A ideologia brasileira da mesquinharia
Juremir Machado no Correio do Povo
O mesquinho acha-se moderno, pragmático, altivo, crítico, autônomo e
visionário. Acredita que toda forma de proteção social, desde que não
seja a empresas, é uma forma de populismo, de paternalismo e de
assistencialismo.
A ideologia da mesquinharia usa sempre o mesmo argumento falacioso: não
se deve dar o peixe, deve-se ensinar a pescar. Não se deve dar
bolsa-família, deve-se dar empregos. Justamente os empregos que nunca
foram dados pelos partidos que apoiam. E não foram dados por não
existirem. E não existiram por incompetência na sua criação, por falta
de um modelo adequado ou por impossibilidade conjuntural ou estrutural
de serem gerados.
O mesquinho entende que, se os empregos não existem, os necessitados
devem ralar-se. Que fiquem passando fome até que seja possível criá-los.
Nessa lógica, o mesquinho promete o futuro, não se lembra do passado e
ignora o presente. Explora sofismas, meias verdades e mentiras inteiras
como formas de justificar a sua indiferença pelo sofrimento dos outros.
Espalha que o assistencialismo gera preguiça. Faz crer que a maioria das
pessoas vai preferir viver com R$ 70 sem trabalhar a viver com R$ 700
trabalhando.
Essa é uma das asneiras mais difundidas por espíritos malignos, gente
ruim, ideólogos da maldade, mas, principalmente, mentes toscas. Isso até
pode acontecer de maneira marginal, mas jamais, estatisticamente
falando, como tendência global. Viver bem, com trabalho, continua sendo
mais interessante para a maioria do que viver mal sem trabalho. Salvo
quando a alma do indivíduo alquebrado já está saturada e ninguém mais
pode lhe incutir esperança, o que ocorre quando o sistema atrofia o
gosto pela vida.
A ideologia da mesquinharia é dissimulada, ardilosa, cruel. Prefere
gastar em repressão a investir em ajuda social. Todo adepto da ideologia
da mesquinharia é um radical, um fundamentalista, um xiita, um
extremista, um fanático da ordem dos cemitérios, da asfixia social, do
parasitismo absoluto.
O mesquinho passa o dia repetindo chavões como se fossem pilares da
modernidade. Acredita, como uma anta, que toda crítica aos excessos do
capitalismo é uma defesa do comunismo.Vê em toda ressalva do modo de
vida americano, marcado pelo consumismo, uma adesão ao estilo de vida
cubano.
O mesquinho tem cérebro de ervilha. Mas não consegue enlatá-las para
vender. Gasta o seu tempo no ódio aos demais. É pouco rentável.
As asneiras dos mesquinhos incluem: acreditar que Lula, de fato, se
tornou milionário, ou bilionário, e que a revista Forbes publicou uma
capa com ele como um dos homens mais ricos do mundo; crer que destacar
os aspectos positivos das cotas, do bolsa-família, do ProUni e de outras
políticas assistenciais dos governos do PT, é ser petista; difundir a
ideia de que nunca houve tanta corrupção no Brasil, como se a corrupção
atual, enorme e condenável, não fosse a mesma de antes; acreditar que a
meritocracia realmente seleciona os melhores num sistema de desigualdade
na competição e não que serve de mecanismo de reprodução dessa
desigualdade.
Enfim, melhor não ser muito sofisticado na análise para não confundir as mentalidades mesquinhas mais lentas e pesadas.
Usina de ódio, de ressentimento e de rancor, o mesquinho odeia as ruas
engarrafadas por causa do acesso dos pobres aos automóveis; odeia os
aeroportos cheios por causa das viagens da classe C; odeia as
universidades “rebaixadas” pela entrada dos que deveriam fazer cursos
técnicos; odeia esses pobres que votam com o estômago; entende que só os
ricos podem votar com os bolsos; vê como a modernidade a permanência
dos pobres na pobreza, à espera dos empregos do futuro, e uma elite
desfrutando da climatização. São os mesmos que se venderam aos Estados
Unidos, em 1964, para evitar as reformas de base: reforma da educação,
agrária, bancária, tributária, etc.
O Brasil corria um sério risco: poderia ficar melhor para a maioria.
A ideologia da mesquinharia deu o golpe para salvar-nos da melhoria.
Atrasou o país em mais de 20 anos.
Continua a cantar o refrão: o perigo comunista.
São fantasmas de opereta.
Falta construir um capitalismo muito melhor.
Uma verdadeira social-democracia.
Para isso, será preciso ensinar geografia aos mesquinhos.
Falar-lhe dos países escandinavos, etc.
O mesquinho adora Estado mínimo em economia e Estado máximo em moral.
Gostar de meter-se na vida alheia para domesticá-la como seu moralismo.
Todo mesquinho é um moralista de ceroula.
*Turquinho