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Ser de esquerda é não aceitar as injustiças, sejam elas quais forem, como um fato natural. É não calar diante da violação dos Direitos Humanos, em qualquer país e em qualquer momento. É questionar determinadas leis – porque a Justiça, muitas vezes, não anda de mãos dadas com o Direito; e entre um e outro, o homem de esquerda escolhe a justiça.
É ser guiado por uma permanente capacidade de se estarrecer e, com ela e por causa dela, não se acomodar, não se vender, não se deixar manipular ou seduzir pelo poder. É escolher o caminho mais justo, mesmo que seja cansativo demais, arriscado demais, distante demais. O homem de esquerda acredita que a vida pode e deve ser melhor e é isso, no fundo, que o move. Porque o homem de esquerda sabe que não é culpa do destino ou da vontade divina que um bilhão de pessoas, segundo dados da ONU, passe fome no mundo.
É caminhar junto aos marginalizados; é repartir aquilo que se tem e até mesmo aquilo que falta, sem sacrifício e sem estardalhaço. À direita, cabe a tarefa de dar o que sobra, em forma de esmola e de assistencialismo, com barulho e holofotes. Ser de esquerda é reconhecer no outro sua própria humanidade, principalmente quando o outro for completamente diferente. Os homens e mulheres de esquerda sabem que o destino de uma pessoa não deveria ser determinado por causa da raça, do gênero ou da religião.
Ser de esquerda é não se deixar seduzir pelo consumismo; é entender, como ensinou Milton Santos, que a felicidade está ancorada nos bens infinitos. É mergulhar, com alegria e inteireza, na luta por um mundo melhor e neste mergulho não se deixar contaminar pela arrogância, pelo rancor ou pela vaidade. É manter a coerência entre a palavra e a ação. É alimentar as dúvidas, para não cair no poço escuro das respostas fáceis, das certezas cômodas e caducas. Porém, o homem de esquerda não faz da dúvida o álibi para a indiferença. Ele nunca é indiferente. Ser de esquerda é saber que este “mundo melhor e possível” não se fará de punhos cerrados nem com gritos de guerra, mas será construído no dia-a-dia, nas pequenas e grandes obras e que, muitas vezes, é preciso comprar batalhas longas e desgastantes. Ser de esquerda é, na batalha, não usar os métodos do inimigo.
Fernando Evangelista
quinta-feira, setembro 26, 2013
Espionagem faz Dilma adiar compra de caças
Americana Boieng estava na frente na corrica pela renovação de caças da
FAB, em um negócio estimado em pelo menos US$ 5 bilhões; no entanto,
presidente prefere adiar a decisão para 2015 em mais uma demonstração de
força ao governo de Barack Obama após casos de quebra de sigilo das
comunicações do Planalto e da Petrobras
247 –
A americana Boieng estava na frente da preferência de Dilma Rousseff na
concorrência para a renovação de caças da FAB. O lote inicial era de 36
caças F-18 Super Hornet, em um negócio estimado em pelo menos US$ 5
bilhões. Mas isso foi antes de o ex-agente Edward Snowden ter revelado
que as conversas de gabinete da presidente do Brasil tiveram o sigilo
quebrado pela Agência de Segurança Nacional dos Estados Unidos (NSA),
assim como a Petrobras.
O episódio melou a visita de Estado que Dilma deveria fazer em outubro a
Washington. O governo brasileiro ficou decepcionado com as respostas
dadas por Barack Obama ao ocorrido. Agora, já é usado como demonstração
de força do Brasil contra acordos comerciais. A presidente do Brasil
quer adiar a decisão dos caças – iniciada no governo Lula - para 2015,
segundo informações do Valor.
A concorrente direta da Boeing no negócio é a francesa Dassault, que
fechou acordo com a Índia de até 126 caças Rafale em dez anos.
*Amoralnato
Nunca vi tanta pressão da mídia sobre um juiz, diz Celso de Mello
O ministro Celso de Mello, do STF (Supremo Tribunal Federal), fez um
desabafo no começo da semana a um velho amigo, José Reiner Fernandes,
editor do "Jornal Integração", de Tatuí, sua cidade natal. Em pauta,
críticas que recebeu antes mesmo de votar a favor dos embargos
infringentes, que deram a réus do mensalão chance de novo julgamento em
alguns crimes.
"Há alguns que ainda insistem em dizer que não fui exposto a uma brutal
pressão midiática. Basta ler, no entanto, os artigos e editoriais
publicados em diversos meios de comunicação social (os mass media') para
se concluir diversamente! É de registrar-se que essa pressão, além de
inadequada e insólita, resultou absolutamente inútil", afirmou ele.
Mello parece estar com o assunto entalado na garganta. Anteontem, ele
respondeu a um telefonema da Folha para confirmar as declarações acima. E
falou sobre o tema por quase meia hora.
"Eu imaginava que isso [pressão da mídia para que votasse contra o
pedido dos réus] pudesse ocorrer e não me senti pressionado. Mas foi
insólito esse comportamento. Nada impede que você critique ou expresse o
seu pensamento. O que não tem sentido é pressionar o juiz."
"Foi algo incomum", segue. "Eu honestamente, em 45 anos de atuação na
área jurídica, como membro do Ministério Público e juiz do STF, nunca
presenciei um comportamento tão ostensivo dos meios de comunicação
sociais buscando, na verdade, pressionar e virtualmente subjugar a
consciência de um juiz."
"Essa tentativa de subjugação midiática da consciência crítica do juiz
mostra-se extremamente grave e por isso mesmo insólita", afirma.
E traz riscos. "É muito perigoso qualquer ensaio que busque subjugar o
magistrado, sob pena de frustração das liberdades fundamentais
reconhecidas pela Constituição. É inaceitável, parta de onde partir. Sem
magistrados independentes jamais haverá cidadãos livres."
"A liberdade de crítica da imprensa é sempre legítima. Mas às vezes é
veiculada com base em fundamentos irracionais e inconsistentes." Por
isso, o juiz não pode se sujeitar a elas. "Abordagens passionais de
temas sensíveis descaracterizam a racionalidade inerente ao discurso
jurídico. É fundamental que o juiz julgue de modo isento e independente.
O que é o direito senão a razão desprovida da paixão?"
O ministro repete: não está questionando "o direito à livre manifestação
de pensamento". "Os meios de comunicação cumprem o seu dever de buscar,
veicular informação e opinar sobre os fatos. Exercem legitimamente
função que o STF lhes reconhece. E o tribunal tem estado atento a isso. A
plena liberdade de expressão é inquestionável." Ele lembra que já
julgou, "sem hesitação nem tergiversação", centenas de casos que
envolviam o direito de jornalistas manifestarem suas críticas. "Minhas
decisões falam por si."
Celso de Mello lembra que a influência da mídia em julgamentos de
processos penais, "com possível ofensa ao direito do réu a um julgamento
justo", não é um tema inédito. "É uma discussão que tem merecido
atenção e reflexão no âmbito acadêmico e no plano do direito
brasileiro." Citando quase uma dezena de autores, ele afirma que é
preciso conciliar "essas grandes liberdades fundamentais", ou seja, o
direito à informação e o direito a um julgamento isento.
O juiz, afirma ele, "não é um ser isolado do mundo. Ele vive e sente as
pulsões da sociedade. Ele tem a capacidade de ouvir. Mas precisa ser
racional e não pode ser constrangido a se submeter a opiniões externas."
Apesar de toda a pressão que diz ter identificado, Celso de Mello afirma
que o STF julgou o mensalão "de maneira independente". E que se sentiu
"absolutamente livre para formular o meu juízo". No julgamento, ele
quase sempre impôs penas duras à maioria dos réus.
"Em 45 anos de atuação na área jurídica, nunca presenciei um
comportamento tão ostensivo dos meios de comunicação buscando subjugar
um juiz"
"Abordagens passionais descaracterizam a racionalidade inerente ao
discurso jurídico. É fundamental que o juiz julgue de modo independente"... As informações estão na *Saraiva
Dalmo Dallari sobre Gilmar Mendes: “Eu não avisei?”
Há dez anos, o jurista e professor da USP publicou artigo que gerou polêmica em que sustentava: “Gilmar Mendes no STF é a degradação do Judiciário”. Agora, em entrevista ao 247, ele reafirma e diz mais: “Há algo errado quando um ministro do Supremo vive na mídia.” Heberth Xavier, via Brasil 247, texto publicado em 29/5/2012
Há dez anos, exatamente em 8 de maio de 2002, a Folha de S.Paulo publicava um artigo que geraria grande polêmica. Com o título “Degradação do Judiciário”, o artigo, escrito pelo jurista e professor da Faculdade Direito da USP, Dalmo de Abreu Dallari, questionava firmemente a indicação do nome de Gilmar Mendes para o Supremo Tribunal Federal (STF). A nomeação se daria dias depois, mesmo com as críticas fortes de Dallari, ecoadas por muita gente da área e nos blogs e sites da época.
Desde então, Mendes esteve no centro das atenções em inúmeras polêmicas. Em 2009, participou de famosa e áspera discussão em pleno plenário do tribunal com o colega Joaquim Barbosa. Dallari, que conhece pessoalmente muitos ministros do STF (foi professor de Ricardo Lewandowski, deu aulas a Carmen Lúcia e orientou Eros Grau), comparou o fato a uma “briga de moleques de rua”: “Os dois poderiam evitar o episódio, mas a culpa grande é do presidente do STF, Gilmar Mendes, que mostra um exibicionismo exagerado, uma busca dos holofotes, da imprensa. Além da vocação autoritária, que não é novidade.” (clique aqui)
Um ano depois, em 2010, na véspera das eleições presidenciais, o Supremo se reuniu para julgar a exigência da apresentação de dois documentos para votar nas eleições. O placar estava 7 a 0 quando o ministro Gilmar Mendes pediu vista do processo. O julgamento foi interrompido. Mais tarde, circulou a informação, confirmada depois em reportagem da Folha de S.Paulo, de que a decisão de Mendes foi tomada depois de conversar com o então candidato do PSDB, José Serra, por telefone. Na época, Dallari não quis comentar sobre a conversa ou não com o candidato tucano e suas implicações (“Como advogado, raciocino em cima de provas”), mas contestou a atitude de Mendes: “Do ponto jurídico, é uma decisão totalmente desprovida de fundamento. O pedido de vistas não tinha razão jurídica alguma, não havia dúvida a ser dirimida”.
Mas a maior polêmica é a atual, envolvendo o político mais popular do Brasil, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, acusado por Mendes de chantagem e pressão ao STF. Procurado pelo 247, a quem concedeu entrevista, Dallari não deixa de reconhecer: “Eu não avisei?”
Leia alguns pontos destacados pelo jurista na entrevista ao 247: STF na mídia
“Eu acho muito ruim para a imagem do Supremo que um de seus ministros fique tanto tempo exposto na mídia, sempre em polêmicas. Não que eu considere bom ficar enclausurado, pelo contrário. É interessante que você dê publicidade às ações do STF, para a população ser melhor informado do processo de decisões no tribunal. Mas há algo errado quando um ministro do Supremo vive na mídia, e sempre em polêmicas. Verdade ou mentira?
“Não posso fazer um julgamento categórico sobre o que disse o ministro Gilmar Mendes. Não se sabe onde está a verdade. Se tivesse mais segurança quanto aos fatos ocorridos poderia dizer melhor. Mas, de qualquer maneira, dá para afirmar de cara duas coisas: a primeira é que não dá, definitivamente, para um ministro do Supremo sair polemizando toda hora para a imprensa, e num nível que parece confronto pessoal. É algo que não faz parte das funções de um ministro do Supremo. A outra coisa é que as acusações de Gilmar são extremamente duvidosas. Feitas com atraso e sem o mais básico, que é a confirmação da única testemunha. Pelo contrário: o ministro Jobim [Nelson Jobim, que foi ministro de FHC, de Lula e do próprio STF] negou o conteúdo do que foi denunciado. Previsão
“Não avisei? Naquele artigo para a Folha, eu já mostrava, com fatos, os problemas que o Judiciário brasileiro enfrentaria com o Gilmar Mendes no Supremo. Não há surpresas, pelo menos para mim. Na época de sua nomeação, já havia informações, por exemplo, de que ele contratou, como procurador-geral da República, pessoal para seu cursinho de Direito. Um detalhe interessante é que o Gilmar Mendes teve 14 votos contrários à sua nomeação para o STF. Isso quebrou uma tradição de unanimidade que existia no Senado brasileiro. Enfim, ele não é, definitivamente, uma personagem altamente confiável a ponto de representar um posto tão importante. Implicações jurídicas
“Primeiramente é preciso lembrar que, fosse verdadeira a nova afirmação de Gilmar Mendes, se tivesse realmente sido vítima de chantagem, o caminho natural seria uma denúncia ao Ministério Público, imediatamente. Por que só agora? Dito isso, cabem dúvidas da extensão realmente do que supostamente foi dito. Ainda que Lula tenha feito referências ao mensalão, é duvidoso se isso teria tanta implicação jurídica, pois parece ter sido numa conversa informal, feita na casa de um amigo comum dos dois. Volto a frisar dois aspectos: é difícil determinar com certeza, pois não há evidência nenhuma de que Gilmar Mendes diz a verdade, apenas a sua palavra; e, tivesse a seriedade que alguns querem pintar, a denúncia teria que ser feita na hora. Ou não é?
Leia abaixo o artigo que Dalmo de Abreu Dallari publicou na Folha, em 8 de maio de 2002: Degradação do Judiciário Dalmo de Abreu Dallari
Nenhum Estado moderno pode ser considerado democrático e civilizado se não tiver um Poder Judiciário independente e imparcial, que tome por parâmetro máximo a Constituição e que tenha condições efetivas para impedir arbitrariedades e corrupção, assegurando, desse modo, os direitos consagrados nos dispositivos constitucionais.
Sem o respeito aos direitos e aos órgãos e instituições encarregados de protegê-los, o que resta é a lei do mais forte, do mais atrevido, do mais astucioso, do mais oportunista, do mais demagogo, do mais distanciado da ética.
Essas considerações, que apenas reproduzem e sintetizam o que tem sido afirmado e reafirmado por todos os teóricos do Estado democrático de Direito, são necessárias e oportunas em face da notícia de que o presidente da República, com afoiteza e imprudência muito estranhas, encaminhou ao Senado uma indicação para membro do Supremo Tribunal Federal, que pode ser considerada verdadeira declaração de guerra do Poder Executivo federal ao Poder Judiciário, ao Ministério Público, à Ordem dos Advogados do Brasil e a toda a comunidade jurídica.
Se essa indicação vier a ser aprovada pelo Senado, não há exagero em afirmar que estarão correndo sério risco a proteção dos direitos no Brasil, o combate à corrupção e a própria normalidade constitucional. Por isso é necessário chamar a atenção para alguns fatos graves, a fim de que o povo e a imprensa fiquem vigilantes e exijam das autoridades o cumprimento rigoroso e honesto de suas atribuições constitucionais, com a firmeza e transparência indispensáveis num sistema democrático.
Segundo vem sendo divulgado por vários órgãos da imprensa, estaria sendo montada uma grande operação para anular o Supremo Tribunal Federal, tornando-o completamente submisso ao atual chefe do Executivo, mesmo depois do término de seu mandato. Um sinal dessa investida seria a indicação, agora concretizada, do atual advogado-geral da União, Gilmar Mendes, alto funcionário subordinado ao presidente da República, para a próxima vaga na Suprema Corte. Além da estranha afoiteza do presidente –pois a indicação foi noticiada antes que se formalizasse a abertura da vaga-, o nome indicado está longe de preencher os requisitos necessários para que alguém seja membro da mais alta corte do país.
É oportuno lembrar que o STF dá a última palavra sobre a constitucionalidade das leis e dos atos das autoridades públicas e terá papel fundamental na promoção da responsabilidade do presidente da República pela prática de ilegalidades e corrupção.
É importante assinalar que aquele alto funcionário do Executivo especializou-se em “inventar” soluções jurídicas no interesse do governo. Ele foi assessor muito próximo do ex-presidente Collor, que nunca se notabilizou pelo respeito ao direito. Já no governo Fernando Henrique, o mesmo doutor Gilmar Mendes, que pertence ao Ministério Público da União, aparece assessorando o ministro da Justiça Nelson Jobim, na tentativa de anular a demarcação de áreas indígenas. Alegando inconstitucionalidade, duas vezes negada pelo STF, “inventaram” uma tese jurídica, que serviu de base para um decreto do presidente Fernando Henrique revogando o decreto em que se baseavam as demarcações. Mais recentemente, o advogado-geral da União, derrotado no Judiciário em outro caso, recomendou aos órgãos da administração que não cumprissem decisões judiciais.
Medidas desse tipo, propostas e adotadas por sugestão do advogado-geral da União, muitas vezes eram claramente inconstitucionais e deram fundamento para a concessão de liminares e decisões de juízes e tribunais, contra atos de autoridades federais.
Indignado com essas derrotas judiciais, o doutor Gilmar Mendes fez inúmeros pronunciamentos pela imprensa, agredindo grosseiramente juízes e tribunais, o que culminou com sua afirmação textual de que o sistema judiciário brasileiro é um “manicômio judiciário”.
Obviamente isso ofendeu gravemente a todos os juízes brasileiros ciosos de sua dignidade, o que ficou claramente expresso em artigo publicado no “Informe”, veículo de divulgação do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (edição 107, dezembro de 2001). Num texto sereno e objetivo, significativamente intitulado “Manicômio Judiciário” e assinado pelo presidente daquele tribunal, observa-se que “não são decisões injustas que causam a irritação, a iracunda, a irritabilidade do advogado-geral da União, mas as decisões contrárias às medidas do Poder Executivo”.
E não faltaram injúrias aos advogados, pois, na opinião do doutor Gilmar Mendes, toda liminar concedida contra ato do governo federal é produto de conluio corrupto entre advogados e juízes, sócios na “indústria de liminares”.
A par desse desrespeito pelas instituições jurídicas, existe mais um problema ético. Revelou a revista “Época” (22/4/02, pág. 40) que a chefia da Advocacia Geral da União, isso é, o doutor Gilmar Mendes, pagou R$32.400 ao Instituto Brasiliense de Direito Público –do qual o mesmo doutor Gilmar Mendes é um dos proprietários- para que seus subordinados lá fizessem cursos. Isso é contrário à ética e à probidade administrativa, estando muito longe de se enquadrar na “reputação ilibada”, exigida pelo artigo 101 da Constituição, para que alguém integre o Supremo.
A comunidade jurídica sabe quem é o indicado e não pode assistir calada e submissa à consumação dessa escolha notoriamente inadequada, contribuindo, com sua omissão, para que a arguição pública do candidato pelo Senado, prevista no artigo 52 da Constituição, seja apenas uma simulação ou “ação entre amigos”. É assim que se degradam as instituições e se corrompem os fundamentos da ordem constitucional democrática.
*Saraiva
SOBRE O DISCURSO DE DILMA NA ONU
Dilma na home do NYT.
* Dodó Macedo
A reação do público norte-americano ao discurso de Dilma
Por Rogério Maestri (leitor do blog Luis Nassif Online)
Muitas vezes saem determinadas notícias sobre repercussões de fatos
ocorridos no Brasil no exterior, a imprensa tradicional cita um ou outro
texto em um jornal on-line de alguns países, nada de relevante.
Agora o discurso da Presidente Dilma teve uma forte repercussão,
principalmente no público norte-americano. Se olharmos os comentários
dos sites de grandes órgãos de imprensa norte-americanos, vemos muito
mais apoio à posição da Presidente Dilma do que repúdio (a não ser de
brasileiros que tentam puxar o assunto para problemas internos e
desqualificar o protesto).
O que mais se vê nas respostas dos leitores é a concordância de que a
violação da internet é uma violação das liberdades individuais.
Grandes comentaristas dão ênfase ao fato de que é a primeira vez que um
governo norte-americano é atacado com força por um governo amigo e bom
parceiro comercial.
Não vi nenhuma recriminação, em mais de 100 entradas que efetuei na
imprensa norte-americana, à atitude da nossa presidente, ou seja, a
repercussão está sendo mais forte no interior do próprio Estados Unidos,
que já estão cheios das bisbilhotices do NSA, do que no exterior.
A linguagem dura de Dilma tocou forte e favoravelmente no povo
norte-americano, que identifica o Brasil como uma nação amiga e não como
alguém a ser espionado.
Logo, falar que não houve repercussão do discurso da Dilma é não saber ler a internet. (Fonte: aqui).
Guerra as Drogas tudo errado
quando tudo sai errado, por
O homem até pode ser o animal mais racional do planeta, como vem
sustentando há milênios alguns filósofos, mas, em determinados assuntos,
que mobilizam medos profundos da espécie, conseguimos a proeza de fazer
tudo absolutamente errado. Um caso notável dessa tempestade perfeita é a
política de drogas.
Nos últimos 100 anos, o mundo embarcou na onda proibicionista, declarando guerra aos estupefacientes e prometendo livrar o globo da chaga da dependência.
Em termos econômicos, nunca fez sentido apostar na repressão. Por razões matemáticas bastante precisas, o tráfico é um delito contra o qual a atuação policial é pouco efetiva. Ao menos em teoria, o sujeito que vai cometer um crime faz uma análise de riscos e benefícios. Ele calcula a chance de ser preso e a sopesa contra o lucro esperado. O papel da repressão é elevar o risco de aprisionamento, de modo que o perigo para o bandido supere o prêmio presumido.
O sistema funciona relativamente bem para crimes como roubo a banco, nos quais o valor do benefício não é afetado pela ação da polícia. No caso das drogas, entretanto, a repressão aumenta o risco para o traficante, mas também a recompensa, pois os preços dos entorpecentes tendem a subir sempre que o cerco se fecha.
O resumo da história é que investimos bilhões de dólares em unidades de combate ao tráfico que são intrinsecamente ineficientes e ainda tendem a aumentar os lucros e o poder de aliciamento dos barões da droga.
E a conta das despesas está apenas começando. Aos gastos com polícia devemos acrescentar as verbas destinadas a tratamento médico para os dependentes –o que pelo menos vale como uma boa ação– e aos presídios, cada vez mais apinhados de condenados por delitos relacionados a drogas.
Nos EUA, núcleo duro do proibicionismo, cerca de 500 mil dos 2,3 milhões de encarcerados estão nessa categoria. Só a manutenção dessa fatia específica dos presidiários consome US$ 12 bilhões anuais. E, diferentemente do que ocorre em relação ao tratamento médico, não dá para afirmar que a ação reverta em benefício da população afetada, muito pelo contrário. Os estudos mostram que a cadeia é um instrumento de baixa eficácia na recuperação do delinquente, mas quase perfeito para destruir o futuro de um jovem. Quem vai parar em uma, mesmo que por uma bobagem como vender um pouco de maconha para os amigos, corre o sério risco de ficar para sempre frequentando intermitentemente esse tipo de ambiente.
O único argumento de peso em favor de uma política mais dura para as drogas é o de que, se adotarmos o “liberou geral”, sobreviria o caos, já que a prevalência global do uso de drogas ilícitas, hoje estimada pela ONU em algo entre 3,6% e 6,9% da população adulta, tenderia a explodir quem sabe até batendo os mais de 40% dos usuários de álcool. Obviamente, seria natural esperar que, nessa situação, o número de dependentes também aumentaria expressivamente.
Pois até essa noção, que parece irresistivelmente lógica, vem sendo contestada nos últimos anos. Como já tive ocasião de mostrar neste espaço, existem duas “escolas” de pensamento.
Para os cientistas que gostam de frisar os aspectos bioquímicos da dependência, não há limite para o vício. Se submetermos uma dada população de ratos (ou pessoas) a um regime de ingestão forçada de cocaína ou álcool, teremos, ao cabo de poucas semanas de uso contínuo, 100% de dependentes, que experimentarão tolerância, “craving”, síndrome de abstinência na retirada e demais sintomas clássicos. Uma outra corrente de pesquisadores, entretanto, sustenta que, em condições “naturais” (isto é, sem que se submetam as infelizes cobaias à dieta do pó e da cachaça), os números ficam bem mais modestos.
Essa linha ganha um importante apoio com a publicação nos EUA de “High Price: A Neuroscientist’s Journey of Self-Discovery That Challenges Everything You Know About Drugs and Society” (preço alto: a jornada de autodescoberta de um neurocientista que desafia tudo o que você sabe sobre drogas e a sociedade), de Carl Hart.
Trata-se de um livro singular. Hart é neurocientista e professor de psicologia em Columbia, uma das mais prestigiadas universidades dos EUA. Desenvolve, como veremos, interessantes pesquisas sobre o comportamento de dependentes. Mas ele também é negro, nascido na pobreza, que viveu toda a juventude nos piores bairros de Miami e que flertou bem de perto com o tráfico e outras modalidades criminosas. Em “High Price”, o autor combina sua rica experiência pessoal com dados estatísticos e os novos trabalhos científicos sobre drogas para sustentar que quase todas as ideias comumente aceitas sobre o problema estão erradas.
Evidentemente, nem vale a pena tentar resgatar aqui os aspectos biográficos da obra. Basta registrar que ele consegue imprimir ao texto um tom romanesco, que nos faz querer ler tudo numa sentada só. Em relação aos argumentos utilizados, há vários que merecem ser destacados.
Para começar, Hart mostra que devemos desconfiar de quase tudo o que nos ensinam sobre drogas nas campanhas de prevenção, que geralmente estão baseadas mais em mitos do que em boa ciência. Você já deve ter ouvido, por exemplo, que basta usar crack uma vez para tornar-se um viciado maltrapilho que terminará seus dias na sarjeta.
Bem, é mentira. Mais de 75% dos usuários de crack, a exemplo dos de heroína e outras drogas tidas como especialmente perversas, jamais se torna dependente da substância. Se queremos entender o problema de forma completa, não podemos perder de vista o espaço amostral. Os cientistas passaram as últimas décadas olhando tão de perto para os casos patológicos que deixaram de considerar a ampla maioria de usuários que não tem sua vida significativamente prejudicada pelo hábito.
Hart traça a origem do mito do vício fatal às teorias de Roy Wise e George Koob de que todas as drogas, independentemente de seu princípio ativo, atuavam sequestrando os centros de prazer e recompensa, notadamente o nucleus accumbens, que se veria de tal forma estimulado por megatorrentes de dopamina que não permitiria ao cérebro fazer outra coisa que não concentrar-se em conseguir a próxima dose. Por ela, o sujeito mataria e se prostituiria.
A ilustração desse mecanismo seria o célebre experimento de James Olds e Peter Milner dos anos 50 em que ratos que tinham a oportunidade puxar uma alavanca que acionava descargas elétricas que, através de eletrodos implantados em seus cérebros, estimulavam a liberação de dopamina nos centros de prazer se empenhavam tanto nessa tarefa que cessavam todas as outras atividades, incluindo sexo e alimentação. Eles morriam, no que seria um modelo para os perigos do vício.
Segundo Hart, essas experiências foram reproduzidas e verificou-se que sua descrição fora um pouco exagerada. Não eram todos os ratos que caíam nessa. Na verdade, em geral só embarcavam no comportamento patológico, seja ao puxar alavancas, seja servindo-se à vontade de uma piscininha de heroína açucarada, os indivíduos que haviam passado por forte estresse (algo comum entre cobaias de laboratório). Se os ratinhos tinham a oportunidade de brincar numa espécie de “Disney World” murídea e interagir com seus semelhantes, procuravam bem menos os estímulos artificiais.
Na verdade, avanços na neurociência mostraram que as coisas são muito mais complicadas do que se supunha. A dopamina está longe de ser o único neurotransmissor envolvido nos mecanismos de vício. E ela também não está ligada apenas ao prazer, sendo acionada inclusive em situações de dor e repulsa. (Ela tem muito a ver com o aprendizado, inclusive por meio de experiências negativas).
Para Hart, não dá para pensar o problema das drogas desvinculado do contexto social em que ele ocorre. Analisando sua vida retrospectivamente (e com todas as limitações de evidências anedóticas), ele conclui que tudo o que costumamos atribuir ao universo do vício já ocorria em sua família sem a concorrência de drogas (exceto, é claro, o álcool), aí incluídas situações de violência doméstica, lares desfeitos, abandono escolar, envolvimento com crime, pobreza etc. Drogas como o crack podem certamente agravar tudo isso, mas não são sua causa.
O autor, contudo, vai ainda mais longe e numa série de experimentos de sua própria lavra, revela que mesmo viciados daqueles que diríamos estar no fim da linha conservam a capacidade de fazer escolhas racionais.
Para mostrar isso, ele recrutou dependentes que topassem passar algumas semanas vivendo num hospital em troca de tóxicos grátis. Tudo, é claro, com licença especial do governo para fornecer drogas a voluntários humanos no contexto de pesquisas. Hart conta que conseguia até imaginar as manchetes dos tabloides se tomassem conhecimento de seu trabalho: “trafica usa dinheiro de impostos para dar a crackentos e outros viciados o que eles querem”.
Bem, o experimento consistia em fornecer logo pela manhã a cada paciente uma dose que podia ser aleatoriamente generosa, muquirana ou um mero placebo. À tarde, o sujeito deveria decidir se iria repetir a ração matinal de seu estupefaciente favorito ou trocá-la por uma quantidade de dinheiro ou vales-compras.
Como o sagaz leitor já deve ter percebido, quando a dose “valia a pena” os “junkies” tendiam a repeti-la; quando não, optavam pelas alternativas com valor pecuniário. É exatamente o que faria um agente econômico racional. É mais um golpe poderoso contra o mito de que viciados fazem tudo o que estiver ao seu alcance para obter a droga.
E onde isso nos leva?
Bem, a política proibicionista hoje adotada é um contrassenso econômico, é extremamente ineficiente, prejudica o futuro de parcela expressiva dos jovens (e com claros vieses racistas) e se baseia em má ciência. O mistério é por que ainda a sustentamos. E a única explicação vagamente racional é que temos um medo tão irracional delas que fazemos tudo errado, com muito gosto.
PS – A fim de dedicar mais tempo a um projeto literário, suspendo por alguns meses a coluna online das quintas-feiras. Os textos da versão impressa continuam normalmente.
Nos últimos 100 anos, o mundo embarcou na onda proibicionista, declarando guerra aos estupefacientes e prometendo livrar o globo da chaga da dependência.
Em termos econômicos, nunca fez sentido apostar na repressão. Por razões matemáticas bastante precisas, o tráfico é um delito contra o qual a atuação policial é pouco efetiva. Ao menos em teoria, o sujeito que vai cometer um crime faz uma análise de riscos e benefícios. Ele calcula a chance de ser preso e a sopesa contra o lucro esperado. O papel da repressão é elevar o risco de aprisionamento, de modo que o perigo para o bandido supere o prêmio presumido.
O sistema funciona relativamente bem para crimes como roubo a banco, nos quais o valor do benefício não é afetado pela ação da polícia. No caso das drogas, entretanto, a repressão aumenta o risco para o traficante, mas também a recompensa, pois os preços dos entorpecentes tendem a subir sempre que o cerco se fecha.
O resumo da história é que investimos bilhões de dólares em unidades de combate ao tráfico que são intrinsecamente ineficientes e ainda tendem a aumentar os lucros e o poder de aliciamento dos barões da droga.
E a conta das despesas está apenas começando. Aos gastos com polícia devemos acrescentar as verbas destinadas a tratamento médico para os dependentes –o que pelo menos vale como uma boa ação– e aos presídios, cada vez mais apinhados de condenados por delitos relacionados a drogas.
Nos EUA, núcleo duro do proibicionismo, cerca de 500 mil dos 2,3 milhões de encarcerados estão nessa categoria. Só a manutenção dessa fatia específica dos presidiários consome US$ 12 bilhões anuais. E, diferentemente do que ocorre em relação ao tratamento médico, não dá para afirmar que a ação reverta em benefício da população afetada, muito pelo contrário. Os estudos mostram que a cadeia é um instrumento de baixa eficácia na recuperação do delinquente, mas quase perfeito para destruir o futuro de um jovem. Quem vai parar em uma, mesmo que por uma bobagem como vender um pouco de maconha para os amigos, corre o sério risco de ficar para sempre frequentando intermitentemente esse tipo de ambiente.
O único argumento de peso em favor de uma política mais dura para as drogas é o de que, se adotarmos o “liberou geral”, sobreviria o caos, já que a prevalência global do uso de drogas ilícitas, hoje estimada pela ONU em algo entre 3,6% e 6,9% da população adulta, tenderia a explodir quem sabe até batendo os mais de 40% dos usuários de álcool. Obviamente, seria natural esperar que, nessa situação, o número de dependentes também aumentaria expressivamente.
Pois até essa noção, que parece irresistivelmente lógica, vem sendo contestada nos últimos anos. Como já tive ocasião de mostrar neste espaço, existem duas “escolas” de pensamento.
Para os cientistas que gostam de frisar os aspectos bioquímicos da dependência, não há limite para o vício. Se submetermos uma dada população de ratos (ou pessoas) a um regime de ingestão forçada de cocaína ou álcool, teremos, ao cabo de poucas semanas de uso contínuo, 100% de dependentes, que experimentarão tolerância, “craving”, síndrome de abstinência na retirada e demais sintomas clássicos. Uma outra corrente de pesquisadores, entretanto, sustenta que, em condições “naturais” (isto é, sem que se submetam as infelizes cobaias à dieta do pó e da cachaça), os números ficam bem mais modestos.
Essa linha ganha um importante apoio com a publicação nos EUA de “High Price: A Neuroscientist’s Journey of Self-Discovery That Challenges Everything You Know About Drugs and Society” (preço alto: a jornada de autodescoberta de um neurocientista que desafia tudo o que você sabe sobre drogas e a sociedade), de Carl Hart.
Trata-se de um livro singular. Hart é neurocientista e professor de psicologia em Columbia, uma das mais prestigiadas universidades dos EUA. Desenvolve, como veremos, interessantes pesquisas sobre o comportamento de dependentes. Mas ele também é negro, nascido na pobreza, que viveu toda a juventude nos piores bairros de Miami e que flertou bem de perto com o tráfico e outras modalidades criminosas. Em “High Price”, o autor combina sua rica experiência pessoal com dados estatísticos e os novos trabalhos científicos sobre drogas para sustentar que quase todas as ideias comumente aceitas sobre o problema estão erradas.
Evidentemente, nem vale a pena tentar resgatar aqui os aspectos biográficos da obra. Basta registrar que ele consegue imprimir ao texto um tom romanesco, que nos faz querer ler tudo numa sentada só. Em relação aos argumentos utilizados, há vários que merecem ser destacados.
Para começar, Hart mostra que devemos desconfiar de quase tudo o que nos ensinam sobre drogas nas campanhas de prevenção, que geralmente estão baseadas mais em mitos do que em boa ciência. Você já deve ter ouvido, por exemplo, que basta usar crack uma vez para tornar-se um viciado maltrapilho que terminará seus dias na sarjeta.
Bem, é mentira. Mais de 75% dos usuários de crack, a exemplo dos de heroína e outras drogas tidas como especialmente perversas, jamais se torna dependente da substância. Se queremos entender o problema de forma completa, não podemos perder de vista o espaço amostral. Os cientistas passaram as últimas décadas olhando tão de perto para os casos patológicos que deixaram de considerar a ampla maioria de usuários que não tem sua vida significativamente prejudicada pelo hábito.
Hart traça a origem do mito do vício fatal às teorias de Roy Wise e George Koob de que todas as drogas, independentemente de seu princípio ativo, atuavam sequestrando os centros de prazer e recompensa, notadamente o nucleus accumbens, que se veria de tal forma estimulado por megatorrentes de dopamina que não permitiria ao cérebro fazer outra coisa que não concentrar-se em conseguir a próxima dose. Por ela, o sujeito mataria e se prostituiria.
A ilustração desse mecanismo seria o célebre experimento de James Olds e Peter Milner dos anos 50 em que ratos que tinham a oportunidade puxar uma alavanca que acionava descargas elétricas que, através de eletrodos implantados em seus cérebros, estimulavam a liberação de dopamina nos centros de prazer se empenhavam tanto nessa tarefa que cessavam todas as outras atividades, incluindo sexo e alimentação. Eles morriam, no que seria um modelo para os perigos do vício.
Segundo Hart, essas experiências foram reproduzidas e verificou-se que sua descrição fora um pouco exagerada. Não eram todos os ratos que caíam nessa. Na verdade, em geral só embarcavam no comportamento patológico, seja ao puxar alavancas, seja servindo-se à vontade de uma piscininha de heroína açucarada, os indivíduos que haviam passado por forte estresse (algo comum entre cobaias de laboratório). Se os ratinhos tinham a oportunidade de brincar numa espécie de “Disney World” murídea e interagir com seus semelhantes, procuravam bem menos os estímulos artificiais.
Na verdade, avanços na neurociência mostraram que as coisas são muito mais complicadas do que se supunha. A dopamina está longe de ser o único neurotransmissor envolvido nos mecanismos de vício. E ela também não está ligada apenas ao prazer, sendo acionada inclusive em situações de dor e repulsa. (Ela tem muito a ver com o aprendizado, inclusive por meio de experiências negativas).
Para Hart, não dá para pensar o problema das drogas desvinculado do contexto social em que ele ocorre. Analisando sua vida retrospectivamente (e com todas as limitações de evidências anedóticas), ele conclui que tudo o que costumamos atribuir ao universo do vício já ocorria em sua família sem a concorrência de drogas (exceto, é claro, o álcool), aí incluídas situações de violência doméstica, lares desfeitos, abandono escolar, envolvimento com crime, pobreza etc. Drogas como o crack podem certamente agravar tudo isso, mas não são sua causa.
O autor, contudo, vai ainda mais longe e numa série de experimentos de sua própria lavra, revela que mesmo viciados daqueles que diríamos estar no fim da linha conservam a capacidade de fazer escolhas racionais.
Para mostrar isso, ele recrutou dependentes que topassem passar algumas semanas vivendo num hospital em troca de tóxicos grátis. Tudo, é claro, com licença especial do governo para fornecer drogas a voluntários humanos no contexto de pesquisas. Hart conta que conseguia até imaginar as manchetes dos tabloides se tomassem conhecimento de seu trabalho: “trafica usa dinheiro de impostos para dar a crackentos e outros viciados o que eles querem”.
Bem, o experimento consistia em fornecer logo pela manhã a cada paciente uma dose que podia ser aleatoriamente generosa, muquirana ou um mero placebo. À tarde, o sujeito deveria decidir se iria repetir a ração matinal de seu estupefaciente favorito ou trocá-la por uma quantidade de dinheiro ou vales-compras.
Como o sagaz leitor já deve ter percebido, quando a dose “valia a pena” os “junkies” tendiam a repeti-la; quando não, optavam pelas alternativas com valor pecuniário. É exatamente o que faria um agente econômico racional. É mais um golpe poderoso contra o mito de que viciados fazem tudo o que estiver ao seu alcance para obter a droga.
E onde isso nos leva?
Bem, a política proibicionista hoje adotada é um contrassenso econômico, é extremamente ineficiente, prejudica o futuro de parcela expressiva dos jovens (e com claros vieses racistas) e se baseia em má ciência. O mistério é por que ainda a sustentamos. E a única explicação vagamente racional é que temos um medo tão irracional delas que fazemos tudo errado, com muito gosto.
PS – A fim de dedicar mais tempo a um projeto literário, suspendo por alguns meses a coluna online das quintas-feiras. Os textos da versão impressa continuam normalmente.
Hélio Schwartsman é
bacharel em filosofia, publicou “Aquilae Titicans – O Segredo de
Avicena – Uma Aventura no Afeganistão” em 2001. Escreve na versão
impressa da Página A2 às terças, quartas, sextas, sábados e domingos e
às quintas no site.
Usuários de maconha não têm uso maior de serviços de saúde, diz pesquisa
Revista Galileu
589 adultos que usam drogas (não só maconha) foram questionados sobre a frequência de uso de drogas, a frequência com que visitam o pronto-socorro e com que sofrem hospitalizações, além de outras informações sobre diagnósticos médicos e sua saúde em geral.
84% dos estudantes afirmaram que usam maconha, 25% faz uso de cocaína, 23% de opióides e 8% de outras drogas. Desse total, 58% usa apenas maconha. E os pesquisadores não encontraram diferença no uso de serviços de saúde nem na saúde geral entre aqueles que usam maconha todo dia e quem não usa a droga.
O médico que conduziu a pesquisa, Daniel Fuster, disse que embora eles não tenham comparado usuários de maconha a não-usuários, ele afirma que é muito baixo o efeito detectado do uso de maconha na saúde e no uso de serviços de saúde de um usuário.
*coletivoDar
Pesquisadores dos EUA não encontraram diferença na saúde geral entre aqueles que usam maconha todo dia e quem não usa a droga
por Ana Freitas Com a legalização da maconha se tornando uma realidade em cada vez mais estados nos EUA, há uma preocupação crescente em descobrir os impactos dessa medida na saúde pública. Com a legalização, no entanto, fica mais fácil registrar e estudar usuários da droga, e foi isso que a Universidade de Boston fez para descobrir que não há uma associação entre a frequência do uso de maconha e a saúde ou um maior uso dos serviços de saúde por parte do usuário.589 adultos que usam drogas (não só maconha) foram questionados sobre a frequência de uso de drogas, a frequência com que visitam o pronto-socorro e com que sofrem hospitalizações, além de outras informações sobre diagnósticos médicos e sua saúde em geral.
84% dos estudantes afirmaram que usam maconha, 25% faz uso de cocaína, 23% de opióides e 8% de outras drogas. Desse total, 58% usa apenas maconha. E os pesquisadores não encontraram diferença no uso de serviços de saúde nem na saúde geral entre aqueles que usam maconha todo dia e quem não usa a droga.
O médico que conduziu a pesquisa, Daniel Fuster, disse que embora eles não tenham comparado usuários de maconha a não-usuários, ele afirma que é muito baixo o efeito detectado do uso de maconha na saúde e no uso de serviços de saúde de um usuário.
*coletivoDar
Carro movido a oxigênio pode percorrer até 200 quilômetros
Jornal GGN – Uma montadora indiana desenvolveu um protótipo de veículo “sustentável”, movido de forma limpa, que pode percorrer até 200 quilômetros em uma velocidade média de 80 km/h. O veículo é alimentado por ar comprimido. Apesar de não representar um conceito novo, o AIRPod pode ser o primeiro modelo de veículo automotor considerado viável com esse tipo de tecnologia, sob a perspectiva da indústria automobilística.
Segundo a empresa, o veículo – que de tão pequeno e compacto é comparado ao robô R2D2 da franquia "Star Wars" – representa um passo importante para “encorajar” a indústria a investir mais nesse tipo de alimentação veicular: a tecnologia é totalmente limpa, que não causa danos ao meio ambiente, ao contrário dos veículos movidos a derivados de petróleo.
A montadora Tata afirma que o carro tem “praticamente” taxa zero de emissões, e o custo do combustível é de apenas 2,5 centavos de euro por quilômetro rodado. O pequeno carro, que pode acomodar até três pessoas, já é considerado por analistas como “um dos veículos econômica e ambientalmente amigáveis no mundo”. Segundo a empresa, há três possibilidades de recarga do tanque, que pode armazenar cerca de 175 litros de ar comprimido. A primeira é a recarga em casa, com sistemas próprios de abastecimento, enquanto a segunda seria em postos especialmente criados para esse fim. A terceira – e mais interessante – é a recarga automática enquanto o carro está em movimento: um motor elétrico suga o ar do lado de fora para abastecer o tanque.
O preço estimado para o AIRPod é de cerca 7.000 euros. A empresa diz ainda que os baixos custos de fabricação, somados aos baixos custos de abastecimento, podem criar uma indústria mundial que pode mudar o cenário atual das grandes cidades. Além disso, diz a empresa, o veículo facilmente venceria “a maioria dos carros inteligentes do mercado”.
*Nassif
Mujica da uma aula de elevada sabedoria e critica sociedade capitalista em discurso na ONU
Mujica da uma aula de elevada sabedoria e critica sociedade capitalista em discurso na ONU
O
presidente do Uruguai, José Mujica, criticou duramente o consumismo
durante seu discurso na 68º Assembleia Geral da ONU, em Nova York, nesta
terça-feira (24/09). “O deus mercado organiza a economia, a vida e
financia a aparência de felicidade. Parece que nascemos só para consumir
e consumir. E quando não podemos, carregamos frustração, pobreza e
autoexclusão”, afirmou.
No
discurso, que durou 40 minutos, ele também elogiou a utopia “de seu
tempo”, mencionou sua luta pelo antigo sonho de uma “sociedade
libertária e sem classes” e destacou a importância da ONU, que se traduz
para ele um “sonho de paz para a humanidade”.
Aos
jornais uruguaios, Mujica prometeu um “discurso exótico” e fugiu do
protocolo ao dizer que “tem angústia pelo futuro” e que nossa “primeira
tarefa é salvar a vida humana”. “Sou do Sul (...) e carrego
inequivocamente milhões de pessoas pobres na América Latina, carrego as
culturas originárias esmagadas, o resto do colonialismo nas Malvinas, os
bloqueios inúteis a Cuba, carrego a consequência da vigilância
eletrônica, que gera desconfiança que nos envenena inutilmente. Carrego a
dívida social e a necessidade de defender a Amazônia, nossos rios, de
lutar por pátria para todos e que a Colômbia possa encontrar o caminho
da paz, com o dever de lutar pela tolerância”.
A
humanidade sacrificou os deuses imateriais e ocupou o templo com o
“deus mercado, que organiza a economia, a vida e financia a aparência de
felicidade. Parece que nascemos só para consumir e consumir. E quando
não podemos, carregamos a frustração, a pobreza, a autoexclusão”. No
mesmo tom, ressaltou o fracasso do modelo adotado no capitalismo: “o
certo hoje é que para a sociedade consumir como um americano médio
seriam necessários três planetas. Nossa civilização montou um desafio
mentiroso”.
Para
o presidente, o atual modelo de civilização “é contra os ciclos
naturais, contra a liberdade, que supõe ter tempo para viver, (…) é uma
civilização contra o tempo livre, que não se paga, que não se compra e
que é o que nos permite viver as relações humanas”, porque “só o amor, a
amizade, a solidariedade, e a família transcendem”. “Arrasamos as
selvas e implantamos selvas de cimento. Enfrentamos o sedentarismo com
esteiras, a insônia com remédios. E pensamos que somos felizes ao deixar
o humano”.
Paz e guerra
“A
cada 2 minutos se gastam dois milhões de dólares em insumos militares.
As pesquisas médicas correspondem à quinta parte dos investimentos
militares”, criticou o presidente ao sustentar que ainda estamos na
pré-história: “enquanto o homem recorrer à guerra quando fracassar a
política, estaremos na pré-história”, defendeu.
Assim,
criamos “este processo do qual não podemos sair e causa ódio,
fanatismo, desconfiança, novas guerras; eu sei que é fácil poeticamente
autocriticarmos. Mas seria possível se firmássemos acordos de política
planetária que nos garantam a paz”. Ao invés disso, “bloqueiam os
espaços da ONU, que foi criada com um sonho de paz para a humanidade”.
O
uruguaio também abordou a debilidade da ONU, que “se burocratiza por
falta de poder e autonomia, de reconhecimento e de uma democracia e de
um mundo que corresponda à maioria do planeta”.
“Nosso
pequeno país tem a maior quantidade de soldados em missões de paz e
estamos onde queiram que estejamos, e somos pequenos”. Dizemos com
conhecimento de causa, garantiu o mandatário, que “estes sonhos, estes
desafios que estão no horizonte implicam lutar por uma agenda de acordos
mundiais para governar nossa história e superar as ameaças à vida”.
Para isso é “preciso entender que os indigentes do mundo não são da
África, ou da América Latina e sim de toda humanidade que, globalizada,
deve se empenhar no desenvolvimento para a vida”.
“Pensem
que a vida humana é um milagre e nada vale mais que a vida. E que nosso
dever biológico é acima de todas as coisas, impulsionar e multiplicar a
vida e entendermos que a espécie somos nós” e concluiu: “a espécie
deveria ter um governo para a humanidade que supere o individualismo e
crie cabeças políticas”.
O presidente do Uruguai, José Mujica,
criticou duramente o consumismo durante seu discurso na 68º Assembleia
Geral da ONU, em Nova York, nesta terça-feira (24/09). “O deus mercado
organiza a economia, a vida e financia a aparência de felicidade. Parece
que nascemos só para consumir e consumir. E quando não podemos,
carregamos frustração, pobreza e autoexclusão”, afirmou...
No
discurso, que durou 40 minutos, ele também elogiou a utopia “de seu
tempo”, mencionou sua luta pelo antigo sonho de uma “sociedade
libertária e sem classes” e destacou a importância da ONU, que se traduz
para ele um “sonho de paz para a humanidade”.
Aos jornais
uruguaios, Mujica prometeu um “discurso exótico” e fugiu do protocolo ao
dizer que “tem angústia pelo futuro” e que nossa “primeira tarefa é
salvar a vida humana”. “Sou do Sul (...) e carrego inequivocamente
milhões de pessoas pobres na América Latina, carrego as culturas
originárias esmagadas, o resto do colonialismo nas Malvinas, os
bloqueios inúteis a Cuba, carrego a consequência da vigilância
eletrônica, que gera desconfiança que nos envenena inutilmente.
Carrego a
dívida social e a necessidade de defender a Amazônia, nossos rios, de
lutar por pátria para todos e que a Colômbia possa encontrar o caminho
da paz, com o dever de lutar pela tolerância”.
A humanidade sacrificou os deuses imateriais e ocupou o templo com o “deus mercado, que organiza a economia, a vida e financia a aparência de felicidade. Parece que nascemos só para consumir e consumir. E quando não podemos, carregamos a frustração, a pobreza, a autoexclusão”. No mesmo tom, ressaltou o fracasso do modelo adotado no capitalismo: “o certo hoje é que para a sociedade consumir como um americano médio seriam necessários três planetas. Nossa civilização montou um desafio mentiroso”.
A humanidade sacrificou os deuses imateriais e ocupou o templo com o “deus mercado, que organiza a economia, a vida e financia a aparência de felicidade. Parece que nascemos só para consumir e consumir. E quando não podemos, carregamos a frustração, a pobreza, a autoexclusão”. No mesmo tom, ressaltou o fracasso do modelo adotado no capitalismo: “o certo hoje é que para a sociedade consumir como um americano médio seriam necessários três planetas. Nossa civilização montou um desafio mentiroso”.
Para
o presidente, o atual modelo de civilização “é contra os ciclos
naturais, contra a liberdade, que supõe ter tempo para viver, (…) é uma
civilização contra o tempo livre, que não se paga, que não se compra e
que é o que nos permite viver as relações humanas”, porque “só o amor, a
amizade, a solidariedade, e a família transcendem”. “Arrasamos as
selvas e implantamos selvas de cimento. Enfrentamos o sedentarismo com
esteiras, a insônia com remédios. E pensamos que somos felizes ao deixar
o humano”.
Paz e guerra
“A cada 2 minutos se gastam dois milhões de dólares em insumos militares. As pesquisas médicas correspondem à quinta parte dos investimentos militares”, criticou o presidente ao sustentar que ainda estamos na pré-história: “enquanto o homem recorrer à guerra quando fracassar a política, estaremos na pré-história”, defendeu.
Assim, criamos “este processo do qual não podemos sair e causa ódio, fanatismo, desconfiança, novas guerras; eu sei que é fácil poeticamente autocriticarmos. Mas seria possível se firmássemos acordos de política planetária que nos garantam a paz”. Ao invés disso, “bloqueiam os espaços da ONU, que foi criada com um sonho de paz para a humanidade”.
O uruguaio também abordou a debilidade da ONU, que “se burocratiza por falta de poder e autonomia, de reconhecimento e de uma democracia e de um mundo que corresponda à maioria do planeta”.
“Nosso pequeno país tem a maior quantidade de soldados em missões de paz e estamos onde queiram que estejamos, e somos pequenos”. Dizemos com conhecimento de causa, garantiu o mandatário, que “estes sonhos, estes desafios que estão no horizonte implicam lutar por uma agenda de acordos mundiais para governar nossa história e superar as ameaças à vida”. Para isso é “preciso entender que os indigentes do mundo não são da África, ou da América Latina e sim de toda humanidade que, globalizada, deve se empenhar no desenvolvimento para a vida”.
“Pensem que a vida humana é um milagre e nada vale mais que a vida. E que nosso dever biológico é acima de todas as coisas, impulsionar e multiplicar a vida e entendermos que a espécie somos nós” e concluiu: “a espécie deveria ter um governo para a humanidade que supere o individualismo e crie cabeças políticas”.
Paz e guerra
“A cada 2 minutos se gastam dois milhões de dólares em insumos militares. As pesquisas médicas correspondem à quinta parte dos investimentos militares”, criticou o presidente ao sustentar que ainda estamos na pré-história: “enquanto o homem recorrer à guerra quando fracassar a política, estaremos na pré-história”, defendeu.
Assim, criamos “este processo do qual não podemos sair e causa ódio, fanatismo, desconfiança, novas guerras; eu sei que é fácil poeticamente autocriticarmos. Mas seria possível se firmássemos acordos de política planetária que nos garantam a paz”. Ao invés disso, “bloqueiam os espaços da ONU, que foi criada com um sonho de paz para a humanidade”.
O uruguaio também abordou a debilidade da ONU, que “se burocratiza por falta de poder e autonomia, de reconhecimento e de uma democracia e de um mundo que corresponda à maioria do planeta”.
“Nosso pequeno país tem a maior quantidade de soldados em missões de paz e estamos onde queiram que estejamos, e somos pequenos”. Dizemos com conhecimento de causa, garantiu o mandatário, que “estes sonhos, estes desafios que estão no horizonte implicam lutar por uma agenda de acordos mundiais para governar nossa história e superar as ameaças à vida”. Para isso é “preciso entender que os indigentes do mundo não são da África, ou da América Latina e sim de toda humanidade que, globalizada, deve se empenhar no desenvolvimento para a vida”.
“Pensem que a vida humana é um milagre e nada vale mais que a vida. E que nosso dever biológico é acima de todas as coisas, impulsionar e multiplicar a vida e entendermos que a espécie somos nós” e concluiu: “a espécie deveria ter um governo para a humanidade que supere o individualismo e crie cabeças políticas”.
Do Opera Mundi
*militanciaviva
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