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Ser de esquerda é não aceitar as injustiças, sejam elas quais forem, como um fato natural. É não calar diante da violação dos Direitos Humanos, em qualquer país e em qualquer momento. É questionar determinadas leis – porque a Justiça, muitas vezes, não anda de mãos dadas com o Direito; e entre um e outro, o homem de esquerda escolhe a justiça.
É ser guiado por uma permanente capacidade de se estarrecer e, com ela e por causa dela, não se acomodar, não se vender, não se deixar manipular ou seduzir pelo poder. É escolher o caminho mais justo, mesmo que seja cansativo demais, arriscado demais, distante demais. O homem de esquerda acredita que a vida pode e deve ser melhor e é isso, no fundo, que o move. Porque o homem de esquerda sabe que não é culpa do destino ou da vontade divina que um bilhão de pessoas, segundo dados da ONU, passe fome no mundo.
É caminhar junto aos marginalizados; é repartir aquilo que se tem e até mesmo aquilo que falta, sem sacrifício e sem estardalhaço. À direita, cabe a tarefa de dar o que sobra, em forma de esmola e de assistencialismo, com barulho e holofotes. Ser de esquerda é reconhecer no outro sua própria humanidade, principalmente quando o outro for completamente diferente. Os homens e mulheres de esquerda sabem que o destino de uma pessoa não deveria ser determinado por causa da raça, do gênero ou da religião.
Ser de esquerda é não se deixar seduzir pelo consumismo; é entender, como ensinou Milton Santos, que a felicidade está ancorada nos bens infinitos. É mergulhar, com alegria e inteireza, na luta por um mundo melhor e neste mergulho não se deixar contaminar pela arrogância, pelo rancor ou pela vaidade. É manter a coerência entre a palavra e a ação. É alimentar as dúvidas, para não cair no poço escuro das respostas fáceis, das certezas cômodas e caducas. Porém, o homem de esquerda não faz da dúvida o álibi para a indiferença. Ele nunca é indiferente. Ser de esquerda é saber que este “mundo melhor e possível” não se fará de punhos cerrados nem com gritos de guerra, mas será construído no dia-a-dia, nas pequenas e grandes obras e que, muitas vezes, é preciso comprar batalhas longas e desgastantes. Ser de esquerda é, na batalha, não usar os métodos do inimigo.
Fernando Evangelista
quinta-feira, maio 20, 2010
Para vazamento de petróleo não há bloqueio aos Cubanos
Para vazamento de petróleo não há bloqueio
O site da BBC informa que o Governo norte-americano esta em contato com o governo cubano para tratar dos riscos do vazamento de petróleo no Golfo do México.”É nossa incumbência informar todos os nossos vizinhos, não apenas as ilhas, mas aqueles países que podem ser afetados pelos desastres que acontecem em nossas águas territoriais”, afirmou o porta-voz do Departamento de Estado, Gordon Duguid, diz a agência estatal britânica.
É tragicamente curioso que seja preciso um catástrofe ambiental para que se retome o que deveria ser o normal entre as nações, sejam elas quais forem: o diálogo. Imaginem só o paradoxo que pode vir a acontecer: os EUA colaborarem com Cuba para evitar ou tentar reparar danos ambientais, enquanto mantêm os danos causados por um bloqueio econômico que, nascido na Guerra Fria, é de uma total irracionalidade em pleno século 21.
Agora, que se aproxima uma Copa do Mundo, dá vontade de lembrar o que dizem os narradores esportivos: “não existe mais time bobo”. Também, a esta altura, não podem existir mais nações onipotentes e outras que, a elas, tenham de lhes obedecer. O mundo tornou-se tão único que este desastre mostra que, se podemos ser solidários na desgraça, não há razão para que não o possamos ser na cooperação pelo progresso mútuo. Só os medíocres acham que ser patrão é melhor do que ser parceiro.
do Tijolaço
PIG Imprensa Golpista The Globe rides again
“The Globe” rides again
quinta-feira, 20 maio, 2010 às 16:11
Chega a ser patético o esforço da grande imprensa brasileira em descredenciar qualquer atitude de Lula, e mesmo as que se referem positivamente a ele, caso da revista Time, que o elegeu o maior líder do mundo. Seu sucesso no acordo com o Irã despertou alergias na mídia conservadora e de direita, que não poupou críticas à sua atuação.
A mídia brasileira não se libertou do complexo de vira-latas. Prefere chanceleres sabujos, que tiram os sapatos para entrar nos Estados Unidos, a uma política externa soberana e independente. Isso se revela claramente no editorial de hoje do jornal O Globo, intitulado “Anatomia do fracasso da política externa”, um primor de reacionarismo e subserviência. Como não consegui encontrá-lo na versão online do jornal, fiquei na dúvida se aproveitava sua reprodução no blog “direita bem informada” ou no site do PPS, mas optei pelo primeiro por assumir abertamente sua identidade
Tenho a impressão de que nem o mais ardoroso dos falcões norte-americanos conseguiria escrever algo tão próximo dos princípios pouco diplomáticos que defendem. Parte O Globo da premissa de que Lula foi açodado pelo desejo de postergar sanções contra o Irã e ajudar o país a ter armas nucleares. De onde se chegou a tal conclusão? A missão brasileira não foi isolada. Brasil e Turquia agiram conjuntamente na solução de um problema que ameaçava a humanidade. Tiveram a coragem de não deixar a resolução com as grandes potências e revelaram o protagonismo dos países emergentes, capazes de negociar, com sucesso, complexas questões mundiais. Não foram poucas as vozes, inclusive na imprensa (estrangeira, naturalmente), que se levantaram para louvar a ação brasileira e turca, que consagra um mundo multipolar.
Mas para o Globo, Lula não age com a “eficiência e o profissionalismo” da diplomacia brasileira, e sim com “ideologia terceiromundista ultrapassada, com cheiro do esquerdismo do pós-guerra, tendo como alvo prioritário hoje se vê o confronto sistemático com os interesses americanos”. Agora está entendido. A visão de O Globo continua bipolar – os EUA liderando o mundo e nós a reboque – e os outros, no qual nos incluímos, no entender do jornal, quando rezamos fora da cartilha norte-americana.
Na sua reverência permanente ao que vem dos EUA, O Globo ressuscita a ALCA e diz que não ocorreu ao governo brasileiro melhorar o projeto surgido em Washington. Claro, se os EUA já tinham definido um projeto, quem somos nós, cucarachos, para não concordar com ele. O Globo parece ignorar que a ALCA, lançada por George Bush, foi rejeitada quase que unanimamente pelos países que buscava abarcar, talvez pelo singelo motivo de que só beneficiava os EUA, não tocando nas questões essenciais para os demais países, como o fim do protecionismo a diversos produtos e a eliminação dos subsídios agrícolas, que nos levaram a enfrentá-los na OMC. Provavelmente, O Globo também deve ter considerado isso um equívoco. Onde já se viu peitar o grande líder que nos conduz?
Prossegue O Globo na cantilena pró-americana, com uma estocada no Mercosul – será que esse parágrafo foi escrito pelo mesmo redator de Serra? – e o questionamento do ingresso da Venezuela no bloco sul-americano, que “inviabilizará qualquer negociação comercial que envolva os EUA”. Quem lê o editorial, pensa que o Brasil é um país isolado, que não se relaciona com ninguém, exatamente o oposto da realidade atual. Para não me estender mais nesse ponto, recorro à matéria do próprio jornal, de abril do ano passado, no qual um representante norte-americano afirma que as relações comerciais entre Brasil e EUA tendem a avançar, apesar da crise econômica global.
O editorial de O Globo termina com a assertiva de que “a política externa não constará do balanço dos melhores momentos da Era Lula”. Penso o contrário. Imagino que já seja possível vislumbrar que a política externa do governo Lula será vista no futuro como um dos grandes momentos de nossa diplomacia. Mas isso, a história dirá.
Brizola Neto
Lula critica diplomacia “do contra”
Lula critica diplomacia “do contra”
quinta-feira, 20 maio, 2010 às 17:26
Em um curto discurso para prefeitos em Brasília, Lula criticou os que precisam criar uma inimigo para justificar suas atitudes. Ele se referia à insistência em sancionar o Irã depois que obteve um acordo, no qual o Irã aceita justamente o que o Conselho de Segurança da ONU queria há um mês.
Lula contrapôs os colunistas brasileiros que o criticam e dizem que aquilo (a questão nuclear no Irã) não é coisa do Brasil, com uma simples perguntinha: “E quem disse que é coisa dos Estados Unidos?”
Brizola Neto
Navalha E o Serra é contra o Mercosul.
Mal sabe o Serra que o Mercosul já tomou o navio para a China
Amanhã, em Campo Grande, Mato Grosso do Sul, se realizará um seminário promovido pela Federação das Indústrias de Mato Grosso do Sul sobre a integração do Codesul com o Zico Sur, para ligar o Atlântico ao Pacífico.
O Codesul reúne o Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná e Mato Grosso do Sul.
O Zico Sur reúne o norte da Argentina, o sul do Chile, a Bolívia, o Paraguai e Mato Grosso do Sul.
Faltam 80 km de rodovia e 200 km de ferrovia para realizar a ligação por terra entre Campo Grande, Corumbá, a Oruru (Bolívia) e o porto de Arica no Norte do Chile.
Ou seja, a ligação de Santos ao Pacífico, com escala obrigatória em Mato Grosso do Sul.
Boa parte dos custos da construção ficará por conta do BNDES.
Este seminário de amanhã se realiza com financiamento parcial da União Européia.
Quer dizer, os europeus já sabem onde está o pote de ouro, no fim do arco-íris.
Os empresários dessas regiões tentam sair na frente, para obrigar os governos, desde já, a realizar a integração aduaneira, sanitária e tributária, que o fluxo comercial do Atlântico ao Pacífico e do Pacífico ao Atlântico vai exigir.
Mais para cima, no Acre, como se sabe, e também com dinheiro, em parte, do BNDES, se realiza a integração do sul do Amazonas com o Acre, em Assis Brasil.
E de Assis Brasil formar a zona econômica Brasil-Peru, até chegar ao porto de Maldonado.
Quer dizer, o Centro-Oeste brasileiro vai ter dois acessos à China, através do Peru e do Chile.
Em Arica, no Chile, o porto é privado, e os dirigentes da Federação das Indústrias de Mato Grosso do Sul acreditam que isso deve facilitar a institucionalização do comércio entre o Codesul e o Zico Sur.
Paulo Henrique Amorim
Capitalismo em crise.... O medo dos europeus. E dos Estados Unidos
Capitalismo em crise....
O medo dos europeus. E dos Estados Unidos
Fears Intensify That Euro Crisis Could Snowball
por NELSON D. SCHWARTZ e ERIC DASH
Do New York Times (em inglês, aqui) via Viomundo
Depois de uma breve pausa que se seguiu ao anúncio na semana passada de um plano de ajuda de 1 trilhão de dólares da Europa, o medo nos mercados financeiros está crescendo novamente, desta vez com preocupações com o fato de que os grandes bancos continentais vão enfrentar dificuldades que poderão prejudicar as economias europeias.
Num sinal de profunda ansiedade, o euro caiu na sexta-feira a seu ponto mais baixo desde o início da crise financeira, quando investidores abandonaram a moeda, assim como ações, em favor de ouro e de outros bens que oferecem mais segurança.
Nas negociações de segunda de manhã, o euro caiu de novo, chegando num momento e atingir um patamar recorde de quatro anos em relação ao dólar.
O presidente do Banco Central europeu, Jean-Claude Trichet, numa entrevista publicada sábado, advertiu que a Europa está diante de “severas tensões” e que os mercados estão frágeis.
Para os bancos europeus, os problemas são duplos. Os custos de empréstimos de curto prazo estão aumentando, o que poderia levar as instituições a evitar novos empréstimos ou se desfazer dos antigos, ameaçando o crescimento econômico.
Ao mesmo tempo, instituições mais seguras em economias sólidas como a França e a Alemanha tem grande quantidade de ações de seus vizinhos trêmulos, como Espanha, Portugal e Grécia.
Os investidores temem que com muitos governos sob o peso de grandes déficits, a dívida das nações mais fracas que usam o euro como moeda terá de ser reestruturada, reduzindo profundamente o valor de seus papéis. Isso acertaria duramente as instituições financeiras europeias e poderia ricochetear em todo o sistema bancário global.
Papéis ligados aos bancos europeus perderam valor na sexta-feira por causa deste temor, e Wall Street seguiu. As ações também cairam em Tóquio e na Austrália no início dos negócios da segunda-feira.
“Este resgate não foi feito para salvar os gregos; foi feito para ajudar os bancos franceses e alemães”, disse Niall Ferguson, um historiador de economia de Harvard. “Jogaram alguma água no fogo, mas o fogo não foi extinto”.
O plano de resgate europeu, totalizando 750 bilhões de euros, tem o objetivo de evitar o risco de quebra, mas aumentaria vastamente os empréstimos. Isso poderia impedir a nascente recuperação econômica da Europa.
Na verdade, foram as dívidas que causaram o problema inicial: um novo relatório do Fundo Monetário Internacional adverte que “os altos graus de endividamento público poderiam pesar no crescimento econômico por anos”.
O déficit mundial como porcentagem do PIB está em 6%, quando estava em apenas 0,3% antes da crise financeira. Se o endividamento público não for reduzido ao nível de antes da crise, diz o relatório do FMI, o crescimento econômico das economias avançadas poderia cair 0,5 ponto percentual anualmente.
Mas nem todas as tendências são negativas. Um euro mais baixo vai tornar as exportações europeias — sejam os automóveis alemães ou os objetos de couro italianos — mais competitivos em todo o mundo. E a Grécia, a Espanha e Portugal tomaram medidas de austeridade na semana passada para reduzir os seus déficits orçamentários.
Esses passos não foram suficientes para prevenir o sumiço de dinheiro dos fundos “money market”, uma esquina pouco notada mas crucial do sistema financeiro na qual os investidores americanos oferecem mais de 500 bilhões de dólares em empréstimos para que os bancos europeus financiem suas operações diárias.
O dinheiro vem de fundos conservadores que controlam a poupança de grandes corporações dos Estados Unidos e de consumidores individuais.
Até agora, o pacote de resgate proposto não conseguiu reduzir a preocupação destes fundos, que cortaram os empréstimos para os bancos europeus e estão exigindo maiores taxas de juros e repagamento mais rápido.
“Mais gente está tomando decisões de sim ou não para cair fora deste mercado e manter o dinheiro mais perto de casa”, disse Lou Crandall, o economista-chefe do Wrightson ICAP, uma empresa de pesquisa do mercado.
Inicialmente, foram os bancos gregos e portugueses que foram desprezados pelos investidores americanos. Mas nas últimas duas semanas os grandes bancos da Espanha, da Irlanda e da Itália tiveram dificuldades para assegurar empréstimos de curto prazo dos Estados Unidos por causa do aumento da ansiedade.
Na sexta-feira, mesmo os bancos de sólidas economias europeias, na França, Alemanha e Holanda, foram afetados, de acordo com corretores e analistas de mercado.
“Os investidores estão esperando para ver se o pacote de estabilização é de fato adotado”, disse Alex Roever, um analista da J.P. Morgan Securities.
“Enquanto os investidores sentem a situação, ficamos pendurados no limbo”.
Por causa do recuo dos investidores americanos, a taxa que os bancos cobram uns dos outros para empréstimos, conhecida como Libor para London Interbank Offered Rate, tem subido constantemente. E a importância da Libor vai muito além da Europa: é a taxa que ajuda a determinar as taxas de juros em muitos empréstimos imobiliários e nos cartões de crédito dos consumidores dos Estados Unidos.
As taxas de empréstimo dos bancos ainda estão bem abaixo do ápice da crise financeira. Temor de que os problemas da Europa façam efeito nos Estados Unidos, no entanto, levou o Banco Central americano a retomar linhas de crédito para o Banco Central Europeu e outros bancos centrais em conjunção com o pacote de resgate europeu anunciado uma semana atrás.
A medida garantiu que as instituições europeias poderão tomar dólares para emprestar a seus clientes, mas isso é mais caro do que contar com o dinheiro de investidores privados.
“Não fizemos isso por amor especial à Europa”, Narayana R. Kocherlakota, o presidente do Banco Central de Minneapolis, disse a um grupo de pequenos empresários de Wisconsin na quinta-feira. “Somos autoridades dos Estados Unidos e tomamos decisões para manter a economia americana forte”. No entanto, ele disse, “os problemas de liquidez nos mercados europeus podem criar problemas perigosos de falta de liquidez em nossos próprios mercados financeiros”.
Não é o único dominó que pode cair.
Se a exposição direta de bancos americanos à Grécia é mínima, as instituições financeiras dos Estados Unidos estão fortemente interligadas a grandes bancos europeus, os quais tem grandes investimentos nas nações mais fracas da Europa.
Por exemplo, os bancos portugueses devem 86 bilhões de dólares a bancos da Espanha, que por sua vez devem 238 bilhões a bancos alemães e 220 bilhões de dólares a bancos franceses. Os bancos americanos também controlam grande quantidade de dívida de bancos espanhóis, cerca de 200 bilhões de dólares, de acordo com o Banco de International Settlements, uma organização global que serve a bancos centrais.
Além disso, os formuladores das políticas financeiras se encontram quase sem armas em seu arsenal.
Depois de emprestar trilhões para estimular suas economias e acabar com as preocupações de crédito durante a última onda de medo no fim de 2008 e início de 2009, os governos não podem emprestar outros trilhões sem causar inflação e atropelar outros emprestadores, como indivíduos e companhias. As taxas de juros de curto prazo, próximas de zero nos Estados Unidos, não podem mais ser reduzidas. E passos vitais como o aumento de impostos ou corte de investimentos poderiam atrapalhar o início da recuperação econômica do norte da Europa e piorar a situação de economias em dificuldades como a da Espanha, onde o desemprego recentemente ultrapassou 20%.
Com a exceção dos tempos de guerra, “as finanças públicas da maioria dos países industriais avançados estão em estado pior hoje do que em qualquer outro período desde a revolução industrial”, Willem Buiter, o principal economista do Citibank, escreveu em um relatório recente.
“Restaurar o equilíbrio financeiro vai emperrar o crescimento por muitos anos”.
quarta-feira, maio 19, 2010
Deu no New York Times
Deu no New York Times
quarta-feira, 19 maio, 2010 às 17:02
Nem todo leitor americano é Homer Simpson, e eles estão cuspindo fogo contra a política dos EUA em relação ao Irã
Muitas vezes, quando criticamos os Estados Unidos, as pessoas pensam que o povo americano compactua com tudo o que seu governo faz. Não é verdade. Nem nos EUA, nem em Israel. Existe uma boa parcela da população com capacidade crítica para entender os interesses e as atitudes do governo americano, que não são os de seu povo.
Nossa comentarista Miack nos mandou o link dos comentários que os leitores do The New York Times fizeram à matéria do jornal, amplamente reproduzida no mundo todo, sobre o acordo anunciado por Hillary Clinton de que EUA, China e Rússia teriam chegado a um acordo para impor novas sanções ao Irã, mesmo após o entendimento firmado entre Irã, Brasil e Turquia.
São seis páginas de comentários, a grande maioria contrária à atitude do governo americano. A maioria procede dos diferentes estados norte-americanos, mas há considerações de leitores de outros países, inclusive do Brasil.
Para dar uma idéia de como os americanos viram a questão, traduzo livremente alguns comentários, alguns até com sugestões de como a imprensa deveria agir para desmascarar certos blefes, como pareceu ser o da secretária de Estado de Obama.
“Por que somos tão obcecados em estabelecer sanções? Anunciar sanções logo depois do acordo Turquia-Brasil-Irã mostra ao mundo que nós não estamos interessados em nenhuma possibilidade de solução pacífica.” (Califórnia)
“Irã, Brasil e Turquia não podem ameaçar a paz mundial prevenindo a próxima “boa guerra”! De qualquer maneira, o que dizer da atual proliferação nuclear no Oriente Médio, em Israel?” (Nova Iorque)
Coisas estranhas estão acontecendo. Mas obrigado por nos esclarecer. Nós eramos ignorantes, eu acho, acreditando que eram os EUA jogando com o resto do mundo nas últimas décadas, EUA e a União Soviética que nos levaram às raias de um holocausto nuclear, os EUA que depuseram um chefe de Estado democraticamente eleito no Irã (Mossadegh) e o substituíram por outra marionete, e Israel tendo tanto as (não divulgadas) armas nucleares quanto a retórica contra armas nucleares em outro país soberano (Irã). Obrigado por nos colocar no caminho certo. Vocês deveriam ir para a Fox, com certeza eles lhes ofereceriam um emprego.” (Bélgica)
“Todo mundo está tentando livrar a cara agora que o acordo alcançado via Brasil e Turquia revelou a constante toada dos EUA e de Israel nessa questão. Sanções nunca funcionaram porque as pessoas erradas são sempre as prejudicadas. Se você quer falar sobre o Irã você deve estar disposto a permitir que a palavra Israel passe por sua boca.” (Wisconsin)
“A senhora Clinton é bonita, elegante e sincera, mas as sanções não funcionariam porque são tingidas por fervor religioso e cultural. Posso perguntar a ela por que sanções não foram impostas a Israel, Índia e Paquistão?” (Nova Iorque)
“Por que isso quando países como Turquia e Brasil sugerem algo que eu começo a acreditar mais do que quando China, Rússia e EUA sugerem alguma coisa?” (Portland)
O poder da elite dos traficantes da guerra fará seu caminho. Eles sempre conseguem. Guerra perpétua é rentável”. (Texas)
“Os senhores da Guerra, como sempre – os EUA parecem não ter aprendido nenhuma lição da sua aventura no Iraque e a subseqüente perda de prestígio e poder. (Flórida)
“Por quê os EUA estão confrontando tanto o Irã? Deve ter mais coisa nisso do que somente armas nucleares… Eu concordo que não devem existir armas nucleares no Irã, nem nos EUA, Reino Unido, China, França, Rússia, Índia, Israel, Paquistão…É uma perdição para a humanidade. Todos vocês devem desmontá-las agora. Por que vocês as mantêm se não vão usá-las?” (Nova York)
“Os EUA realmente querem evitar outra Guerra? Essa nova leva de sanções contra o Irã dizem que não.” Aparentemente, a busca da paz não inclui os esforços de outras nações em consegui-la”. (Carolina do Norte)
“Voces sabem que os EUA acabaram de aprovar US$ 180 bilhões para aprimorar armas nucleares? Por que o Irã não pode? As pessoas não podem ser tão egoístas em sacrificar a segurança de outras pessoas para se sentirem seguras! Eu não posso entender…” (Xangai)
“E Clinton é como Pinóquio: China apóia acordo entre Brasil, Turquia e Irã…” (Brasil)
“Eu acho interessante que, num artigo que diz que os EUA obtiveram o apoio de China e Russia para seu esforço de sanções, não há absolutamente nenhuma menção à confirmação de China e Rússia a tal acordo. Muito suspeito, para dizer o mínimo, desde que os EUA muitas vezes disseram ter o apoio de Rússia e China para seus planos e a realidade subseqüente provar o contrário. Por que, como parte dessa história, os jornalistas não pediram comentários dos dois governos em questão? Quando os chineses disserem que estão propensos a apoiar as sanções, então eu acredito.” (Virgínia)
“A máscara caiu! Estão mais que claros agora os objetivos dos EUA e de seus parceiros: Impor ao Irã sanções que matam crianças, vamos dizer por 10 anos, instalar uma festa de petróleo por comida, drenar a capacidade do Irã de se defender, conclamar uma invasão military, destruir, torturar, estuprar e finalmente colocar uma marionette no poder para que os membros da coalizão possam mover suas companhias de petróleo para Teerã.
A única coisa incrível sobre isso é que o mundo já assistiu essa novela mas, de alguma maneira, é forçado a concordar com o nuclearmente armado (e única nação com experiência em usá-las contra civis) Estados Unidos da América.
Os EUA podem conseguir impor isso, mas o sentimento antiamericano irá aos céus! Os terroristas que irão atacar nossas crianças amanhã estão sendo alimentados pela América hoje.” (Escandinávia)
E por último, o de Phil Greene, lá de Houston, Texas, tido como um estado dos mais conservadores:
“Leia os jornais, Hillary. O caso foi resolvido por Brasil, Turquia e Irã ontem. Rasteje de volta para seu buraco; o Mundo te deixou para trás.” (Texas)
A mídia brasileira, sempre a serviço dos interesses de Washington
19 de maio de 2010 às 10:44
A mídia brasileira, sempre a serviço dos interesses de Washington
O mal estar da grande mídia por conta do acordo Brasil-Irã-Turquia
Por Dennis de Oliveira
Este final de semana foi cômico para a mídia conservadora que não conseguiu disfarçar o seu mal estar e incômodo com o acordo obtido pelo governo brasileiro com o Irã a respeito da contenda do programa nuclear da nação persa. Na sexta e no sábado, a tônica unânime da mídia hegemônica brasileira foi que o presidente Lula estaria “perdendo tempo”, que estava “arriscando a credibilidade internacional do país” ao tentar negociar com um governo já qualificado como “pária”, “autoritário”, “desequilibrado”, entre outros
No domingo, a Folha de S. Paulo estampou na matéria sobre o tema o título “Irã dá ao Brasil um polêmico protagonismo” com duas linhas finas: “Gestões de Lula conseguem reduzir isolamento de Teerã e adiar sanções na ONU, mas dificilmente resultarão em recuo iraniano” e “Esforços por acordo com país persa têm gerado críticas à política externa brasileira; presidente se reúne hoje com Ahmadinejad e Khamenei”.
A matéria do jornalista enviado especial a Teerã, Sammy Adghirni começa com o seguinte lide: “A despeito do discurso otimista, a mediação do presidente Luiz Inácio Lula da Silva nas conversas sobre o programa nuclear iraniano provavelmente não surtirá efeito”. As críticas citadas na linha fina vieram de um analista do jornal Washington Post e de um ex-assessor do governo dos EUA, Bill Clinton. Fontes dos EUA, país diretamente interessado em isolar o Irã por conta da sua estratégia geopolítica internacional que privilegia o enfraquecimento dos países adversários de Israel e o fortalecimento deste (que, diga-se de passagem, possui armas atômicas).
O jornal O Estado de S. Paulo vai na mesma linha e busca apoio para esta posição na aparentemente insuspeita candidata do Partido Verde, a senadora ex-petista Marina Silva, que critica a tentativa de um diálogo com um “governo que desrespeita os direitos humanos”.
Bem, chega o domingo à noite e o acordo é acertado entre Brasil, Irã e Turquia. A aposta no fracasso dá lugar ao ceticismo com misto de inveja e dor de cotovelo. O portal da revista Veja lembra que o Irã já “descumpriu” acordos anteriores e por isto, nada garante que este vai ser cumprido. Lembra ainda que o acordo está restrito a uma das usinas, mas a secretária Hillary Clinton acredita existir outras instalações nucleares no Irã. O portal da Veja só esqueceu de lembrar que o governo Bush também disse que o Iraque tinha armas de destruição em massa e por isto invadiu-o. As investigações posteriores mostraram que esta informação era falsa e tudo não passou de um pretexto para aquela guerra absurda.
Na mesma toada de ser cético – agora não quanto a fazer o acordo, mas sim quanto à eficácia do acordo – vieram Folha e Estadão. O jornalão dos Mesquita novamente usou Marina Silva para reforçar o ceticismo. Para a senadora, a estratégia do Irã ao fechar acordos como o do ano passado e o atual é ganhar tempo. “É bom não perder a perspectiva histórica, de que aquele país tem perseguido a construção de artefatos nucleares e da bomba atômica. Há indícios que preocupam”, avaliou (trecho da matéria publicada no portal Estadão hoje).
Na Folha online, a forma de tentar reduzir a importância do acordo foi destacar o anúncio de que o Irã afirmou que irá continuar enriquecendo urânio a 20% (em uma linha final de um dos vários textos do portal UOL, é dada a informação – sonegada em quase todas notícias – de que para fazer uma bomba atômica é necessário enriquecer urânio a 90%!). Também repercutiu as opiniões céticas de “analistas internacionais” – sempre dos EUA e das potências nucleares europeias, interessadas diretas em bloquear o acesso dos países em desenvolvimento à tecnologia nuclear, porém deu espaço a um articulista iraniano que deu uma visão diferenciada, enfatizando o papel importante de mediação do Brasil e da Turquia, vistos como países “amigos” do Irã, ao contrário dos demais membros do Conselho de Segurança da ONU.
O que chama a atenção nesta cobertura? Primeiro, o alinhamento ideológico da mídia conservadora a uma política internacional de submissão aos Estados Unidos e demais potências mundiais, criticando qualquer iniciativa internacional independente da chancelaria brasileira, em especial a geopolítica Sul-Sul. Segundo, a transformação do espaço de noticiário em lugar de manifestação explícita de opinião e uma “quase torcida” para que estas iniciativas da chancelaria brasileira fracassem e, quando dão certo, a recusa em reconhecer o erro de avaliação. E, terceiro, a postura desavergonhada de ocultação de informações (por exemplo, que este enriquecimento do urânio no Irã não é suficiente, nem de longe, para a fabricação de armas nucleares), de escolha ideológica de fontes (todas elas das grandes potências, em especial dos EUA) e a tentativa de construção de um consenso de que a ação política das “potências ocidentais” é o lado do bem e o Irã, o lado “mau”.
E, travestidos de vestais do bem, os jornais pouco deram espaço – como dão, por exemplo, quando a China ou Cuba expulsam um dissidente político – ao fato de que Israel impediu o pensador judeu norte americano Noam Chomsky de fazer uma palestra em Ramallah porque ele é um crítico áspero da política israelense para os palestinos. Será que isto não é ataque à “liberdade de expressão” ou isto acontece só quando vem do Chavez, do Castro ou do Lula?
Dennis de Oliveira é professor da Escola de Comunicações e Artes da USP, coordenador geral do CELACC (Centro de Estudos Latino Americanos de Cultura e Comunicação) e membro do Alterjor (Grupo de Pesquisa de Jornalismo Popular e Alternativo).
Le Monde: O Sul emergente abre alas e pede passagem
19 de maio de 2010 às 18:42
Le Monde: O Sul emergente abre alas e pede passagem
Irã nuclear: o Sul emergente abre alas e pede passagem, na negociação
19/5/2010, “Opinion”, Le Monde, Paris
http://www.lemonde.fr/opinions/article/2010/05/19/nucleaire-iranien-le-sud-emergent-veut-sa-place-dans-la-negociation_1353888_3232.html
Tradução de Caia Fittipaldi
O Sul emergente já aparecera antes, em cena que provocou frisson e alarido no palco internacional, em domínios do meio ambiente e do comércio. Essa semana, inaugura nova etapa, importante sinal de o quanto aumenta o poder desses países.
Ei-los ativos em terreno que, até agora, permanecia como quase-monopólio das tradicionais “grandes potências”: a proliferação nuclear no Oriente Médio – ou, em resumo, a relação de forças numa região-chave para Europa e Estados Unidos.
Os livros de História guardarão a data – 2ª-feira, 17 de maio –, em que Brasil e Turquia apresentaram à ONU acordo negociado com Teerã, sobre uma das facetas da questão nuclear iraniana.
Pense-se o que se pensar sobre o texto que resultou dessa mediação turco-brasileira, a própria mediação, em estratégia de mostrar fato consumado – não foi mediação solicitada –, muda consideravelmente o quadro mundial. Ela quebra de facto o domínio até agora reservado aos cinco membros permanentes do Conselho de Segurança da ONU: China, EUA, França, Grã-Bretanha e Rússia.
Endereçada exatamente a esses, a mensagem do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e do primeiro-ministro Recep Tayyip Erdogan é clara: nem pensem, em 2010, em porem-se a reinar só vocês, sobre uma ordem internacional na qual o peso das nações evolui a favor de países como os nossos (o Sul emergente estende-se do Egito à África do Sul, da Nigéria à Indonésia).
AMBIÇÕES POLÍTICAS LEGÍTIMAS
Para os que ainda não entenderam: Brasil e Turquia, segunda-feira passada, puseram os pontos nos “is”. São membros, sim, do grupo dito “5 +1”, ou “os Cinco” que, na ONU, discute a questão nuclear iraniana.
O grupo é constituído dos cinco membros permanentes do Conselho de Segurança acima citados, mais a Alemanha. Os cinco países acusam o Irã de descumprir compromissos internacionais e de ignorar várias Resoluções da ONU. Suspeitam que Teerã mantenha um programa de enriquecimento de urânio que parece ter uma única finalidade: militar.
As ambições políticas dos países do Sul são legítimas. Têm de ser acolhidas positivamente. Mas, no caso do dossiê iraniano, a desconfiança dos Cinco tem fundamento. Evidentemente, todos saudaram a iniciativa turco-brasileira como “um passo na direção certa”.
Simultaneamente, para marcar a desconfiança quanto à substância do acordo anunciado em Teerã, os Cinco já avisaram, na 3ª-feira, que manterão a pressão sobre o Irã. Trabalham agora num projeto de Resolução que prevê novas sanções contra a República Islâmica.
Têm razão. O documento turco-brasileiro propõe que uma parte – apenas uma parte – do urânio iraniano seja armazenada no exterior, em troca de combustível enriquecido só aproveitável para uso civil. Assim, não se impede o Irã de produzir o urânio mais potente de que carece para produzir arma nuclear.
Os iranianos já disseram, ontem: não pensam em suspender seu próprio programa de enriquecimento de urânio… Têm razão, pois, os Cinco, que exigem mais.
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