Concessões públicas não deveriam ser usadas em prejuízo da população. E no caso das emissoras de rádio e TV, cuja influência é decisiva na formação de hábitos e do caráter da audiência, o bônus da concessão deveria ter como contrapartida um alto grau de responsabilidade com a saúde dos ouvintes e telespectadores mais suscetíveis à propaganda: as crianças e os jovens.
Assim pensa o senador Geraldo Mesquita Júnior (PMDB-AC). Para ele, a propaganda de bebidas alcoólicas é o lado negativo da televisão brasileira. Ao homenagear, na última terça-feira (10), a Rede União de Rádio e Televisão e seu caráter educativo, o parlamentar lamentou a tramitação vagarosa de projeto de sua autoria que proíbe a propaganda de bebidas alcoólicas em rádios e canais televisivos.
- Eu vou sair do Congresso Nacional triste e decepcionado com o fato de que aqui não conseguimos resolver essa questão. O projeto dorme nas gavetas do Senado desde que cheguei aqui - desabafou Mesquita Júnior na sessão de homenagem à Rede União.
Na interpretação do senador, existe um "lobby fortíssimo" que atua no Congresso Nacional e vem dificultando a tramitação da matéria. Para ele, as cervejarias patrocinam essa propaganda massiva de bebidas principalmente para atrair o público mais jovem.
- Quem quiser beber que beba, mas o rádio e a televisão são instrumentos públicos no nosso país, e o poder público permitir que essas empresas veiculem propaganda de bebida alcoólica é uma covardia. Covardia com a juventude e covardia com a rede de saúde que recolhe milhares e milhares de pessoas que sofrem de todos os males decorrentes da ingestão de bebidas alcoólicas - disse o senador.
Atualmente, o projeto (PLS 182/03) está na Comissão de Ciência, Tecnologia, Inovação, Comunicação e Informática (CCT) e já passou pelas Comissões de Assuntos Sociais (CAS) e de Educação, Cultura e Esporte (CE). Nesta última, foi realizada uma audiência pública em outubro de 2005 sobre o assunto.
Nessa audiência, o então coordenador de Saúde Mental do Ministério da Saúde, Pedro Delgado, afirmou que o Brasil deveria pelo menos adotar restrições de horário e de conteúdo à propaganda de bebidas alcoólicas nas emissoras de rádio e televisão. Já o então diretor do Sindicato Nacional das Indústrias de Cerveja, Luiz Osório, argumentou que essas propagandas teriam "pouco ou nenhum efeito" no consumo total de bebidas. Já um representante do Conselho Nacional de Autorregulamentação Publicitária (Conar) defendeu que a proibição desse tipo de publicidade seria inconstitucional.
- Inconstitucional é a gente colocar uma questão comercial acima de uma questão de saúde pública nacional - afirmou Mesquita Júnior à época.
Na justificação de seu projeto, Mesquita Júnior afirma que o consumo de álcool causa milhares de mortes todos os anos no mundo, além de deixar pessoas incapacitadas ou com sérios problemas de saúde, como o próprio alcoolismo, depressão, cirrose hepática e lesões decorrentes de acidentes automobilísticos.
"É um contrassenso que as empresas fabricantes de bebidas se utilizem de concessões públicas (rádios e emissoras de televisão) para promover o consumo de produtos sabidamente nocivos à saúde da população. Precisamos, urgentemente, eliminar a influência perniciosa da propaganda de bebida alcoólica sobre o comportamento da juventude", acrescenta o senador na justificação.
As informações são da Agência Senado.Merece um destaque especial a afirmação do representante do Sindicato Nacional das Indústrias de Cerveja de que essas propagandas teriam "pouco ou nenhum efeito" no consumo total de bebidas. Ele subestima inteligência dos seus interlocutores de forma quase agressiva. Caso a propaganda não tivesse efeito sobre o consumo a indústria gastaria centenas de milhões em mídia? Teria a indústria de bebidas alcoólicas perdido o domínio da própria razão, embriagada pela mídia, para desperdiçar tanto dinheiro?