Ao ingresso da Venezuela no Mercosul sucederam variadas críticas de tons
e razões distintas, mas que apontam a dificuldade dos setores
conservadores em aceitar o avanço da integração na região e o
fortalecimento dos países-membros que, sob uma mesma orientação
geopolítica, vêm mostrando que existe um modelo alternativo de
desenvolvimento.
Um paradigma que passa ao largo da dependência dos receituários neoliberais que, por tanto tempo, comprometeram seu progresso.
Contudo, o que a crítica não se dá ao trabalho de manifestar em seus
inúmeros discursos dedicados não só a desaprovar a entrada da Venezuela,
mas também em desqualificar a importância do Mercosul, é a dimensão
econômica da incorporação venezuelana e os benefícios de uma integração
que, em muitos aspectos, já existe.
Com a entrada da Venezuela, o PIB do Mercosul somará cerca de US$ 3,2
trilhões, alcançando 75% do total da América do Sul. A população dos
países membros abarcará 70% do total da região, um total de 272 milhões
de pessoas.
Nos últimos sete anos, as importações feitas pela Venezuela de países do Mercosul aumentaram mais de seis vezes.
Além disso, a integração resultará em um bloco dos mais importantes
mundialmente, com destaque na produção de energia, alimentos e
manufaturados, dada as imensas reservas de minerais, água potável e rica
biodiversidade do vizinho caribenho.
O novo membro do Mercosul é o quinto maior produtor mundial de petróleo
e, segundo relatório anual da Organização dos Países Exportadores de
Petróleo (Opep), divulgado em julho de 2011, chegou ao fim de 2010 com
uma reserva comprovada de mais de 250 bilhões de barris, superando até
mesmo a Arábia Saudita.
As reservas venezuelanas triplicaram nos últimos cinco anos e alcançaram
quase 20% do total mundial, um resultado relacionado às recentes
descobertas e certificações da Faixa Petrolífera do Orinoco. O país
detém ainda a oitava maior reserva de gás do planeta.
A adesão de um país caribenho que possui localização privilegiada e
fácil acesso marítimo também amplia geopoliticamente a força do bloco e
deve abrir caminho para o ingresso de novos membros — o que está de
acordo com o intuito de incrementar o comércio regional, ampliar a pauta
comercial e aumentar a competitividade da região frente a outros
centros.
Por tudo isso, não nos deixemos enganar: o Mercosul é, sim, estratégico
para o desenvolvimento dos países sul-americanos, e a adesão da
Venezuela só contribui para a afirmação do bloco, especialmente se
superarmos as dificuldades e investirmos em uma agenda de integração
produtiva, que seja capaz de ampliar o ciclo de crescimento econômico.
A consolidação de um bloco integrado e fortalecido cria também um
instrumento essencial de afirmação e defesa da América do Sul em suas
relações com os demais países e blocos, com capacidade de responder de
forma mais ágil à crise mundial, a partir de políticas comuns de
crescimento, valorização dos mercados internos, fortalecimento do
comércio regional e uso sustentável de nossa grande diversidade de
recursos naturais.
Para o Brasil, a integração da Venezuela ao Mercosul intensifica e torna
ainda mais promissora uma relação de grandes parcerias e elevada
colaboração. De 2003 para cá, o comércio entre os dois países, que era
de US$ 880 milhões, saltou para US$ 5,9 bilhões em 2011.
Nos cinco primeiros meses deste ano, as exportações do Brasil para a
Venezuela cresceram 40,6% em relação ao mesmo período do ano passado. A
Venezuela é hoje o terceiro superávit comercial do Brasil, figurando
entre os nossos três maiores sócios comercias desde 2007.
A integração entre os dois países tem apresentado progressos
significativos nos últimos anos por meio de acordos entre órgãos
venezuelanos e brasileiros, como Caixa Econômica Federal (CEF), Empresa
Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), Agência Brasileira de
Desenvolvimento Industrial (ABDI), Petrobras e Eletrobras.
Além da ampla aliança entre o setor público, a entrada do país no
Mercosul amplia as perspectivas de avanços na agenda de projetos que
envolvem empresas privadas brasileiras — como Odebrecht, OAS, Camargo
Corrêa, Andrade Gutierrez, Braskem, Ambev, Gerdau, entre outras.
A eventual associação da PDVSA venezuelana e da Petrobras, que está
dentre as possíveis parcerias mais promissoras entre Brasil e Venezuela,
resultaria na maior empresa petrolífera do mundo, projetando ainda mais
o bloco no cenário internacional.
As relações entre o Brasil e a Venezuela se dão com grande cooperação e
servem de exemplo de parceria bem sucedida, não apenas no campo
comercial, mas, sobretudo, de troca de experiências e integração
produtiva, fundamentais para o nosso desenvolvimento regional.
A América do Sul vive hoje, graças à ascensão, na última década, de
governos progressistas, situação muito favorável à construção de uma
dinâmica integradora, de um projeto comum, sustentado na cooperação, no
desenvolvimento econômico, na solidariedade.
Por isso, segue fundamental afirmar o papel do Mercosul como projeto de
união regional e, principalmente, como estratégia para o desenvolvimento
dos países sul-americanos. O Brasil tem grande responsabilidade nessa
empreitada, e o ingresso da Venezuela deve ser festejado como fator
capaz de dar novo impulso à agenda regional.
José Dirceu, advogado, ex-ministro da Casa Civil e membro do Diretório Nacional do PT