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Ser de esquerda é não aceitar as injustiças, sejam elas quais forem, como um fato natural. É não calar diante da violação dos Direitos Humanos, em qualquer país e em qualquer momento. É questionar determinadas leis – porque a Justiça, muitas vezes, não anda de mãos dadas com o Direito; e entre um e outro, o homem de esquerda escolhe a justiça.
É ser guiado por uma permanente capacidade de se estarrecer e, com ela e por causa dela, não se acomodar, não se vender, não se deixar manipular ou seduzir pelo poder. É escolher o caminho mais justo, mesmo que seja cansativo demais, arriscado demais, distante demais. O homem de esquerda acredita que a vida pode e deve ser melhor e é isso, no fundo, que o move. Porque o homem de esquerda sabe que não é culpa do destino ou da vontade divina que um bilhão de pessoas, segundo dados da ONU, passe fome no mundo.
É caminhar junto aos marginalizados; é repartir aquilo que se tem e até mesmo aquilo que falta, sem sacrifício e sem estardalhaço. À direita, cabe a tarefa de dar o que sobra, em forma de esmola e de assistencialismo, com barulho e holofotes. Ser de esquerda é reconhecer no outro sua própria humanidade, principalmente quando o outro for completamente diferente. Os homens e mulheres de esquerda sabem que o destino de uma pessoa não deveria ser determinado por causa da raça, do gênero ou da religião.
Ser de esquerda é não se deixar seduzir pelo consumismo; é entender, como ensinou Milton Santos, que a felicidade está ancorada nos bens infinitos. É mergulhar, com alegria e inteireza, na luta por um mundo melhor e neste mergulho não se deixar contaminar pela arrogância, pelo rancor ou pela vaidade. É manter a coerência entre a palavra e a ação. É alimentar as dúvidas, para não cair no poço escuro das respostas fáceis, das certezas cômodas e caducas. Porém, o homem de esquerda não faz da dúvida o álibi para a indiferença. Ele nunca é indiferente. Ser de esquerda é saber que este “mundo melhor e possível” não se fará de punhos cerrados nem com gritos de guerra, mas será construído no dia-a-dia, nas pequenas e grandes obras e que, muitas vezes, é preciso comprar batalhas longas e desgastantes. Ser de esquerda é, na batalha, não usar os métodos do inimigo.
Fernando Evangelista

sábado, julho 20, 2013

Registro Memoria del Mundo de la UNESCO: Che é imortalizado


Videos Cuba Hoy.- La colección Vida y Obra de Ernesto Che Guevara queda oficialmente aprobada en el Registro Internacional de la Memoria del Mundo de la UNESCO.
Colección de documentos sobre la vida y obra de Ernesto Che Guevara se inscribe en el Registro Memoria del Mundo de la UNESCO
UNESCO / Servicio de Prensa.- Entre las 54 nuevas inscripciones en el Registro Memoria del Mundo de la UNESCO aprobadas este martes 18 de junio por la Directora General de la UNESCO, Irina Bokova, se encuentra la colección documental “Vida y obra de Ernesto Che Guevara: de los manuscritos originales de su adolescencia y juventud al Diario de Campaña en Bolivia”, propuesta presentada conjuntamente por Cuba y Bolivia ante el Comité Consultativo Internacional del Programa Memoria del Mundo, que se reúne hasta el próximo viernes en Gwangju, República de Corea.
Según se refiere en el expediente de candidatura, el inventario de la colección alcanza un volumen de 1007 documentos, correspondientes al período de 1928 a 1967, sobre su obra revolucionaria, ensayística, periodista, biográfica y personal, así como su correspondencia con diversas personas, incluida su familia. De ese volumen, 431 son manuscritos del Che y 567 son documentos sobre el Che o relacionados con él. La colección comprende igualmente un valioso material iconográfico y filmográfico de y sobre el Che.
El reconocido escritor y periodista uruguayo Eduardo Galeano escribiría en el aval entregado para acompañar la candidatura: “El archivo documental que guarda la vida y obra del Che Guevara será, sin duda, un muy valioso aporte al Registro de la Memoria del Mundo. Los documentos encontrarán allí una casa merecida. (…) Nadie ignora que el Che es un símbolo universal, celebrado en los más diversos lugares y cantado en las más diversas lenguas. Su memoria se enciende y crece, porque ella encarna la energía de la dignidad humana (…) El Che, vencido, derrota al olvido cada día”.
El Registro Memoria del Mundo de la UNESCO posee en la actualidad 299 documentos y colecciones documentales considerados de relevancia universal, procedentes de los cinco continentes y conservados en todo tipo de soportes.
Hasta el momento Cuba contaba con otras dos obras inscritas en este importante Registro, el fondo documental de José Martí y la colección de negativos del Noticiero ICAIC Latinoamericano; al tiempo que Bolivia, por su parte, alistaba a su favor los fondos documentales de la Real Audiencia de la Plata y las colecciones documentales de música americana de los siglos XVI-XVIII.
*GilsonSampaio

Romário declara apoio aos manifestantes


Após telefonema de vice de Obama a Dilma, Brasil enviará comissão sobre espionagem


Técnicos e autoridades brasileiras viajam nos próximos dias a Washigton para apurar denúncias. Dilma reitera que espera desculpas à sociedade brasileira e mantém viagem aos Estados Unidos em outubro
por Redação RBA publicado 20/07/2013 08:01
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Roberto Stuckert Filho/Planalto
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Biden deu explicações gerais sobre o tema, e Dilma cobrou desculpas à sociedade, diz o Planalto
São Paulo – O vice-presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, telefonou na noite de ontem (19) para a presidenta Dilma Rousseff para dar explicações sobre as denúncias de espionagem do Brasil por órgãos de inteligência norte-americanos. Segundo informações divulgadas pelo Palácio do Planalto, Dilma aceitou a proposta da Casa Branca de que se envie a Washington nos próximos dias uma comissão de técnicos e autoridades que buscarão explicações detalhadas sobre o caso.
A ligação durou 25 minutos, disse o governo brasileiro, e Biden deu explicações gerais a respeito da situação. A nota divulgada no Blog do Planalto não esclarece se o vice-presidente abordou especificamente a informação de que uma central de espionagem de políticos, cidadãos e empresas funcionou em Brasília até 2002. De acordo com o texto, o vice-presidente lamentou a repercussão negativa do caso dentro da sociedade brasileira.
Na conversa, Dilma expressou grande preocupação com a violação da privacidade de cidadãos e de instituições de Estado, e informou que espera que os Estados Unidos prestem esclarecimentos à soecidade brasileira. Ela reiterou esperar mudanças nas políticas de comunicações para evitar que haja novas violações de privacidade e da soberania do país.
Segundo o Planalto, a presidenta manteve a intenção de viajar a Washington no próximo dia 23 de outubro, expressando que espera que o caso seja resolvido até lá.
Após a descoberta do esquema, o governo montou um grupo interministerial para abordar a questão. Este grupo manifestou desejo de formulação de regras para evitar que o episódio se repita, e prometeu enviar o caso à Organização das Nações Unidas (ONU) para que seja debatida uma reação.
Durante Cúpula de Chefes de Estado do Mercosul este mês, em Montevidéu, Dilma cobrou esclarecimentos e a formulação de políticas conjuntas contra este tipo de atuação ilegal. “Nós também fomos atingidos diretamente pelas recentes denúncias de que as comunicações eletrônicas e telefônicas de cidadãos e instituições de nossos países e de outros países da América Latina estão sendo objeto de espionagem por órgãos de inteligência”, afirmou. “Isso fere nossa soberania e atinge direitos individuais inalienáveis de nossa população. Defendemos que a soberania, a segurança de nossos países, a privacidade de nossas comunicações, a privacidade de nossos cidadãos, a privacidade de nossas empresas devem ser preservados.”
*redebrasilatual

Documentários | O Apartheid Não Morreu (1998)



*ocomunista

Alarme de incêndio: o fascismo espreita a crise




No último dia 05 de junho, o jovem estudante Clément Méric, 18 anos, foi espancado até a morte por hordas fascistas na cidade de Paris, França. O triste fato, mais que um acontecimento político, desperta o alarme de incêndio na sociedade em tempos de crise. A sociedade tardo-burguesa, na aurora do século XXI, tem se mostrado incapaz de produzir uma solução estratégica que possibilite a saída da crise e a continuidade da lógica capitalista, no entanto, continua em vigor a manutenção do seu projeto societário através de agressivos ajustes ideológicos. Essa crise cresceu, expandiu-se sobre a sociedade e consolidou-se numa crise sistêmica que está colocando em xeque as instituições da ordem burguesa e o sistema capitalista, expondo a crescente erosão institucional desse sistema predatório. 
A particularidade mais visível da crise sistêmica global, que é a crise financeira mundial, já se estende por um período de seis anos e continuará por um tempo ainda mais longo. Não existe uma causalidade única para a crise, mas, examinando esse processo, a partir das descobertas científicas de Marx n´O Capital, pode-se concluir que essa crise tem na superprodução, seu elemento determinante. Apesar de o Estado burguês ter injetado uma quantidade substancial de recursos para evitar o aprofundamento da crise, o equilíbrio do sistema está cada vez mais distante. O que se apresenta na cena do capitalismo é a anarquia social da produção. O descompasso entre oferta e demanda tem aprofundado a erosão do sistema, gerando pobreza para o conjunto dos trabalhadores e luxo exorbitante para a burguesia. Apesar do aporte de cifras substanciais por parte do fundo público - algo em torno de alguns trilhões de dólares para evitar o colapso do sistema bancário - a fome ataca centenas de milhões de pobres em todo o mundo e aprofunda o pauperismo dos trabalhadores.
Esse ciclo de erosão societária remete a um processo de restauração tardo-burguesa. A degeneração ideológica do pensamento burguês falsifica e naturaliza a crise através da violência do Estado, quando ataca os direitos sociais dos trabalhadores, quando avança sobre o fundo público, quando modifica a legislação colocando em seu lugar regulações reacionárias e que vão, via o aparato jurídico-político, esgarçando o tecido social.
Estamos começando um período histórico em que a crise levará à abertura da cena política, quando o imponderável poderá se tornar realidade numa velocidade extraordinária. Os efeitos desse projeto de barbárie já se manifestam para além do aumento da recessão, do desemprego, do eclipse financeiro. Esses fatores se consolidam na crise de subjetividade dos trabalhadores, na xenofobia crescente que se alastra pela Europa e, até mesmo, na periferia de São Paulo (vide o tratamento dispensado aos bolivianos), no racismo que infesta os estádios na Europa, no rigor com que a “classe média” exige novas leis para punir os pobres (vide a campanha pela mudança na maioridade penal no Brasil), nas legislações fascistas que visam impedir que os comunistas disputem as eleições (Hungria), no ascenso do populismo neofranquista na Espanha, no crescimento dos partidos fascistas na Grécia, Holanda, Itália e Áustria.
Acendeu o alarme de incêndio, precisamos do freio de emergência para conter a barbárie. A crise sistêmica está erodindo as estruturas da institucionalidade burguesa e essa classe começou a construir brechas para a ação do fascismo. A morte do jovem lutador Clément Méric deve iluminar a compreensão sobre os caminhos a trilhar e as lutas a desenvolver, agora, no fogo da conjuntura.
O fascismo, em síntese, é uma possibilidade política de caráter social conservador que se apresenta durante o período do imperialismo capitalista para tentar se consolidar no desenvolvimento do capitalismo monopolista, apresentando-se como um instrumento de modernização social de corte irracionalista, alimentado por uma cultura de consumo dirigido a partir da vigência do capital financeiro. Essa sociedade da lógica tardo-burguesa tem estimulado a guerra imperialista, desenvolvido o misticismo da aparência para fugir da ciência e da filosofia, se aquartelando nos “nacionalismos chauvinistas”, no anticomunismo e nas saídas da contrarrevolução permanente (governos da ordem neoliberais).
Diante desse processo de emergência se faz necessário a “unidade da teoria e da prática”, como pensado por Marx. É importante acabar com o espaço político para a manobra fascista que se utiliza do pragmatismo radical, e suas técnicas de propaganda, para fazer a disputa ideológica, agindo em campo aberto de forma “antiliberal, antidemocrático, antissocialista, antioperário”, aplicando, em muitos momentos, a violência física, estabelecendo o medo e o terror.
Contudo, a abertura da cena política, com sua imprevisibilidade, está forjando um mundo em convulsão que tem movimentado milhões de trabalhadores. Partem da indignação, se comportam de forma espontaneísta, balançam estruturas com greves e manifestações. A história do tempo presente está lançando uma palavra de ordem: urge a auto-organização dos trabalhadores. É tarefa da emergência histórica organizar a vanguarda para que, quando os trabalhadores se movimentarem, ter condições políticas de dirigir as batalhas que a luta de classes acena. Numa só palavra, precisamos da construção do operador político enquanto sujeito coletivo que tenha capacidade de formular e agir a partir de um projeto orgânico dos trabalhadores. Esse operador político se constitui de forma diversa para, a partir da unidade do bloco revolucionário do proletariado, fazer o enfrentamento à ordem do capital, impedindo assim que o fascismo em seu novo ciclo vença. Ao mesmo tempo, esse instrumento de vanguarda, orgânico aos trabalhadores, deve construir a possibilidade da revolução.
*

Ex Executivo de Wall Street que virou blogueiro diz que a máquina pode explodir



No Viomundo
por Heloisa Villela, de Nova York

Afinal, onde está a revolta?
A pergunta é cada vez mais frequente nos blogs dos Estados Unidos. Richard Eskow já foi músico, consultor e executivo de Wall Street na área de tecnologia.
Com o título acima ele publicou, recentemente, na internet, um artigo comparando Estados Unidos e Brasil — no qual cita o brasileiro Paulo Freire várias vezes. Quando fala da crescente desigualdade na sociedade norte-americana, ele afirma que a retórica do consenso e da busca de acordo, uma constante na atuação política do presidente Barack Obama, é responsável por boa parte do acirramento dessa desigualdade. Conclui com palavras de Paulo Freire: “Lavar as mãos em face da opressão é reforçar o poder do opressor, é optar por ele”. Para explicar porque mudou de carreira para se dedicar ao jornalismo na internet, novamente cita o brasileiro, lembrando que a palavra transforma o mundo.
Eskow conheceu as ideias de Paulo Freire bem cedo, através do pai, que era educador. Ele acha que o momento pede a leitura e os pensamentos do pernambucano.
Apesar de se considerar um otimista, Eskow analisou o processo de concentração de renda nos Estados Unidos e concluiu que ele cria um círculo vicioso: dá ainda mais poder de fogo aos grandes grupos, que investem pesado nas campanhas eleitorais e nos lobbies, para garantir leis ainda mais vantajosas ao capital no Congresso.
Eskow também leva em consideração as denúncias recentes sobre espionagem doméstica. Elas refletem um estado policial cada vez mais opressor, que se une aos interesses financeiros para desmantelar qualquer movimento de massa nascente, como aconteceu com o Occupy. Ainda assim, acredita que é possível vencer toda essa máquina e vê, no temor dos poderosos, sinais de que o caldo eventualmente vai entornar.
Que medo é esse? Ainda bem conectado ao mundo das finanças, ele conta que um amigo economista voltou há pouco de uma reunião na Europa com 100 representantes de instituições financeiras mundiais e perguntou qual era o clima entre os banqueiros. “Eles estão aterrorizados”, disse o amigo.
Por quê? Segundo Eskow, eles analisam as estatísticas, os gráficos e dados econômicos. Sabem que a concentração de renda nas mãos de uma camada cada vez menor da população é uma receita desastrosa. Cria uma situação de instabilidade cada vez maior que pode, a qualquer momento, explodir. E nem por isso eles cedem: a ganância vicia.
Na pergunta do título vai implícito: quando essa panela de pressão vai dar sinal de vida? Enquanto a situação econômica da maioria piora, os norte-americanos continuam calados, trancados em casa, provavelmente achando que são uns fracassados.
Olham para os problemas de forma individual. Não conectam o que estão vivendo com o que se passa com o vizinho, com o colega de trabalho que também perdeu o emprego, com o conhecido que perdeu a casa porque não conseguiu mais pagar as prestações…
Eskow também responsabiliza a mídia norte-americana por essa alienação, já que ela não discute os problemas econômicos que a população enfrenta. “Limita-se ao trivial”, afirma.
Para Eskow — uma versão estadunidense de blogueiro sujo, já que o espaço dele se chama Crooks and Liars, Velhacos e Mentirosos — o Brasil ofereceu um bom contraste ao que se passa na terra de Tio Sam.
Enquanto todos os indicadores mostram que houve uma mudança positiva para os mais pobres e uma ascensão de muitos à classe média no Brasil, ainda assim os protestos explodiram. Ou seja, melhoria e mais protestos (no Brasil). Concentração de renda cada vez maior e silêncio (nos Estados Unidos). Na conversa com o Viomundo, ele analisou essa apatia.
Viomundo – Para responder à pergunta do título do artigo, você menciona a alienação. Como ela é produzida?
RE — Existem vários fatores. Um deles é que quando as pessoas perdem de vista o contraste entre o mundo delas, como ele existe, e o mundo como ele poderia ser — ou até mesmo como era alguns anos atrás — quando as pessoas perdem essa noção do contraste, então usamos a expressão “é como um canário em uma mina de carvão”. Quando o oxigênio vai acabando, o canário não percebe que o ar está acabando até que cai e morre.
Os mineiros levam o canário para a mina porque não sabem quando estão perdendo o ar. Se o canário morre eles sabem que estão prestes a sufocar. Acho que é o que acontece conosco.
Não sabemos que nosso oxigênio econômico está desaparecendo à nossa volta. Acho que parte dessa alienação é porque as pessoas estão com medo. Trabalhando muitas horas, foram forçadas a se endividar, vivem em um estado constante de insegurança. Mas aconteceu tão devagar que não têm nada para comparar com isso. Acham apenas que o mundo é mesmo assim.
Acho que isso é parte do problema. Também há o aprendizado desse conceito de impotência: elas tentam eleger republicanos, depois democratas, vão e voltam — e nada funciona. Então, o desânimo se torna parte do processo.
Acho também que é falta de informação. Nossa mídia, em sua grande maioria, não está enfatizando os problemas econômicos que estão acontecendo. Tende a focar no trivial e não enfatizar o que está acontecendo social e economicamente ou apontar as forças subjacentes a esses problemas. Se você soma todos esses fatores, você tem pessoas altamente insatisfeitas, mas desanimadas e alienadas, que não estão reagindo.
Viomundo – Aqui nos Estados Unidos você ainda tem as redes públicas de rádio e tevê — a PBSe a NPR – que são fortes e discutem assuntos com um pouco mais de profundidade, enquanto no Brasil a internet é que se tornou uma ferramenta importante, especialmente para os jovens, para obter informações e discutir as coisas.  Aqui nos Estados Unidos, você encontra na internet uma grande variedade de opiniões e debates. Por que isso não produz algum tipo de discussão maior?
RE — Acho que existem duas razões. Por um período, isso aconteceu. Especialmente durante a presidência de George W. Bush [2000-2008] quando houve uma quase assustadora uniformidade de cobertura da mídia neste país. Realmente fez a gente sentir quase como uma coisa totalitária a forma como certas notícias não estavam sendo transmitidas. A internet realmente explodiu em matéria de blogs e de mídia alternativa para oferecer uma contra-narrativa durante os anos Bush, especialmente sobre a guerra [do Iraque] e algumas das políticas econômicas…
Mas acho que uma das razões pelas quais ela não é tão efetiva agora é porque, com a eleição de Barack Obama e com a decisão do Obama, em várias áreas, de apoiar interesses econômicos aos quais o Bush também deu apoio, o mundo da internet ficou dividido entre os que queriam continuar lutando contra essas forças econômicas e os que se sentem mais à vontade e até leais quando essas medidas estão sendo promovidas por alguém que é democrata ou parece mais liberal – ao menos culturalmente e socialmente mais liberal, como Obama.
Acho que isso criou uma fragmentação na internet. Agora você tem uma proliferação tão grande de pontos-de-vista que não existe uma força coerente argumentando contra esses interesses econômicos. Nós tivemos um pouco durante o movimento Occupy. Foi um curto espaço de tempo fascinante.
Literalmente, em um período de duas ou três semanas, quando o Occupy surgiu, a parte do mundo da internet e do ativismo social que eram leais ao Partido Democrata – me lembro disso vividamente – reagiu de forma bastante negativa.
Depois, quando o movimento se tornou bem sucedido, tentaram cooptá-lo, se juntar a ele. Depois desapareceram e voltaram às suas velhas práticas. Então, acho que existe uma energia potencial que não foi acionada. Mas por causa dessa fragmentação e da ausência de uma mensagem, essa energia não é coerente e não se articula, como está acontecendo no Brasil.
Viomundo – - Como pode se dar essa articulação, a formulação de uma mensagem mais coerente?
RE – De certa forma, eu bem que gostaria de saber. Mas muitos de nós continuamos tentando responder essa pergunta. Para mim é uma questão de continuar reiterando certas mensagens. Existe um artigo recente a respeito da maneira com que os políticos que servem aos interesses corporativos estão usando a agenda social – como casamento gay e os direitos reprodutivos das mulheres — para dividir a oposição.
São boas causas, mas esses políticos dão ênfase a elas e ignoram ou até representam forças econômicas negativas. Conseguem que as pessoas votem contra seus próprios interesses porque ganham a lealdade delas nas causas sociais.
Então, acho que precisamos manter essas mensagens vivas. Infelizmente, se nada for feito, a pressão vai aumentar tanto que vai se tornar insuportável para as massas. No momento em que isso acontecer, existem várias possibilidades. Nem todas são muito atraentes. Uma delas é que as pessoas podem se virar para uma forma de política demagógica, como você viu aqui nesse país com o Tea Party, tipo super nacionalista, até mesmo potencialmente racista.
Ou poderemos ver a volta a algo mais dedicado à igualdade e justiça social e econômica. Podemos ainda ver o ódio, um ódio niilista. Os que, como eu, pensam que isso é um problema, têm a obrigação de preparar o caminho para a melhor reação possível, quando esse momento vier.
Viomundo – Na cultura norte-americana, existe um sentimento individualista muito forte. O mito de que todo mundo precisa se virar por conta própria, a ideia do desbravador do Oeste, a cobrança de que é preciso sair de casa com 17 anos, não importa a situação… Isso tudo dificulta um pouco a atuação em grupo para mudar a atual situação?
RE – Com certeza! Acho que você colocou o dedo na ferida. Falei rapidamente disso no artigo que você leu. Acho que não há dúvida que tem sido muito útil para certos interesses poderosos continuar reforçando esse mito cultural que diz que as pessoas não existem de forma coletiva, só existem no sentido individual.
A versão de Margareth Tatcher de que não existe sociedade, apenas indivíduos e famílias. Nos Estados Unidos, nós temos todo tipo de expressão e ícones culturais que dizem: você faz as coisas por conta própria.
O outro lado da moeda disso é que se você não pode pagar a prestação da sua casa, se não consegue arrumar um emprego que pague decentemente, então você é um derrotado. Essa sensação de vergonha e culpa cruel e excruciante, paralisa as pessoas, evita que elas ajam.
Acho que essa cultura da individualidade, nos Estados Unidos, é gigantesca. Mas a grande maioria das pessoas perdeu o poder de uma maneira que seria impensável, aqui mesmo, há cinquenta anos, quando tínhamos na presidência Dwight Eisenhower que, apesar de ser republicano e um general, uma figura militar considerada conservadora, mas não de extrema direita, estava bem à esquerda de Barack Obama e da maioria dos políticos democratas de hoje.
Na campanha pela reeleição, Eisenhower falou muito de aumentar a filiação aos sindicatos e incluir mais gente na fila dos programas sociais para que tivessem segurança financeira quando ficassem mais velhos ou ficassem impossibilitados de trabalhar por problemas de saúde.
Tínhamos uma visão social bem mais aguda durante o governo Eisenhower. Construímos um sistema federal de estradas de uma costa à outra. Tudo isso foi feito com o entendimento de que, apesar do nosso individualismo, existem também coisas que fazemos juntos, uns pelos outros e uns com os outros. Mas agora esse individualismo ficou acima de tudo. Acho que estamos vendo essa ideia de individualismo ser usada para realmente destruir o tecido social.
Viomundo – O senhor vê alguma conexão entre esse estado geral de coisas e o fato de os Estados Unidos serem o país que tem o maior consumo per capita de remédios para depressão?
RE – Bem, ainda somos os primeiros em algo! Somos muito competitivos, você sabe… (ele ri). Nós temos uma doença coletiva para a qual estamos procurando cura individual. E o consumo de antidepressivos se adequa muito bem a isso.
Se você faz tudo o que sua cultura diz que deveria lhe fazer feliz mas isso está deixando você péssimo, essa escravidão à necessidade de consumir produtos, que deveria lhe trazer conforto mas não traz, se você faz o que a sociedade diz que faria de você uma pessoa bem sucedida e está fracassando, não tem como interpretar isso a não ser como uma doença individual. Se isso não está te realizando, você deve estar doente — e temos uma pílula para isso.
O consumo de remédios é uma saída lógica para isso. Aliás, se você estudar a ciência e a economia da indústria farmacêutica neste país, é um exemplo perfeito de como nosso modelo corporativo está se infiltrando em todos os aspectos da nossa cultura.
É bastante chocante ver quão fracas são as provas da eficácia dos remédios psiquiátricos para muitas pessoas. Mas o processo é controlado pelas corporações que fabricam os remédios. Então temos centenas de milhares de médicos neste país que acreditam que estes remédios são eficazes com base em provas bastante duvidosas.
Até mesmo a editora do New England Journal of Medicine, que foi médica, disse que não acredita em nenhum estudo sobre remédios feito neste país porque são financiados pelas empresas farmacêuticas e eles são divulgados seletivamente.
Então, é chocante constatar como os lucros corporativos se infiltraram em tudo, nas nossas publicações, na nossa vida profissional. Some-se a isso esse fracasso do modelo de busca de prazer consumista individual e o resultado é uma porção de gente tomando antidepressivos.
Viomundo – Diante desse controle cada vez maior do estado, evidenciado pelas denúncias de Edward Snowden a respeito do programa de espionagem da NSA (Agência de Segurança Nacional), da concentração de riqueza nas mãos de um número cada vez menor de grandes empresas, que influenciam a política de forma decisiva, você ainda é otimista a respeito da possibilidade de mudar esse estado de coisas. Por que?
RE – Claro que existe maneira de lutar contra tudo isso. E não seria a primeira vez na história que uma enorme e poderosa máquina foi derrubada. Existem meios. Tenho um amigo que é economista e acaba de vir de uma reunião na Europa. Foi uma reunião de 100 líderes da indústria bancária mundial para falar da indústria deles, do que pode ser modificado, etc. Perguntei qual era o clima por lá. Ele me disse que estão “aterrorizados”.
Muitas das pessoas contra as quais nos sentimos impotentes vivem em um estado permanente de medo porque podem ler as estatísticas econômicas tão bem quanto nós. Podem ver o aumento da desigualdade da riqueza entre o 1% e os 99% e entre o 0,1% e o 0,99%.
Até mesmo entre os super-ricos existe uma disparidade enorme. Eles sabem que 400 famílias têm a fatia do leão do poder econômico dos Estados Unidos. Isso é tão visível para eles como é para qualquer pessoa. A história nos mostra que os sistemas de distribuição enormemente injustos são instáveis.
Então, fiquei surpreso quando ele me respondeu isso. Mas depois pensei bem e faz sentido. Por isso o Occupy os assustou tanto e eles reuniram todas as forças disponíveis para marchar contra o Occupy. Acho que eles realmente têm medo do povo se virar contra eles. Acho que essa é uma possibilidade bastante concreta. Eu gostaria que acontecesse de forma justa e humana e não violenta.
Quando escrevi sobre isso, sobre os bancos e tudo isso, recebi comentários no meu blog dizendo que a única maneira de lidar com essas pessoas [os banqueiros] é com uma corda, com a forca. É preciso parar com isso. Esse é o meu medo. Acho que é o que eles temem, também. Acho que existem meios pacíficos de lidar com isso e a história americana tem precedentes nessa área.
Fizemos isso nos anos 30. Com Franklin Roosevelt tínhamos um sistema extremamente injusto e instável e mudou de forma bastante pacífica. Esse novo modelo funcionou, mal ou bem, por quase 50 anos. Então acho que esse é o tipo de mudança que devemos promover. Talvez haja algo ainda melhor que isso. Mas a ideia de que pode haver violência, é o que está deixando muita gente com medo. Se você diz que é impossível parar a máquina, acho que a melhor resposta é que os poderosos não acham isso.
Viomundo — Mesmo assustados e com medo, eles continuam investindo uma fábula no Congresso para impedir a adoção das leis que tem por objetivo reformar o sistema financeiro. Separar novamente bancos comerciais e bancos de investimento, combater os paraísos fiscais, etc. Dinheiro que poderia resolver todos os problemas do país. Se eles têm tanto medo, talvez não devessem investir tanto dinheiro para evitar essas reformas.
RE – É verdade. Mas acho que eles estão chegando a um ponto em que estão começando a agir contra os interesses deles mesmos ao serem tão gananciosos.
Você sabe, havia um chefe de uma tribo indígena americana que ouviu de seu povo a seguinte pergunta a respeito do homem branco: por que eles rompem todos os acordos que fazem conosco? O amor ao dinheiro é uma doença deles, respondeu o chefe.
Acho que o amor ao dinheiro é mesmo uma doença, um vício que eles não podem cortar, mesmo quando sabem que é ruim para eles. Então o medo aumenta, mas o vício também aumenta, a riqueza deles aumenta e estão em uma rota de colisão com a história. Acho que eles sabem disso.
Eles estão enfraquecendo ainda mais a Dodd-Frank [a lei de reforma do sistema financeiro que entrou em vigor em 2010, nos Estados Unidos]. Ela já era uma reforma fraca que fez algumas mudanças importantes, mas longe do que realmente precisamos. Estão resistindo às outras reformas bancárias. Certamente ficaram muito chateados com a proposta Warren-McCain que é bastante razoável e propõe restabelecer as proteções da lei Glass-Steagall [que separava bancos comerciais de bancos de investimento e foi derrubada durante o governo Clinton] que funcionou tão bem, por tantos anos.
Mas eles vivem em um sistema que precisa dar resultados a cada trimestre. É assim que eles são remunerados, valorizados. Quando você vive nesse sistema trimestral não pode, por exemplo, construir um sistema bancário sólido para uma economia estável no futuro porque será demitido e substituído pelo cara que consegue melhores resultados no próximo trimestre.
Para ter melhores resultados no próximo trimestre, você precisa derrubar todas as leis que por ventura estejam no seu caminho. Tem que derrubar qualquer movimento político que esteja no seu caminho. Esse ciclo louco, sempre acelerado de lucros em espaços de tempo cada vez menores, ganância e ausência de leis… ainda tem de garantir a existência de políticos eleitos que não permitam que você seja punido por ter desrespeitado as leis… e assim por diante.
É por isso que muita gente se pergunta se é possível parar essa máquina. Mas eu acho que deveriam perguntar quanto tempo mais essa máquina pode funcionar dessa maneira, antes que exploda.
Viomundo – E leve todos nós junto…
RE – Claro, e eles também. Por isso acho que existe essa mentalidade de “vamos arrancar todo lucro possível agora, enquanto podemos o mais rápido possível e torcer para que possamos assegurar uma moradia em Doha ou em alguma ilha antes que a merda bata no ventilador”. Quando perguntam como brigar contra essa máquina você tem que partir do princípio de que ela não é invencível, em primeiro lugar.
Em segundo, ver que ela possui defeitos estruturais que a fazem acelerar constantemente até que exploda. E se preparar, ficar pronto para, no momento que ela explodir, dar uma resposta pacífica com propostas para o futuro e não com raiva e violência niilista. É com isso que eu me preocupo.

*Ajusticeiradeesquerda

Após estupros no Cairo, feministas protestam com 'vaginas dentadas'


Mulheres protestaram com tinta representando o sangue do abuso sexual em Berlim (Foto: Thomas Peter/Reuters)

O Incrível Exército Blogoleone
G1 - em São Paulo
Seminuas, mulheres do Femen usaram calcinhas ilustradas e tinta vermelha.
Ato ocorreu em frente à embaixada do Egito em Berlim: 'mordemos de volta'.
Ativistas do grupo feminista Femen protestaram nesta sexta-feira (19) em frente à embaixada do Egito em Berlim, na Alemanha, pedido pela proteção dos direitos das mulheres no Egito. Uma ativista egípcia, Alia El Mahdi, participou do ato mostrando os seios e frases de ordem escritas pelo corpo.

A ativista egípcia Alia El Mahdi (2ª à direita) participa de protesto do Femen em Berlim (Foto: Thomas Peter/Reuters)A ativista egípcia Alia El Mahdi (2ª à direita) participa de protesto do Femen em Berlim (Foto: Thomas Peter/Reuters)


O protesto ocorre após a denúncia de que mais de 200 casos de estupros ocorreram na praça Tahrir, no Cairo, em meio aos protestos que resultaram na deposição do presidente Mohamed Morsi pelas forças armadas.
As manifestantes do Femen foram ao protesto com calcinhas com desenho representando uma vagina com dentes, além de tinta vermelha simbolizando o sangue da agressão sexual. Entre os cartazes exibidos por elas, um dizia: "nós mordemos de volta".
Mulheres protestaram com tinta representando o sangue do abuso sexual em Berlim (Foto: Thomas Peter/Reuters)Mulheres protestaram com tinta representando o sangue do abuso sexual em Berlim (Foto: Thomas Peter/Reuters)
Ato ocorre após denúncias de estupros em meio a protestos no Cairo (Foto: Thomas Peter/Reuters)Ato ocorre após denúncias de estupros em meio a protestos no Cairo (Foto: Thomas Peter/Reuters)






*Ajusticeiradeesquerda

Istoé aponta propinoduto tucano no metrô paulista


I:
Reportagem aponta que nos governos de Geraldo Alckmin, mas também de José Serra e Mario Covas, cerca de US$ 50 milhões teriam sido desviados das obras do metrô; denúncia da Siemens, que decidiu colaborar com a Justiça, lança luzes sobre o esquema; Alckmin será, agora, alvo de ação de improbidade
 

Ser doutor é mais fácil do que se tornar médico


 

A resistência ao projeto que obrigará os estudantes de medicina a trabalhar dois anos no SUS expõe a fratura social do Brasil
Eliane Brum, Revista Época
O programa “Mais Médicos”, lançado pela presidente Dilma Rousseff, não vai resolver o problema do Sistema Único de Saúde (SUS). Mas pode, sim, ser parte da solução. Ou alguém realmente acredita que colocar mais médicos nos lugares carentes do Brasil pode fazer mal para a população? Sério que, de boa fé, alguém acredita nisso? A veemência dos protestos contra o projeto de ampliar o curso de medicina de seis para oito anos e tornar esses dois últimos anos um trabalho remunerado para o SUS revela muito. Especialmente o quanto é abissal a fratura social no Brasil. E o quanto a parte mais rica é cega para a possibilidade de fazer a sua parte para diminuir uma desigualdade que deveria nos envergonhar todos os dias – e que, no caso da saúde, mata os mais frágeis e os mais pobres.
Para resolver o problema do SUS é preciso assumir, de fato, o compromisso com a saúde pública gratuita e universal. O que significa investir muito mais recursos. Em 2011, segundo dados da Organização Mundial da Saúde (OMS), o Brasil gastou US$ 477 per capita em saúde. Menos do que vizinhos como Uruguai (US$ 817,8) e Argentina (US$ 869,4), por exemplo. E quase seis vezes menos do que o Reino Unido (US$ 2.747), cujo sistema de saúde tem sido apresentado como referência do projeto do governo. Hoje, falta dinheiro e falta gestão eficiente. Sem dinheiro e sem eficiência, duas obviedades, não se constrói um sistema decente. Mas, para investir mais dinheiro no SUS, é preciso tocar também em questões sensíveis, como o financiamento da saúde privada. Falta dinheiro no SUS também – mas não só – porque o Estado tem subsidiado a saúde dos mais ricos via renúncia fiscal.
Um recente estudo do IPEA (leia aqui) mostrou que, em 2011, último ano avaliado, quase R$ 16 bilhões de reais deixaram de ser arrecadados pelo governo, por dedução no imposto de renda de pessoas físicas e jurídicas e desoneração fiscal da indústria farmacêutica e de hospitais filantrópicos. O que é, de fato, renúncia fiscal? Um pagamento feito pelo Estado: ele não desembolsa, mas paga, ao deixar de receber. Assim, quase R$ 16 bilhões, o equivalente a 22,5% do gasto público federal em saúde, deixaram de ser investidos no SUS para serem transferidos para o setor privado, numa espécie de distribuição de renda para o topo da pirâmide. Para ter uma ideia do impacto, é mais do que os R$ 13 bilhões que o ministro da Saúde, Alexandre Padilha, afirma que o governo está investindo em unidades básicas de saúde, pronto-atendimento e hospitais. Não é a toa que, entre 2003 e 2011, o faturamento do mercado dos planos de saúde quase dobrou e o lucro líquido cresceu mais de duas vezes e meia acima da inflação.
O governo tem estimulado a população – e também os empregadores – a investir em saúde privada. Um plano de saúde privado tornou-se uma marca de ascensão social. A “classe C” ou “nova classe média” tem sido vítima de planos de saúde mequetrefes que, na hora de maior necessidade, deixam as pessoas desprotegidas. Como muitos já sentiram na pele, quando a coisa realmente aperta, quando a doença é séria e requer recursos  e intervenções de ponta, quem vai resolver não é a rede privada, mas o SUS, porque uma parte significativa dos planos não cobre os exames e tratamentos mais caros.
Para que a solução seja estrutural – e não cosmética – é preciso acabar com as distorções e fortalecer o SUS. Sem dinheiro, o SUS vai sendo sucateado e se torna o destino apenas dos mais pobres e com menos instrumentos para reivindicar seus direitos. Assustada com a precarização do SUS, a classe média se sacrifica para pagar um plano privado, que tem sempre muitas letras miúdas. Os trabalhadores organizados incluem saúde privada na pauta sindical, afastando-se da luta do SUS. Quem tem mais poder de pressão para pressionar o Estado por saúde pública de qualidade, portanto, encontra saídas individuais – que muitas vezes vão se mostrar pífias na hora da urgência – ou saídas coletivas, mas para grupos específicos, no caso dos empregados com planos empresariais.
Enquanto sobrar distorções e faltar dinheiro, o SUS não vai melhorar. Não vai mesmo. Neste sentido, tem razão quem afirma que o programa “Mais Médicos” é demagogia. Mas apenas em parte.
Acrescentar dois anos ao curso de medicina e tornar esses dois últimos anos um trabalho remunerado no SUS, uma das mudanças previstas para iniciar em 2015, pode ser um aprendizado. E rico. Não só da prática médica como da realidade do país e da sua população, o que não pode fazer mal a alguém que pretenda ser um bom médico. Para que isso funcione, tanto como formação quanto como atendimento de qualidade à população, é preciso que exista de fato a supervisão dos professores e das faculdades. E essa é uma boa causa para as entidades corporativas e para as escolas de medicina.
Hoje, um dos problemas do SUS é a fragilidade da atenção básica: o que poderia ser resolvido nos postos de saúde ou pelo médico de família e que consiste em cerca de 90% dos casos acaba indo sobrecarregar os hospitais, que deveriam ser acionados apenas para os casos mais graves. A distorção provoca problemas de atendimento de uma ponta a outra do sistema. Por outro lado, entre os avanços mais significativos do SUS está o Programa Saúde da Família (PSF), um dos principais responsáveis, junto com o Bolsa Família, pela redução da mortalidade infantil no país. Mas faltam médicos para esse programa. A atuação dos estudantes de medicina poderá fazer uma enorme diferença. E isso não é pouco num país em que os filhos dos pobres ainda morrem de diarreia e de doenças já erradicadas nos países desenvolvidos.
A obrigatoriedade de trabalhar dois anos no SUS tem sido considerada por alguns setores, como as entidades corporativas, uma violação dos direitos individuais do estudante de medicina. Será que não poderia ser vista, além de um aprendizado, também como uma contrapartida, especialmente para quem estudou em universidades públicas ou foi beneficiado com bolsas do Prouni? O Estado, o que equivale a dizer toda a população brasileira, incluindo os que hoje não têm acesso à saúde pela precariedade do SUS, financia os estudos desses estudantes. Não seria lógico e mesmo ético que, ao final do curso, os estudantes devolvessem uma mínima parte desse investimento à sociedade? Para os estudantes das escolas privadas, o projeto prevê a liberação do pagamento das mensalidades nestes dois últimos anos. Mas sempre vale a pena lembrar que também há financiamento público das particulares, na forma de uma série de mecanismos, como renúncia fiscal para as filantrópicas e para as que aderiram ao Prouni.
Os estudantes de medicina serão remunerados pelo trabalho e pelo aprendizado. O valor mensal da bolsa ainda não está definido, mas a imprensa divulgou que será algo entre R$ 3 mil e R$ 8 mil. Ainda que seja o menor valor, que outra categoria no Brasil pode sonhar em ganhar isso antes mesmo de se formar? E mesmo depois de formado? Por que, então, uma resistência tão grande?
Por causa do abismo. A maioria dos estudantes de medicina vem das classes mais abastadas, como mostrou a Folha de S. Paulo de 13/7: na Unesp (Universidade Estadual Paulista), apenas 2% cursaram colégio público, contra 40% no geral; na USP (Universidade de São Paulo), 20% dos estudantes têm renda familiar superior a R$ 20 mil, não há negros na turma que ingressou em 2013. Historicamente, a elite brasileira não se vê como parte da construção de um país mais igualitário. Pelos motivos óbvios – e porque está acostumada a receber, não a dar. Assim, ter seus estudos financiados pelo conjunto da população brasileira é interpretado como parte dos seus direitos – não como algo que pressupõe também um dever ou uma contrapartida. Dever e contrapartida, como se sabe, são para os outros.
Não fosse esse olhar sobre si e sobre seu lugar no país, seria plausível que trabalhar os dois últimos anos do curso no SUS pudesse ser uma boa notícia para quem escolheu ser médico. Fosse até desejável. Primeiro, porque está ajudando a levar saúde a uma população que não tem. E, neste sentido, pode fazer a diferença, algumas vezes entre viver e morrer. Segundo, por participar da construção de um país mais justo, o que implica deveres ainda maiores a quem recebeu mais. Receber mais – melhores escolas, melhor saúde, melhores oportunidades – não significa que tenha de continuar recebendo mais, mas que precisa dar mais, já que a responsabilidade com quem recebeu menos se torna ainda maior. Terceiro, porque é inestimável a oportunidade de conhecer as dores, as necessidades e as aspirações das porções mais carentes do Brasil, não só pelo aprendizado médico em si, mas pelo que essa população pode ensinar sobre um outro viver.
Tornar-se médico – e não apenas um técnico em medicina – não passa pela capacidade de escutar o outro como alguém que tem algo a dizer não apenas sobre seus sintomas, mas sobre uma visão de mundo singular e uma interpretação complexa da vida?
Ao ler a maioria das críticas sobre o programa, o que chama a atenção é a impossibilidade de seus autores se verem como parte da construção de um SUS mais forte e eficiente, o que significa ser parte da construção de um Brasil melhor para todos – e não só para uma minoria. No geral, o que se revela nitidamente é um olhar de fora, como se tudo tivesse que estar pronto, em perfeitas condições, para que só então o médico atuasse. Mas é no embate cotidiano, no reconhecimento das carências e na pressão por mudanças que o SUS será fortalecido, como tem mostrado em sua prática uma parcela dos médicos tachada – às vezes pejorativamente – como idealista. Nesse sentido, também os estudantes de medicina e seus professores farão uma enorme diferença ao estar no palco onde esse embate é travado. Ao estar presentes – promovendo saúde, denunciando distorções e pressionando por qualidade – mais do que hoje.
Acredito que a vida da maioria só muda quando os Brasis se aproximam e se misturam. Tenho esperança de que esse programa – se bem executado, o que só pode acontecer com a adesão e o compromisso de todos os envolvidos – possa ser inscrito nesse gesto. O conjunto de medidas do “Mais médicos”, que inclui também a atuação de profissionais estrangeiros em áreas carentes, já promoveu pelo menos um impacto positivo: colocou o SUS no centro da pauta nacional. Seria tão importante que os protagonistas desse debate superassem a polarização inicial entre governo e entidades médicas para fazer uma discussão séria, com a participação da população, que pudesse resultar no acesso real da maioria a um sistema de saúde com qualidade. E seria uma pena que essa oportunidade fosse perdida por interesses imediatos e menos nobres, tanto de um lado quanto de outro.
É grande o debate sobre se faltam profissionais ou se eles estão mal distribuídos. O que me parece é que não faltam doutores no Brasil – o que falta são médicos. São muitos os doutores que ainda nem sequer se formaram, mas já assumiram o título e o encarnam num sentido profundo. O SUS terá mais chance quando existirem menos doutores e mais médicos trilhando o mapa do Brasil.
*Mariadapenhaneles 

(JAL)ECOS DA REVOLTA


Médicos com fronteiras: pobre não entra
(Trechos do editorial de Carta Maior de 19.07.2013)
Credite-se  à elite brasileira façanhas anteriores dignas de figurar, como figuram, nos rankings da vergonha do nosso tempo. O repertório robusto ganhou agora um destaque talvez inexcedível em seu simbolismo maculoso: uma rebelião de médicos contra o povo. Sim, os médicos, aos quais  o senso comum associa a imagem de um aliado na luta pela vida, lutam hoje nas ruas do Brasil.

Contra a adesão de profissionais ao programa ‘Mais Médicos’, que busca mitigar o atendimento onde ele inexiste. A sublevação branca incluiria táticas ardilosas: uma rede de inscrições falsas estaria em operação para inibir o concurso de profissionais estrangeiros, sobre os quais os nacionais tem precedência.

Consumada a barragem, uma desistência em massa implodiria o plano no último dia de inscrição. O cinismo conservador é useiro em evocar a defesa do interesse nacional e social enquanto procede à demolição virulenta de projetos e governos assim engajados.

Encara-se o privilégio de classe  como o perímetro da Nação. Aquela que conta. O resto é o vazio.  A boca do sertão, hoje, é tudo o que não pertence ao circuito estritamente privado. O sertão social pode começar na esquina, sendo tão agreste ao saguão do elevador, quanto Aragarças o foi para os irmãos Villas Boas,nos anos 40, na expedição ao Roncador.

Sergio Buarque de Holanda anteviu, em 1936,  as raízes de um Brasil insulado em elites indiferentes ao destino coletivo. O engenho era um Estado paralelo ao mundo colonial. O interesse privado ainda prevalece sobre a coisa pública. Mesmo quando está em questão a vida.

Se a organização humanitária  ‘Médicos Sem Fronteiras’ tentasse atuar no Brasil, em ‘realidades que não podem ser negligenciadas’, como evoca o projeto que ganhou o Nobel da Paz, em 1999, possivelmente seria retalhada pelo levante dos bisturis. Jalecos evocam as fronteiras do engenho corporativo, dentro das quais não cabem os pobres do Brasil. (Fonte: aqui e aqui)).

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Enquanto isso, entidades médicas simplesmente anunciam o rompimento com o governo federal (aqui), sob a alegação de "rompimento do diálogo". Merece registro o fato de que as entidades médicas jamais se interessaram em manter ao menos um mísero diálogo com as populações dos pequenos municípios e periferias das grandes cidades, que seguem à míngua, desprovidos de médicos.  Quantidade de municípios sem médico: 700 (setecentos).