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Ser de esquerda é não aceitar as injustiças, sejam elas quais forem, como um fato natural. É não calar diante da violação dos Direitos Humanos, em qualquer país e em qualquer momento. É questionar determinadas leis – porque a Justiça, muitas vezes, não anda de mãos dadas com o Direito; e entre um e outro, o homem de esquerda escolhe a justiça.
É ser guiado por uma permanente capacidade de se estarrecer e, com ela e por causa dela, não se acomodar, não se vender, não se deixar manipular ou seduzir pelo poder. É escolher o caminho mais justo, mesmo que seja cansativo demais, arriscado demais, distante demais. O homem de esquerda acredita que a vida pode e deve ser melhor e é isso, no fundo, que o move. Porque o homem de esquerda sabe que não é culpa do destino ou da vontade divina que um bilhão de pessoas, segundo dados da ONU, passe fome no mundo.
É caminhar junto aos marginalizados; é repartir aquilo que se tem e até mesmo aquilo que falta, sem sacrifício e sem estardalhaço. À direita, cabe a tarefa de dar o que sobra, em forma de esmola e de assistencialismo, com barulho e holofotes. Ser de esquerda é reconhecer no outro sua própria humanidade, principalmente quando o outro for completamente diferente. Os homens e mulheres de esquerda sabem que o destino de uma pessoa não deveria ser determinado por causa da raça, do gênero ou da religião.
Ser de esquerda é não se deixar seduzir pelo consumismo; é entender, como ensinou Milton Santos, que a felicidade está ancorada nos bens infinitos. É mergulhar, com alegria e inteireza, na luta por um mundo melhor e neste mergulho não se deixar contaminar pela arrogância, pelo rancor ou pela vaidade. É manter a coerência entre a palavra e a ação. É alimentar as dúvidas, para não cair no poço escuro das respostas fáceis, das certezas cômodas e caducas. Porém, o homem de esquerda não faz da dúvida o álibi para a indiferença. Ele nunca é indiferente. Ser de esquerda é saber que este “mundo melhor e possível” não se fará de punhos cerrados nem com gritos de guerra, mas será construído no dia-a-dia, nas pequenas e grandes obras e que, muitas vezes, é preciso comprar batalhas longas e desgastantes. Ser de esquerda é, na batalha, não usar os métodos do inimigo.
Fernando Evangelista

terça-feira, outubro 11, 2011

A peça começa

Tudo bem, mas não há boas noticias?

Há: na Europa não há um plano. Que dizer, há algo, tanto para manter as pessoas calmas, uns 780 biliões de Euros. É como entrar na gaiola dos leões com uma bolacha: "Fiquem calmos, há um pedaço por cada um".

E esta seria a boa notícia?
Eu acho que sim. Quando uma pessoa tem dor de dentes, a coisa melhor é ir ao dentista: dói, mas depois passa. Ficar aí, sempre com queixas, pelo contrário, não resolve.

Doutro lado, é evidente que nunca houve a intenção de resolver as coisas, bem pelo contrário: 3 anos passaram desde Setembro de 2008, o começo da crise. Havia tempo para regras, havia tempo para emendar. Se nada foi feito, é porque a ideia era outra.

Resumindo: tudo está pronto. O que acontecerá?

Vamos ver: falência grega, colapso dos bancos europeus, mercados do crédito congelados, pânico no mercado da dívida, fuga de dinheiro da Europa com destino Estados Unidos mas ainda mais novas áreas em desenvolvimento.
Crise das Bolsas, venda massiva de acções, de bens e até de metais preciosos.

Isso no começo. Porque depois da Europa será a vez do Estados Unidos. E depois, ao longo de meses ou de anos, destruição das instituições financeiras, das moedas, instabilidade política.

Mais um pouco de guerra, que dá sempre jeito nestes casos.

É isso? Provavelmente sim.
Mas nada de pânico: lembrem que é apenas uma demolição controlada.
Ou melhor: uma peça.

(Pssssst! Há outros desfechos possíveis? Claro que há, ora essa. É que hoje este parece o mais provável, só isso).


Ipse dixit.

Fontes: CNBC, SHTFplan, Los Angeles Times, Project Syndicate, Washington's blog 
*InformaçãoIncorreta
Wanessa Camargo abre processo contra Rafinha Bastos, diz jornal

Wanessa Camargo processa Rafinha Bastos. Foto: Amauri Nehn/AgNews
Wanessa Camargo processa Rafinha Bastos
Foto: Amauri Nehn/AgNews
De acordo com a coluna Zapping, do jornal Agora São Paulo, a cantora Wanessa Camargo e seu marido, o empresário Marcus Buaiz, estão processando o humorista Rafinha Bastos.
O motivo é a postura do rapaz, que no dia 19 de setembro disse no CQC que comeria a cantora e o bebê que ela espera. Wanessa está grávida de 7 meses.
*Terra

Cláudia Costin repudia novela da Globo que estimula não estudar. Vão criticá-la igual a Iriny?

TV Globo escolhe música em novela cuja letra desestimula jovens a estudar.
Cláudia Costin é Secretária municipal de Educação da prefeitura do Rio de Janeiro (gestão peemedebista do prefeito Eduardo Paes), e manifestou protestos contra a falta de responsabilidade social da TV Globo.

A novela Fina Estampa escolheu uma música para cena de baile funk cuja letra estimula jovens a não estudar.

A personagem Solange (Carol Macedo) rebola no baile funk e canta a música "Dez no popozão", cuja letra é esta:
... Eu odeio redação / mas requebro até o chão / Não sou boa no estudo / levo zero em quase tudo / Reprovada no provão / tirei dez no popozão / Meu diploma é de funkeira / vem comigo meu irmão / Põe a mão no popozão / e requebra até o chão. 

Como se não bastasse a letra desestimulando o estudo, a "obra prima" de Agnaldo Silva exibiu a personagem em uniforme oficial das escolas da Prefeitura do Rio, na primeira vez em que apareceu cantando a música. E sem autorização da prefeitura.

Costin criticou:
“No momento em que toda a sociedade realiza um esforço conjunto para melhorar a educação pública no Rio e em todo o país, a Secretaria Municipal de Educação considera lamentáveis as imagens exibidas em Fina Estampa em que Solange enfatiza, em seus diálogos, o descompromisso com a educação e preconiza o fracasso escolar. As imagens acabam estigmatizando a educação pública, uma vez que a personagem, em uma das cenas, utilizou, sem autorização, o uniforme oficial das escolas da Prefeitura do Rio”.
Cláudia Costin ocupou diversos cargos em administrações e ONG's tucanas. Foi até ministra da Administração no governo FHC, e secretária estadual de cultura no governo Alckmin (2003-2005).

E agora? O Agninaldo Silva, o Reinaldo Azevedo, o Ricardo José Delgado (Noblat), o Augusto Nunes, a loira-burra da revista Época vão dizer o mesmo que disseram da ministra Iriny Lopes?

Vão fazer piadas, ridicularizando-a? Vão dizer que a Cláudia Costin está censurando? Interferindo na "obra prima" do autor? Na "liberdade de expressão"?

Vão dizer que Costin está com inveja do popozão da atriz global, como falaram da ministra?

O cartunista Chico Caruso fará charges com Cláudia Costin de mini-short dançando o funk "Dez no popozão"?

(Com informações do Jornal Extra)
*osamigosdopresidentelula

Assim é a hipocrisia da mídia

O moralismo das empresas de mídia, sempre se considerando acima do bem e do mal, às vezes é flagrado com a bunda de fora.
Veículo da RPC-TV - afiliada da Rede Globo no Paraná - é fotografado estacionado em uma vaga especial, veja o vídeo:
*comtextolivre

Evangélico afirma ter sido violentado por pastor da Quadrangular de Maceió

O pastor Luiz, o acusado, ainda
não deu à imprensa a sua versão
Anderson da Luz Rocha, 42, está movendo um processo na Justiça contra o pastor João Luiz (foto) sob a acusação de ter sofrido abuso sexual dele em sua mocidade, de 1984 a 1990, em Paranaguá, ali bem perto de Antonina (PR), terra de "Ornitorrincos".
Luiz é da Igreja do Evangelho Quadrangular em Alagoas e vereador em Maceió pelo DEM. Rocha é também pastor, só que da Igreja Betesda. Ele disse que relatou o abuso à polícia em agosto de 2007. O caso tramita em segredo de Justiça.
Rocha contou que quando tinha 16 anos procurou Luiz para dizer que gostaria de ser pastor. “Ele disse que eu poderia ficar na igreja durante as manhãs, e eu aceitei.”
Falou que Luiz o tratava muito bem. “Me dava roupa e comida, e eu achei que isso era porque ele era um homem de Deus.”
O assédio acabou se transformando em um relacionamento homoafetivo. Em troca, Rocha ganhava “roupas e perfumes caros”.
Em 1988, Luiz convidou Rocha para morar em Maceió. “Ele disse que acabaria comigo se eu não aceitasse.”
“O Luiz me obrigava a ter relações sexuais com ele. Mas chegou a um ponto em que eu não aguentava mais e falei que iria embora”, afirmou. “Fiz um escândalo e disse que, se ele não me deixasse ir, eu contaria para a mulher dele”.
Rocha voltou para o Paraná em 1990.
Ele afirmou que não foi à polícia antes porque se sentia intimidado. “Eu era um jovem pobre, filho de empregada doméstica negra e ele era um pastor conhecido.”
Ainda agora, disse Rocha, ter de levar o caso judicial adiante é penoso. “Tive de contar para minha esposa e a família dela.” Falou estar sofrendo pressão dos advogados do pastor.
Os jornalistas procuraram Luiz para que desse a sua versão, mas não foi localizado.
*comtextolivre

Polarização financeira e corrupção: A política do engano de Obama

Via Resistir.info
Michael Hudson
Duplicidade. As sementes da conferência de imprensa demagógica do presidente Obama na quinta-feira foram plantadas no último Verão quando ele designou os 13 membros de extrema-direita do Comité encarregado de resolver o óbvio e inevitável impasse do orçamento no Congresso forjando uma política anti-trabalho que corta a Segurança Social, o Medicare e a Medicaid, além de utilizar as poupanças para salvar bancos de ainda mais empréstimos que se tornarão ruinosos em resultado do programa de austeridade estilo FMI que democratas e republicanos concordaram em apoiar.
O problema enfrentado pelo sr. Obama é bastante óbvio: Como pode ele manter o apoio de moderados e independentes (ou, como os chama a Fox News, socialistas e anti-capitalistas), estudantes, trabalhadores, minorias e outros que fizeram forte campanha por ele em 2008? Ele enganou-os duplamente – suavemente, com um sorriso gentil e contemporizando com um conversa balbuciante, mas com uma determinação de ferro de manipular a política monetária federal e fiscal em favor dos seus maiores contribuidores da campanha eleitoral: a Wall Street e interesses especiais variados – o núcleo de operadores da Rubinomics e Clintonomics do Partido Democrata, mais suaves vestígios da administração Bush tal como Tim Geithner, sem mencionar quase-factotums de Cheney no Ministério da Justiça.
A solução do presidente Obama foi fazer o que faz qualquer político demagogo: Vir a público com discursos de campanha estridentemente populistas que não têm possibilidade de se tornarem a lei do Estado, enquanto silenciosamente dar aos seus contribuidores de campanha aquilo pelo que pagaram: dádivas para a Wall Street, cortes fiscais para a riqueza (eufemisticamente chamadas "isenções" fiscais e contabilidade por referência (mark-to-model accounting), mais um acordo em contar o seu rendimento como "ganhos de capital" tributado a uma taxa muito mais baixa).
Assim, aqui está o trato que a liderança democrata fez com os republicanos. Os republicanos lançarão alguém da sua gama actual de perdedores garantidos, permitindo ao sr. Obama concorrer como a "voz da razão", como se de alguma forma representasse a América Média. Isto abrirá caminho na eleição de 2012 para um segundo mandato se ele adoptar o seu programa – um conjunto de regras pagas pelos principais contribuidores de campanha a ambos os partidos.
As políticas do presidente Obama não têm sido a voz da razão. Elas estão mesmo mais à direita do que George W. Bush podia ter conseguido. Um presidente republicano teria pelo menos enfrentado um Congresso democrata que bloquearia a espécie de programa que o sr. Obama impôs. Mas os democratas parecem paralisados quando se trata de resistir a um presidente que concorre como um democrata ao invés dos Tea Partier de que ele parece estar tão próximo na sua ideologia.
Assim, eis o que o Comité dos 13 porá em jogo. Dado (1) o acordo de que se os republicanos e democratas NÃO concordarem com o estratagema da "criação de emprego" morto antes de chegar ao hospital; e (2) a declaração do líder republicano da Câmara, Boehner, de que o seu partido rejeitará a retórica populista que o presidente Obama está a apregoar nestes dias, então (3) o Comité conseguirá a sua oportunidade para por em acção o seu machado e cortar despesas sociais federais em coerência com a ideologia que professa.
O presidente Obama assinalou isso com muita antecipação, no princípio da sua administração quando nomeou a sua Comissão para a Redução do Défice chefiada pelo antigo republicano senador Simpson e Bowles, conselheiro da administração Clinton, destinada a recomendar como cortar a despesa social federal, enquanto dava ainda mais dinheiro à Wall Street. Ele confirmou suspeitas de uma traição ao renomear o lobbyista da banca Tim Geithner para o Tesouro, e Ben Bernanke, com visão afunilada em túnel, como chefe do Federal Reserve Board.
Mas na quarta-feira, 4 de Outubro, o presidente tentou representar o movimento OccupyWallStreet como apoiante dos seus esforços. Ele pretendeu aprovar um regulador pró consumidor a fim de limitar a fraude bancária, como se não fosse ele que tivesse rejeitado Elizabeth Warren a conselho do sr. Geithner – o qual parece estar assente como o homem do saco de dinheiro junto aos contribuidores de campanha da Wall Street.
Pode o presidente Obama escapar desta? Pode ele saltar para a frente da procissão e apresentar-se como um amigo do trabalho e dos consumidores enquanto os seus nomeados apoiam a Wall Street e o seu Comité de 13 a aguardar nos ares à espera de executar a sua função designada de guilhotinar a Segurança Social?
Quanto visitei o sítio OccupyWallStreet , na quarta-feira, ficou claro que o desgosto com o sistema político foi a tal profundidade que não há qualquer conjunto simples de exigências que possa consertar um sistema tão fundamentalmente avariado e disfuncional. Ninguém pode remendar um regime que está a empobrecer a economia, a acelerar arrestos, a empurrar orçamentos de estados e cidades para ainda mais défices e a forçar cortes em despesas sociais.
A situação é muito semelhante à da Islândia e da Grécia. Governos já não representam o povo. Eles representam interesses financeiros predatórios que estão a empobrecer a economia. Isto não é democracia. É oligarquia financeira. E oligarquias não dão voz às suas vítimas.
Assim, a grande questão é: para onde vamos nós a partir daqui? Não há caminho viável dentro do modo como a economia e o sistema político estão estruturados actualmente. Qualquer tentativa de proposta de um plano claro de "conserto" pode apenas sugerir ataduras para o que aparenta ser uma ferida político-económica fatal.
Os democratas estão tão infectados pela doença quanto os republicanos. Outros países enfrentam um problema semelhante. O regime social-democrata na Islândia está a actuar como o partido dos banqueiros e a taxa de aprovação do seu governo caiu 12 por cento. Mas eles recusam-se a demitir-se. Assim, no princípio da semana passada, eleitores trouxeram tambores de aço para a sua própria Ocupação em frente ao Althing [parlamento] e rufaram quando o primeiro-ministro começou a falar, para abafar a sua advocacia dos banqueiros (e dos banqueiros abutres estrangeiros, além disso!).
Tal como na Grécia, os manifestantes estão a mostrar aos bancos estrangeiros que qualquer acordo que o Banco Central Europeu faça para salvar detentores franceses e alemães de títulos à custa de aumentos de impostos sobre o trabalho grego (mas não sobre a propriedade e riqueza grega) não pode ser visto como democraticamente aprovado. Portanto, quaisquer dívidas que sejam reclamadas, e quaisquer imóveis ou empresas públicas dadas aos poderes credores para liquidação sob condições de agonia podem ser revertidas uma vez que aos eleitores seja permite exprimir democraticamente se querem impor uma década de pobreza ao país e forçar a emigração.
Este é o espírito de desobediência civil que está a crescer neste país. É uma quadratura – ou seja, um problema sem solução. Tudo o que se pode fazer sob tais condições é descrever a doença e os seus sintomas. A cura seguir-se-á logicamente do diagnóstico. O papel de OccupyWallStreet é diagnosticar a polarização financeira e a corrupção do processo político que se estende até ao Supremo Tribunal, à Presidência e ao Comité dos 13 que dentro em breve, quando se esfumarem as suas actuais alegres pretensões, será tristemente notório.
07/Outubro/2011
Ver a respeito:



  • segunda-feira, outubro 10, 2011

    Zizek na ocupação de Wall Street

    O filósofo e escritor esloveno Slavoj Zizek visitou o acampamento do movimento "Ocupar Wall Street," no parque Zuccotti, em Nova York. “Estamos testemunhando como o sistema está a se autodestruir”, disse, num discurso que o portal Esquerda.Net traduziu o Aldeia Gaulesa publicou e reproduzimos abaixo:
    Durante o crash financeiro de 2008, foi destruída mais propriedade privada, ganha com dificuldades, do que se todos nós aqui estivéssemos a destruí-la dia e noite durante semanas. Dizem que somos sonhadores, mas os verdadeiros sonhadores são aqueles que pensam que as coisas podem continuar indefinidamente da mesma forma.
    Não somos sonhadores. Somos o despertar de um sonho que está transformando-se num pesadelo. Não estamos a destruir coisa alguma. Estamos apenas a testemunhar como o sistema está a autodestruir-se.
    Todos conhecemos a cena clássica do desenho animado: o coiote chega à beira do precipício, e continua a andar, ignorando o fato de que não há nada por baixo dele. Somente quando olha para baixo e toma consciência de que não há nada, cai. É isto o que estamos a fazer aqui.
    Estamos a dizer aos homens de Wall Street: “hei, olhem para baixo!”
    Em Abril de 2011, o governo chinês proibiu, na TV, nos filmes e em romances, todas as histórias que falassem em realidade alternativa ou viagens no tempo. É um bom sinal para a China. Significa que as pessoas ainda sonham com alternativas, e por isso é preciso proibir este sonho. Aqui, não pensamos em proibições. Porque o sistema dominante tem oprimido até a nossa capacidade de sonhar.
    Vejam os filmes a que assistimos o tempo todo. É fácil imaginar o fim do mundo, um asteróide destruir toda a vida e assim por diante. Mas não se pode imaginar o fim do capitalismo. O que estamos, então, a fazer aqui?
    Deixem-me contar uma piada maravilhosa dos velhos tempos comunistas. Um fulano da Alemanha Oriental foi mandado para trabalhar na Sibéria. Ele sabia que o seu correio seria lido pelos censores, por isso disse aos amigos: “Vamos estabelecer um código. Se receberem uma carta minha escrita em tinta azul, será verdade o que estiver escrito; se estiver escrita em tinta vermelha, será falso”. Passado um mês, os amigos recebem uma primeira carta toda escrita em tinta azul. Dizia: “Tudo é maravilhoso aqui, as lojas estão cheias de boa comida, os cinemas exibem bons filmes do ocidente, os apartamentos são grandes e luxuosos, a única coisa que não se consegue comprar é tinta vermelha.”
    É assim que vivemos – temos todas as liberdades que queremos, mas falta-nos a tinta vermelha, a linguagem para articular a nossa ausência de liberdade. A forma como nos ensinam a falar sobre a guerra, a liberdade, o terrorismo e assim por diante, falsifica a liberdade. E é isso que estamos a fazer aqui: a dar tinta vermelha a todos nós.
    Existe um perigo. Não nos apaixonemos por nós mesmos. É bom estar aqui, mas lembrem-se, os carnavais são baratos. O que importa é o dia seguinte, quando voltamos à vida normal. Haverá então novas oportunidades? Não quero que se lembrem destes dias assim: “Meu deus, como éramos jovens e foi lindo”.
    Lembrem-se que a nossa mensagem principal é: temos de pensar em alternativas. A regra quebrou-se. Não vivemos no melhor mundo possível, mas há um longo caminho pela frente – estamos confrontados com questões realmente difíceis. Sabemos o que não queremos. Mas o que queremos? Que organização social pode substituir o capitalismo? Que tipo de novos líderes queremos?
    Lembrem-se, o problema não é a corrupção ou a ganância, o problema é o sistema. Tenham cuidado, não só com os inimigos, mas também com os falsos amigos que já estão a trabalhar para diluir este processo, do mesmo modo que quando se toma café sem cafeína, cerveja sem álcool, sorvete sem gordura.
    Vão tentar transformar isto num protesto moral sem coração, um processo descafeinado. Mas o motivo de estarmos aqui é que já estamos fartos de um mundo onde se reciclam latas de coca-cola ou se toma um cappuccino italiano no Starbucks, para depois dar 1% às crianças que passam fome e fazer-nos sentir bem com isso. Depois de fazer outsourcing ao trabalho e à tortura, depois de as agências matrimoniais fazerem outsourcing da nossa vida amorosa, permitimos que até o nosso envolvimento político seja alvo de outsourcing. Queremos de volta.
    Não somos comunistas, se o comunismo significa o sistema que entrou em colapso em 1990. Lembrem-se que hoje os comunistas são os capitalistas mais eficientes e implacáveis. Na China de hoje, temos um capitalismo que é ainda mais dinâmico do que o vosso capitalismo americano. Mas ele não precisa de democracia. O que significa que, quando criticarem o capitalismo, não se deixem chantagear pelos que vos acusam de ser contra a democracia. O casamento entre a democracia e o capitalismo acabou.
    A mudança é possível. O que é que consideramos possível hoje? Basta seguir os média. Por um lado, na tecnologia e na sexualidade tudo parece ser possível. É possível viajar para a lua, tornar-se imortal através da biogenética. Pode-se ter sexo com animais ou qualquer outra coisa. Mas olhem para os terrenos da sociedade e da economia. Nestes, quase tudo é considerado impossível. Querem aumentar um pouco os impostos aos ricos? Eles dizem que é impossível. Perdemos competitividade. Querem mais dinheiro para a saúde? Eles dizem que é impossível, isso significaria um Estado totalitário. Algo tem de estar errado num mundo onde vos prometem ser imortais, mas em que não se pode gastar um pouco mais com cuidados de saúde.
    Talvez devêssemos definir as nossas prioridades nesta questão. Não queremos um padrão de vida mais alto – queremos um melhor padrão de vida. O único sentido em que somos comunistas é que nos preocupamos com os bens comuns. Os bens comuns da natureza, os bens comuns do que é privatizado pela propriedade intelectual, os bens comuns da biogenética. Por isto e só por isto devemos lutar.
    O comunismo falhou totalmente, mas o problema dos bens comuns permanece. Eles dizem-nos que não somos americanos, mas temos de lembrar uma coisa aos fundamentalistas conservadores, que afirmam que eles é que são realmente americanos. O que é o cristianismo? É o Espírito Santo. O que é o Espírito Santo? É uma comunidade igualitária de crentes que estão ligados pelo amor um pelo outro, e que só têm a sua própria liberdade e responsabilidade para este amor. Neste sentido, o Espírito Santo está aqui, agora, e lá em Wall Street estão os pagãos que adoram ídolos blasfemos.
    Por isso, do que precisamos é de paciência. A única coisa que eu temo é que algum dia vamos todos voltar para casa, e vamos voltar a encontrar-nos uma vez por ano, para beber cerveja e recordar nostalgicamente como foi bom o tempo que passámos aqui. Prometam que não vai ser assim. Sabem que muitas vezes as pessoas desejam uma coisa, mas realmente não a querem. Não tenham medo de realmente querer o que desejam. Muito obrigado.
     

    TV Cultura reprisa entrevista com Fidel Castro

     
    Amanhã (10/10/11), o 'Roda Viva', da TV Cultura, vai reprisar a entrevista com companheiro Fidel Castro que foi feita em março de 1990. Com a reprise, os telespectadores irão acompanhar o ex-presidente de Cuba respondendo perguntas sobre as mudanças que ocorreram com o país caribenho diante dos reflexos da Perestroika, principalmente no leste europeu e se ele tinha  medo de algum atentado contra a sua vida, entre outros temas que foram abordados pelo apresentador Jorge Escosteguy e os demais jornalistas da bancada. A reprise começa as 22 horas.
     *solidários

    e naquele inferno...





    Números à prova: Enem bate record de inscritos

    Enem terá maior número de inscritos desde sua primeira edição, em 1998
    O Conversa Afiada reproduz texto da Carta Capital:

    Números à prova


    por Alexandre Pavan


    O Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), que acontece nos dias 22 e 23 deste mês, apresenta o maior número de inscritos desde a sua primeira edição, em 1998, quando foi lançado pelo então ministro Paulo Renato Souza (1945-2011). São 6.221.697 interessados em realizar a prova que, originalmente, foi criada com o intuito de avaliar o desempenho dos alunos ao término da escolaridade básica. Com o passar dos anos, no entanto, o exame começou a ser aplicado em substituição ou como complemento dos vestibulares de acesso aos cursos profissionalizantes pós-Médio e ao Ensino Superior. Atualmente, sua atuação é abrangente e, para muitos, dispersiva.


    A primeira grande mudança ocorreu em 2004, quando o Ministério da Educação (MEC) instituiu o Programa Universidade para Todos (ProUni-) e vinculou a concessão de bolsas em instituições privadas à nota obtida no Enem. Mais tarde, em 2009, intensificando o discurso de democratização do acesso à educação superior, o MEC instituiu o exame para o ingresso às universidades públicas brasileiras via Sistema de Seleção Unificada (Sisu). O Sisu é um método informatizado que indica os candidatos para as instituições públicas de ensino de acordo com a nota que obtiveram no Enem. No segundo semestre de 2011, foram oferecidas 26.336 vagas em 48 instituições de ensino públicas por meio do Sisu/Enem.


    No que depender do ministro Fernando Haddad, o vestibular convencional está com os dias contados. De acordo com o titular da pasta da Educação, os exames tradicionais podem acabar ainda nesta década. Ele -também já estuda tornar a prova obrigatória. Um exemplo que estimula essa previsão é o da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), que decidiu substituir sua prova tradicional pelo Enem para o acesso 2012.


    O processo teve início em 2009, quando a instituição utilizou o exame como primeira fase do vestibular. Na época, foram selecionados quatro candidatos por vaga para a segunda fase. Por exemplo, se havia 30 vagas para o curso de Engenharia Mecânica, os candidatos com as 120 melhores notas realizavam a prova específica da UFRJ.


    Em 2010, houve uma divisão de vagas: 40% destinadas ao vestibular, 40% para o Sisu e outros 20% pelo Sisu somado ao processo de ação afirmativa, que determinava que somente podiam concorrer candidatos egressos do Ensino Médio de escolas públicas. O Conselho Universitário da UFRJ avaliou a experiência como bem-sucedida e resolveu extinguir o vestibular próprio. Agora, o próximo processo seletivo será pelo Sisu/Enem, oferecendo um total de 9 mil vagas, 30% reservadas aos alunos que fizeram Ensino Médio integralmente na escola pública e com renda familiar per capita inferior a um salário mínimo (545 reais).


    “Nosso foco é a democratização do acesso ao Ensino Superior”, afirma Marta Feijó Barroso, superintendente acadêmica da gradução da UFRJ. Segundo ela, a ação resolve um problema antigo do processo seletivo, a autoexclusão dos alunos provenientes de escolas públicas. “Em geral, esses estudantes acham que não têm chance de concorrer. Com o Enem, isso não está acontecendo. Nós estamos preenchendo, inclusive, vagas de cursos de mais baixa procura que antes não conseguía-mos preencher”, explica.


    No outro extremo da ponte aérea, a Universidade de São Paulo (USP), continua sem utilizar o Enem em nenhuma das etapas de seu processo seletivo. Em 2009, a instituição até cogitou aproveitar a prova como complemento em uma das fases de seu vestibular, porém, por causa de uma alteração de datas do exame nacional, a experiência foi descartada.


    Naquele ano, o Enem sofreu o mais duro golpe na sua credibilidade e eficiência logística, quando a prova foi furtada de dentro da gráfica que fora contratada para imprimi-la. Os criminosos foram descobertos ao tentar vender as questões, o que provocou o adiamento do exame. Inicialmente agendado para outubro, ele foi alterado para dezembro. Na época, o gasto com a reimpressão da prova foi estimado em 148 milhões de reais, além de ter causado prejuízo aos 4,5 milhões de candidatos inscritos. Dos 4,1 milhões de inscritos, 37% desistiram de fazer a avaliação.


    Por causa do problema e alegando incompatibilidade de calendários, a USP descartou o Enem – o mesmo aconteceu com a Universidade Estadual- de Campinas (Unicamp). Dois anos depois, a posição da instituição paulista permanece inalterada. A questão do cronograma é o argumento oficial para que o exame nacional continue não sendo usado no seu processo seletivo. Se a intenção de Haddad é unificar os vestibulares, muitos especialistas acreditam que o ministro enfrentará resistência.


    Mil e uma utilidades


    “A USP jamais terá o Enem como prova determinante. No máximo, o utilizará como complemento”, opina Mauro Aguiar, diretor-presidente do Colégio Bandeirantes e membro do Conselho Estadual de Educação do Estado de São Paulo. Aguiar ainda questiona o foco de atuação do exame que, desde 2009, também serve como certificação de conclusão do Ensino Médio em cursos de Educação de Jovens e Adultos (EJA), o antigo supletivo.


    “O Enem nasceu para ser uma avaliação de competências e habilidades, o que é diferente do vestibular. A prova foi uma grande evolução na área educacional, mas ela quer fazer tudo – seleção para vestibular, avaliação das escolas, certificação para o Ensino Médio. Não existe exemplo internacional de exame que seja tudo isso ao mesmo tempo”, comenta Aguiar.


    Essa opinião vai ao encontro do pensamento de Nilson José Machado, professor titular da Faculdade de Educação da USP. “O Enem não surgiu para substituir o vestibular. A LDB (Lei de Diretrizes e Bases) estabelece que o Ensino Médio é uma etapa do Ensino Básico, portanto um fim em si mesmo – não é um passo para o Ensino Superior”, argumenta.


    Machado afirma que seria fundamental a discussão a respeito dos referenciais teóricos do exame, porém esse assunto não está na pauta. “A preocupação agora é logística”, resume. O professor lembra que o grande mérito do Enem foi tirar do centro das atenções os indispensáveis conteúdos disciplinares, dando ênfase às competências e habilidades pessoais, que deveriam ser desenvolvidas por meio deles. Assim, ao final da educação básica, os alunos deveriam demonstrar capacidade de expressão e de compreensão, de contextualização e de imaginação. “Ultimamente, o pessoal parece confundir contexto com tamanho de texto porque as questões estão apresentando enunciados enormes, sem necessidade”, diz. Se nos primeiros anos a prova contava com 60 questões, hoje são 180. De acordo com o professor, o exame merece redefinições. “Hoje, virou uma maratona.”


    Ranking e influência nos currículos


    Outro ponto do Enem que há anos causa polêmica é o ranking gerado pela divulgação das médias por escola. O diretor-presidente do Colégio Bandeirantes considera um aspecto negativo julgar e comparar escolas por diferenças de 0,1% ou 0,2%. “Não que eu seja contra o ranking, até porque o Bandeirantes sempre vai bem, mas a função do Enem não é essa”, comenta Mauro Aguiar, cuja escola ficou na sexta colocação entre as melhores de São Paulo e em 49ª no comparativo nacional.


    Os resultados relativos a 2010 foram divulgados pelo MEC divididos em quatro grupos, de acordo com a taxa de participação dos estudantes de cada instituição de ensino. O recurso serve para evitar distorções na hora de fazer a comparação. Em setembro, durante entrevista coletiva para tratar dos resultados do exame do ano passado, o ministro Haddad comemorou: “Conseguimos aumentar 10 pontos na média. Isso significa que cumprimos 10% da meta esperada para a década”.


    Aguiar entende que, mesmo com a mudança, o Enem continua não sendo uma amostragem, pois a prova é voluntária. Em 2010, o índice de abstenção entre os estudantes do Bandeirantes foi de 37%. “A saída da USP desmotivou os alunos”, esclarece o diretor. Questionado se o Enem interfere de alguma forma no currículo do colégio, ele é direto: “Quem norteia nosso currículo é a Fuvest (fundação responsável pelo vestibular da USP), e acredito que seja assim em todas as escolas de São Paulo”.


    O mesmo não acontece no Instituto Dom Barreto, de Teresina (PI). A escola, segunda colocada no ranking nacional, atrás apenas do Colégio São Bento, do Rio de Janeiro, já realizou algumas adaptações curriculares por conta do Enem. Depois que exames anteriores tiveram questões relacionadas ao vôlei, os coordenadores pedagógicos decidiram preparar conteúdos envolvendo práticas esportivas e conceitos de física. O Enem também trouxe para a escola um cuidado maior com as aulas de artes, como a música. É o segundo ano consecutivo que a escola conquista uma boa posição no ranking – em 2009, ficaram em terceiro lugar. “Não vemos o ranking com vaidade, encaramos como um compromisso com a educação”, afirma Maria Stela Rangel, diretora do Instituto Dom Barreto.


    Nilson José Machado, da Feusp, avalia que o Enem trouxe mudanças positivas também para alguns vestibulares, que passaram a apresentar questões menos técnicas e herméticas. Para o diretor Aguiar, o grande mérito do exame foi conseguir criar uma cultura de avaliação escolar.



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    *PHA