O significado de "austeridade"
por James Corbett
http://iconoclasistas.com.ar
É um velho truque exprimir uma realidade penosa como uma platitude floreada. Ouvimos isto o tempo todo nas nossas vidas diárias e a maior parte das vezes sabemos como ler nas entrelinhas quando alguém tenta fazer isto connosco.
Quando o médico lhe diz que "Isto só vai doer um pouco", você sabe bem que será um procedimento penoso. Quando o seu patrão lhe diz que tem um novo projecto excitante para si, você sabe que está prestes a ficar atado à tarefa que mais ninguém quis fazer. Quando um vendedor lhe conta que um carro usado precisa algumas reparações, você sabe que está na frente de um chaço.
Analogamente, quando o FMI diz a um país que tem de implementar "austeridade" a fim de se livrar de uma crise financeira , também aqui há um fosso abissal entre a linguagem e a realidade.
"Austeridade" é daqueles termos orwellianos que foram injectados no nosso discurso político precisamente porque é uma palavra que soa bonito para uma realidade muito penosa. "Austeridade" implica disciplina, auto-controle, mesmo nobreza. A "austeridade" é prudente. A "austeridade" é modesta. A "austeridade" é uma virtude. Ela é um fim em si mesmo.
Se o FMI ou o Banco Central Europeu se dirigirem ao povo de um país europeu em colapso e lhes disserem para sacrificar as suas pensões, as suas poupanças e o seu próprio padrão de vida por uma dívida que o seu governo fraudulentamente acumulou em seu nome, ninguém deveria acreditar nisso – e com muita razão.
Mas conte a este mesmo povo que ele precisa por em prática "medidas de austeridade" a fim de economicamente "voltar a ficar de pé" e muito aceitarão viver nas mais duras condições, satisfeitos em suportar o desmantelamento do seu próprio país na vã esperança de que ao dar mais poder às instituições financeiras internacionais possam de algum modo evitar o colapso económico.
O truque, naturalmente, é que a realidade é completamente oposta. Como o médico ao dar suas falsas garantias de que isto só doerá um pouco, a amputação económica que os banqueiros têm no armazém para os outrora orgulhosos países do mundo industrializado será excruciante.
Simplesmente pergunte a qualquer um no terceiro mundo. Eles deveriam saber. Têm estado a atravessar estes planos de "austeridade" durante décadas.
Pergunto ao povo da Etiópia se a "terapia económica" do FMI/Banco Mundial da década de 1980 funcionou em favor do seu país. Pergunte-lhes acerca da liquidação de activos do estado, de empresas públicas, de unidades agrícolas e fábricas vendidas por centavos de dólar a corporações multinacionais. Pergunte-lhe como a USAID ajudou a despejar excedentes de colheitas geneticamente modificadas que não podiam ser vendidas na Europa sobre países africanos pobres como ajuda alimentar caridosa.
A extensão dos horrores infligidos à Etiópia pelos financeiros internacionais quase ultrapassa a descrição.
Os banksters não ficaram contentes em retalhar o país em bocados e vender as partes aos seus cúmplices do big business. Eles então tiveram a audácia de roubar a própria comida das mesas dos agricultores pobres e substituí-la por alimentos frankenstein geneticamente modificados que o resto do mundo nem mesmo tocaria.
Esta é a face real da "austeridade". É nada menos do que escravização económica a um grupo de elite de banksters que criaram a sua própria riqueza por decreto a partir do nada.
Nem a Etiópia é o único exemplo deste procedimento. Exactamente ao contrário. Um processo semelhante foi efectuado em quase todo país em que os oligarcas das finanças internacionais tentaram "por direito" com os seus procedimentos que "só doerão um pouco".
No Brasil , as reformas do FMI realmente alteraram a natureza da constituição brasileira, travando transferências de fundos federais para governos estaduais de modo a que estes fundos pudessem ser utilizados para pagar aos banqueiros o que exigiam.
O programa de ajustamento estrutural no Peru devastou a economia agrícola local e tornou ilegal a produção de coca, o único meio viável para muitos agricultores ganharem a vida. Desde o primeiro pacote de "reforma económica" patrocinado pelo FMI em 1978 ao segundo round da reforma do FMI no princípio da década de 1990, a produção de coca aumentou mais de 400%.
Um empréstimo de 4,8 mil milhões de dólares do FMI à Rússia no fim da década de 1990 nunca sequer chegou a entrar nos cofres russos, com milhares de milhões sendo depositados directamente em contas bancárias offshore ligadas a gangsters, políticos e banksters. Apesar do facto de o povo russo não ter visto um único rublo deste dinheiro sifonado, ainda assim ficou responsável por pagá-lo de volta aos banqueiros internacionais que foram gentis em emprestá-lo, a juros.
Vezes sem conta, país após país, em todo canto do globo, os empréstimos do FMI resultam em desastre para o povo que tem de aguentar as consequências.
O ponto crucial de toda a questão é que nada disto é inesperado. De facto, faz parte da concepção dos próprios programas de austeridade do FMI.
Como foi revelado por Joseph Stiglitz, o antigo economista chefe do Banco Mundial, o modus operandi do FMI é efectuar ataques económicos a países devedores, desmantelando e liquidando infraestrutura em benefício de corporações estrangeiras e assegurando que todo dinheiro público seja utilizado para pagar os banqueiros.
Ele tem mesmo um nome para o que acontece após o plano de "austeridade" inevitavelmente resultar na dissolução de uma sociedade: os tumultos FMI .
Os bolivianos fizeram tumultos por causa dos preços da água, os indonésios por causa dos subsídios a alimentos e combustível, os equatorianos por causa dos preços do gás de cozinha, os argentinos por causa do total colapso de um país que outrora fora rico. O denominador comum em todos os casos foram "medidas de austeridade" e o FMI.
Agora, os princípios de tumultos FMI estão a tomar forma na Europa. O povo está a tomar as ruas para protestar contra as medidas que estão prestes a serem tomadas a fim de reembolsa aos banqueiros o que governos corruptos roubaram do povo. Do outro lado posta-se a polícia, cada vez mais militarizada e de prontidão ao serviço dos banksters e de políticos. As linhas de batalha estão a formar-se.
Mas haverá uma outra saída?
Poderão os povos da Europa aprender com os exemplos da Islândia? Aquele minúsculo país insular no Atlântico Norte também se encontrou a enfrentar a bancarrota completa quando a bolha alimentada por derivativos do sector financeiro islandês explodiu na sequência do Lehman Bros. O povo era mais uma vez deixado para aguentar as consequências dos milhares de milhões de dólares em dívidas para com bancos estrangeiros e as ruas tranquilas da sonolenta Reykjavik explodiam em violência.
Mas na Islândia, o povo não combateu o governo. Ele tornou-se o governo. Um movimento popular forçou o colapso antecipado do governo da Islândia e políticos foram varridos do poder .Eles efectuaram um referendo no qual o povo esmagadoramente rejeitou a ideia de que iriam pagar milhares de milhões de dólares a banksters estrangeiros por uma dívida que não era sua. Ela era fraudulenta. Eles não a pagarão.
Está para ser visto se os países do G20 serão capazes de seguir o exemplo islandês quando o apodrecimento começar a corroer as economias dos países industrializados "ricos". O primeiro teste quanto a isto pode acontecer no princípio desta semana na cimeira G8/G20 em Toronto, onde fantoches políticos do governo canadiano endividaram o povo do país nuns estarrecedores mil milhões de dólares para pagar por uma polícia de estado totalitário que inevitavelmente provocará tal insensibilidade, reacções violentas.
Estamos numa encruzilhada, onde o povo pode levantar-se em massa contra os oligarcas financeiros que estão a manipular esta queda e livrar-se dos fantoches políticos em fileira cerrada com os abutres da Wall Street não importa quem se sente na Casa Branca... ou, não entendendo o que está a acontecer ou quem realmente está por trás disto, o povo pode ser levado a actos de violência sem sentido contra polícias vestidos de negro em batalhas que não tratarão da raiz do problema mas levarão à dor e ao sofrimento.
O primeiro passo é promover o entendimento de que a "austeridade" oferecida pelos banksters não é solução para os nossos problemas, mas o princípio deles. Então saberemos o que significa o FMI contar-nos que "isto só doerá um pouco".
do Crônicas e Críticas da AmericaLatina
A França em greve geral
Juremir Machado da Silva no
correio do povo Estou chegando de Paris.
A França está em greve geral hoje.
Nada de anormal.
Francês faz greve mesmo. Até na Copa do Mundo.
Mais de dois milhões de pessoas pararam contra o projeto do governo de mudança nas leis de aposentadoria.
O governo quer passar a idade mínima de 60 para 62 anos.
O tempo de contribuição passaria de 37 para 39 anos.
Sentei num bar com quatro sociólogos franceses.
Revisei meus conhecimentos da legislação francesa.
Confirmei tudo o que sabia.
Um francês oficialmente carente pode receber o RMI (o bolsa-família deles) durante a vida inteira.
O valor anda em torno dos 250 euros.
O francês carente vive mal, muito mal, mas tem cobertura de saúde universal, não paga eletricidade e recebe ajuda moradia. E outras mais. Sobrevive. Mas um francês não quer apenas sobreviver.
Os demais franceses têm educação gratuita em todos os níveis para os filhos.
O Estado dá ajudas para quem tem mais de um filho.
Dá até mesmo um cheque férias para ajudar os mais necessitados a sair de casa.
A partir do francês médio, todo mundo tem uma assistência saúde completar, que reembolsa todos os gastos, inclusive os medicamentos.
Aqui é que começa a confusão.
Nem todos os medicamentos existentes podem ser reeembolsados.
Mas todos aqueles que são prescritos pelos médicos são reembolsáveis.
Em outras palavras, saúde e educação por conta do Estado com uma participação dos trabalhadores.
A coisa já foi melhor.
Alguns direitos se perderam.
Para os franceses, o Estado é condomínio formado por todos os cidadãos. Todas as despesas devem ser compartilhadas para que o edifício funcione.
Quem ganha mais, paga mais.
Quem nada ganha, é coberto pelos outros.
Quem perder o emprego depois de 12 meses, recebe um salário-desemprego por, segundo as situações, até 18 meses, em torno de 75% do salário recebido no emprego.
Mesmo quando a direita está no poder, a França é de esquerda, republicana, social-democrata.
É por isso que eu gosto de lá.
E por isso que Luiz Inácio faz sucesso por lá.
O nosso bolsa-família é uma mera e boa cópia do que é praticado em todos os países civilizados da Europa.
Quem critica, o faz por conservadorismo radical ou por má fé.
Desemprego mundial alcança recorde histórico
Informe da Organização das Nações Unidas (ONU) afirma que há 211 milhões de desempregados hoje no mundo, o maior índice registrado na história. Segundo a ONU, será preciso criar globalmente 470 milhões de novos postos de trabalho nos próximos 10 anos só para manter o nível do crescimento. “As condições do mercado de trabalho seguiram se deteriorando em muitos países e é provável que afetem negativamente a grande parte do progresso obtido durante a década passada na meta de conseguir trabalhos decentes", diz ainda o informe. O artigo é do La Jornada.
O número de desempregados no mundo alcançou um nível histórico, chegando a 211 milhões, enquanto a geração de postos de trabalho estancou há mais de uma década, revelou um informe da Organização das Nações Unidas (ONU). "Hoje, o desemprego no mundo é o maior registrado na história”, expressou nesta quarta o secretário-geral da ONU, Ban Ki-Moon, na apresentação do informe sobre os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio 2010.
“Existem 211 milhões de pessoas sem trabalho e é necessário criar globalmente 470 milhões de novos postos de trabalho nos próximos 10 anos só para manter o passo do crescimento”, acrescentou.
Os objetivos das Metas do Milênio são oito parâmetros de desenvolvimento social que devem ser melhorados de maneira substancial, dos níveis de 1990 a 2015 e cujos progressos serão revisados numa reunião que ocorrerá em setembro próximo na ONU.
O informe comparou que no mundo em desenvolvimento existiam 63 empregos para cada 100 pessoas em 1998, enquanto que, em 2008, se reduziu a 62 e se manteve esse nível durante 2009.
“As condições do mercado de trabalho seguiram se deteriorando em muitos países e é provável que afetem negativamente a grande parte do progresso obtido durante a década passada na meta de conseguir trabalhos decentes”, indicou.
No informe se explicou que a deterioração da economia provocou “uma forte queda na relação emprego/população” e que a produtividade laboral declinou em 2009 em relação ao ano anterior.
Na América Latina a relação entre emprego e população era de 58% em 1998; avançou apenas a 61% em 2008 e voltou a cair a 60% em 2009.
A ONU observou que o emprego vulnerável voltou a subir no último ano, depois de ter registrado um declive na década mais recente. Em 2009, era de 60%, enquanto que um ano anos era de 59% no mundo em desenvolvimento.
Na América Latina o percentual de pessoas auto-empregadas ou que administra negócios familiares aumentou de 31 a 32% entre 2008 e 2009, depois de registrar 35% em 1998. Mesmo assim aumentou na região o que a ONU chama de “trabalhadores pobres”, aqueles que têm um emprego, mas ganham menos de 1,25 dólares por dia. O índice subiu a 8% em 2009, depois de registrar 13% em 1998.
“A tendência positiva de redução do emprego vulnerável foi interrompida pela deterioração das condições do mercado de trabalho causada pela crise financeira”, assentou o informe. No entanto, a ONU destacou alguns avanços na América Latina, como o percentual da população que vive em “situação de miséria”, que foi reduzido de 34% em 1990 para 24% em 2010.
No informe sobressaíram as reduções das taxas de mortalidade materno-infantil e os avanços na igualdade de gênero feitos na América Latina.
Em geral o informe ressaltou que se tem registrado notáveis avanços na redução da pobreza no mundo, embora estes se devam aos progressos realizados na China e na Índia, em especial.
O número de pessoas que subsiste com menos de 1,25 dólares por dia diminuiu de 46% em 1990 a 27% em 2005, e se espera que se reduzam a 15% para o ano de 2015.
Tradução: Katarina Peixoto