Tenho três ícones no Jornalismo: Cláudio Abramo (o homem que revolucionou estilo e conteúdo dos dois maiores jornalões nacionais), Mino Carta (diretor de Redação da Carta Capital e criador de algumas das melhores revistas brasileiras) e Ricardo Kotscho (o mais brasileiro dos grandes repórteres do País).
Do primeiro, guardo a lição de que a “ética dos jornalistas” é uma falácia; a ética, afinal, é uma só para todos os profissionais. Do segundo, a recomendação de que todo jornalista alie um aguçado espírito crítico a uma fidelidade espartana aos fatos. Do terceiro, o ensinamento de que “lugar de repórter é na rua” – e não nas refrigeradas Redações dos veículos de imprensa.
Por absoluta ignorância, por abjeta canalhice ou pela somatória destes defeitos, um assustador contingente de jornalistas nativos parece desconhecer os ensinamentos acima. Prefere agir como estelionatários da realidade, espetacularizando a notícia, manipulando informações e pessoas em troca de audiência, fama e, claro, dinheiro.
Faço esta introdução a propósito de dois fatos ocorridos na semana passada: a entrevista do deputado federal Jair Bolsonaro (PP/RJ) ao programa CQC, da TV Bandeirantes, na qual o parlamentar radicalizou na defesa das suas conhecidas posições medievais contra os negros e os homossexuais; e a veiculação da revista Caras, que estampou manchete com as pesadas acusações da falecida atriz Cibele Dosa contra seu ex-marido, Doda Miranda.
Já se falou praticamente tudo sobre estes dois exemplos de péssimo Jornalismo, que simbolizam o problema crônico de boa parte da grande mídia nacional: sua miopia em relação ao significado da expressão “liberdade de imprensa”, esta peça de ficção invocada sempre que setores da mídia brasileira sentem a necessidade de se safar da irresponsabilidade, superficialidade e sensacionalismo que muitas vezes imprimem ao seu trabalho.
O que trago de novo ao debate sobre o tema é um desafio: exatamente devido a exemplos como estes, intensificarmos a discussão conduzida pelo Congresso Nacional, pelo movimento popular e pela Fenaj (Federação Nacional dos Jornalistas) sobre o modelo de Comunicação que os grandes veículos de imprensa exercem.
O momento não poderia ser mais oportuno, inclusive por conta da criação da Frente Parlamentar pela Liberdade de Expressão e o Direito à Comunicação com Participação Popular, que objetiva discutir a democratização da comunicação e o novo marco regulatório da mídia.
Não podemos mais admitir que a sociedade continue sendo bombardeada pelo macartismo reeditado pelos arautos dos grandes veículos de imprensa, que, além de todas as mazelas apontadas acima, vetam a exigência da formação universitária para o exercício do Jornalismo, repudiam a criação do Conselho Federal de Jornalistas e ainda precarizam as condições de trabalho até o limite de tolerância dos jornalistas. Pobres profissionais de imprensa, que não têm grandes motivos para comemorar, nesta quinta-feira (7), o Dia do Jornalista.
Esta tigrada – barões da grande mídia e seus áulicos – está matando a imprensa de verdade e substituindo-a por uma aberração capitalista chamada de “Jornalismo Industrial” – mera linha de produção de notícias descartáveis, servíveis apenas aos seus mesquinhos interesses. Despreza o fato de que Jornalismo de verdade só é aquele que tem compromisso com o efetivo interesse da maioria e que, escorado na verdade, exerce sua função social visando o bem comum. O resto é conversa fiada.
* Aurélio Munhoz é jornalista, sociólogo, consultor em Comunicação e presidente da oscip Pense Bicho. Pós-graduado em Sociologia Política e em Gestão da Comunicação, foi repórter, editor e colunista na imprensa do Paraná.
*observadoressociais