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Ser de esquerda é não aceitar as injustiças, sejam elas quais forem, como um fato natural. É não calar diante da violação dos Direitos Humanos, em qualquer país e em qualquer momento. É questionar determinadas leis – porque a Justiça, muitas vezes, não anda de mãos dadas com o Direito; e entre um e outro, o homem de esquerda escolhe a justiça.
É ser guiado por uma permanente capacidade de se estarrecer e, com ela e por causa dela, não se acomodar, não se vender, não se deixar manipular ou seduzir pelo poder. É escolher o caminho mais justo, mesmo que seja cansativo demais, arriscado demais, distante demais. O homem de esquerda acredita que a vida pode e deve ser melhor e é isso, no fundo, que o move. Porque o homem de esquerda sabe que não é culpa do destino ou da vontade divina que um bilhão de pessoas, segundo dados da ONU, passe fome no mundo.
É caminhar junto aos marginalizados; é repartir aquilo que se tem e até mesmo aquilo que falta, sem sacrifício e sem estardalhaço. À direita, cabe a tarefa de dar o que sobra, em forma de esmola e de assistencialismo, com barulho e holofotes. Ser de esquerda é reconhecer no outro sua própria humanidade, principalmente quando o outro for completamente diferente. Os homens e mulheres de esquerda sabem que o destino de uma pessoa não deveria ser determinado por causa da raça, do gênero ou da religião.
Ser de esquerda é não se deixar seduzir pelo consumismo; é entender, como ensinou Milton Santos, que a felicidade está ancorada nos bens infinitos. É mergulhar, com alegria e inteireza, na luta por um mundo melhor e neste mergulho não se deixar contaminar pela arrogância, pelo rancor ou pela vaidade. É manter a coerência entre a palavra e a ação. É alimentar as dúvidas, para não cair no poço escuro das respostas fáceis, das certezas cômodas e caducas. Porém, o homem de esquerda não faz da dúvida o álibi para a indiferença. Ele nunca é indiferente. Ser de esquerda é saber que este “mundo melhor e possível” não se fará de punhos cerrados nem com gritos de guerra, mas será construído no dia-a-dia, nas pequenas e grandes obras e que, muitas vezes, é preciso comprar batalhas longas e desgastantes. Ser de esquerda é, na batalha, não usar os métodos do inimigo.
Fernando Evangelista
domingo, abril 06, 2014
DOIS FILMES PARA RECORDAR JOSÉ WILKER (1946-2014)
Nem sempre um grande ator tem seu talento imortalizado em culminâncias da sétima arte.
José Wilker, que faleceu neste sábado, aos 67 anos de idade,
constantemente me dava (a exemplo de Richard Burton) a impressão de ser
muito maior do que seus papéis, buscando um personagem à sua altura e
nunca o encontrando.
Burton hoje é lembrado mais por produtos hollywoodescos típicos como Quem tem medo de Virginia Woolf? (d. Mike Nichols, 1966) e não por sua única quase obra-prima, O espião que saiu do frio (d. Martin Ritt, 1965).
Wilker -coitado!- era tecnicamente perfeito e carismático ao extremo,
mas se desperdiçou nos medíocres projetos televisivos e cinematográficos
das organizações Globo.
Ganhou muito dinheiro e suas atuações se perderão na poeira dos tempos
-ao contrário, p. ex., de um Jardel Filho, que lhe era inferior como
artista, mas cujo desempenho em Terra em Transe (d. Glauber Rocha, 1967) deverá indefinidamente continuar sendo um marco do melhor cinema que o Brasil já produziu.
Dos filmes que Wilker estrelou, o principal continua sendo o primeiro Os inconfidentes (d. Joaquim Pedro de Andrade, 1972), no qual compôs um Tiradentes inesquecível.
Depois que passou a jogar suas pérolas para os porcos, nada há de tão destacado. Por exclusão, opto por O homem da capa preta
(d. Sérgio Rezende, 1986), num reconhecimento da dificuldade que
qualquer ator teria ao se defrontar com um tipo tão bizarro como Tenório
Cavalcanti, o deputado pistoleiro da Baixada Fluminense que ocultava
uma submetralhadora sob a tal capa preta, foi alvo de vários atentados e
responsável por inúmeras mortes.
Aliás, o fato de sair-se tão bem no desafio de personificar figuras históricas díspares como Tiradentes, Tenório Cavalcanti, Juscelino Kubitschek, Lampião e Antônio Conselheiro atesta o quanto tinha de talento e versatilidade.
Aliás, o fato de sair-se tão bem no desafio de personificar figuras históricas díspares como Tiradentes, Tenório Cavalcanti, Juscelino Kubitschek, Lampião e Antônio Conselheiro atesta o quanto tinha de talento e versatilidade.
"ENQUANTO MALHÃES LANÇAVA CORPOS EM RIOS, MINO CARTA BATIA BUMBO PARA MÉDICI"
Quando Mino Carta fez de sua revista um house organ
no pior sentido da palavra, infestando-a de textos panfletários e
lobbistas que secundavam a caça a Cesare Battisti deflagrada por Silvio
Berlusconi, cansei de desafiá-lo para defender sua postura inquisitorial
numa polêmica.
Adivinhava que se acovardaria, como sempre se acovardou.
Já amarelara em 2004, quando uma repórter da Carta Capital
me entrevistou sobre o 25º aniversário da Lei da Anistia e ele ordenou,
na enésima hora, que fossem suprimidas todas as referências ao meu
nome.
Também naquela ocasião mandei uma veemente contestação da atitude
despótica que, com a mesma prepotência dos censores da ditadura, ele
tomou.
Em vão: não deixou que publicassem, nem respondeu. Estava ciente de que todo seu poder de nada valeria num confronto de textos, pois eu pulverizaria facilmente sua algaravia pomposa.
Em vão: não deixou que publicassem, nem respondeu. Estava ciente de que todo seu poder de nada valeria num confronto de textos, pois eu pulverizaria facilmente sua algaravia pomposa.
A que se devia tal antipatia gratuita? É simples: ele odeia os
contestadores de 1968. Sempre nos detestou. Como boa parte dos
comunistas da velha guarda, naquele ano decisivo ele se posicionou,
junto com os partidões da Itália e da França, do outro lado da barricada. Entre as forças da ordem e os jovens rebeldes, ficou com as primeiras.
E contraiu ódio eterno pelos verdadeiros esquerdistas, que expuseram a
cumplicidade dos PC's com a burguesia (o PC francês tudo fez para minar o
apoio dos operários à revolução que já estava nas ruas, enquanto o
italiano compartilhou o poder com ninguém menos que a Democracia Cristã,
podre até a medula).
Então, mesmo sem ter identificação ou simpatia pelo Demétrio Magnoli,
não posso deixar de aplaudir as estocadas certeiras que ele deu no Mino
Carta, na Folha de S. Paulo deste sábado (5).
Começa citando a ode ao golpe de 1964 que o próprio Mino fez publicar na Veja de 1º de abril de 1970 (ou seja, o editorial que ele assinava com suas iniciais, MC), ajudando os milicos a soprarem as seis velinhas:
Começa citando a ode ao golpe de 1964 que o próprio Mino fez publicar na Veja de 1º de abril de 1970 (ou seja, o editorial que ele assinava com suas iniciais, MC), ajudando os milicos a soprarem as seis velinhas:
"Propostos como solução natural para recompor a situação turbulenta do Brasil de João Goulart, os militares surgiram como o único antídoto de seguro efeito contra a subversão e a corrupção (...). Mas, assumido o poder, com a relutância de quem cultiva tradições e vocações legalistas, eles tiveram de admitir a sua condição de alternativa única. E, enquanto cuidavam de pôr a casa em ordem, tiveram de começar a preparar o país, a pátria amada, para sair da sua humilhante condição de subdesenvolvido. Perceberam que havia outras tarefas, além do combate à subversão e à corrupção --e pensaram no futuro".
Hoje, muitos companheiros desavisados mostram deferência e respeito por
esse sujeitinho que via os Ustras e Curiós como "único antídoto de
seguro efeito contra a subversão e a corrupção" (exatamente a desculpa
esfarrapada que utilizaram para a usurpação do poder), atribuía-lhes
relutância em incidirem nas práticas hediondas (todos que passamos pelas
câmaras de tortura podemos afiançar que, sádicos como eram, eles
extraíam visível prazer do que faziam), louvava a preocupação deles com o
futuro (qual, a de assegurarem a própria impunidade antes de serem
enxotados?) e a firmeza com que botavam "a casa em ordem" (nela impondo a
paz dos cemitérios!).
Espero que doravante passem a ser mais seletivos em suas devoções, não engolindo gato por lebre.
Enfim, está certíssimo o Magnoli ao jogar na cara do Mino o seguinte:
Espero que doravante passem a ser mais seletivos em suas devoções, não engolindo gato por lebre.
Enfim, está certíssimo o Magnoli ao jogar na cara do Mino o seguinte:
"Enquanto Paulo Malhães lançava corpos em rios, Mino Carta batia bumbo para Médici. A censura não tem culpa: os censores proibiam certos textos, mas nunca obrigaram a escrever algo. Os proprietários da Abril não têm culpa (ou melhor, são culpados apenas pela seleção do diretor de Redação): segundo depoimento (nesse caso, insuspeito) de um antigo editor da revista e admirador do chefe, hoje convertido, como ele, ao lulismo, Carta dispunha de tal autonomia que os Civita só ficavam sabendo do conteúdo da Veja depois de completada a impressão".
Desta vez, mesmo que encontre uma insuspeitada e até agora inexistente
coragem, de nada lhe adiantará. Não existe resposta nem justificativa
possível.
*Naufragodautopia
Como é possível que até hoje nenhum torturador tenha conhecido a Justiça no Brasil?!
Marco Weissheimer
Como
é possível que, até hoje, no Brasil, nenhum torturador tenha sido
preso? Nenhum! Como é possível que nenhum responsável por essas
atrocidades tenha conhecido a justiça? As perguntas feitas por Flavio
Koutzii expressaram a mistura de indignação e perplexidade que outros
participantes do ato- homenagem “50 anos do Golpe de 1964, 50 anos de
impunidade” manifestaram na noite de segunda-feira (31), no Salão de
Atos da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), que ficou
superlotado para ouvir o depoimento de seis pessoas reconhecidas por
suas trajetórias de luta contra a ditadura instalada no país após o
golpe de 64 e pelas denúncias que fazem até hoje dos crimes cometidos
neste período. A presença do público, majoritariamente jovem,
surpreendeu os próprios organizadores do ato e, principalmente, os
homenageados.
“A
presença de vocês aqui hoje é um alento que não vivi em nenhum momento
no pós-ditadura”, disse emocionada Suzana Lisboa, manifestando um
sentimento que atravessava o ar do Salão de Atos da UFRGS. Foi um evento
com uma altíssima carga emocional. E o principal combustível para a
emoção foi a realidade. Algo de novo estava acontecendo ali, disseram
vários dos participantes do encontro. A começar por Clara Charf, viúva
de Carlos Marighella, que se mostrou absolutamente surpresa e encantada
pelo que estava presenciando. “Estou admirada e encantada. Há muito
tempo que eu não via uma manifestação assim. Se o Marighella estivesse
vivo, isso aqui seria um grande presente para ele”, disse Clara, 88
anos, militante desde 1945, sempre com o movimento de mulheres como fez
questão de registrar.
O
ato-homenagem na UFRGS foi um encontro de gerações que, segundo
testemunharam os mais antigos, ainda não havia acontecido na escala em
que aconteceu. Um dos principais responsáveis por esse encontro
inter-geracional foi o professor Enrique Serra Padrós (História/UFRGS),
que trabalha com esse tema há anos e criou o Coletivo pela Educação,
Memória e Justiça, que reúne professores, alunos e ativistas da área de
direitos humanos. Padrós contou que, quando o Coletivo estava pensando o
ato-homenagem, decidiu eleger como público-alvo preferencial estudantes
das escolas de Porto Alegre. A partir daí se constituiu uma rede de
amigos, companheiros, estudantes, ex-alunos e professores cujo trabalho
se materializou segunda-feira à noite nas cerca de duas mil pessoas que
lotaram o salão da universidade.
“Um ato de redenção para a UFRGS”
O
encontro teve um significado especial para a universidade também, como
afirmou a socióloga Lorena Holzmann, ex-aluna e professora da UFRGS. Ela
lembrou o triste período das cassações e expurgos de professores que se
seguiu ao golpe de 64. “Com este ato de hoje, a Universidade se redime,
de certo modo, do que houve na ditadura. É um ato de redenção”, disse
Lorena, também emocionada. Redenção, memória, verdade, justiça, encontro
de gerações, vida: essas foram algumas das palavras centrais no
ato-homenagem. Uma homenagem que se dirigiu aos participantes convidados
e também aos que caíram na ditadura, sendo que cerca de 155 deles
seguem desaparecidos até hoje. Um vídeo exibido no início do evento
mostrou os seus rostos, em sua maioria, jovens idealistas como aqueles
que estavam na plateia encontrando uma história que ainda não conheciam.
E juntou uma foto de Amarildo na galeria dos que tombaram vítimas da
violência policial.
As
novas gerações ouviram relatos crus e duros sobre o que foi a tortura
na ditadura. Relatos como o de Goreti Lousada, filha de Antônio Losada,
que sofreu um atropelamento e está na UTI do Hospital de Pronto Socorro.
Goreti contou um pouco da história de luta de seu pai, que foi preso em
1973 no governo Médici e ficou quatro meses no DOPS em Porto Alegre
sofrendo tortura. Ela leu um trecho de um texto escrito por Losada que
descreve a tortura sofrida por uma mulher no DOPS. Essa mulher era a mãe
de Goreti que, com a voz engasgada pela emoção, prosseguiu a leitura
até o fim sendo muito aplaudida. Ela lembrou, com orgulho, que seu pai,
após sair da prisão não seguiu o conselho dado pelos policiais de deixar
aquilo tudo para trás. “Ele denunciou seus torturadores, nome por
nome”.
João
Carlos Bona Garcia homenageou, na pessoa de Enrique Padrós, todos os
professores de História que estão trabalhando para resgatar a memória do
período da ditadura. Também homenageou a todos os que tombaram pelo
caminho, tanto no Brasil como no Exterior, lembrando os nomes de Frei
Tito e Maria Auxiliadora. Bona Garcia também falou da tortura da qual
foi vítima e deu o nome de seu torturador. “Quem me torturou foi Átila
Rohrsetzer, que estava acompanhado de um médico, e nos torturava ouvindo
música clássica e falando da mulher e dos filhos. Eles sentiam prazer
em fazer isso”, contou. Bona disse ainda que a visão da ditadura segue
presente na sociedade. “Em outros países, órgãos de repressão estão
reconhecendo crimes que cometeram. Aqui no Brasil ainda não houve nada
disso”.
“Não esquecer e entender o que aconteceu”
Flavio
Koutzii lutou contra ditaduras no Brasil e na Argentina, onde foi
preso, e definiu assim a importância do ato do qual estava participando:
“O centro de hoje é não esquecer o que aconteceu e entender o que
aconteceu, em toda a sua complexidade”. Ele falou de dois resquícios do
período ditatorial que seguem vivos hoje: “No Colégio Militar de Porto
Alegre, os livros com os quais os alunos trabalham ainda trazem a versão
das forças armadas sobre aquele período. Espero que um dia a
Presidência da República ponha um fim nisso”. O segundo resquício é o
fato de os torturadores não terem sido julgados até hoje. “Como é
possível isso? Não se trata de nenhuma fobia anti-militar, mas sim de
justiça e memória”. Sobre esse ponto, chamou a atenção ainda para o
seguinte fato: “Nunca li uma notícia dizendo que alguém que foi
torturado foi atrás de seu algoz depois de sair da prisão e o matou com
um tiro na cabeça. Nenhum de nós fez isso, pois seria mais uma vitória
deles”.
Na
mesma direção, a uruguaia Lilián Celiberti denunciou a impunidade dos
crimes cometidos na ditadura brasileira e defendeu a importância da
memória para combatê-la. “A impunidade é a perseguição e a destruição da
memória. Com todos vocês aqui hoje a memória se torna algo vivo, algo
presente. Para derrotar a impunidade, cada um de nós aqui precisa sair
daqui e compartilhar essa luta, compartilhar o que está ouvindo e vendo
aqui. Neste diálogo inter-geracional podemos construir uma democracia
real baseada na memória, na verdade e na justiça”.
Nei
Lisboa manifestou algum otimismo com o que estava vendo nas atividades
sobre os 50 anos do golpe. “É a primeira vez que vejo isso que está
acontecendo agora. Nos atos relativos aos 30 ou 40 anos do golpe nunca
conseguimos reunir tanta gente como está aparecendo aqui hoje. E se
começou a falar mais claramente sobre o papel da sociedade civil, de
empresários, da mídia e dos Estados Unidos no golpe”.
Ditadura gestou uma sociedade de medo
Nilce
Azevedo Cardoso, que também foi torturada durante a ditadura,
manifestou-se extasiada com o que estava vendo no Salão de Atos da
UFRGS. Ela acentuou o caráter midiático-civil e militar do golpe e disse
que “toda a sociedade brasileira foi torturada a cada tortura que um de
nós sofremos”. Nilce traçou uma linha de conduta entre a impunidade da
tortura e a sua prática hoje no Brasil: “Nós ficamos sabendo de torturas
e mortes praticamente todos os dias. Nossos jovens estão sendo
assassinados e uma das razões disso estar acontecendo é que, durante 21
anos, foi gestada uma sociedade do medo. Foram 21 anos de medo e
não-pensar. Temos que desconstruir tudo isso. Temos que denunciar os
Pedro Seelig e os Ustra da vida e perguntar onde estão nossos
companheiros que foram assassinados, onde estão seus corpos?”.
Irmã
do militante do PCdoB, João Carlos Haas, um dos desaparecidos da
guerrilha do Araguaia, Sônia Haas lembrou que ele foi aluno da UFGRGS e
presidente do Centro Acadêmico Sarmento Leite, razão pela qual foi preso
inclusive. Ela também expressou otimismo pelo que estava vendo em Porto
Alegre: “A gente enxerga em vocês uma esperança. Nós seguimos lutando,
mas estamos ficando cansadas. Precisamos renovar essa energia pois ainda
há muita coisa para contar. A boa notícia é que as pessoas estão tendo
mais coragem e o coletivo está ficando mais forte”, disse Sônia,
lembrando uma frase dita pelo irmão morto na guerrilha do Araguaia:
“nenhum sacrifício será em vão”.
“O Estado brasileiro até hoje não nos entregou nenhum corpo”
Encerrando
os depoimentos, Suzana Lisboa observou que até hoje essa história não
faz parte do currículo escolar. “Devíamos sair daqui e exigir dos nossos
governos municipal, estadual e federal para que esse tema passe a fazer
parte do currículo das escolas”, propôs. Viúva de Luiz Eurico Tejera
Lisboa, irmão de Nei Lisboa, Suzana criticou o espaço dado ao coronel
Ustra em uma entrevista de três páginas publicada no jornal Zero Hora. E
lembrou que o único militar morto dentro de um quartel no Rio Grande do
Sul foi o coronel aviador Alfeu Monteiro, assassinado pelas costas com
uma rajada de metralhadora por ter se recusado a atacar o Palácio
Piratini. Suzana Lisboa elogiou o gesto da presidenta Dilma Rousseff que
impediu que os quarteis comemorassem o golpe este ano, mas fez
cobranças ao Estado brasileiro. Ela defendeu que o Brasil cumpra a
sentença da Corte Interamericana de Direitos Humanos e lembrou: “dos 160
desaparecidos de que temos conhecimento, nós, os familiares,
conseguimos resgatar cinco corpos. O Estado brasileiro até hoje não nos
entregou nenhum corpo. Além disso, até hoje, os familiares dos
desaparecidos não foram recebidos pelo governo (nenhum dos últimos
governos: Fernando Henrique Cardoso, Lula e Dilma)”.
Nilce Azevedo Cardoso, Sônia Haas,Suzana Lisboa
Sheherazade teve o que mereceu
Ela |
Rachel Sheherazade pode se juntar a Heisenberg e cantar com ele a música
que fecha gloriosamente Breaking Bad: guess I got what I deserved. Tive
o que mereci.
Se for confirmado que ela está fora do SBT, ela terá o que mereceu.
Sheherazade rompeu um limite no comentário em que aplaudiu justiceiros.
Se mesmo depois ela não se deu conta de que estava aplaudindo um crime, é
porque ela é sem noção.
O que ela não imaginava provavelmente, em sua arrogância cega, era a
reação de indignação que suas palavras despertariam entre todas aquelas
pessoas que não podem ser caracterizadas como direitistas raivosos.
Ela poderia ter suavizado o problema se tivesse, nem que fingidamente,
pedido desculpas pelo que disse. Não. Ela acelerou na curva, e o
precipício era a consequência inevitável.
O SBT — mais uma vez, caso se confirme seu afastamento — demorou para
agir. Aparentemente Sílvio Santos só se comoveu quando começaram a
circular rumores segundo os quais o governo estaria estudando a verba
anual de 150 milhões de reais que coloca em publicidade oficial no SBT.
Ela está fora do ar. A justificativa oficial da emissora é que se trata
de férias, mas Sheherazade teria que sair de férias mês sim, mês não
para esta explicação fazer sentido. Alguém lembrou que ela tirou férias
recentemente.
Há aspectos cômicos num episódio essencialmente dramático. Dias atrás, o
procurador-geral da República, Rodrigo Janot, disse numa entrevista que
achava o caso grave.
Janot disse que liberdade de expressão não pode ser confundida com
incitamento ao crime. O engraçado é que ele afirmou que não tinha visto o
vídeo ainda.
Ou ele vive num planeta paralelo, dada a repercussão formidável do
comentário, ou estava fugindo do jornalista. Qualquer que seja a
alternativa, foi um momento de comédia na história.
Sheherazade parecia assustada nas últimas semanas. Em sua conta no
Twitter, ela pediu aos admiradores que assinassem uma petição virtual
pela sua permanência no SBT.
O tom do pedido mostrou que ela não aprendeu nada com o episódio. Ela se apresenta, numa brutal inversão de papeis, como vítima.
As viúvas e os viúvos dela não devem chorar. A plutocracia cuidará bem
de Sheherazade. Todos os jornalistas que defendem os interesses do 1%
estão a salvo dos problemas econômicos que podem afligir os demais em
caso de perda de emprego. Até o “historiador” Marco Antonio Villa, com
seus constantes e bizarros erros de avaliação, continua a aparecer com
destaque na mídia.
O caso ensina muita coisa. Demonstra como é falaciosa a tese da “mídia
técnica” que, até recentemente, governou as administrações do PT.
Colocar dinheiro público com base apenas em audiência pode fazer com que o governo, indiretamente, estimule o crime.
O mais interessante, em tudo, foi a força da opinião pública. A
sociedade rejeitou o incentivo à violência feito por Sheherazade.
Por isso, e só por isso, ela teve o que mereceu.
Paulo Nogueira
No DCM
*comtextolivre
As burocracias para fazer Arte. Artistas de Rua pedem licença
Já dizia o poeta que a Arte existe
porque a vida não basta. Infelizmente não é esse o sentimento da
Prefeitura de São Paulo. Recentemente foi promulgado pelo Executivo
paulista o Decreto 54.948/14, que legisla sobre apresentação de
artistas de rua. Neste Decreto fica estabelecido que é necessária
licença, fornecida pelas subprefeituras, para que tais artistas se
apresentem.
A licença não é algo que se vai na
padaria e pede. É mais complexo do que um simples pedido. A licença
envolve, para o pavor da arte, a burocracia. Isto é, para obter esta
licença é necessário o cadastramento do artista na subprefeitura que
administre a área da apresentação, além de ter que ser fornecido o
horário, local e o tipo de equipamento que será utilizado. Esta medida
da prefeitura nada mais é do que emperrar a Arte, a qual combina com
burocracia tanto quanto a PM combina com manifestações populares.
Algumas das restrições previstas neste
Decreto são: a impossibilidade de se apresentar a menos de 5 metros de
entradas de metrô, monumentos tombados e orelhões; a menos de 20 metros
de feiras de arte, artesanato e antiguidades e a menos de 50 metros de
hospitais e zonas residenciais.
A Avenida Paulista, por exemplo, que
concentra grande quantidade de artistas, poderá ter este trabalho
impedido em quase toda sua extensão diante da existência de várias
estações de metrô, pontos de ônibus, hospitais, zonas residenciais,
orelhões, enfim. Dentre as aberrações, pobre do artista de Rua que por
diversas vezes buscou no seu estilo de vida fugir das burocracias
modernas.
A medida, por seu exagero, nos faz
refletir a sua constitucionalidade. A Constituição Federal determina, em
seu artigo 5º, inciso IX, que:
“é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença”.
Aparentemente, o higienismo que foram referências em outras administrações públicas da capital voltam a dar as caras.
Eduardo Galeano conta uma passagem muito
oportuna: “na parede de um botequim de Madri, um cartaz avisa: Proibido
cantar. Na parede do aeroporto do Rio de Janeiro, um aviso informa: É
proibido brincar com os carrinhos de porta-bagagem. Ou seja: ainda
existe gente que cante, ainda existe gente que brinca”.
Na Selva de Pedra, ainda existe gente
que faz arte. Na Selva de Pedra, ainda tem gente ama, que emociona,
provoca, distrai, alegra. De outro lado, na Selva de Pedra, ainda tem
governante que trata a arte como caso de polícia.
*AdvogadosAtivistas
sábado, abril 05, 2014
Por que Delfim Netto mente
Delfim com Boilesen, o chefão da Oban |
Delfim Netto é, provavelmente, um dos maiores casos de blindagem da
história e um exemplo de sobrevivência política impressionante.
Levou tempo para ele aceitar depor na Comissão da Verdade. Esteve lá no
ano passado. Na versão paulista da comissão, repetiu seu velho refrão
quando perguntado sobre os abusos do regime: não sabia de nada.
“Havia a mais absoluta separação. No meu gabinete nunca entrou um
oficial fardado”, disse. “Não existia nenhum vínculo entre as
administrações”.
Delfim não era um contínuo. Assinou o AI-5 quando era ministro da
Fazenda de Costa e Silva. “Direi mesmo que creio que não é suficiente”,
afirmou naqueles tempos. Ao chancelar o ato, estava ajudando a
suspender o habeas corpus para crimes políticos e contra a segurança
nacional, o que foi fundamental para a indústria da repressão.
Ocupou esse mesmo cargo entre 1969 e 1974, sob Médici. Depois foi
ministro da Agricultura e do Planejamento com Figueiredo. Sobre seu
legado, declarou que “Geisel quebrou o Brasil”. Não ele.
Nos anos Figueiredo, tornou-se uma figura meio pop. Jô Soares tinha um
quadro em que metia uns óculos de lentes de fundo de garrafa, um terno
apertado e o imitava. Num depoimento para o documentário “Muito Além do
Cidadão Kane”, Roberto Civita, da Abril, contava que, em 1980, quando o
grupo tentou uma concessão de TV, a empresa tinha a seu lado “Golbery e
Delfim, os dois homens mais importantes do governo naquela época”.
Declara não ter conhecimento da OBAN, apesar de sua proximidade com
gente como Henning Boilesen, o dinamarquês que presidiu a Ultragás e
financiou a tortura. Mesmo sob censura, o cidadão medianamente informado
tinha noção do que acontecia. Delfim, repito, não era um
contínuo. Depois da redemocratização, foi cinco vezes deputado federal,
virou colunista de jornais e revistas, conselheiro de Lula e absolvido
sem julgamento.
Delfim Netto mente. E impede que se conheça melhor um período importante da história do Brasil.
Albert Speer era conhecido como “o bom nazista”. Arquiteto do Terceiro
Reich, depois ministro do Armamento, querido de Hitler, sempre negou
ter ideia do extermínio em massa dos judeus. Foi julgado em Nuremberg e
preso em Spandau. Publicou uma autobiografia reveladora e doou parte
dos lucros para instituições judaicas de caridade.
Trinta anos após sua morte em 1981, documentos revelaram não apenas que
ele conhecia os campos de concentração como participou de roubos de
obras de arte de judeus.
Não há, hoje, um único edifício ou viaduto de Speer de pé em Berlim. A obra de Delfim está aí.
Kiko Nogueira
No DCM
*comtextolivre
Mais uma homenagem ao grande ator José Wilker.
Campeonato Mundial de Cannabis
Casa da Mãe Joana 2
Mais uma homenagem ao grande ator José Wilker. #R.I.P
Mais uma homenagem ao grande ator José Wilker. #R.I.P
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