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Ser de esquerda é não aceitar as injustiças, sejam elas quais forem, como um fato natural. É não calar diante da violação dos Direitos Humanos, em qualquer país e em qualquer momento. É questionar determinadas leis – porque a Justiça, muitas vezes, não anda de mãos dadas com o Direito; e entre um e outro, o homem de esquerda escolhe a justiça.
É ser guiado por uma permanente capacidade de se estarrecer e, com ela e por causa dela, não se acomodar, não se vender, não se deixar manipular ou seduzir pelo poder. É escolher o caminho mais justo, mesmo que seja cansativo demais, arriscado demais, distante demais. O homem de esquerda acredita que a vida pode e deve ser melhor e é isso, no fundo, que o move. Porque o homem de esquerda sabe que não é culpa do destino ou da vontade divina que um bilhão de pessoas, segundo dados da ONU, passe fome no mundo.
É caminhar junto aos marginalizados; é repartir aquilo que se tem e até mesmo aquilo que falta, sem sacrifício e sem estardalhaço. À direita, cabe a tarefa de dar o que sobra, em forma de esmola e de assistencialismo, com barulho e holofotes. Ser de esquerda é reconhecer no outro sua própria humanidade, principalmente quando o outro for completamente diferente. Os homens e mulheres de esquerda sabem que o destino de uma pessoa não deveria ser determinado por causa da raça, do gênero ou da religião.
Ser de esquerda é não se deixar seduzir pelo consumismo; é entender, como ensinou Milton Santos, que a felicidade está ancorada nos bens infinitos. É mergulhar, com alegria e inteireza, na luta por um mundo melhor e neste mergulho não se deixar contaminar pela arrogância, pelo rancor ou pela vaidade. É manter a coerência entre a palavra e a ação. É alimentar as dúvidas, para não cair no poço escuro das respostas fáceis, das certezas cômodas e caducas. Porém, o homem de esquerda não faz da dúvida o álibi para a indiferença. Ele nunca é indiferente. Ser de esquerda é saber que este “mundo melhor e possível” não se fará de punhos cerrados nem com gritos de guerra, mas será construído no dia-a-dia, nas pequenas e grandes obras e que, muitas vezes, é preciso comprar batalhas longas e desgastantes. Ser de esquerda é, na batalha, não usar os métodos do inimigo.
Fernando Evangelista

domingo, março 17, 2013

Charge foto e frase do dia











O jornal que incomoda fardas e batinas




Na manhã seguinte ao anúncio de um Papa argentino, o jornal ‘Página 12’ sacudiu Buenos Aires com a seguinte manchete: ‘!Dio, Mio!’
Na 6ª feira, como relata o correspondente de Carta Maior, Eduardo Febbro, direto do Vaticano, o porta-voz da Santa Sé reclamou do que classificaria como ‘acusações caluniosas e difamatórias’ envolvendo o passado do Sumo Pontífice.

Em seguida atribui-as a ‘elementos da esquerda anticlerical’.

Alvo: o ‘Página 12’ .

Com ele, seu diretor, o jornalista, Horácio Verbitsky, que tem um livro sobre o as suspeitas que ensombrecem a trajetória do cardeal Jorge Mário Bergoglio, durante a ditadura argentina.

A cúpula da Igreja acerta ao qualificar o ‘Página 12’ como ‘de esquerda’ – algo que ostenta e do qual se orgulha praticando um jornalismo analítico, crítico, ancorado em fatos.

Mas erra esfericamente ao espetá-lo de ‘anticlerical’.

O destaque que o jornal dispensa ao tema dos direitos humanos não se restringe ao caso Bergoglio.

Fundado ao final da ditadura, em maio de 1987, o ‘Página 12’ é reconhecido como o grande ponto de encontro da luta pelo direito à memória na Argentina.

Não foi algo premeditado.

No crepúsculo da ditadura militar, um grupo de jornalistas de esquerda vislumbrou a oportunidade de criar um veículo enxuto, no máximo 12 páginas (daí o nome), mas dotado de densa capacidade analítica.

E, sobretudo, radicalmente comprometido com a redemocratização e com os seus desafios.

A receita das 12 páginas baseava-se num cálculo curioso.

Era o máximo que se conseguiria produzir com qualidade naquele momento; e o suficiente para a sociedade reaprender a refletir sobre ela mesma.

A fidelidade a essa diretriz (hoje o total de páginas cresceu e a edição digital tem mais de 500 mil acessos/dia) levou-o, naturalmente, a investigar os crimes da ditadura.

Seu jornalismo tornou-se um acelerador da transição que os interesses favorecidos pelo regime militar gostariam de maquiar.

Não apenas interesses econômicos.

Lá, como cá, existe um núcleo de poderosas empresas de comunicação, alvo agora da ‘Ley de Medios’, no caso da Argentina, que, por interesse financeiro, identidade ideológica ou simples covardia integrou-se ao aparato repressivo.

Usufruiu e desfruta vantagens dessa intimidade. Até hoje. O quase monopólio das comunicações é uma delas – combatida agora pelo governo de lá.

Naturalmente, a pauta dos direitos humanos dispunha de um espaço acanhado e ambíguo nessa engrenagem.

Não por falta de familiaridade com o assunto.

Mais de uma centena de jornalistas foram presos e muitos desapareceram na ditadura argentina.

A principal fábrica de papel de imprensa do país foi praticamente expropriada de seus donos.

Eles estavam presos, foram torturados. E então a transferência de propriedade se deu.

A sociedade compradora tinha como participantes o próprio governo militar e os principais jornais apoiadores do regime. Entre eles o ‘El Clarín’, de oposição frontal ao governo Cristina, atualmente.

O ‘Página 12’ não se deteve diante das conveniências. E vasculhou esses impérios sombrios.

Fez o equivalente em relação aos direitos humanos em outros países. Não raro, com a mesma mordacidade que incomoda agora o Vaticano.

Quando Pinochet morreu em 2006, a manchete indagava: ‘Que terá feito o inferno para merecer isso?’

A condenação do ditador Videla à prisão perpétua, em 2010, mereceu letras garrafais: ‘Deus existe!’

Foi com essa ironia cortante, às vezes, mas sempre intransigente em defesa dos direitos humano, que o ‘Página 12’ tornou-se um espaço apropriado pelos familiares dos desaparecidos políticos.

Por solicitação de Estela Carlotto, atual dirigente das Abuelas de Plaza de Mayo, passou a publicar, desde 1988, pequenas atualizações da trajetória familiar de vítimas da ditadura.

Os anúncios sugerem uma espécie de prosseguimento da vida dos que foram precoce e violentamente apartados dela.

Filhos que perderam os pais ainda crianças, mencionam os netos que esses avós jamais viram; avós falam dos bisnetos.

O efeito é tocante ao se deparar com a foto de um jovem desaparecido que hoje poderia estar brincando com os netinhos na praça.

Em 2007, o ‘Página 12’ recebeu na Espanha o prêmio da Liberdade de Imprensa, instituído pela Casa da América, junto com a Chancelaria espanhola e o governo da Catalunha.

Motivo: a seriedade na defesa dos direitos humanos e o compromisso com o rigor da informação, requisito da liberdade de expressão.

No momento em que pairam sombras sobre o Vaticano, o que deve fazer essa cepa de bom jornalismo?

O ‘Página 12’ faz aquilo que em geral desagrada aos poderes terrenos e celestiais: investiga.

Ao contrário do que sugere o porta-voz da Santa Sé, o assunto extravasa o campo religioso e envolve uma questão política.

Um tema de interesse ecumênico universal, do qual o ‘Página 12’ não abre mão: o dever que todos, sobretudo as autoridades, tem de respeitar e fazer respeitar os direitos humanos e democráticos dos cidadãos.

Sob quaisquer circunstancias; e principalmente quando são ameaçados.

Há dúvidas se o passado do cardeal Mario Jorge Bergoglio nesse campo honra o manto santo que agora envolve Francisco, o desenvolto sucessor do atormentado Bento XVI.

As dúvidas estão marmorizadas em um lusco-fusco de pejo, silêncios e versões contrastantes.

É preciso esclarecer.

Há nomes, testemunhos, relatos, datas e um cenário dantesco: os anos de chumbo vividos pela sociedade argentina, entre 1976 e 1983.

O país do então líder dos jesuítas, Mario Jorge Bergoglio, vivia o inferno na terra, sob a ação genocida de uma ditadura cujos atos confirmam a indiferença aterrorizante dos aparatos clandestinos em relação à vida e à dor.

O que se ouve ainda arrepia.

A mesma sensação inspira o rosto endurecido e gasto de seus líderes militares, julgados e condenados, um a um.

Em sete anos, eles azeitaram uma máquina de torturar, matar e eclipsar corpos que operou infatigável.

Nessa moenda 30 mil pessoas foram liquidadas ou desapareceram.

Mais de 4 mil e duzentos corpos por ano.

Filhos de militantes de esquerda foram sequestrados e entregues a famílias simpáticas ao regime.

Muitos permanecem nesse limbo.

No dia em que a ‘fumata bianca’ do Vaticano anunciou o ‘habemus papam’ e em seguida emergiu a figura do cardeal argentino, no balcão do Vaticano, Graciela Yorio esmurrou as paredes de seu apartamento a 11.200 quilômetros de distancia, em Buenos Aires.

O relato está nos jornais argentinos e também na Folha de São Paulo.

A revolta deve-se a uma certeza guardada há 36 anos na memória dessa sexagenária.

Em maio de 1976, seu irmão, já falecido, padre Orlando Yorio, foi delatado a esse aparato sedento e recém-instalado.

Juntamente com o sacerdote Francisco Jalics, este vivo, na Alemanha— Yorio ficou cinco meses nas mãos dos militares, na temível Escola Mecânica da Marinha, transformada na máquina de moer ossos do regime.

O delator teria sido o cardeal Bergoglio. O Papa, então com cerca de 40 anos e um líder conservador entre os jesuítas.

Essa é a convicção de Graciela, baseada no que ouviu do irmão, falecido em 2000, militante, como Jalics, da Teologia da Libertação.

Jalics não se pronunciou, alegando viagem. Mas emitiu uma nota na Alemanha em que se diz em paz e reconciliado com Bergoglio.

A nota compassiva não nega a dor que levou Graciela a esmurrar paredes.

A estupefação tampouco é apenas sua, ainda que setores progressistas argentinos optem por uma certa moderação em público.

Estela Carlotto, a dirigente das Abuelas de Mayo, em entrevista ao ‘Página 12’ deste sábado, procura manter a objetividade num relato que adiciona mais nuvens às sombras.

Carlotto afirma que o Cardeal Bergoglio nunca fez um gesto de solidariedade para ajudar a luta mundialmente reconhecida das mães e avós de desaparecidos políticos argentinos.

Poderia, mas não facilitou a reunião do grupo com o Papa.

O primeiro encontro se deu em 1980, no Brasil, graças à mediação de religiosos brasileiros.

As abuelas só seriam recebidas em Roma três anos mais tarde, graças a essa intermediação.

Prossegue Estela Carlotto.

O cardeal Bergoglio teria sido conivente com o sequestro de pelo menos uma criança nascida na prisão.

Procurado por familiares da desaparecida política, Elena de la Quadra, teria aconselhado: ‘Não busquem mais por essa criança que está em boas mãos’.

E desfechou sentença equivalente em relação às demais.

O ‘Jornal Página 12’ tem sido o principal eco desses relatos e dessa revolta, que muitos relativizam e gostariam de esquecer.

O que o jornal faz ao investigar as dúvidas que pairam sobre Francisco é coerente com o desassombro de um veículo que nascei justamente com esse propósito: não sacrificar a memória ao conforto das conveniências.

Pode soar anticlerical a setores da Igreja que gostariam de esquecer o que já se cometeu em nome de Deus nesse mundo.

Talvez se afigure assim, também, a certos círculos no Brasil.

Mas na Argentina, graças à persistência de trincheiras, como a do ‘Página 12’, a memória deixou de ser o espaço da formalidade.

Hoje a memória é vista como um pedaço do futuro. Um mirante poderoso para se entender o presente e superar o passado.

Carta Maior orgulha-se de ser parceira do jornalismo criterioso e corajoso de ‘Página 12’ no Brasil.


*Saraiva

ITÁLIA autoriza o uso medicinal da maconha

Itália autoriza uso medicinal da maconhaEnquanto a mídia do mundo inteiro se concentra na tediosa eleição do novo Papa, um fato histórico passou praticamente despercebido na Itália: a legalização do uso medicinal da cannabis.Sim, é isso mesmo: o berço do catolicismo careta é agora o mais novo destino legalizado do planeta! Publicado na Gazeta Oficial no último dia 23 de fevereiro, um decreto do Ministério da Saúde reconhece aquilo que voê já está cansado de saber:  os benefícios medicinais da cannabis são maiores do que seus possíveis danos à saúde e potencial de vício.
Assinado em janeiro pelo ministro da Saúde, Renato Balduzzi, o projeto de lei entrou em vigor em meados de fevereiro. Desde então, a cannabis foi enquadrada em uma nova tabela de riscos (seção B), seguindo os princípios da Convenção das Nações Unidas sobre Drogas. Isso significa que está autorizado o uso da erva em todas as suas formas, desde que para fins medicinais. A medida tem o aval do Instituto Superior de Saúde, Conselho Superior de Saúde e  Departamento de Políticas Anti-Drogas da Itália.
O mais recente país da Europa a legalizar a maconha medicinal, depois da República Tcheca, a Itália agora será mais verde e florida do que nunca! Clique aqui para conhecer a íntegra do decreto oficial divulgado pelo governo italiano. Agora SÓ falta o Brasil acordar e deixar de lado a babaquice proibicionista em nome da saúde de milhões de pessoas que se beneficiarão com a legalização da maconha. 
*coletivoDAR

Os registros da primeira explosão nuclear subaquática

Por Vaas
Fotografias da primeira explosão nuclear subaquática do mundo  
Post por Valerie Scavone Em 1946, os Estados Unidos conduziram uma série de testes de armas nucleares, no Atol de Bikini, conhecido como Operação Cossroads. No total, duas bombas foram detonadas para testar os efeitos das explosões nucleares nos navios de guerra. A segunda, chamada Baker, foi a primeira bomba nuclear a ser detonada debaixo d´água. A Baker foi instalada cerca de 90 metros de profundidade e provocou um maremoto que atingiu 2 quilômetros de altura formando uma nuvem de cogumelo gigantesca.  Na primeira foto, é possível identificar a escala se você atentar-se aos navios ao redor. A explosão levantou milhões de toneladas de água e areia no ar, criando uma coluna de 6.000 pés de altura, 2.000 metros de largura e paredes de 300 pés de espessura!  Com resultados monstruosamente devastadores, a explosão do terceiro teste, chamado Charlie, programado para 1947, foi cancelado porque os navios de guerra ainda estavam tendo problemas para a descontaminação do teste de Baker. A expectativa de vida das pessoas envolvidas foi reduzida por uma média de três meses. Mais tarde, o teste ficou conhecido como o primeiro desastre nuclear do mundo.   Fotos e na sequência um vídeo!
 
      
O video: as imagens são impressionantes!


*Nassif

Revista Samuel apresenta trechos de livro que relaciona Igreja Católica à ditadura argentina


Publicação que chega às bancas nesta semana traz também dossiê especial sobre a crise econômica europeia

Reprodução
A eleição do cardeal argentino Jorge Mario Bergoglio como novo papa, passando a assumir o comando da Igreja Católica com o nome de Francisco, colocou de volta à baila as denúncias de ligação entre o clero daquele país com o regime militar (1976-1983) que, além das milhares de mortes, ficou marcado pelos inúmeros e violentos casos de violação aos direitos humanos e à tortura.

O próprio sumo-pontífice é apontado por Horacio Verbitsky, jornalista e escritor, autor de diversos livros sobre o tema, como envolvido com o regime opressor. O número oito da Revista Samuel, que estará nas bancas nesta semana, traz na seção “Vale a Pena Ler de Novo”  trechos do livro El Silencio, que revela como a instituição conspirou e ajudou a implantar a ditadura no país.

Já o dossiê especial fica por conta da crise europeia, que entra em seu quarto ano, não demonstra sinais de enfraquecimento e coloca em risco o modelo conhecido como “estado de bem estar social”, que por anos foi um norteador da promoção de igualdade em países de sistema capitalista.

Os textos selecionados abordam o futuro da moeda única; o endurecimento dos discursos nacionalistas, separatistas e antieuropeus; e as políticas de austeridade fiscal que restringem cada vez mais os direitos dos trabalhadores.

*NINA

sábado, março 16, 2013

O Caminho do Meio - laercio fonseca

María Gabriela Chávez: Obrigada por nos devolver a pátria

Charge foto e frase do dia















A TV COMO FERRAMENTA DO PROJETO BURGUÊS DE HEGEMONIA PAUTADA NO HIGIENISMO.

A TV COMO FERRAMENTA DO PROJETO BURGUÊS DE HEGEMONIA PAUTADA NO HIGIENISMO.






Os programas “humorísticos” da tevê brasileira, em geral, são realizados por pessoas da elite branca do sul-sudeste do país, que se sentem muito à vontade para praticar booling contra aqueles que não se enquadrem nesse perfil étno-sócio-econômico-geográfico.
Não é raro vermos programas como Pânico, Zorra Total, A Praça É Nossa, CQC e outras porcarias do gênero ridicularizarem os traços fenotípicos, lingüísticos, a orientação sexual, entre outras marcas de individualidade, daquelas pessoas que não nasceram no seio da sociedade burguesa - nem a ele se incorporaram, seja por qual caminho tenha sido, até porque o que vale é estar dentro, não importando o caminho percorrido. Ou alguém já viu esses programas fazerem piadas com algum “empresário” que tenha enriquecido da noite para o dia por meio de fraudes fiscais ou calotes financeiros? Absolutamente não.
Alvos de piada ou de uma abordagem caricatural na tevê são apenas os nordestinos, os negros, pessoas que apresentem algum tipo de deformidade física ou déficit cognitivo ou alguma disfunção neurológica (observando-se, evidentemente, os limites de tolerância que a nossa “etiqueta” permite, e que se expressam com um “esse cara é esquisito” ou “esse cara é comédia demais”, e por aí vai). No mais das vezes, esses “caras esquisitos” ou “cômicos” são pessoas pobres e de famílias de poucos recursos, que acabam não tendo condições para tratar seus casos como fatos médicos típicos. Costumam ser casos não tratados de dislexia, gagueira, distúrbios de atenção, etc. que vão parar “na tela da tevê, no meio desse povo”, como se fossem “iguarias” da natureza humana. Mas pára por aí, claro. Afinal de contas, não pega bem fazer piada com pessoas que tenham um laudo médico que ateste uma doença mental “propriamente dita”. Esses viram tabu.
Não existem no universo televisivo. São “sujidades”, “imperfeições” do mundo real que a tevê se encarrega de “limpar” para nos proporcionar uma tele-visão mais arejada. Na tevê é assim: ou se adultera a realidade de alguns tipos (alisa o cabelo, clareia a pele, “trata” o sotaque), ou então todas essas características acabam sendo artificializadas e caricaturizadas (como ocorre, por exemplo, com personagens vindos do interior, que sempre apresentam um sotaque que não corresponde a nenhum lugar do Brasil, e uma “pureza” ou “ingenuidade” ou “candura” ou uma “tacanhice” absolutamente inexistentes na realidade. Ou com personagens oriundos das camadas mais pobres, caracterizados como ignorantes desconectados do tempo em que vivemos – sabe aquela empregada de telenovela que acha que computador morde ou então não consegue pronunciar uma palavra que tenha um encontro consonantal? Pois é... é assim que a tele-visão enxerga essas pessoas “estranhas”).
Esse emprego da estratégia de desvalorização humana em relação ao universo de pessoas cujas características não se ajustam ao perfil prototípico do burguês branco, bem sucedido financeiramente, “culto” e morador dos centros urbanos do sul-sudeste do país é mais uma maneira que a tevê encontrou para disseminar conteúdo ideológico carregado de preconceito de classe, inculcando nas pessoas valores correspondentes a esse ideário excludente, racista, eugenista, e corroborando a falácia da superioridade burguesa para, dessa forma, legitimar a dominação dessa classe sobre as demais.
De um modo geral, os apresentadores desses programas são todos brancos (vide o exemplo do CQC), o que não condiz definitivamente com a realidade étnica da sociedade brasileira. Outras vezes, quando algum negro é incorporado ao elenco desses programas, é em virtude de algum caráter que é tratado como “exótico” pelo próprio programa (vide o exemplo do Pânico, que manteve – ou mantem ainda, não sei – um co-apresentador negro que provavelmente se enquadra numa daquelas características mencionadas acima de um caso médico não abordado da maneira devida). Em suma, quando algum negro participa, não é como sujeito, mas como objeto, como alvo das piadas e chacotas que terminam sempre por desqualificá-lo e ridicularizá-lo.
Dessa maneira, com a graciosa e “bem-humorada” ajuda da tevê, o universo burguês, próprio da burguesia, seu mundinho e seus valores, acaba por impor uma ordem burguesa extensiva a todas as classes sociais. O pior dos efeitos alcançados por obra desse aparato discursivo-ideológico que propagandeia incessantemente as maravilhas de um modo de ser, pensar, agir e fazer correspondente a apenas uma parcela da sociedade como sendo comum a todos é a interiorização de uma ideologia de classe por aqueles que não pertencem a essa classe.
As pessoas precisam compreender os mecanismos desse TOTALITARISMO empreendido pela burguesia por meio de seus aparelhos de radiodifusão de ideologia. A televisão não fala em nome de todos, não representa o interesse de todos, não defende os direitos de todos, mas finge fazê-lo. A televisão fez a sua escolha de classe porque ela pertence a essa classe. Portanto, é preciso estar atento para não reproduzir irrefletidamente as opiniões e os hábitos que a tevê se propõe a propagandear, pois essas opiniões e hábitos podem ser contrários aos projetos históricos da classe social a que você pertence. É preciso que, primeiramente, cada um conheça o seu lugar no mundo para se ter uma visão de classe a respeito do mundo, e não se deixar ser comandado por uma tele-visão que mais omite do que revela sobre a vida e a nossa existência.
Em tempo 1:
A radiodifusão eletrônica é uma concessão pública. O verdadeiro dono do espectro eletromagnético por onde trafegam as ondas de rádio e tevê é o povo brasileiro. Os concessionários do direito de explorar comercialmente a radiodifusão DEVERIAM observar uma série de contrapartidas sociais que a Constituição Federal estabelece. Está lá no Capítulo V, artigos 220 a 224. Entre essas contrapartidas estão aquelas estabelecidas pelos incisos do artigo 221:
I - preferência a finalidades educativas, artísticas, culturais e informativas; II - promoção da cultura nacional e regional e estímulo à produção independente que objetive sua divulgação; III - regionalização da produção cultural, artística e jornalística, conforme percentuais estabelecidos em lei;
Além dessas contrapartidas, é natural que uma concessionária pública de radiodifusão não possa praticar atos que contrariem essa mesma Constituição nem as leis vigentes no país. Pois bem, fazer piadas de teor racista não é humor: é crime! Ridicularizar pessoas com piadas ofensivas e preconceituosas não atende a nenhuma finalidade educativa, artística, culturai e informativa. E muitos desses “humoristas”, que se julgam artistas quando nem mesmo humoristas eles conseguem ser, acham que em nome da “liberdade criativa” eles podem sim usar seres humanos para contra eles externar seu desprezo pelas diferenças. Repito aqui algo que já afirmei em outras oportunidades: expor ao ridículo seres humanos em função de alguma característica que os tornem frágeis ou vulneráveis não é humor, é covardia! É fácil apontar o dedo e rir dos marginalizados, dos que já são vítimas de outros mecanismos de inferiorização. Quero ver ter colhões para fazer piada com os que estão no seio da sociedade. Será que eles não são engraçados não? Humor pra mim é o que Molière, Martins Pena, Ernst Lubtsch, Buñuel, Chaplin faziam. Eles sim riam e nos faziam rir do que realmente tem graça (que é o quanto essa nossa "sociedade de bem" é ridícula), e não da desgraça alheia. Pra falar a verdade, eu vejo muito mais originalidade num humor de paródia, como o dos seriados Chaves e Chapolin, por exemplo, do que nessas babaquices que a TV brasileira tem feito. Por falar em paródia, as chanchadas da Atlântida eram geniais... O modo como eles desconstruiam o glamour hollywoodiano, a maneira como eles escrachavam com tudo aquilo que era levado a sério... Era muito bom. Billy Wilder tambem fez coisas memoráveis. Machado de Assis, Mário de Andrade, Flaubert e até Eça de Queiros naquilo em que as "tragédias" têm de cômico... Quer escracho maior com a sociedade burguesa do que Madame Bovary? Vamos ridicularizar o que realmente é ridículo!
Quer dizer... fonte tem. Se essa galerinha metida a besta, esses mimadinhos que se acham a última bala do pacote (e essa própria crença deles em si mesmos já me mata de rir), tivessem o mínimo interesse em correr atrás e buscar as referências bacanas, encontrariam. Mas...
Como bem definiu Martin Esslin, em “Anatomia do drama”, “o riso é uma forma de liberação de ansiedades subconscientes”, o que é bastante diferente dessa risada mecânica que esses “humorísticos” ainda conseguem arrancar de alguns.
Em tempo 2:
Em “Ordem médica e norma familiar” - livro que eu recomendo com entusiasmo - o psicanalista Jurandir Freire Costa desenha o percurso histórico dessa perspectiva higienista de mundo, que foi determinante para a consolidação da burguesia como classe dominante. Colei a seguir um pequeno trecho da introdução desse estudo porque considero que a análise empreendida pelo autor contextualiza perfeitamente bem todo esse panorama traçado acima.
A partir da terceira década do século XIX, o higienismo conseguiu impor à família uma educação física, moral, intelectual e sexual, inspirada nos preceitos sanitários da época, exterminando assim a desordem higiênica dos velhos hábitos coloniais. A ação desta pedagogia médica extravasou os limites da saúde individual. A higiene, enquanto alterava o perfil sanitário da família, modificou também sua feição social. Contribuiu, junto com outras instâncias sociais, para transformá-la na instituição conjugal e nuclear característica dos nossos tempos. Converteu, além do mais, os predicados físicos, psíquicos e sexuais de seus indivíduos em insígnias de classe social. A família nuclear e conjugal, higienicamente tratada e regulada, tornou-se no mesmo movimento sinônimo histórico de família burguesa.
A vida privada dos indivíduos foi atrelada ao destino político de uma determinada classe social, a burguesia. O corpo, o sexo e os sentimentos conjugais, parentais e filiais passaram a ser programadamente usados como instrumentos de dominação política e sinais de diferenciação social daquela classe.
A educação física defendida pelos higienistas do século XIX criou, de fato, o “corpo saudável”. Corpo robusto e harmonioso, organicamente oposto ao corpo relapso, flácido e doentio do indivíduo colonial. Mas foi este corpo que, eleito representante de uma classe e de uma raça, serviu para incentivar o racismo e os preconceitos sociais a ele ligados. Para explorar e manter explorados, em nome da “superioridade racial e social” da burguesia branca, todos os que, por suas singularidades étnicas ou pela marginalização sócio-econômica, não logravam conformar-se ao modelo anatômico construído pela Higiene.
O cuidado higiênico com o corpo fez do preconceito racial um elemento constitutivo da consciência de classe burguesa. O racismo não é um acessório ideológico, acidentalmente colado ao ethos burguês. A consciência de classe tem, na consciência da “superioridade” biológico-social do corpo, um momento indispensável à sua formação. O indivíduo de extração burguesa, desde a infância, aprende a julgar-se “superior” aos que se situam abaixo dele na escala ideológica de valores sócio-raciais. Por isso mesmo, admite com mais facilidade e, às vezes, com marcante insensibilidade a situação de inferioridade sócio-econômica a que geralmente estão submetidos os banidos da elite física: “crioulos”, “paraíbas”, “caipiras”, etc. Por isso mesmo, quando, por vezes, consegue despojar-se da ideologia política de sua classe social, continua avaliando pejorativamente o corpo, os gestos, a fala, o modo de ser e viver dos "mal-nascidos".
*Amoralnato