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Ser de esquerda é não aceitar as injustiças, sejam elas quais forem, como um fato natural. É não calar diante da violação dos Direitos Humanos, em qualquer país e em qualquer momento. É questionar determinadas leis – porque a Justiça, muitas vezes, não anda de mãos dadas com o Direito; e entre um e outro, o homem de esquerda escolhe a justiça.
É ser guiado por uma permanente capacidade de se estarrecer e, com ela e por causa dela, não se acomodar, não se vender, não se deixar manipular ou seduzir pelo poder. É escolher o caminho mais justo, mesmo que seja cansativo demais, arriscado demais, distante demais. O homem de esquerda acredita que a vida pode e deve ser melhor e é isso, no fundo, que o move. Porque o homem de esquerda sabe que não é culpa do destino ou da vontade divina que um bilhão de pessoas, segundo dados da ONU, passe fome no mundo.
É caminhar junto aos marginalizados; é repartir aquilo que se tem e até mesmo aquilo que falta, sem sacrifício e sem estardalhaço. À direita, cabe a tarefa de dar o que sobra, em forma de esmola e de assistencialismo, com barulho e holofotes. Ser de esquerda é reconhecer no outro sua própria humanidade, principalmente quando o outro for completamente diferente. Os homens e mulheres de esquerda sabem que o destino de uma pessoa não deveria ser determinado por causa da raça, do gênero ou da religião.
Ser de esquerda é não se deixar seduzir pelo consumismo; é entender, como ensinou Milton Santos, que a felicidade está ancorada nos bens infinitos. É mergulhar, com alegria e inteireza, na luta por um mundo melhor e neste mergulho não se deixar contaminar pela arrogância, pelo rancor ou pela vaidade. É manter a coerência entre a palavra e a ação. É alimentar as dúvidas, para não cair no poço escuro das respostas fáceis, das certezas cômodas e caducas. Porém, o homem de esquerda não faz da dúvida o álibi para a indiferença. Ele nunca é indiferente. Ser de esquerda é saber que este “mundo melhor e possível” não se fará de punhos cerrados nem com gritos de guerra, mas será construído no dia-a-dia, nas pequenas e grandes obras e que, muitas vezes, é preciso comprar batalhas longas e desgastantes. Ser de esquerda é, na batalha, não usar os métodos do inimigo.
Fernando Evangelista

sábado, janeiro 11, 2014

Mansões invadem praias no Guarujá, ricaços se apropriam do espaço público impunemente: a burguesia pode...




Viver no Brasil é "sonho" mundial




Morar no Brasil é 'sonho' internacional
 
O Brasil é um dos 12 países mais cobiçados para se morar, segundo uma série de pesquisas feitas em 65 nações pelo WIN - coletivo dos principais institutos de pesquisa do mundo - e tabulada pelo Estadão Dados. O crescimento econômico na última década, aliado à boa imagem cultural do País no exterior, fizeram com que o Brasil fosse citado como destino dos sonhos por moradores de dois em cada três países onde foi feito o estudo.
 
Na lista dos destinos mais cobiçados por quem não está feliz na terra natal, o Brasil é o único da América Latina, o único Bric (grupo formado por Brasil, Rússia, China e Índia) e a única nação ocidental em desenvolvimento. As pesquisas foram feitas no fim do ano passado e ouviram mais de 66 mil pessoas ao redor do globo. Elas foram questionadas se gostariam de morar no exterior se, hipoteticamente, não tivessem problemas como mudanças ou vistos e qual local elas escolheriam. Por isso, os resultados dizem mais sobre a imagem dos destinos mencionados do que com imigrantes em potencial.
 
 
Se esse desejo virasse realidade, o Brasil receberia em torno de 78 milhões de imigrantes nesse cenário hipotético. Mas, em um mundo sem fronteiras, a população do País diminuiria - 94 milhões de brasileiros se mudariam para outras nações, se pudessem. Ainda assim, 53% dos brasileiros não desejam emigrar, porcentual acima da média mundial.
 
Quem mais tem vontade de vir para o Brasil são os argentinos: 6% se mudariam para cá se tivessem a chance. O Brasil também está entre os cinco mais cobiçados por peruanos e mexicanos. Mas não são apenas latinos que gostariam de viver aqui. Os portugueses acham o Brasil mais atrativo do que a Alemanha, os italianos o preferem à França, os australianos o consideram o segundo país mais desejável, os libaneses o colocam em posição tão alta quanto a Suíça e até no longínquo Azerbaijão o Brasil aparece entre os quatro destinos mais sonhados, na frente até dos Estados Unidos.
*Nassif

Quem criou Sarney?



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Um leitor me envia um email engraçado, embora o assunto seja muito sério. Desde que Lula teve que se apoiar em Sarney, poderoso político nordestino, para construir a sua maioria no Senado, a Globo vem tentando detonar o velho cacique do Maranhão e sua família. 
Sempre é bom lembrar, contudo, que Sarney construiu seu poder através do domínio dos meios de comunicação de seu estado, sobretudo a Rede Mirante, que desde 1991 tem o direito de retransmissão da Globo.
Uma Lei de Mídia, que a Globo trata como um atentado à democracia, teria o poder de tirar a TV das mãos da família Sarney e, portanto, injetaria democracia num dos estados mais sofridos do país.
Lula teve que se aliar a Sarney, porque precisava de uma base de apoio no Senado para aprovar os programas sociais de governo, além dos aumentos do salário mínimo e ampliação de verbas para educação e saúde.  Já Roberto Marinho se associou a Sarney para manter sua hegemonia midiática sobre a política nacional. Pode-se dizer que os Sarney são uma espécie de sub-produto da Globo.
Ah, o email que recebi do leitor:
*
Veja só que belezura! E a Globo está detonando o Sarney para atingir a Dilma. Coisa feia…
“O senador José Sarney e Roberto Marinho foram amigos pessoais até o fim da vida do jornalista. Sarney era vice-presidente de Tancredo Neves e tinha a missão de concluir o processo de redemocratização do país, após a morte do político de São João del-Rei.
“Quando era presidente, Sarney visitava Roberto Marinho sempre que vinha ao Rio de Janeiro. As conversas giravam em torno da política maranhense, de apoio para a realização de eventos culturais, como exposições de arte, e assuntos pessoais. Sarney relembra: “A partir daí, foi se estabelecendo uma ligação mais estreita, mas sempre marcada, do meu lado, pela diferença de idade entre mim e o Dr. Roberto, o que dava um espaço muito grande, sempre com um tom reverencial em relação a ele.”
http://www.robertomarinho.com.br/vida/trajetoria/uma-trajetoria-liberal/jose-sarney.htm
*Tijolaço



    Um pequeno vídeo de Glauber é o melhor documento sobre a predação dos Sarneys no Maranhão


A posse, em 1966
A posse, em 1966
Gosto de uma passagem de Montaigne em que ele discorre sobre as virtudes da simplicidade ao falar.
Ele conta que, na Grécia antiga, um candidato fez um discurso longo para uma multidão, repleto de promessas e de truques retóricos.
Seu adversário disse apenas o seguinte: “O que ele prometeu eu vou fazer.”
A passagem cômica de Montaigne me ocorreu diante de uma situação trágica: o discurso de posse de Sarney quando ele estava assumindo o cargo de governador do Maranhão pela primeira vez, em 1966.
A cena foi imortalizada pela figura improvável de Glauber Rocha, que tinha sido convidado para registrar a posse de Sarney.
São dez minutos de um vídeo que resume a história do Maranhão, objeto de meio século de predação pela dinastia que então se iniciava.
Enquanto Sarney promete mudar tudo no Maranhão, a câmara de Glauber capta o povo miserável, sofrido, espoliado.
São imagens que transmitem uma imensa tristeza a quem as vê. Como a sociedade brasileira pode tolerar tanta miséria, tanta desigualdade?
O que o poder público federal fez pelos desvalidos maranhenses nestes anos todos? Deixou-os entregues aos Sarneys, essencialmente. O que a mídia fez? Nada. Rigorosamente nada.
A nobreza da mídia está em dar voz em quem não a tem. A nossa dá a quem já a tem em proporções colossais. No caso do Maranhão, a mídia deu voz sempre à família Sarney, e jamais às vítimas dela.
Passados quase cinquenta anos do documento de Glauber, a única mudança concreta no Maranhão foi o enriquecimento brutal da família Sarney, e sua onipresença nos nomes de aeroportos, escolas, hospitais, ruas e o que mais deva ser batizado.
São tenebrosos os índices de desenvolvimento social do Maranhão. Basta dizer que é a pior expectativa de vida do Brasil, que já não é uma das maiores do mundo.
Lembremos Montaigne e a história dos candidatos gregos.
Alguém transformador poderia pegar hoje o discurso de Sarney em 1966 e dizer: “O que ele prometeu eu vou fazer.”

Papa Francisco confessa: “Já fumei maconha quando jovem”


papa fumante.
O Santo Padre fez revelação em conversa privada com seus sacerdotes. Apesar de ter dado um tapinha, o Papa nao apoia a legalização na Argentina.
Não é segredo que a maconha permeia todos os níveis da sociedade. Ela é utilizada por médicos, juízes, professores… e porque não pelos padres? Melhor, porque não pelo Papa? Pois eis que Jorge Mario Bergoglio solta essa bomba, como quem não quer nada, deixando muita gente chocada.
Segundo o site italiano  Giornale Del Corriere, a afirmação foi feita durante um almoço com jovens sacerdotes que queriam saber mais sobre o que ele pensa sore temas modernos, especialmente em relação ao uso de drogas leves.
“Em 1954, quando eu era um segurança de um pé sujo em Córdoba, eu me permiti fumar um baseado oferecido por alguns amigos.”
O encontro foi por acaso em um curso da Missa Crismal da Quinta-feira Santa e no almoço que foi oferecido depois, pelo Bispo, juntamente com um grupo de sacerdotes, como regra uma antiga tradição.
O Papa Francisco, se juntou ao grupo de sacerdotes de surpresa. Na mesa, junto com o Santo Padre, estavam oito sacerdotes da diocese romana e ao conhecer os jovens sacerdotes, agiu de acordo com sua experiência como diretor espiritual no seminário, e respondeu uma série de perguntas feitas pelos jovens presentes.
“Eu não julgo quem usa drogas leves, mas não concordo com o governo argentino que vem trabalhando uma possível legalização, mesmo que em pequenas quantidades para uso pessoal.”
Soou meio hipócrita? Então segura essa: “É necessário promover a justiça, educar os jovens em valores que constroem uma vida comum, acompanhando quem esta em dificuldade e dando esperança de num futuro enfrentar o problema que envolve o seu uso, especialmente entre jovens que perderam o sentido da verdadeira alegria, assim como no consumismo e no paraíso artificial das drogas, e toda forma de alienação”, declarou o Papa Bergoglio.
Provavelmente ele quis lavar as mãos após a confissão que fez, afinal ele é a maior autoridade da Igreja Católica. Mas ser contra a legalização não muda o fato que el já deu uma bolinha e sabe o gostinho que a ganja tem.
*http://projetocharas.com/papa-francisco-confessa-eu-ja-fumei-maconha-quando-jovem/

A “descoberta” de uma conversa de John Kennedy e o embaixador Gordon remonta a um livro publicado em 2002

Internacional

Análise / Luiz Gonzaga Belluzzo

Que revelação é essa?

A “descoberta” de uma conversa de John Kennedy e o embaixador Gordon remonta a um livro publicado em 2002
 

Arquivo Pessoal
Kennedy e Jango
Kennedy e Jango na Casa Branca. O presidente norte-americano perguntou a Lincoln Gordon se os EUA poderiam “intervir militarmente” no Brasil para depor João Goulart
A imprensa brasileira noticiou na terça-feira, 7 de janeiro de 2014, a “descoberta” de uma gravação reveladora. O próprio Kennedy gravou a conversa com o embaixador americano no Brasil. Kennedy perguntou a Lincoln Gordon se os Estados Unidos poderiam “intervir militarmente” no Brasil para depor o presidente João Goulart. Os jornais proclamam que “a revelação feita pelo jornalista Elio Gaspari muda o entendimento da participação americana”. Às vésperas do famigerado golpe de Estado de 1964, surgiu um slogan premonitório: “Basta de intermediários, Lincoln Gordon para presidente”. Gordon era o embaixador dos Estados Unidos no Brasil.
Em seu livro A Segunda Chance do Brasil – subtítulo, A Caminho do Primeiro Mundo – publicado em 2002, Gordon relata uma reunião na Casa Branca com o presidente Kennedy: “Durante a reunião na Casa Branca, eu alertei o presidente Kennedy sobre a possibilidade de algum tipo de ação pelos militares brasileiros e ele perguntou qual deveria ser nossa atitude”. Depois de tergiversar, enrolar com considerações a respeito da admiração de Goulart pelo presidente americano, Gordon foi ao que interessava e concluiu: “O mais importante é ao mesmo tempo organizar as forças tanto políticas quanto militares para reduzir o poder de Goulart [...] ou, em uma situação extrema, destituí-lo, se as coisas chegarem a esse ponto, o que dependeria de uma ação explícita de sua parte. Minutos depois, Goodwin observou: ‘Podemos muito bem querer que eles (militares brasileiros) assumam o poder no fim do ano, se eles puderem fazer isso”. Richard Naradof Goodwin era, na ocasião, subsecretário de Estado para Assuntos Interamericanos.
Na nota de rodapé da página 325 da primeira edição do livro publicado pela Editora Senac, o embaixador Gordon escreve: “Para minha surpresa revelou-se recentemente que o presidente Kennedy tinha instalado um aparelho de gravação no Salão Oval. Nessa conversa de 30 de julho, que incluiu também Richard Goodwin, foi a primeira reunião a ser gravada. A transcrição tem muitos hiatos (sic), alguns por razões de segurança, outros porque certas passagens não puderam ser decifradas. A maior parte desse material está disponível agora nas páginas 9 a 25 de Timothy Naftali (org.) The Presidential Records, John F. Kennedy, The Great Crisis, vol. 1, 2001.”

Gordon conspirava abertamente com as “forças democráticas” nativas, aquelas que estão permanentemente arquitetando a supressão da democracia. Da conspirata participavam naturalmente os homens de bem: ricos de todos os gêneros, parte da classe média ilustrada, semi-ilustrada e deslustrada. Até mesmo os habitantes de outras galáxias sabiam que senhores da mídia tupiniquim estavam metidos até a raiz dos cabelos nas conversações e maquinações conspiratórias articuladas por Gordon. É surpreendente que manifestem surpresa com as palavras de Kennedy registradas na gravação. Mas, como sugere Woody Allen em um de seus filmes, “tudo pode acontecer”.

Segue o enterro: a situação política, continua Gordon, “me levou a endossar a sugestão da CIA de que fornecesse dinheiro a candidatos amigáveis”. Para tanto, a agência americana de espionagem e informação valeu-se do Ibad, o Instituto Brasileiro de Ação Democrática, criado em 1959 por um certo Ivan Hasslocher com o propósito de combater o governo Juscelino, que, sabem todos, era um perigoso aliado do comunismo internacional.
Os Estados Unidos já haviam patrocinado a deposição de Arbenz na Guatemala e instigaram a queda de Perón na Argentina. O suicídio de Getúlio, em 1954, e a coragem do então general Henrique Batista Duffles Teixeira Lott, ministro da Guerra, em 11 de novembro de 1955, abortaram as tentativas de interrupção da normalidade institucional no Brasil. Mas, em março de 1964, o País entrou finalmente no roteiro dos “golpes democráticos” gestados em Washington.
O resto da história os brasileiros maiores de 50 anos sabem: duas décadas de ditadura militar, cevada e sustentada pelo Departamento de Estado. Está mais do que provado há tempos que a participação da CIA e de outras agências americanas no golpe foi decisiva. Os americanos foram generosos na transferência de tecnologia: enviaram experts nas técnicas de tortura, conforme depoimento insuspeito e digno de muitos oficiais brasileiros que se recusaram a compactuar com os desatinos do regime autoritário.
É bom abrir o olho. Quando essa turma e seus institutos falam de liberdade, está preparando a “cama” para os adversários políticos. Gordon gostava de fumar cachimbo. Dizem que, já morto, ainda tem a boca torta.

*FlaviaLeitão

A conta corrente aberta para a contribuição ao Genoino é

Via Ze Carlos Guarani Kaiowá da Silva
Compartilhar para Informar; Conhecer para ter Posição
Foto de Regina Schmitz.
Foto de Regina Schmitz.
A conta corrente aberta para a contribuição ao Genoino é: José Genoino Neto, Caixa Econômica Federal - Agência: 0269, Conta Poupança: 013.22277-7.

Somos todos cúmplices da tragédia no presídio de Pedrinhas, no Maranhão



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Do El País

A tragédia do presídio Pedrinhas mostra o respaldo popular às políticas penitenciárias mais ineficientes do mundo

A tragédia no presídio de Pedrinhas, no Maranhão, onde, desde 2013, 62 pessoas foram mortas de maneira brutal, é o resultado de uma operação friamente calculada e respaldada por uma opinião pública que, de maneira perversa, aposta num sistema prisional inaceitável, ilegal e ineficiente.
Os responsáveis por tragédias assim estão entre as autoridades públicas: governadores, juízes e promotores. Mas os cúmplices somos todos nós, que não queremos ou não conseguimos mudar um sistema que conserva intacto, com rigor arqueológico, os mesmos métodos e as mesmas condições que existiam nas masmorras da Idade das Trevas.
Em Pedrinhas, uma das vítimas foi imobilizada e, ainda viva, assistiu à dissecação de sua própria perna, até a morte, enquanto a cena era gravada por celular. Outra foi punçada diversas vezes com a ponta de um espeto. Três foram decapitadas. Em comum, o fato de estarem enjauladas, sob tutela do Governo do Estado do Maranhão, e com o pretexto de serem reeducadas. O local tem capacidade para 1.700 pessoas, mas abriga 2.500.
Não é a primeira vez que a opinião pública se escandaliza com fatos assim. Há cinco anos, Conectas projetou para diplomatas do mundo inteiro, na ONU, em Genebra, fotos de presídios do Espírito Santo onde corpos humanos apareciam desmembrados em carrinhos de roupa suja. No horror capixaba, presos eram mantidos em contêineres metálicos lacrados, sob um sol abrasador. Quando a porta era aberta, vários caíam desacordados para o lado de fora.
Tragédias como essas se repetem sazonalmente no Brasil. São como as chuvas de verão que, todo ano, com data marcada, desabam com a força do descaso sobre milhares de mortos, num tsunami previsível. Aos poucos, estas hecatombes se incorporam ao calendário brasileiro, como o Carnaval ou os campeonatos de futebol.
Isso só é possível porque existe respaldo público. Num País em que a maioria dos 548 mil presos são negros ou pardos, pobres e moradores da periferia, a classe média e a elite não se importam de ter seus semelhantes enjaulados, literalmente defecando uns sobre os outros. Muitos dos que dão de ombros para estas violações têm a ideia mágica de que pessoas presas passam sem volta para um universo distante. Deveriam saber que as prisões no Brasil são absolutamente ineficientes. Funcionam como uma porta giratória, com índice de reincidência superior a 60%, na qual, de passagem, o preso é aliciado por grupos criminosos organizados e sofre todo tipo de brutalidade antes de voltar para a rua.
A obsessão brasileira em prender e maltratar presos bate recordes mundiais. Em 20 anos, o País teve um aumento de 380% no número de presos.
Construímos um sistema ilegal de prisões. Nele, violamos sistematicamente leis e garantias constitucionais. Trata-se de um ciclo vicioso, onde todos perdem. O processo de investigação é pífio – menos de 8% dos homicídios sequer são investigados. Com isso, a ferramenta principal das prisões – quase 40% provisórias – é a suspeita, quase sempre dirigida ao jovem negro de periferia. Este é, curiosamente, o mesmo perfil de quem não tem acesso à Justiça, pois não pode pagar um advogado e dependerá de um defensor público que, em São Paulo, é responsável por levar adiante, sozinho, entre 8 e 10 mil processos semelhantes. O número mostra que nem o Estado mais rico da Federação está livre das mazelas prisionais. São Paulo tem 80 novos presos por dia e sequer criou o Mecanismo Estadual de Prevenção e Combate à Tortura, o que daria efetividade ao compromisso que havia sido assumido pelo Estado Brasileiro há sete anos na ONU.
O argumento de que não podemos construir uma sociedade baseada em valores inumanos já é, por si, irrefutável. Mas, caso ainda existam sádicos que apoiem estes horrores, é preciso que saibam o quanto a construção de um sistema prisional como este acabará por construir, em pouco tempo, uma sociedade cada vez mais brutal, desumana e irreconciliável.
Lucia Nader, 36, diretora executiva da Conectas Direitos Humanos e Marcos Fuchs, 50, diretor adjunto da Conectas Direitos Humanos e membro do CNPCP (Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária).
*coletivoDar.org

A elite que envergonha o Brasil




Com 24 anos de carreira, Rubens Valente é um dos repórteres mais premiados do Brasil. Rigoroso na apuração dos fatos, fiel na interpretação dos acontecimentos, construiu uma carreira respeitada no jornalismo. Durante mais de dois anos, Valente se dedicou à investigação que resultou no livro “Operação Banqueiro” (462 páginas, R$ 44,90, Geração Editorial), um mergulho nos documentos e bastidores da Satiagraha. O subtítulo da obra resume o conteúdo escrito com habilidade e independência: “Uma trama brasileira sobre poder, chantagem, crime e corrupção. A incrível história de como o banqueiro Daniel Dantas escapou da prisão com apoio do Supremo Tribunal Federal e virou o jogo, passando de acusado a acusador”. A análise do livro pode ser lida na edição impressa de CartaCapital que chega às bancas nesta sexta-feira 10. Na entrevista a seguir, Valente fala do papel do então presidente do STF, Gilmar Mendes, na campanha contra a operação policial e a favor de Dantas e desmonta algumas versões mentirosas alimentadas com o único intuito de anular a condenação do banqueiro a 10 anos de prisão por suborno.“Operação Banqueiro” é uma ode à verdade factual e presta um grande serviço à democracia e ao jornalismo.
Blog do Briguilino: Na sua longa carreira de repórter, você se lembra de uma operação tão combatida quanto a Satiagraha?
Rubens Valente: O aspecto mais grave foi a interdição da investigação, a impossibilidade de as autoridades levarem a apuração inteira até o final.
Em termos gerais, a regra do jogo do processo penal no Brasil é simples: o delegado aponta evidências, o procurador acusa ou não, o juiz julga. Ao longo do processo, o réu se defende. Em caso de inocência, após o processo o réu pode buscar a punição dos responsáveis por um eventual erro judicial. Mas no caso  da Satiagraha, o delegado foi proibido de investigar e o juiz foi impedido de julgar. O sistema foi brutalmente bloqueado, de modo a não funcionar, a não concluir sequer a apuração inicial. Ao longo de 24 anos como repórter, li e acompanhei algumas dezenas de inquéritos policiais. Mas nunca vi uma inversão de fatores tão dramática e na dimensão deste caso. Eu só posso qualificar o rumo dos acontecimentos como espantoso. Que dizer de um cidadão que não chega a ser julgado, mas em poucos meses passa a acusador em um processo contra o próprio delegado e o próprio juiz que o prenderam? É o sonho de todo investigado. As instituições estão em risco quando um acusado consegue impedir que a atribuição de um fato criminoso seja devidamente apurada até o fim pelos órgãos públicos. O bloqueio da Satiagraha foi um dos principais motivos do meu empenho neste livro, inclusive financeiro, pois todos os gastos, incluindo as viagens a três capitais e cópias de documentos, foram bancados com as minhas próprias economias.
BB: Daniel Dantas não só conseguiu anular na Justiça a operaçao como leis e regras judiciais foram mudadas depois da ação policial, entre elas o uso de algema (a Lei Dantas), que passou a ser disciplinado. De onde provém tanto poder?
RV: Até 2010, o Opportunity sequer constava nas listas de doadores das principais campanhas eleitorais registradas na Justiça eleitoral. Estranho que uma empresa com tantas relações no meio político não tenha colaborado para eleições até aquele ano. Mas certa vez um advogado de Dantas o descreveu como um indivíduo com boas relações com o Congresso, com os poderosos, uma pessoa “que se vira".  De fato, as relações de Dantas com políticos parece ser um traço fundamental na sua trajetória. Mas isso não explica tudo. No livro procurei descrever as relações de amizade e acadêmicas de advogados de Dantas e do banco Opportunity com o ministro do Supremo Gilmar Mendes. Que durante a presidência do STF disse abertamente se opor ao que chamava de abusos do Ministério Público e da Polícia Federal. As coisas se juntaram. Sem Mendes na presidência do Supremo, nem todo o prestígio de Dantas teria sido capaz de reverter o jogo de forma tão espetacular. A alteração de regramentos se deveu ao empenho pessoal de Mendes, que chegou a convocar um “pacto social” e chamar o presidente da República “às falas”. Ele se tornou um ator fundamental no processo de desqualificação da Satiagraha. Partiu do Supremo o vazamento de um relatório, depois desmontado pelos fatos, que sugeria a existência de grampo sobre autoridades do tribunal. E partiu de Mendes a decisão de acolher a tese de que o juiz Fausto De Sanctis havia se “insurgido” contra o Supremo pelo simples fato de ter ordenado uma segunda ordem de prisão contra Dantas. Como se um juiz não pudesse julgar de acordo com sua consciência. A ideia de uma suposta “rebeldia” comoveu outros ministros do STF, que chegaram a falar em “união” em defesa do tribunal. Como se o Supremo fosse um clube no qual os filiados devem “defender” uns aos outros, e não meramente analisar fatos e provas.
BB: A introdução de “Operação Banqueiro” cita excessos e equívocos do delegado Protógenes Queiroz. Essas falhas eram suficientes para anular o processo?
RV: A defesa do banqueiro se aproveitou dessas falhas. Mas o delegado muito mais acertou do que errou. Ele acertou ao elaborar e colocar em prática um plano que levou à documentação da oferta de suborno e à apreensão do dinheiro que seria usado como propina para ele e outro delegado do caso. Foi uma situação arriscada, que ele soube concluir com sucesso. Acertou ao conseguir uma ampla interceptação de telefones e de comunicações por internet com ordem judicial que trouxe evidências importantes para a investigação. Acertou ao não se dobrar às dificuldades do inquérito, que tratava de temas variados e de certa complexidade técnica. Esses méritos, porém, foram ofuscados pela intensa campanha de desmoralização que ele e a Satiagraha sofreram em diversos níveis e por diferentes meios. Seus erros, por mais banais, acabaram amplificados à exaustão. Por quê? Porque ele era a peça mais fraca do inquérito, havia sido abandonado à própria sorte pela sua instituição, a Polícia Federal. Qualquer jornalista com alguma experiência em processos judiciais sabe que todo e qualquer inquérito policial, todo e qualquer, repito, contém certa dose de erros, imprecisões ou conclusões sem rigorosa base nos fatos. Mas o trabalho de um delegado é apenas uma parte do processo. O sistema judicial possui freios e contrapesos que permitem que as opiniões do delegado sejam verificadas por outras instâncias, a saber: o Ministério Público, o juiz e os advogados dos réus. O beabá de um advogado criminalista é descobrir esses erros e, por meio deles, tentar obter alguma vitória judicial, na estratégia de convencer o Judiciário sobre as “ilegalidades” da polícia. O jornalista isento que ler com paciência o inquérito da Satiagraha vai concluir que os erros cometidos pelo delegado ao longo da operação, talvez o principal deles tenha sido pedir a colaboração de agentes da Abin sem um respaldo superior da direção da Polícia Federal, jamais teriam a capacidade de levar à anulação da operação. Em situações normais de temperatura e pressão, seus erros poderiam ser censurados e corrigidos, mas não teriam qualquer repercussão em termos de legalidade.
BB: Ao longo da apuração, você encontrou alguma prova ou indício de que o então presidente do STF, Gilmar Mendes, ou algum integrante do tribunal foi grampeado pela Policia Federal ou pela Abin?
RV: Sob vários pontos de vista (jornalístico, técnico, jurídico e mesmo ético), não é mais possível aceitar que essa suspeita continue a ser veiculada como fato, pois todas as imensas e complicadas investigações desencadeadas por diferentes órgãos públicos jamais localizaram qualquer prova material de grampo telefônico ou ambiental sobre qualquer ministro do STF. Eu cuidei de verificar esse ponto quase à exaustão. Ouvi com atenção e a necessária dose de desconfiança integrantes da Operação Satiagraha, li as conclusões das investigações policiais, vi os laudos do material apreendido. Não há uma linha sequer sobre constatação de grampo contra autoridades do Supremo. Esses são os elementos concretos que integram o processo. Fora disso, só mesmo a paranóia, alimentada por um estranho silêncio das autoridades encarregadas de verificar a existências desses supostos grampos. A Polícia Federal e a Procuradoria Geral da República sabem muito bem que não existe prova alguma dos grampos, mas até hoje, mais de cinco anos depois, jamais vieram a público fazer o desmentido cabal. Nunca prestaram contas das investigações. Esse ato de transparência deveria ter ocorrido há muito tempo, pois instituições e figuras públicas foram colocadas em xeque.
BB: E quanto as supostas ilegalidades cometidas pela Abin?
RV: Li e reli várias vezes os diversos depoimentos e documentos que integram a Satiagraha e o inquérito aberto para apurar a participação da Abin. A única conclusão possível é que a Abin não usurpou o papel de investigação consagrado pela Constituição às polícias. A Abin não interceptou nenhum telefonema, não tomou nenhum depoimento e não requisitou ao juiz do caso nenhuma medida de qualquer natureza. Em suma, os agentes da Abin em momento algum conduziram o inquérito. Por todo o tempo a investigação continuou presidida pela autoridade policial, com a devida fiscalização do Ministério Público e sob os olhares do Judiciário. O papel dos agentes da Abin se restringiu a acompanhar e fotografar alvos nas ruas, ler emails interceptados por ordem judicial, transcrever conversas interceptadas com ordem judicial. Ou seja, era um papel meramente auxiliar. Um trabalho braçal. No pen drive do delegado Protógenes foram apreendidos também documentos em word produzidos por agentes da Abin sobre algumas autoridades. Esses papéis, que incluem dados delirantes e informações de difícil comprovação, jamais foram anexados à Satiagraha. São imprestáveis como prova, tanto que o delegado não os juntou ao inquérito. E foi apenas esse o papel da Abin. Por que a eventual participação de agentes da Abin em certo ponto do inquérito poderia ser capaz de anular a operação inteiraa? Não há uma única participação, nem mesmo lateral, de agentes da Abin no episódio do suborno de dois delegados federais. A alegação de que a mera e pontual ajuda de alguns agentes da Abin em qualquer ponto da investigação seja capaz de anular um processo inteiro é inteiramente risível. É, na verdade, um tapa na cara dos cidadãos brasileiros pagadores de impostos e cumpridores das leis. Os advogados falam na teoria importada dos EUA dos “frutos da árvore contaminada”. Diz a tese que um processo gerado por uma prova ilícita deve ser anulado pelo vício na origem. Ocorre que a participação dos agentes da Abin n Satiagraha nada teve a ver com a origem do processo, foi sempre posterior, e portanto a teoria é totalmente inválida.
BB: Dantas já foi condenado fora do Brasil. Cortes britânicas e norte-americanas se referiram a ele em termos duros e o acusaram de fraude, entre outro crimes. No Brasil, a despeito da anulação posterior (agora em analise no Supremo), ele foi condenado em primeira instancia por suborno. Seu nome também tem sido citado nos principais escândalos da era FHC e Lula. Ele continua, porém, a ser tratado em diversos círculos e por considerável parcela da mídia como um "empresário polêmico". E apenas isso. Pelo seu livro, conclui-se que ele e mais do que polêmico, certo?
RV: Dantas e o banco Opportunity aparecem referidos em diversos escândalos nos últimos anos: grampos do BNDES e as privatizações, caso do extinto banco Banestado, investigação privada da Kroll e a Operação Chacal, CPI dos Correios e o mensalão e, por fim, a Operação Satiagraha. Essa sequência de acontecimentos coloca o banqueiro como um dos principais personagens da história brasileira contemporânea. Tratá-lo como “polêmico” é um resumo pobre e impreciso. Ele foi acusado e investigado não por suas supostas “polêmicas”, mas por fatos e atos que podem e devem ser averiguados.
BB: As relações de Dantas com o PSDB foram retratadas em varias reportagens e livros ao longo das ultimas décadas. "Operação Banqueiro" acrescenta novas e interessantes provas dessa relação umbilical. O banqueiro, por outro lado, sempre se declarou perseguido pelo PT, mas os interesses do Opportunity e do partido se entrelaçam na Satiagraha. Você chegou a buscar explicações para os motivos de os petistas terem saído em apoio ao banqueiro e participarem da força tarefa para desacreditar a operação?
RV: A Satiagraha veio a público em abril de 2008, no mesmo período de intensas negociações entre os fundos de pensão ligados ao PT, a telefônica Oi e o banqueiro com vistas à criação da gigante da telefonia BrOi. Havia um interesse público e manifesto do governo na criação da nova supertele, uma operação que acabou possível após um ato do próprio presidente Lula. Creio que as investigações da Satiagraha chegaram num péssimo momento para os interesses do governo, que queria logo concluir aquela fusão. Isso pode ter contribuído para a extrema má vontade do governo em relação ao inquérito policial. Por outro lado, Dantas havia conseguido se aproximar de petistas históricos. No livro procurei descrever o papel de dois desses petistas no processo de criação da BrOi. Houve um segundo fato: em 2008, a Polícia Federal havia incomodado muitos interesses de políticos de vários partidos, incluindo petistas e integrantes da base aliada. E a “tolerância” do PT e do governo em relação à PF havia chegado ao ponto máximo um ano antes, quando uma equipe de policiais invadiu a casa do irmão de Lula na Grande São Paulo. Por sua vez, Lula havia superado, do ponto de vista da sua imagem diante o eleitorado, o trauma da acusação do mensalão, e não estava tão dependente das ações espetaculares da polícia, que davam ao governo um discurso anti-corrupção.
BB: Dantas recorre a uma teoria conspiratória para se defender. Diz-se vitima da união de interesses políticos e econômicos de integrantes do PT, seu desafeto Luis Roberto Demarco e a Telecom Italia. Ele tem usado esse argumento para tentar influenciar processos contra ele no Brasil.  Nos últimos anos, ele e seus advogados se referem a um inquérito em Milao que investigou e puniu funcionários da Telecom Italia por espionagem. Esse inquérito sempre é evocado em diversos processos pelo Opportunity. Ao longo de sua pesquisa, encontrou alguma evidência dessa conspiração ou alguma relação entre os processos no Brasil e a investigação italiana?
RV: Tive acesso e verifiquei milhares de páginas que integram a investigação realizada na Itália, incluindo os extensos depoimentos dos principais envolvidos. Como digo no livro, o Opportunity enfrenta sérias e talvez incontornáveis dificuldades para demonstrar uma prova objetiva sobre a alegada corrupção de autoridades do Brasil por funcionários da Telecom Italia de modo a “perseguir” o banco brasileiro. Até o momento, essa hipótese não passa disso, uma simples suspeita sem confirmação. Nos autos há apenas referências indiretas e imprecisas. Mas os advogados do Opportunity passaram a manobrar esse fantasma para relacionar a investigação no Brasil à outra da Itália, exigindo que uma acusação só fosse investigada depois da outra. É como se um motorista atropelasse alguém na rua e, quando encontrado pela polícia, alegasse ao juiz: “Lá na Itália uma pessoa disse que esse delegado que me prendeu aqui está me perseguindo. Então eu só posso ser acusado do atropelamento se antes vocês investigarem esse delegado”. É um argumento juridicamente absurdo. Mas que ganhou guarida em variados meios.
BB: No relatório da Satiagraha, Protógenes Queiroz dedica um capitulo às relações de Dantas com a mídia. Como você definiria essa relação?
RV: O foco do meu livro são as provas, acusações e explicações do caso Satiagraha e não o papel da mídia, embora ela seja um personagem presente em toda a narrativa. Eu também entendi que o debate sobre o papel da mídia na cobertura da Satiagraha havia sido extenso e intenso na internet, por meio de blogs e sites e outras publicações, como CartaCapital, que remaram contra a maré, e por isso eu não precisava gastar páginas que poderiam ser usadas para avaliar outros aspectos do caso. Mas ao longo do livro eu procurei demonstrar diversas imprecisões e enganos divulgados pela mídia que acabaram por ajudar as posições do Opportunity. Outro aspecto notável foi ver que boa parte da mídia não viu nenhum problema na paralisação e anulação do caso Satiagraha, considerando-os fatos quase rotineiros, mas que de banais nada tinham.
do Blog do Briguilino
*cutucandodeleve

sexta-feira, janeiro 10, 2014

Quem são os presos do Maranhão, por que estão presos, quem os prendeu e quem os mantém presos?

Vistoria realizada no Complexo Penitenciário - A.Baêta/OIMP/D.A Press

Quem são os presos do Maranhão, por que estão presos, quem os prendeu e quem os mantém presos?

Gerivaldo Neiva *

Agora, depois de explodido o barril de pólvora no sistema prisional do Maranhão, parece que o poder e setores da mídia descobriram o verdadeiro caos criminoso, violador trágico dos direitos humanos, que é o sistema penitenciário brasileiro.
Apressadamente, os “culpados” também começam a serem apontados: os próprios criminosos, o governo que não constrói presídios, penas exageradas, judiciário deficiente, ausência de defensores públicos, descaso do Ministério Público etc.
Talvez todas as opções tenham sua parcela de culpa, mas penso que o problema é bem mais complexo do que simplesmente apontar culpados. Na verdade, o sistema prisional e sua população encarcerada não deixam de ser o retrato de uma forma de organização social excludente e concentradora da renda nas mãos de uns poucos. Enfim, ou resolvemos o problema da gritante desigualdade social neste país, ou continuaremos a encarcerar pobres, negros, analfabetos, sem profissão, periféricos, delinquentes comuns e “não-sujeitos” de direitos.
Como prova disso, basta uma breve análise do perfil da população carcerária do Estado do Maranhão. Em dezembro de 2012, última estatística divulgada pelo Infopen Estatísica – sistema de informações penitenciárias do Ministério da Justiça[1], por exemplo, aquele Estado apresentava uma população penitenciária de 5.417 detentos e uma média de 82,45 presos por cada 100 mil habitantes. Ora, considerando que a média nacional era de 287,31 presos por cada 100 mil habitantes, significa dizer que o Estado do Maranhão, embora seja um dos mais pobres do país, aponta índices de encarceramento equivalente a países da Europa central e Japão. Sendo assim, é muito provável que os conflitos não sejam contabilizados ou que esteja sendo resolvidos por outras vias.

CAPACIDADE DO SISTEMA
Apesar de contar com 5.417 presos em dezembro de 2012, o sistema prisional do Estado do Maranhão oferecia apenas 2.219 vagas, ou seja, o sistema contava com um excesso de mais da metade dos detentos.

CONDENADOS X PROVISÓRIOS
Segundo dados de dezembro de 2012, o sistema prisional do Maranhão contava com 1.176 presos no sistema de “Polícia Judiciária do Estado (Polícia Civil/SSP)”, ou seja, em delegacias de polícia ou prisões estaduais. O restante, 4.241 detentos, estavam recolhidos no sistema penitenciário e, absurdamente, 2.336 detentos eram presos provisórios à espera de julgamento, ou seja, cumprindo antecipadamente suas penas.
 Assim, o sistema penitenciário do Estado do Maranhão abriga mais da metade de presos (55,08%) ainda à espera de julgamento. Acrescentando à estes os que estavam recolhidos em delegacias, pode se concluir que 64,83% dos presos do Estado do Maranhão estão recolhidos e esquecidos no sistema prisional.

ESCOLARIDADE
De acordo com os dados oficiais de dezembro de 2012, a população carcerária do Estado do Maranhão era composta de 83,35% de detentos com escolaridade até o ensino fundamental, ou seja, sem qualificação profissional alguma. De outro lado, apenas 0,18% eram portadores de curso superior.
Esses números falam por si só.

CRIMES COMETIDOS
Com relação aos crimes cometidos, segundo ainda a mesma fonte de pesquisa, 44,23% dos presos cometeram crimes contra o patrimônio (furtaram ou roubaram) e 20,13% cometeram crimes de tráfico, ou seja, mais de 64% dos presos são delinquentes comuns que roubaram, furtaram ou se envolveram com o tráfico.
De outro lado, apenas 14,5% cometeram crimes contra a vida, 4,82% cometeram crimes contra os costumes (estupro, atentado violento ao pudor etc) e 0,15% cometeram crimes contra a administração pública (peculato, concussão e corrupção passiva).
Por fim, curiosamente, 1,13% dos presos violaram a Lei Maria da Penha. Muito mais, como mostram os números, do que os ladrões do dinheiro público.

QUEM OS PRENDEU E QUEM OS MANTÉM PRESOS?
É certo que a responsabilidade de construir presídios é do Poder Executivo e cabe ao Judiciário apenas cuidar da execução da pena.
De outro lado, é certo também que um condenado adquire este status depois de preso em flagrante ou por mandado judicial; depois que um Promotor de Justiça oferece uma Denúncia; depois que o Juiz de Direito condena e, por fim, depois que outro Juiz de Direito passa a ser o Juiz que cuidará da execução daquela pena.
Sendo assim, ao condenar uma pessoa que cometeu crime, o Juiz de Direito está apenas cumprindo com o que lhe determina a lei penal, mas também está deixando de cumprir a lei penal quando mantém centenas de presos provisórios aguardando julgamento, sob o argumento sem justificativa da “garantia da ordem pública”, ou quando a mesma lei lhe autoriza aplicar penas alternativas e opta por pena privativa de liberdade.
Por fim, será que também não viola os tratados internacionais e a Constituição, o Juiz de Direito que envia condenados para um sistema prisional que não comporta mais presos e que não atende às exigências da lei de execuções penais? Ora, se o executivo não oferece as vagas no sistema prisional, por que o judiciário encaminha o condenado para cumprir pena em regime fechado em uma vaga que não existe?
Por fim, o mesmo barril de pólvora que explodiu no Maranhão – pobre para muitos e rico para uns poucos – está prestes a explodir em outros Estados. Quem sabe assim, a sociedade e o Direito Penal Brasileiro passarão a entender que não se resolve problemas causados pela exclusão e desigualdade social através da segregação de delinquentes comuns em prisões-infernos.

* Juiz de Direito (Ba), membro da coordenação estadual da Associação Juízes para a Democracia (AJD), membro da Comissão de Direitos Humanos da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) e Porta-Voz no Brasil do movimento Law Enforcement Against Prohibition – Agentes da Lei Contra a Proibição (Leap-Brasil).