O “caça às mulatas”: " Na tela da TV explorando o meu corpo A gente não se vê na Globo"
O “caça às mulatas” e a luta feminista
A mídia
brasileira desempenha papel fundamental na manutenção do racismo e
machismo. Nas últimas três semanas as mulheres negras ocuparam o horário
nobre na TV aos domingos, (o que não é nada comum), enquanto a Rede
Globo realizava sua “caça as mulatas” para eleger a nova Globeleza.
Não, isso não é fantástico.
O corpo
das mulheres negras é constantemente hipersexualizado nas TVs, seja
nas propagandas, novelas, nos programas de esporte ou
auditório. A mercantilização da nossa sexualidade é naturalizada para
que as mulheres sejam cada vez mais exploradas.
Nesse
concurso tentam mais uma vez nos afirmar como coisas, objetos
sexuais, sendo assim, nulas de vontade, nascidas para atender ao desejo
masculino. Um lucrativo produto vendido nas propagandas, no
Carnaval, nas Copas do Mundo e esquinas das avenidas.
A luta
das mulheres contra a opressão, exploração e pela liberdade, é histórica
e cotidiana. Ao falarmos da formação social e econômica do Brasil,
falamos de uma história de resistência e enfrentamento de mulheres
indígenas e negras contra um sistema que estuprou, explorou e destruiu
muitos povos.
Para as
mulheres negras, que vieram na condição de escravizadas, inferiores e
subalternas, eram reservados três destinos: escrava sexual, reprodução
de mão de obra e exploração da força de trabalho. Além disso, a cultura,
a beleza e identidade do povo negro e indígena foram negadas,
destruídas e criminalizadas.
Estamos
falando de um sistema de dominação que tem no cerne da sua estrutura
o racismo e o patriarcado - anteriores ao capitalismo, mas muito bem
apropriados por ele - e que tem como um dos principais agentes
de manutenção, os meios de comunicação hegemônicos.
A mercantilização
do corpo das mulheres é representado pela grande mídia como
valorização. O concurso para eleger a nova Globeleza foi um desses
momentos em que se afirmou em rede nacional: “Viram como não somos
racistas? Estamos aqui cultuando esse lindos corpos negros”. Eles querem
que vejamos a exploração dos nossos corpos como um elogio. Para
nós, não é elogio, é exotificação. Quando não somos objetos sexuais
ideais, tornamo-nos as indesejáveis, por vezes tratadas como feias e
nojentas, nossos corpos sofrem ojeriza quando não enquadradas no papel
de “mulata” sensual e provocante, ou então, o lugar que nos cabe
é permanecer como empregadas domésticas, à serviço dos patrões no
quartinho dos fundos, ou melhor na senzala do século 21.
A Globo,
com seu discurso mentiroso de inclusão, atua na lógica da omissão e
naturalização da violência sistêmica que recai sobre o povo negro, sendo
vetor principal da criminalização e extermínio da juventude negra, da
invisibilização do trabalho doméstico e da culpabilização da mulher pela
violência sofrida. Quem ganha com tudo isso? Certamente não é a classe
trabalhadora.
A Globeleza
é mais uma vez a reprodução de um lugar e papel que só acumulam para a
burguesia. Não é assim que queremos nos ver na televisão! A Globeleza
não representa os anseios das mulheres negras, trabalhadoras e
lutadoras. A Globeleza não é a afirmação da identidade, nem da cultura e
muito menos da beleza do povo negro.
Nós
identificamos e apontamos a Rede Globo e suas filiais como inimigas das
mulheres e instrumento da classe dominante patriarcal e racista. Não é
demais lembrar que o império das telecomunicações da família Marinho,
aqui na Bahia da família Magalhães, no Maranhão da família Sarney …
(poderíamos aqui citar inúmeros estados), foram construídos
principalmente na ditadura militar, roubando o dinheiro do povo
brasileiro e derramando o sangue de lutadoras e lutadores.
Compreendemos
que para desmontar e destruir esse sistema de exploração, a
democratização dos meios de comunicação é questão estratégica e
fundamental. Queremos que as trabalhadoras possam pensar e
produzir seus próprios meios de comunicação. Só assim seremos de fato
representadas. Seguiremos em marcha lutando contra a mercantilização dos
nossos corpos e vidas! Nossa resistência é a reação!
Pela democratização dos meios de comunicação! O mundo não é mercadoria, as mulheres também não!
Anaíra Lobo, Gabriela Silva e Maíra Guedes - Militantes do Núcleo Negra Zeferina da Marcha Mundial das Mulheres - Bahia
*mariadapenhaneles