Contra repressão, protesto reúne milhares no Centro de São Paulo
Em assembleia que lotou o salão nobre da Faculdade de Direito na noite dequinta-feira (11), estudantes da Universidade de São Paulo (USP) decidiram manter a greve decretada no dia 8. Alunos dos mais diversos cursos das áreas de humanas, exatas e biológicas estiveram presentes. Estudantes que foram presos durante a reintegração de posse da reitoria também participaram da reunião.
Nenhum novo eixo de reivindicação foi acrescentado. Dessa forma, a greve estudantil se mantém exigindo o fim dos processos políticos administrativos contra estudantes e funcionários, pela saída do reitor João Grandino Rodas do cargo e da Polícia Militar do campus, pelo fim do convênio da Universidade com a Corporação, anistia aos presos políticos e por um plano de segurança alternativo para a Cidade Universitária.
A última vez que o salão nobre da Faculdade de Direito foi ocupado por estudantes aconteceu em agosto de 2007, quando o então diretor João Grandino Rodas, atual reitor da USP, concedeu o espaço para que estudantes votassem a destituição da gestão do Centro Acadêmico XI de Agosto.
A gestão havia apoiado uma ocupação política do espaço realizada por integrantes da Jornada Nacional em Defesa da Educação Pública, apoiada por movimentos sociais como a UNE (União Nacional dos Estudantes) e o MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra). No dia 22 de agosto, a tropa de choque foi chamada por Rodas para dissolver a ocupação e mais da metade dos 350 manifestantes acabou detida no 1º Distrito Policial.
Quatro anos depois, Rodas sofre um revés. “Fizemos uma boa demonstração de nossas forças para a reitoria. Foi espetacular saber que os estudantes se colocaram de maneira solidária. Para mim, isso foi uma demonstração de que o movimento estudantil da USP é capaz de grandes coisas”, afirma o estudante preso Alexandre Suka, do movimento Juventude Às Ruas.
Ato reúne mais de 5 mil
Durante a tarde, cerca de 5 mil pessoas (segundo o cálculo dos organizadores) participaram de um ato contra a repressão política e a Polícia Militar no centro de São Paulo. Elas se reuniram em frente à Faculdade de Direito e de lá saíram em passeata em direção ao Largo São Bento, passando pelo Anhangabaú, República e retornando ao Largo São Francisco. Na Avenida São João, os manifestantes se confraternizaram com ocupantes dos prédios ocupados por famílias sem-teto. Aos gritos de “Moradia, educação, não à repressão”, moradores e estudantes se saudavam.
Papéis picados também foram jogados pela população das janelas. Ao passar pelo Largo São Bento, os manifestantes se encontraram com uma turma de alunos da Escola João 23, que estava no local a passeio. Eles apoiaram a manifestação e gritaram as palavras de ordem do ato.
“A mobilização foi crescente desde o começo. Começou com [assembleia de] mais de mil estudantes no pátio da História contra a prisão de três estudantes. Avançamos para a ocupação [do prédio] da FFLCH (Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas), crescemos mais ainda com a ocupação da reitoria e o Rodas só fez dar o tapa final para estourar tudo isso que a gente está vendo agora”, afirmou Rafael Alves, um dos 73 presos políticos e alvo de processos administrativos movidos contra ele pela Universidade.
“Estou aqui porque sou totalmente contra a maneira como a polícia agiu no campus. Foi algo totalmente arbitrário e anacrônico. Acho que temos que fazer alguma coisa para mudar isso, a começar por eleições diretas para reitor”, diz Simone Dominique, estudante da Filosofia.
O militante do Psol, Plínio de Arruda Sampaio, e o jurista Jorge Luiz Souto Maior também falaram durante o ato, que foi apoiado por funcionários e professores da Universidade. Para o diretor do Sindicato dos Trabalhadores da USP (Sintusp), Magno de Carvalho, a luta dos estudantes é um passo para barrar a repressão política aos movimentos sociais no campus. “O Rodas reúne dois ataques, um é a militarização do campus, sob pretexto da segurança. A Polícia tem ido para cima de trabalhadores e estudantes com abordagens truculentas. O outro é a pressão em cima de movimentos, que é combinada com processos judiciais que visam a destruição de tudo que existe de organização política na Universidade”, conta.
Mídia convencional criminaliza movimento
Apesar do grande ato, com palavras de ordem e cartazes que expressavam as reivindicações políticas do movimento, ainda há desinformação da população sobre os motivos da luta dos uspianos. Durante a manifestação, muitos ainda associavam a saída da polícia à liberdade para o consumo de maconha no campus. “Estou tentando entender o protesto. Dá impressão de que eles são um bando de baderneiros, que o protesto é para usar maconha. Se é uma questão política, isso eu acho que os uspianos não estão dando conta de mostrar para a população”, avalia Márcia Feldeman, professora de língua portuguesa.
“A questão da legalização da maconha nunca foi a pauta central do movimento. Quando a gente começou discutir a PM no campus, foi sim por causa de um ato que envolvia a posse da maconha, mas não por causa da maconha em si e sim pelo fato da PM estar revirando as pessoas a torto e a direito. A PM revista professor, revista aluno negro só porque se encaixava num certo ‘perfil’. O que a mídia está passando não é o que a gente está falando”, explica Gabriela Vasconcelos, integrante da Anel (Assembleia Nacional de Estudantes - Livre) e aluna de Ciências Sociais.
Para o cientista social Flávio Mendes, a imprensa acaba contribuindo para que não haja entendimento de qual é a verdadeira reivindicação dos estudantes. “A grande mídia é formadora de opinião e ajuda a formar essa opinião reacionária de boa parte da população. Tem muitos interesses envolvidos, tem patrocinadores, audiência e uma preocupação de se manter em contato com o grande público”.
“A nossa discussão é que a Universidade deve ser um espaço de livre pensar, um espaço de livre manifestação, de contraposição de idéias que estão na sociedade e que a PM no campus só serve para revistar pessoas e reprimir o a política que fazemos contra o Rodas. Foi colocado que era uma questão de segurança, mas a Polícia não está fazendo isso”, afirma Gabriela.
*Brasil de Fato