Mais cedo
postei o artigo (insuspeito, de um dirigente de bancomultinacional) falando do peso da educação no desenvolvimento chinês.
Agora, antes de almoçar, leio uma matéria que seria irônica, se não fosse trágica.
E, também, no insuspeitíssimo O Globo.
É que o
blog do Big Brother, certamente por distração de seus mentores, publica a seguinte informação:
“Na quarta-feira, 30 de março, existirão 169 ex-integrantes do “Big Brother Brasil”. Um número que chama atenção ao ser posto, lado a lado, ao de profissionais com carteira assinada em algumas atividades regulamentadas pelo Ministério do Trabalho: hoje, no Brasil, existem 18 geoquímicos, 34 oceanógrafos, 77 médicos homeopatas e 147 arqueólogos, entre outros ofícios. No entanto, na mesma quarta, alguém estará R$ 1,5 milhão mais rico (ou menos pobre, dependendo do ponto de vista), e não será um desses trabalhadores.”
Pois é. Mas o que o “brother” vai ganhar é nada, perto do que
a Globo fatura.Ano passado foram R$ 300 milhões; em 2011, estima-se, R$ 400 milhões. E fatura porque as grandes empresas pagam para patrocinar.
Não tenho notícia de uma grande empresa patrocinando uma Universidade. Não tenho notícia de uma multinacional investindo na formação de oceanógrafos, ou de arqueólogos, ou de homeopatas, ou geoquímicos.
Nem vejo os nossos gloriosos colunistas dizendo que as empresas devem ter uma função social, como prevê, desde 1946, a nossa Constituição.
Nada contra as moças e rapazes que estão ali tentando um lugar ao sol que, em nosso país, durante décadas, nos acostumamos a não merecer pelo estudo, pelo trabalho, pela austeridade. “Faz parte”, como dizia o bordão de um ex-”brother”.
Mas tudo contra o império do interesse comercial moldando, a seu bel-prazer, um
comportamento social marcado pela competição a qualquer preço, pelo exibicionismo, pelo vazio, para embolsar milhões.
Sempre é bom repetir o que diz o artigo 221 de nossa Constituição:
A produção e a programação das emissoras de rádio e televisão atenderão aos seguintes princípios:
I – preferência a finalidades educativas, artísticas, culturais e informativas;
II – promoção da cultura nacional e regional e estímulo à produção independente que objetive sua divulgação;
III – regionalização da produção cultural, artística e jornalística, conforme percentuais estabelecidos em lei;
IV – respeito aos valores éticos e sociais da pessoa e da família.
É por isso que quando a Globo fala em princípios, em educação, em trabalho honesto, em respeito ao ser humano, o cheiro da hipocrisia se espalha no ar.
O negócio da China é outra coisa
Há, hoje, na
Folha de S. Paulo, um artigo que merece ser lido com atenção. Não é de um téorico de economia, de um sociólogo, muito menos de um esquerdista. Ao contrário, é do presidente do Conselho de Administração do Banco Santander.
Fábio Colleti Barbosa dá o testemunho de quem viu, pessoalmente, que o desenvolvimento chinês não é, como muita gente pensa, obtido com uma legião de trabalhadores miseráveis produzindo quinquilharias de baixo custo.
Ao contrário, envolve mercado interno, avanço tecnológico e, sobretudo, educação.
Como o acesso é só para assinantes, reproduzo, aqui, alguns trechos, com grifos meus:
“Muitas vezes ouço previsões de que o modelo chinês não se sustentará e várias razões que aparentemente fazem sentido são apresentadas para suportar esse argumento.
Possível bolha imobiliária, qualidade dos ativos dos bancos, migração rural, demanda por maior abertura democrática etc. estão frequentemente na lista dos alertas feitos repetidamente nos últimos muitos anos. O fato, porém, é que a economia chinesa cresceu a uma média de 9% anuais nos últimos 34 anos -e há 33 anos os economistas ocidentais dizem que esse crescimento não vai perdurar.” (…)
“Há poucos anos, viajei pelo interior da China para regiões pouco visitadas por turistas estrangeiros e pude ver quão abrangente é a mudança que ocorre em todo o país. Claro que de forma desigual, mas ainda assim é comum encontrar aeroportos, estradas, banda larga e hotéis modernos e de bom nível. O mercado interno chinês é gigantesco, e um exemplo é que neste ano a China deverá produzir perto de 16 milhões de veículos (o Brasil produziu 3,6 milhões em 2010), tornando-se o maior produtor mundial, e quase tudo para consumo interno.
O segundo ponto tem a ver com os produtos chineses, muitas vezes associados a menor qualidade. Isso está mudando. Empresários comprovam a evolução por conta dos equipamentos industriais de alta tecnologia que compram da China.
Assim como seus vizinhos Japão e Coreia do Sul, que entraram no mercado global com produtos de baixo valor agregado e rapidamente migraram para produtos de alta qualidade, a China avança rapidamente.
Mas o que realmente parece dar sustentação a essa arrancada da economia chinesa é o salto na educação. Os chineses estão estrategicamente investindo nos seus jovens.
Alguns dados: há cerca de 130 mil chineses em cursos de pós-graduação nos EUA; há mais de 300 milhões de crianças aprendendo inglês na China; quatro universidades chinesas apareceram no recente ranking das cem melhores do mundo (nenhuma brasileira, a propósito).”(…)
“Portanto, o que acontece na China não me parece algo passageiro ou fruto de uma estratégia apenas focada em subsídios ou distorção cambial. A crescente eficiência da China está sendo alicerçada com vultosos investimentos na qualidade da educação em todos os níveis.“
É muito bom que um executivo – e um executivo de banco, e de um banco multinacional – esteja vendo isso.
Claro que ninguém acha que China e Brasil são iguais, mas o desenvolvimento de gigantes como ambos são passa por fundamentos semelhantes.
Jamais seremos grandes como exportadores de
commodities, de produtos primários, apenas.
Muito menos fazendo como a Vale fez, mandando construir na China 12 supernavios para levar para lá o minério em bruto, praticamente.
Não digo que os chineses não pudessem encomendar 12 navios ao Brasil. Mas é provável que eles mandassem junto o próprio estaleiro que os construiria. E para levar o aço chinês, feito com o nosso minério, para os compradores dos EUA e da Europa. Ah, e algum para cá, porque as mineradoras, a Vale à frente, também pouco investem aqui em siderurgia, pela necessidade de reduzirem um pouco os lucros gigantescos de hoje e ganhar mais – as empresas e o país – amanhã.
Mas o Roger Agnelli é um gênio, não é?
*Tijolaço