleições presidenciais no Brasil e com a possibilidade de Jair Bolsonaro ser o escolhido pela maioria da população. O candidato já afirmou que “não vai ter nem um centímetro demarcado para reserva indígena”.
Preocupado, mas sereno, Ailton responde: “Em outras épocas, o meu povo já experimentou diferentes tipos de violência. Os botocudos foram aniquilados durante o século XIX e chegaram ao século XX quase extintos, ao ponto de sermos a única família. Os krenak têm memória da guerra descrita numa carta assinada por D. João VI, que se chamava mesmo 'guerra de extermínio à nação dos botocudos do Vale do Rio Doce'. Uma declaração de guerra contra o nosso povo.”
Uma guerra que não se pode resumir ao número de mortos. “A população de indígenas daquela região no final do século XIX era estimada em cinco mil pessoas. Só chegaram 140 indivíduos ao século XX. Era como se caísse uma bomba na Europa e ficassem umas cem mil pessoas para contar a história. Fomos vítimas de um genocídio e não há contabilidade possível. Os krenak voltaram a reunir 120 famílias. Se considerarmos cinco pessoas por família, somos pouco mais de 500. Vivemos dentro de uma pequena reserva, segregados pelo governo brasileiro, num campinho de concentração que o Estado fez para os krenak sobreviverem. Durante o período da ditadura, se constituiu num campo de reeducação, que na verdade era um centro de tortura. Já passamos por tanta ofensa que mais essa agora não nos vai deixar fora do sério. Fico preocupado é se os brancos vão resistir. Nós estamos resistindo há 500 anos.”
DECLARAÇÃO DE GUERRA
Há 30 anos, perante a Assembleia Constituinte que redigiu a lei fundamental da então recém recuperada democracia brasileira, Ailton Krenak pintou o rosto de negro e declarou guerra aos congressistas. Lutava pelos direitos do povo indígena - e venceu. Mas diz que o tempo não se repete e que hoje não voltaria a tomar a mesma atitude. “Na década de oitenta abrimos trilhas para as novas gerações buscarem o reconhecimento dos direitos das populações originárias, os indígenas, e para conscientizar a população da importância de continuarmos tendo rios, montanhas, paisagens, florestas como recursos capazes de se refazerem ao longo do tempo e como uma riqueza a ser partilhada pelas gerações futuras. É um tipo de entendimento da terra como a nossa casa comum, mas o que tem prevalecido é a ideia de que diferentes lugares do planeta podem oferecer posicionamentos estratégicos para algumas potências ou ser simplesmente fonte de suprimento daquilo que estas potências querem controlar. E pequenas nações como o Brasil e a maior parte dos países da América Latina, ex-colónias, não tiveram sequer o tempo necessário para consolidar um pensamento acerca de si mesmos. Não tenho nenhuma ilusão acerca do futuro destas pequenas nações: ou vamos experimentar grandes transformações globais na relação entre os povos ou estas pequenas nações vão ser cada vez mais territórios de disputa e enclaves das potências que têm força para decidir o jogo, que não precisa nem de ser na ONU, é decidido no mercado.”
Nações pequenas? O Brasil? “O Brasil é pequeno no sonho. Sonha pequeno. Um território que não esboça uma visão soberana pode ser grande geograficamente mas vai continuar sendo pequeno na sua expressão no mundo. A Amazónia é a maior floresta tropical do planeta que ainda tem condição de ser reguladora do clima e o Brasil quer derrubar a Amazónia. Por que eu vou achar o Brasil grande? O Brasil é menor do que a Amazónia. Eu queria que ele fosse maior.”
E como aquele país se limitou desta forma? Para Ailton, “a colonização que a Europa fez do resto do mundo desde os séculos XV e XVI imprimiu uma maneira de dominação que é como um vírus, é capaz de se auto-reproduzir, inclusive nas colónias”. E “se o Brasil foi inseminado com esta ideologia colonialista, ele vai ser capaz de reproduzir isso infinitamente, enquanto não quebrar esse ciclo colonial. O projeto político de criar uma nação chamada Brasil é tão pequeno que chega a ser menor do que a Amazónia.”
PISAR COM LEVEZA
Ailton Krenak não se esquece de um texto de 1865, atribuído a um chefe indígena da América do Norte quando abordado por um representante do governo de Washington, avisando que queriam comprar as terras dos índios. Não se esquece também de que a resposta do chefe Seatle foi de que os índios não podiam vender a terra porque a terra é maior do que os índios, é a mãe deles. “Disse aos brancos que, se algum dia eles herdassem aquela terra, que a pisassem suavemente, porque se não aprenderem a respeitar, vão acumular detritos sobre detritos até que vão acordar enterrados no próprio vómito.” Reconhece aquele texto como o primeiro manifesto ambiental do século XX, “uma ideia partilhada pelos povos que vivem nas ilhas do Pacífico, nos Andes, nas montanhas dos Himalaias, porque estes povos originários têm isso no coração, antes de ter na cabeça”. Para completar: “Talvez o que as nossas crianças aprendem desde cedo é a pôr o coração no ritmo da terra.”
Como um círculo, a conversa volta ao início, à génese: à memória e à sua partilha. Das muitas formas de as novas gerações terem acesso ao passado. Homem de longos silêncios, Ailton Krenak emudece por alguns momentos, quando questionado sobre como o legado de um povo é transmitido às gerações seguintes. “Quem dera que eu pudesse responder a uma pergunta dessas. Ao longo da minha vida inteira vou experimentar [as formas] como transmitimos aos nossos filhos e filhas os valores que nos distinguem de uma sociedade predatória, individualista e que incentiva desde cedo as crianças para a competição, a dominarem-se uns aos outros”. Para concluir com outro questionamento, ainda mais denso do que a primeiro: “Parece que o mandamento principal dessa civilização é 'dominai-vos uns aos outros', contrariando aquele outro que seria 'amai-vos uns aos outros'. Estamos nesta dualidade e podemos escolher qual o mandamento mais interessante para ensinarmos aos nossos filhos.” E Ailton despede-se de nós e do Sol, que também começa a partir. “Te mum tepó itxá, kren nabã tepó erehé”*
* “Oh Sol, você já tá indo? Eu abaixo a minha cabeça para você.”
“A burguesia recorre a solução fascista para se proteger menos contra as perturbações de rua do que contra as perturbações de seu próprio sistema econômico”
– Daniel Guérin (Fascisme et grand capital. Galiimard, 1936)
“Aquelas pessoas que são contra o fascismo sem serem contra o capitalismo, que lamentam a barbárie que vem desse barbarismo, são como pessoas que querem comer sua carne de vitela sem matar o bezerro. Elas estão preparadas para comer a vitela, mas não gostam de ver o sangue. Elas facilmente se satisfazem se quem matou o bezerro lava suas mãos antes de pesar a carne. Elas não são contra as relações de propriedade que produzem a barbárie; elas somente são contra a barbárie em si. Elas levantam suas vozes contra a barbárie, e o fazem em países onde exatamente as mesmas relações de propriedade prevalecem, mas onde quem matou os bezerros novamente lava suas mãos antes de pesar a carne.”
– Bertolt Brecht
Nenhum governo do mundo combate o fascismo até suprimir-lo. Quando a burguesia vê que o poder lhe escapa das mãos recorre ao fascismo para manter o poder de seus privilégios, e isso é o que ocorre na Espanha. Se o governo republicano tivesse desejado eliminar os elementos fascistas, podia tê-lo feito a muito tempo. Ao invés disso, contemporizou, transigiu e gastou seu tempo buscando compromissos e acordos com eles. Mesmo no atual momento existem membros do governo que desejam tomar medidas “muito moderadas” contra os fascistas. É, quem sabe se o governo ainda não espera utilizar as forças rebeldes para esmagar o movimento revolucionário desencadeado pelos trabalhadores.
– Buenaventura Durruti
Não é só no Brasil destes dias que o termo “fascismo” voltou a permear o debate político. Em países europeus como Hungria, Polônia, Áustria e Itália, berço do fenômeno, a ascensão de políticos populistas de extrema direita – com pendores nacionalistas e xenófobos – tem suscitado calorosas discussões sobre a conveniência ou não de se usar a palavra.
O historiador Emilio Gentile é considerado na Itália o maior especialista vivo sobre o assunto. Autor de inúmeros livros sobre o período fascista, muitos deles adotados nas escolas italianas, ele afirma que utilizar o termo, como se tornou comum recentemente, é uma forma de confundir as ideias e não observar um fenômeno que, na verdade, tem a ver com a crise da democracia.
“A democracia não está em risco por causa de um fascismo que não existe. Hoje, o perigo é a democracia que se suicida”, disse à BBC News Brasil. “O que há de novo, em todo o mundo, é um novo poder de direita nacionalista e xenófobo. É o que Orbán (Viktor Orbán, primeiro-ministro da Hungria, um dos expoentes desse movimento na Europa) classificou de política nacionalista democrática iliberal.”
De acordo com Gentile, há muitos movimentos políticos – na Europa e em outros lugares do mundo – que se referem à experiência fascista e utilizam seus símbolos, mas de uma maneira muito “idealizada e imaginária”.
O fascismo foi criado por Benito Mussolini – um ex-socialista – há quase cem anos. Originário da palavra latina “fascio littorio”, um conjunto de galhos amarrados a um machado, símbolo do poder de punição dos magistrados na Roma Antiga, o experimento nasceu oficialmente em 23 de março de 1919, quando Mussolini fundou em Milão o grupo “Fasci di Combattimento”, que reunia ex-combatentes da Primeira Guerra Mundial (1914-18).
Com a Itália imersa no caos – à beira de uma guerra civil, com crise política, econômica e social, num momento em que o poder fugiu do controle do Estado -, e à sombra da revolução russa de 1917 (temia-se que o comunismo chegasse também no país), o grupo fundado por Mussolini cresceu rapidamente.
Ainda em 1919, ocorreram ataques de brigadas fascistas – que depois se tornariam efetivamente milícias paramilitares – contra políticos de esquerda, judeus, homossexuais e órgãos da imprensa. Eles ficariam conhecidos como os “camisas negras”.
No final de 1921, nasceu o Partido Nacional Fascista (PNF), cujo símbolo era exatamente o “fascio littorio”. Menos de um ano depois, Mussolini assume o poder. Ele fortaleceu sua influência na Itália angariando o apoio de industriais, empresários e do Vaticano, e tornou-se referência para regimes autoritários mundo afora – Francisco Franco na Espanha, António Salazar em Portugal e, sobretudo, Adolf Hitler na Alemanha (que por muito tempo manteve um busto do Duce italiano em seu escritório) tiveram em Mussolini e no seu regime uma grande fonte de inspiração.
Regime totalitário baseado num partido único, a característica fundamental do fascismo foi a militarização da política, que era tratada como uma experiência de guerra: além do projeto de expansão imperial, com a supremacia fascista imposta no Estado e na sociedade, o regime tratava os adversários como inimigos que deveriam ser eliminados. No mês passado, a Itália lembrou os 80 anos da chamada lei racial, aprovada contra os judeus e que estava em consonância ao regime nazista de Hitler.
“O fascismo sempre negou a soberania popular, enquanto o nacionalismo populista de hoje reivindica o sucesso eleitoral. Esse políticos de agora se dizem representantes do povo, pois foram eleitos pela maioria. Isso o fascismo nunca fez”, comenta Emilio Gentile.
Raízes fascistas
Para o sociólogo italiano Domenico de Masi, que conhece o Brasil há muitos anos, se não é possível falar num fascismo histórico como o implementado na Itália no século passado, não há dúvidas, por outro lado, de que Jair Bolsonaro (PSL) é um político de inspiração fascista – o candidato à Presidência disse recentemente num comício no Acre em “metralhar a petralhada”. A eliminação física de adversários era exatamente uma das características do regime de Mussolini.
“Ele tem inspiração fascista no que diz respeito à relação do Estado com a economia, entre o poder civil e militar, política e religião. E com base num conceito de autoritarismo, acha que pode resolver problemas complexos com receitas fáceis”, diz De Masi.
O sociólogo vê com inquietação a ascensão de governos e políticos com raízes “claramente fascistas”. “Bolsonaro é como Salvini (Matteo Salvini, político de direita e vice-premiê italiano hoje). Os dois têm uma visão autoritária da sociedade. Brasil e Itália são sociedades muito distintas, mas vejo os dois muito parecidos”, completou.
Salvini, aliado de Steve Bannon, ex-estrategista de Donald Trump que já se reuniu com um dos filhos de Bolsonaro, declarou recentemente no Twitter torcer pela eleição do ex-capitão no Brasil.
Domenico de Masi ressalta que, enquanto na Europa o que alimenta esse tipo de discurso é a imigração (e que tem, na Itália, o apoio das classes média e média-baixa), no Brasil o fenômeno é estimulado pelo ódio ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e ao Partido dos Trabalhadores. “No caso brasileiro, o cidadão pobre do Nordeste é mais inteligente quanto ao perigo de Bolsonaro do que os ricos de São Paulo, que apoiam o candidato”.
Como o colega Emilio Gentile, o historiador Eugenio di Rienzo, professor de História Contemporânea da Universidade Sapienza, em Roma, afirma que o fascismo é um regime que nasceu e morreu no século passado – em 1945, quando Mussolini foi assassinado em Milão.
“Não se pode fazer uma analogia entre aquele fenômeno e outro. O fascismo não se reproduz mais, é preciso cuidado com o uso da palavra, pois acaba provocando desinformação”, disse. “Um racista não é sempre um fascista. O governo de (Recep Tayyip) Erdogan na Turquia é autoritário, mas não fascista.”
Di Rienzo reconhece que há muitos nostálgicos do fascismo na Itália, assim como do nazismo na Alemanha, mas para ele o processo atual (na Europa e nos Estados Unidos de Trump) não é uma “repetição do passado”: “Há algumas semelhanças, mas os processos são muito diferentes. A analogia, muitas vezes, tem o propósito de propaganda”.
Emilio Gentile concorda. “Na verdade, faz-se propaganda de um fascismo que parece eterno, mas ao menos na Europa é um fenômeno novo que se relaciona à crise da democracia, ao medo da globalização e dos movimentos imigratórios que poderiam sufocar a coletividade nacional. Mexe com a imaginação das pessoas, mas não se trata de um perigo real.”
Gentile lembra que o sucesso de Bolsonaro no Brasil tem a ver com uma tradição latino-americana da participação dos militares na política, vistos como atores da “ordem e da competência”, o que não acontece nos países europeus.
Madeleine Albright, ex-secretária de Estado dos Estados Unidos, país onde chegou nos anos 1940 após sua família fugir do nazi-fascismo na Europa, publicou recentemente o livro Fascismo: Um Alerta, em que discute o tema e as formas atuais de transmutação do que ela chama de “vírus do autoritarismo”. “Definir fascismo é difícil. Primeiro, não acho que fascismo seja uma ideologia. É um método, um sistema”, disse Albright recentemente numa entrevista.
O certo é que o debate sobre o que é fascismo e em quais situações se deve utilizar o conceito é tão antigo quanto o próprio regime.
Numa coluna para o jornal inglês Tribune, em março de 1944, o escritor e jornalista George Orwell escreveu – o artigo intitulava-se “O que é fascismo?” – que todo aquele que usa indiscriminadamente a palavra fascismo está agregando a ela um significado emocional. “Por fascismo, eles estão se referindo, de maneira grosseira, a algo cruel, inescrupuloso, arrogante, obscurantista.”
Autor de livros clássicos sobre o totalitarismo (como 1984 e A Revolução dos Bichos), Orwell recomendava: “Tudo que se pode fazer no momento é usar a palavra com certa medida de circunspeção e não, como usualmente se faz, degradá-la ao nível de um palavrão”.
Se você têm noção do que é certo ou errado, ou do bem e do mal, não fazendo o que é errado ou o mal, pra que religião? Porque é bom pagar dízimo e pagar por besteiras ungidas tirando dos filhos para dar ao pastor ou ao padre ou ao Rabino ou ao Guru? Se é pecador é porque não é boa pessoa e pelo que eu saiba, segundo se ensina nas igrejas, coisa ruim não tem salvação. Gente boa não se importa se existe um deus ou religião porque não precisa ser salvo de coisa alguma. O Paraíso é aqui e a vida acontece agora.
Temos à nossa volta animais sofrendo, sendo torturados, abandonados; crianças vendendo o corpo por um prato de comida ou por drogas; idosos abandonados, doentes e solitários em asilos; pessoas com doenças terminais em hospitais…e você rezando? Pensando na SUA salvação e sonhando com um paraíso e uma vida eterna? Pra quê vida eterna? Pra continuar fazendo o que você já faz? NADA a não ser rezar e dizer Amém? O seu amém não salva ninguém do sofrimento…aumenta o sofrimento porque de efetivo e eficaz para melhorar as condições de vida dos seus semelhantes, estejam eles em que parte do planeta estiverem, você faz NADA.
Pecadores só pensam em si mesmos.
Carregue a cruz que o seu amado Pai colocou em suas costas. É mais fácil do que ir até um asilo dar banho nos idosos, conversar com eles ou fazer a barba dos velhinhos. Carregar a cruz e viver de joelhos é a sua sentença de morte em vida.
Atravessando um pedregal desde o esfaqueamento, a candidatura de Jair Bolsonaro parou de crescer e começou a ser apedrejada por forças que ainda sonham com sua troca por Geraldo Alckmin num segundo turno contra o PT.
Agora espocam denúncias sobre seus malfeitos nunca antes descobertos, por exemplo, pela revista Veja, com sua expertise.
Ontem ele reagiu com sua mais clara ameaça de virar a mesa se não ganhar: “Não posso falar pelos comandantes. Pelo que vejo nas ruas, não aceito resultado diferente da minha eleição”, disse em entrevista ao programa de TV Brasil Urgente.
Mais uma vez ele se afirma como ameaça real à democracia.
Com a introdução inicial, “não posso falar pelos comandantes”, insinua que pode contar com apoio militar para insurgir-se contra um resultado adverso, denunciando a ocorrência de fraude.
Supostamente ele fala do segundo turno, pois sabe que não tem votos para ganhar no primeiro.
Ontem ele voltou a falar em fraude, a criticar a urna eletrônica e ainda levantou suspeitas contra os técnicos do TSE. Que diz a ministra Rosa Weber?
O que pode fazer um candidato que não aceita o resultado das urnas?
Uma coisa, como ele já insinuou, seria dar um golpe militar com apoio dos “comandantes”. Quando diz obsequiosamente que não pode falar por eles, sugere que a possibilidade de ser apoiado por eles existe.
Do contrário, nem os estaria mencionando.
Outra forma de “não aceitar” o resultado seria liderando uma insurgência civil, abrindo as portas da convulsão social. Bolsonaro nunca foi tão longe mas as instituições não reagem ameaças.
Os candidatos, sim, poderiam firmar um pacto sobre o essencial: Vão concorrer confiando no sistema.
Quem ganhar vai tomar posse, prometendo respeitar as regras do jogo.
É inacreditável que estejamos novamente discutindo a posse do eleito, como em 1955, diante das ameaças da UDN de não permitir a posse de JK se ele ganhasse. Onde foi que nos perdemos?
Os tucanos e o perigo É preciso reconhecer o papel do candidato tucano Geraldo Alckmin na denúncia do que Bolsonaro representa, não importa que buscando tomar-lhe o papel de anti-PT.
Boa parte dos tucanos, entretanto, prepara a adesão, no segundo turno, ao “candidato da bala”, como diz Alckmin.
“Os ataques ao Bolsonaro têm que parar”, cobrou anteontem o senador Cunha Lima (PSDB-PB).
Em Minas, o vice do candidato tucano ao governo (Anastasia), deputado Marcos Montes, avisou que se Alckmin ficar fora do segundo turno, “vamos ter que dar a mão a Bolsonaro”, para evitar a volta do PT.
Adocicando Bolsonaro, até o chanceler Nunes Ferreira declarou, em Nova York, que seu governo em nada comprometeria a política externa do Brasil.
Há alguns dias o ex-presidente FHC disse que seu partido não teria problema em apoiar o petista Haddad para evitar o perigo Bolsonaro.
Mudou de idéia. Na carta aberta da semana passada falou no “perigo dos extremos”, em inaceitável equiparação do PT a Bolsonaro.
O PT governou 13 anos sem ferir as regras do jogo. Se quisesse, Lula teria mudado a Constituição (como fez FHC) para disputar o terceiro mandato.
Com Dilma, o PT mal chiou e entregou o poder, submeteu-se ao impeachment que considerou golpe, por ter forçado o enquadramento dela num crime de responsabilidade de araque.
Lula, mito de verdade, não se deixou prender banalmente.
Não fugiu, não se asilou, mas montou seu ritual de resistência antes de entregar-se à Justiça. Está preso.
O PSDB, que ajudou a construir a democracia que temos, não pode ter dúvidas sobre quem ameaça sua sobrevivência.
Esta última declaração de Bolsonaro é tão eloquente quando a postagem de seu filho, de desenho representando um torturado encapuzado. Se confirmado o segundo turno Haddad-Bolsonaro, para ser contra o PT, para resgatar o eleitor antipetista que perdeu, o PDSB não tem que se atirar nos braços do perigo. Pode optar, como defende outra ala, mais próxima de Alckmin, pela neutralidade, evitando desonrar seu nome de batismo: social-democrata.