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Ser de esquerda é não aceitar as injustiças, sejam elas quais forem, como um fato natural. É não calar diante da violação dos Direitos Humanos, em qualquer país e em qualquer momento. É questionar determinadas leis – porque a Justiça, muitas vezes, não anda de mãos dadas com o Direito; e entre um e outro, o homem de esquerda escolhe a justiça.
É ser guiado por uma permanente capacidade de se estarrecer e, com ela e por causa dela, não se acomodar, não se vender, não se deixar manipular ou seduzir pelo poder. É escolher o caminho mais justo, mesmo que seja cansativo demais, arriscado demais, distante demais. O homem de esquerda acredita que a vida pode e deve ser melhor e é isso, no fundo, que o move. Porque o homem de esquerda sabe que não é culpa do destino ou da vontade divina que um bilhão de pessoas, segundo dados da ONU, passe fome no mundo.
É caminhar junto aos marginalizados; é repartir aquilo que se tem e até mesmo aquilo que falta, sem sacrifício e sem estardalhaço. À direita, cabe a tarefa de dar o que sobra, em forma de esmola e de assistencialismo, com barulho e holofotes. Ser de esquerda é reconhecer no outro sua própria humanidade, principalmente quando o outro for completamente diferente. Os homens e mulheres de esquerda sabem que o destino de uma pessoa não deveria ser determinado por causa da raça, do gênero ou da religião.
Ser de esquerda é não se deixar seduzir pelo consumismo; é entender, como ensinou Milton Santos, que a felicidade está ancorada nos bens infinitos. É mergulhar, com alegria e inteireza, na luta por um mundo melhor e neste mergulho não se deixar contaminar pela arrogância, pelo rancor ou pela vaidade. É manter a coerência entre a palavra e a ação. É alimentar as dúvidas, para não cair no poço escuro das respostas fáceis, das certezas cômodas e caducas. Porém, o homem de esquerda não faz da dúvida o álibi para a indiferença. Ele nunca é indiferente. Ser de esquerda é saber que este “mundo melhor e possível” não se fará de punhos cerrados nem com gritos de guerra, mas será construído no dia-a-dia, nas pequenas e grandes obras e que, muitas vezes, é preciso comprar batalhas longas e desgastantes. Ser de esquerda é, na batalha, não usar os métodos do inimigo.
Fernando Evangelista
quinta-feira, abril 18, 2013
Criança é tão criminosa quanto um adulto?
Urariano Mota - Direto da Redação
*Mariadapenhaneles
Urariano Mota - Direto da Redação
Recife (PE) - Chega a ser irônico.
Neste 18 de abril, temos o Dia Nacional do Livro Infantil, uma homenagem ao dia
de nascimento de Monteiro Lobato. Mas ontem veio a público uma pesquisa do
Datafolha sobre a redução da maioridade penal. Por que fenômenos tão diferentes
se avizinham? Um calendário não se explica, pois na véspera do Dia do Livro
Infantil soubemos que 93% dos moradores da cidade de São Paulo querem a prisão
para menores a partir de 16 anos. Noventa e três por cento são quase uma
unanimidade.
O que
é isso? Por experiência, acredito que a pesquisa espelha um dado real. Em um
programa de direitos humanos no rádio, o Violência Zero, travamos com travo
esse conhecimento. No estúdio da Rádio Tamandaré, no fim dos anos 80, sentíamos
a disputa de ideias na sociedade do Recife entre punir sem medida e o direito à
justiça. Mas não com esses números. Ainda que sem método científico, pelos
telefonemas dos ouvintes, notávamos que a divisão entre os mais bárbaros e
civilizados era quase meio a meio. O que houve agora para esse assalto de
vingança? Segundo o Datafolha, foi a maior aprovação à proposta de redução
penal. Em 2003 e 2006, o apoio foi de 83% a 88%.
É
claro que a última pesquisa espelha um instante de abalo emocional na
população. Ela veio depois do assassinato do universitário Victor Hugo
Deppman. O suspeito pelo crime é um jovem que estava a três dias de fazer 18
anos. Isso foi repetido à náusea. Naquele tempo do Violência Zero
no rádio, não sofríamos o massacre de imagens repetidas na televisão. Melhor
dizendo, sofríamos, mas a doutrinação não atingia os noticiários mais
“educados”, como o Jornal Nacional, Jornal da Band e outros. Antes, as
insinuações do “só vai matando” ficavam restritas aos guetos dos programas
policiais. No entanto, consideremos.
Ainda
que sinta a batalha perdida diante do clamor, é um dever de consciência não
seguir a onda do momento. Está certo, é justo, criminosos têm que ser punidos.
Se possível, com algo exemplar, que iniba e reprima o crime. Mas para a
maioridade penal que deveria cair, levanto algumas perguntas:
Qual
seria o limite da redução? 12 anos, 11 anos, 10,9, 8, 7 anos? Bebês? Qual o
limite? Sintam que a cada redução devem ocorrer novos crimes que estarão no
limite da punibilidade. Mais: com o necessário aumento da população carcerária,
que já é um inferno e um fracasso do sistema, não estaríamos dando ótimas
escolas do crime aos meninos?
Já
imagino que os reformadores do Código Penal podem argumentar que teríamos alas
de criminosos de 16, outra de 15, mais outra de 14, até atingir um berçário...
mas tudo dentro das mais perfeitas condições de higiene e cura da perversão.
Diante do crime que ameaça e atinge a própria casa, já existe quem declare
pérolas do gênero “sou de opinião que não deveria haver nenhuma idade mínima na
lei”. Salve, daí partiremos fácil fácil para a pena de morte aplicada aos
diabinhos mais precoces.
Enquanto
isso, não vemos, ou fingimos não ver a exclusão social e humana que cobre as
cidades. Comemos, bebemos, vestimos, vamos aos shoppings sem olhar para
os lados. E depois nos surpreendemos o quanto o mundo pode ser cruel quando
atinge a estabilidade – porque nos julgamos estáveis em chão sólido -, ou a
estabilidade sagrada – por tudo quanto mais é santo e elevado acima da animalidade
dos outros, que não somos nós mesmos - a estabilidade sagrada dos nossos
lares – pois somos aqueles que temos casa, enquanto os outros, ah, eles dormem
na rua, que casa podem ter? Seria até uma questão de justiça, nós os
humanos temos que destruir e tirar dos olhos a mancha da escória.
Lembro
que uma vez perguntei a idade a um menino que cheirava cola nas ruas do Recife.
“Onze anos”, ele me respondeu. E eu, com minhas exatidões burras de classe
média: “Vai fazer, ou já fez?”. Silêncio. Eu insisti, crente de que não havia
sido entendido. “Você faz anos em que mês?”. Então ele me ensinou, antes de
correr até a esquina:
- Tio,
eu não tenho aniversário.
Todos
não notamos que vem dessa exclusão o alimento e sangue para o horror. Enquanto
fazemos de conta que nada temos a ver com isso, crescem os comentários com que
termino a coluna, no Dia do Livro Infantil: se os Direitos Humanos
criarem caso, prendam ou os arranquem para fora do Brasil ! Temos que punir
duramente quem mata, sequestra, seja quem for. Com a idade de treze anos sabem
muito bem o que estão fazendo. Se não melhorarem com novas leis, pena de morte.*Mariadapenhaneles
quarta-feira, abril 17, 2013
A intromissão descabida dos EUA
Após os resultados mostrando a vitória de Nicolás Maduro para a
Presidência da Venezuela, os Estados Unidos resolveram pedir a
recontagem manual dos votos, assim como fez o candidato oposicionista,
Henrique Capriles.
A Casa Branca disse que considera que uma auditoria nos resultados das
eleições presidenciais da Venezuela seria um passo "importante, prudente
e necessário".
Só faltava esta. É como se a Venezuela pedisse na eleição de George W.
Bush, em 2000, a recontagem dos votos ou uma auditoria e apoiasse o
candidato democrata em sua solicitação.
É uma prova da intromissão indevida e descabida dos EUA nos assuntos
internos da Venezuela, particularmente porque Maduro aceitou a auditoria
do Conselho Nacional Eleitoral (CNE), sem evidentemente aceitar a não
proclamação dos resultados.
Isso foi o óbvio a ser feito, já que abrir mão da proclamação seria
aceitar que houve fraudes. Fica evidente que a oposição que apenas
tumultua, já que uma vitória eventual de Capriles seria aceita como
democrática.
O fato é que o CNE proclamou Maduro como presidente eleito e rejeitou o
pedido de Capriles para recontar os votos. Maduro obteve 50,75% contra
48,97% de Capriles, uma diferença de 262.473 votos.
Aproveito para recomendar a leitura do artigo de Breno Altman sobre o resultado:“Vitória de Maduro é incontestável, mas representa novos desafios”.
*Ajusticeiradeesquerda
João Pedro Stédile : Pacto do latifúndio com o Judiciário
Por João Pedro Stedile, no jornal Brasil de Fato:
Uma marcha pacífica com mais de mil trabalhadores rurais organizados pelo MST percorria uma rodovia de Parauapebas a Marabá em 17 de abril de 1996. Foram encurralados por dois batalhões da Policia Militar, em uma no localidade conhecida como Curva do S, no município de Eldorado de Carajás. Um batalhão saíra de Parauapebas e outro de Marabá, apoiados por caminhões boiadeiros, que trancaram a estrada dos dois lados.
Assim começou um massacre premeditado, realizado para dar uma lição naqueles "vagabundos vindos do Maranhão", como expressaram os policiais nos autos dos processos. Os policiais saíram dos quartéis sem identificação na farda, com armamento pesado e balas verdadeiras. O comando de Marabá chegou a avisar o Pronto Socorro e o Instituto Médico Legal (IML) para ficarem de plantão…
O julgamento demonstrou que, além das ordens explícitas de Paulo Sette Câmara, secretário de segurança do governo tucano de Almir Gabriel, a empresa Vale do Rio Doce financiou a operação, cobrindo todos os gastos, porque o protesto dos sem-terra na rodovia atrapalhava a circulação de seus caminhões.
O resultado foi 19 mortos no ato, sem direito a defesa, 65 feridos incapacitados para o trabalho e dois mortos dias depois. O líder Oziel da Silva, com apenas 19 anos, foi preso, algemado e assassinado a coronhadas, na frente dos seus companheiros, enquanto um policial mandava que gritasse “Viva o MST”.
Esses episódios estão registrados em mais de mil páginas dos autos do processo e foram descritos no livro "O Massacre", do jornalista Eric Nepomuceno (Editora Planeta). Passados 17 anos, foram condenados apenas os dois comandantes militares, que estão recolhidos em algum apartamento de luxo dos quartéis de Belém.
O coronel Pantoja ainda tenta se livrar da prisão e pede para cumprir a pena de 200 anos em regime domiciliar. Os demais responsáveis no governo federal e estadual e empresa Vale foram inocentados. A Justiça se contentou em apresentar à sociedade dois bodes expiatórios.
Impunidade dos latifundiários
No Brasil inteiro, o cenário é o mesmo: desde a redemocratização, foram assassinados mais de 1.700 lideranças de trabalhadores e apoiadores da luta pela terra. Somente 91 casos foram julgados. Apenas 21 mandantes foram condenados.
O Massacre de Carajás se inscreve na prática tradicional dos latifundiários brasileiros, que com seus pistoleiros fortemente armados ou por meio do controle da Polícia Miliar e do Poder Judiciário, se apropriam de terras públicas e mantêm privilégios de classe, cometendo sistematicamente crimes que ficam impunes.
A atuação do latifúndio corresponde à correlação de forças políticas. Durante o governo José Sarney, diante do avanço das lutas sociais e da esquerda, organizou a UDR (União Democrática Ruralista). Com isso, se armou até os dentes, desrespeitando todas as leis. Foi o período com o maior número de assassinatos. Os fazendeiros chegaram à petulância de lançar seu próprio candidato à Presidência, Roberto Caiado, que foi solenemente condenado pela população brasileira ao receber apenas 1% dos votos.
Nos governos Fernando Collor e FHC, com a derrota do projeto democrático-popular e da luta social que se aglutinava ao redor da candidatura de Luiz Inácio Lula da Silva em 1989, os latifundiários se sentiram vitoriosos e utilizaram sua hegemonia no Estado para controlar a manu militari a luta pela terra. Nesse período, aconteceram os massacres de Corumbiara (RO), em 1995, e de Carajás.
Lula chegou ao governo, em 2003, quando parte dos latifundiários tinha se modernizado e preferiu fazer uma aliança com o governo, apesar de ter apoiado a candidatura de José Serra. Em troca, recebeu o Ministério da Agricultura. Um setor mais truculento e ideológico resolveu dar uma demonstração de força e mandar avisos para demonstrar "quem de fato mandava no interior e nas terras", ainda mais depois de Lula colocar o boné do MST.
Nesse contexto, aconteceram dois novos massacres, com ares de perversidade. Em 2004, a poucos quilômetros do Planalto Central, no município de Unaí (MG), uma quadrilha de latifundiários mandou assassinar dois fiscais do Ministério do Trabalho e o motorista da viatura, quando o grupo se dirigia a uma fazenda para fazer uma inspeção de trabalho escravo. Um dos fazendeiros se elegeu prefeito da cidade pelo PSDB e, até hoje, o crime está impune. O Estado não teve coragem de defender seus servidores.
O segundo massacre foi em novembro de 2005, no município de Felisburgo (MG), quando o fazendeiro-grileiro Adriano Chafik resolveu acabar com um acampamento do MST. Chafik foi com seus pistoleiros à fazenda e comandou pessoalmente a operação em um sábado à tarde. No ataque, deram tiros em direção às famílias, colocaram fogo nos barracos e na escola. O saldo foi o assassinato de mais cinco trabalhadores rurais e dezenas de feridos. Depois de oito anos de espera, o Tribunal de Justiça de Minas Gerais marcou o julgamento do fazendeiro para 15 de maio, em Belo Horizonte. Esperamos que a justiça seja feita.
Os fazendeiros truculentos – que felizmente não são a maioria – agem assim, porque têm certeza absoluta de sua impunidade, graças ao conluio que mantêm com os poderes locais e com o Poder Judiciário. Agora, nos últimos anos, seu foco está voltado para o Poder Legislativo, onde mantêm a chamada Bancada Ruralista, para mudar leis e para se proteger da lei vigente.
Já fizeram as mudanças no Código Florestal e impedem a implementação da lei que obriga a desapropriação das terras dos fazendeiros que exploram o trabalho escravo. A cada ano, a Policia Federal liberta em média dois mil seres humanos do trabalho escravo. No entanto, os latifundiários continuam com essa prática, apoiados na impunidade do Poder Judiciário.
Tiveram a coragem de encaminhar projetos de lei que contrariam a Constituição para impedir a demarcação das terras indígenas já reconhecidas, legalizar o arrendamento das áreas demarcadas e permitir a exploração dos minérios existentes. Foram apresentados projetos também para travar a titulação de terras de comunidades quilombolas.
Uma série de projetos foi apresentada para liberar o uso de agrotóxicos proibidos na maioria dos países, classificados pela comunidade cientifica como cancerígenos, e para impedir que os consumidores saibam quais produtos são transgênicos. Por que não querem colocar no rótulo nos produtos transgênicos, já que garantem segurança total para a saúde das pessoas?
A sanha da ganância dos fazendeiros não tem limites. No interior, usam com mais frequência a violência física e os assassinatos. No entanto, essa sanha tem consequências diretas para toda a população, pela apropriação das terras públicas, pela expulsão dos camponeses do meio rural que incha as favelas e pelo uso indiscriminado dos agrotóxicos, que vão parar no seu estômago e causam câncer. Infelizmente, tudo isso é acobertado por uma mídia servil e manipuladora da opinião pública.
Uma marcha pacífica com mais de mil trabalhadores rurais organizados pelo MST percorria uma rodovia de Parauapebas a Marabá em 17 de abril de 1996. Foram encurralados por dois batalhões da Policia Militar, em uma no localidade conhecida como Curva do S, no município de Eldorado de Carajás. Um batalhão saíra de Parauapebas e outro de Marabá, apoiados por caminhões boiadeiros, que trancaram a estrada dos dois lados.
Assim começou um massacre premeditado, realizado para dar uma lição naqueles "vagabundos vindos do Maranhão", como expressaram os policiais nos autos dos processos. Os policiais saíram dos quartéis sem identificação na farda, com armamento pesado e balas verdadeiras. O comando de Marabá chegou a avisar o Pronto Socorro e o Instituto Médico Legal (IML) para ficarem de plantão…
O julgamento demonstrou que, além das ordens explícitas de Paulo Sette Câmara, secretário de segurança do governo tucano de Almir Gabriel, a empresa Vale do Rio Doce financiou a operação, cobrindo todos os gastos, porque o protesto dos sem-terra na rodovia atrapalhava a circulação de seus caminhões.
O resultado foi 19 mortos no ato, sem direito a defesa, 65 feridos incapacitados para o trabalho e dois mortos dias depois. O líder Oziel da Silva, com apenas 19 anos, foi preso, algemado e assassinado a coronhadas, na frente dos seus companheiros, enquanto um policial mandava que gritasse “Viva o MST”.
Esses episódios estão registrados em mais de mil páginas dos autos do processo e foram descritos no livro "O Massacre", do jornalista Eric Nepomuceno (Editora Planeta). Passados 17 anos, foram condenados apenas os dois comandantes militares, que estão recolhidos em algum apartamento de luxo dos quartéis de Belém.
O coronel Pantoja ainda tenta se livrar da prisão e pede para cumprir a pena de 200 anos em regime domiciliar. Os demais responsáveis no governo federal e estadual e empresa Vale foram inocentados. A Justiça se contentou em apresentar à sociedade dois bodes expiatórios.
Impunidade dos latifundiários
No Brasil inteiro, o cenário é o mesmo: desde a redemocratização, foram assassinados mais de 1.700 lideranças de trabalhadores e apoiadores da luta pela terra. Somente 91 casos foram julgados. Apenas 21 mandantes foram condenados.
O Massacre de Carajás se inscreve na prática tradicional dos latifundiários brasileiros, que com seus pistoleiros fortemente armados ou por meio do controle da Polícia Miliar e do Poder Judiciário, se apropriam de terras públicas e mantêm privilégios de classe, cometendo sistematicamente crimes que ficam impunes.
A atuação do latifúndio corresponde à correlação de forças políticas. Durante o governo José Sarney, diante do avanço das lutas sociais e da esquerda, organizou a UDR (União Democrática Ruralista). Com isso, se armou até os dentes, desrespeitando todas as leis. Foi o período com o maior número de assassinatos. Os fazendeiros chegaram à petulância de lançar seu próprio candidato à Presidência, Roberto Caiado, que foi solenemente condenado pela população brasileira ao receber apenas 1% dos votos.
Nos governos Fernando Collor e FHC, com a derrota do projeto democrático-popular e da luta social que se aglutinava ao redor da candidatura de Luiz Inácio Lula da Silva em 1989, os latifundiários se sentiram vitoriosos e utilizaram sua hegemonia no Estado para controlar a manu militari a luta pela terra. Nesse período, aconteceram os massacres de Corumbiara (RO), em 1995, e de Carajás.
Lula chegou ao governo, em 2003, quando parte dos latifundiários tinha se modernizado e preferiu fazer uma aliança com o governo, apesar de ter apoiado a candidatura de José Serra. Em troca, recebeu o Ministério da Agricultura. Um setor mais truculento e ideológico resolveu dar uma demonstração de força e mandar avisos para demonstrar "quem de fato mandava no interior e nas terras", ainda mais depois de Lula colocar o boné do MST.
Nesse contexto, aconteceram dois novos massacres, com ares de perversidade. Em 2004, a poucos quilômetros do Planalto Central, no município de Unaí (MG), uma quadrilha de latifundiários mandou assassinar dois fiscais do Ministério do Trabalho e o motorista da viatura, quando o grupo se dirigia a uma fazenda para fazer uma inspeção de trabalho escravo. Um dos fazendeiros se elegeu prefeito da cidade pelo PSDB e, até hoje, o crime está impune. O Estado não teve coragem de defender seus servidores.
O segundo massacre foi em novembro de 2005, no município de Felisburgo (MG), quando o fazendeiro-grileiro Adriano Chafik resolveu acabar com um acampamento do MST. Chafik foi com seus pistoleiros à fazenda e comandou pessoalmente a operação em um sábado à tarde. No ataque, deram tiros em direção às famílias, colocaram fogo nos barracos e na escola. O saldo foi o assassinato de mais cinco trabalhadores rurais e dezenas de feridos. Depois de oito anos de espera, o Tribunal de Justiça de Minas Gerais marcou o julgamento do fazendeiro para 15 de maio, em Belo Horizonte. Esperamos que a justiça seja feita.
Os fazendeiros truculentos – que felizmente não são a maioria – agem assim, porque têm certeza absoluta de sua impunidade, graças ao conluio que mantêm com os poderes locais e com o Poder Judiciário. Agora, nos últimos anos, seu foco está voltado para o Poder Legislativo, onde mantêm a chamada Bancada Ruralista, para mudar leis e para se proteger da lei vigente.
Já fizeram as mudanças no Código Florestal e impedem a implementação da lei que obriga a desapropriação das terras dos fazendeiros que exploram o trabalho escravo. A cada ano, a Policia Federal liberta em média dois mil seres humanos do trabalho escravo. No entanto, os latifundiários continuam com essa prática, apoiados na impunidade do Poder Judiciário.
Tiveram a coragem de encaminhar projetos de lei que contrariam a Constituição para impedir a demarcação das terras indígenas já reconhecidas, legalizar o arrendamento das áreas demarcadas e permitir a exploração dos minérios existentes. Foram apresentados projetos também para travar a titulação de terras de comunidades quilombolas.
Uma série de projetos foi apresentada para liberar o uso de agrotóxicos proibidos na maioria dos países, classificados pela comunidade cientifica como cancerígenos, e para impedir que os consumidores saibam quais produtos são transgênicos. Por que não querem colocar no rótulo nos produtos transgênicos, já que garantem segurança total para a saúde das pessoas?
A sanha da ganância dos fazendeiros não tem limites. No interior, usam com mais frequência a violência física e os assassinatos. No entanto, essa sanha tem consequências diretas para toda a população, pela apropriação das terras públicas, pela expulsão dos camponeses do meio rural que incha as favelas e pelo uso indiscriminado dos agrotóxicos, que vão parar no seu estômago e causam câncer. Infelizmente, tudo isso é acobertado por uma mídia servil e manipuladora da opinião pública.
Longe de Boston, em países como Paquistão e Afeganistão, o horror é diário
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As emissoras de televisão vão passar as cenas durante muitos dias, e novos detalhes trarão dor, choque e raiva.
O que ocorreu é um horror. É uma desgraça. É um absurdo.
Cada vítima tem que ser lamentada e para sempre lembrada nos esforços pela paz mundial.
E que as famílias encontrem forças para seguir adiante.
Mas não se esqueça das pessoas que, longe dos holofotes, longe de todos nós, vivem esta situação pavorosa não ocasionalmente – mas todos os dias.
As mortes lá se acumulam o tempo todo: crianças, mulheres, velhos.
Em países como o Paquistão e o Afeganistão, a morte é precedida pela visão aterrorizante de aviões não tripulados que sobrevoam cidades e aldeias quase que ininterruptamente antes de soltar bombas que matam 50 civis para cada terrorista.
Lamente, lamente muito, os acontecimentos de ontem em Boston.
Mas reserve um pouco de sua justa indignação para os mortos invisíveis que estão tão longe de você e das emissoras de televisão.
É possível que, se não fosse tanta a brutalidade vivida cotidianamente naquelas terras tão devastadas, não tivéssemos agora que nos amargurar com as imagens de Boston que veremos tantas vezes nestes dias.
(Publicado no DCM)
do Blog COMUNICA TUDO
*cutucandodeleve
terça-feira, abril 16, 2013
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