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Ser de esquerda é não aceitar as injustiças, sejam elas quais forem, como um fato natural. É não calar diante da violação dos Direitos Humanos, em qualquer país e em qualquer momento. É questionar determinadas leis – porque a Justiça, muitas vezes, não anda de mãos dadas com o Direito; e entre um e outro, o homem de esquerda escolhe a justiça.
É ser guiado por uma permanente capacidade de se estarrecer e, com ela e por causa dela, não se acomodar, não se vender, não se deixar manipular ou seduzir pelo poder. É escolher o caminho mais justo, mesmo que seja cansativo demais, arriscado demais, distante demais. O homem de esquerda acredita que a vida pode e deve ser melhor e é isso, no fundo, que o move. Porque o homem de esquerda sabe que não é culpa do destino ou da vontade divina que um bilhão de pessoas, segundo dados da ONU, passe fome no mundo.
É caminhar junto aos marginalizados; é repartir aquilo que se tem e até mesmo aquilo que falta, sem sacrifício e sem estardalhaço. À direita, cabe a tarefa de dar o que sobra, em forma de esmola e de assistencialismo, com barulho e holofotes. Ser de esquerda é reconhecer no outro sua própria humanidade, principalmente quando o outro for completamente diferente. Os homens e mulheres de esquerda sabem que o destino de uma pessoa não deveria ser determinado por causa da raça, do gênero ou da religião.
Ser de esquerda é não se deixar seduzir pelo consumismo; é entender, como ensinou Milton Santos, que a felicidade está ancorada nos bens infinitos. É mergulhar, com alegria e inteireza, na luta por um mundo melhor e neste mergulho não se deixar contaminar pela arrogância, pelo rancor ou pela vaidade. É manter a coerência entre a palavra e a ação. É alimentar as dúvidas, para não cair no poço escuro das respostas fáceis, das certezas cômodas e caducas. Porém, o homem de esquerda não faz da dúvida o álibi para a indiferença. Ele nunca é indiferente. Ser de esquerda é saber que este “mundo melhor e possível” não se fará de punhos cerrados nem com gritos de guerra, mas será construído no dia-a-dia, nas pequenas e grandes obras e que, muitas vezes, é preciso comprar batalhas longas e desgastantes. Ser de esquerda é, na batalha, não usar os métodos do inimigo.
Fernando Evangelista
segunda-feira, junho 09, 2014
domingo, junho 08, 2014
Justiça condena revista por publicar mentiras sobre Gushiken
Por Rodrigo Vianna
Do Viomundo
Quase oito anos se passaram. A Justiça levou tanto tempo para ser feita, que a vítima dos ataques covardes já não está entre nós. Fundador do PT, bancário de profissão, Luiz Gushiken foi ministro da Secretaria de Comunicação (Secom) na primeira gestão Lula. Por conta disso, teve seu nome incluído entre os denunciados do “mensalão” (e depois retirado do processo, por absoluta falta de provas).
Mas os ataques de que tratamos aqui são outros. Em maio de 2006, a revista “Veja” publicou uma daquelas “reportagens” lamentáveis, que envergonham o jornalismo. A torpe “reportagem” (acompanhada de texto de certo colunista que preferiu se mudar do Brasil – talvez, por vergonha dos absurdos a que já submeteu os leitores) acusava Gushiken de manter conta bancária secreta no exterior. Segundo a publicação da editora Abril, os ministros Marcio Thomaz Bastos, Antonio Palocci e José Dirceu (além do próprio Lula!) também manteriam contas no exterior.
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PT e CUT lamentam morte de seu fundador e ex-ministro Luiz Gushiken
Qual era a base para acusação tão grave? Papelório reunido por ele mesmo – o banqueiro Daniel Dantas. A “Veja” trabalhou como assessoria de imprensa para Dantas. Da mesma forma como jogou de tabelinha algumas vezes com certo bicheiro goiano. Mas mesmo ataques vis precisam adotar alguma técnica, algum rigor.
No caso das “contas secretas”, não havia provas. Havia apenas o desejo da revista de impedir a reeleição de Lula. O vale-tudo estava estabelecido desde o ano anterior (2005) – com a onda de “denuncismo” invadindo as páginas (e também as telas – vivi isso de perto na TV Globo comandada por Ali Kamel) da velha imprensa.
Pois bem. Gushiken processou a “Veja”. O trabalho jurídico (árduo e competente – afinal, tratava-se de enfrentar a poderosa revista da família Civita) ficou por conta do escritório Manesco, Ramires, Perez, Azevedo Marques Sociedade de Advogados – com sede em São Paulo. Em primeira instância, a revista foi evidentemente derrotada. Mas a Justiça arbitrou uma indenização ridícula: 10 mil reais! Sim, uma revista que (supostamente) vende 1 milhão de exemplares por semana recebe a “punição” de pagar 10 mil reais a um cidadão ofendido de forma irresponsável. Reparem que este blogueiro, por exemplo, que usou uma metáfora humorística para se referir a certo diretor da Globo (afirmando que ele pratica “jornalismo pornográfico”), foi condenado em primeira instância a pagar 50 mil reais a Ali Kamel! e a “Veja” deveria pagar 10 mil… Piada.
Mas sigamos adiante na história de Gushiken. O ex-ministo recorreu ao Tribunal de Justiça de São Paulo. Antes que os desembargadores avaliassem a demanda, Gushiken morreu. Amigos mais próximos dizem que o estado de saúde dele (Gushiken lutava contra um câncer) se agravou por conta dos injustos ataques que sofreu nos últimos 8 anos.
Gushiken morreu, mas a ação seguiu. E os herdeiros agora acabam de colher nova vitória contra “Veja”. O TJ-SP mandou subir a indenização para 100 mil reais, e deu uma lição na revista publicada às margens fétidas da marginal.
O desembargador Antonio Vilenilson, em voto seguido pelos demais desembargadores da Nona Câmara de Direito Privado do TJ-SP (apelação cível número 9176355-91.2009.8.26.0000), afirmou:
“A Veja dá a entender que não eram fantasiosas as contas no exterior. E não oferece um único indício digno de confiança. Infere, da identidade dos acusadores e dos interesses em jogo, a verdade do conteúdo do documento. A falácia é de doer na retina.”
Quanto aos valores, o TJ-SP sentenciou:
“A ré abusou da liberdade de imprensa e ofendeu a honra do autor. Deve, por isso, indenizá-lo. No que diz com valores, R$ 10.000,00 não condizem com a inescusável imprudência e com o poderio econômico da revista. R$ 100.000,00 (cem mil reais) atendem melhor às circunstâncias concretas.”
Chama atenção que a Justiça tenha levado 8 anos para julgar em segunda instância (portanto, há recursos possíveis ainda nos tribunais superiores) caso tão simples. O “Mensalão” – com 40 réus na fase inicial – foi julgado antes.
A Justiça é rápida para julgar pobres, pretos, petistas. E eventualmente é rápida também para punir blogueiros que se insurgem contra a velha mídia. Mas a Justiça é lenta para punir ricos, tucanos e empresas de mídia.
De toda forma, trata-se de vitória exemplar obtida por Gushiken – que era chamado pelos amigos mais próximos de “samurai”…
E falando em samurais, há um ditado oriental que diz mais ou menos o seguinte : submetido ao ataque de forças poderosas, o cidadão simples deve agir como o bambu - sob ventania intensa pode até se inclinar, mas jamais se quebra.
O “samurai” ganhou a batalha. Inclinou-se, ficou perto de quebrar-se. Mas está de pé novamente. E é de se perguntar, depois da sentença proferida: quem está morto mesmo? Gushiken ou o “jornalismo” apodrecido da revista ”Veja”?
Nunca antes na história desse país, o Judiciário adotou expressão tão precisa e elegante para descrever fenômeno tão abjeto: a revista da família Civita produz “falácias de doer na retina”. E não são poucas.
*carosamigos
é preciso refletir sobre as "circunstâncias e condições que possibilitaram a um personagem medíocre e grotesco desempenhar um papel de herói".
Joaquim Barbosa saiu do STF para não cair do pedestal
Sem o mensalão, sua vida na Suprema Corte acabou. Não tem mais razão de ser. É ladeira abaixo
por Antonio Lassance
A pergunta mais importante sobre Joaquim Barbosa é a mesma que Marx expressou em "O 18 Brumário de Luís Bonaparte": é preciso refletir sobre as circunstâncias e condições que possibilitaram a um personagem medíocre e grotesco desempenhar um papel de herói.
A pergunta mais importante sobre Joaquim Barbosa é a mesma que Marx expressou em "O 18 Brumário de Luís Bonaparte": é preciso refletir sobre as circunstâncias e condições que possibilitaram a um personagem medíocre e grotesco desempenhar um papel de herói.
Joaquim Barbosa tem muito em comum com o ex-presidente Jânio Quadros.
Ambos renunciaram aos cargos que eram o ponto máximo que cada qual
almejou em sua carreira. Jânio largou a Presidência da República.
Barbosa abdicou de seu trono no Supremo.
Jânio fez sucesso falando em acabar com a corrupção e tratando os
políticos, genericamente, como bandidos - a principal vítima foi o
presidente Juscelino Kubitschek. Barbosa fez algo muito parecido. Só não
empunhou a vassourinha.
Jânio isolou-se politicamente. Depois que renunciou, só se falava de
quem assumiria em seu lugar. No caso, era João Goulart, tratado como um
perigo.
Barbosa saiu e seu futuro substituto na presidência do STF, Ricardo Lewandowski, é alvo de mil e uma hostilidades.
Barbosa deixou o STF para não descer do pedestal. Sem o mensalão, sua
vida na Suprema Corte acabou. Não tem mais razão de ser. É ladeira
abaixo.
Barbosa brigou e isolou-se de praticamente todos os seus pares e de todos os seus apoiadores.
A ojeriza é seu principal currículo. A desmoralização de tudo e de
todos foi seu principal discurso e uma maneira fácil de conseguir muitos
adeptos.
Nunca alguém em uma posição tão qualificada foi tão bom martelo para
os golpes dos que se interessam não em mudar a política, mas
simplesmente em desqualificá-la.
Para juízes, advogados e membros do Ministério Público, Barbosa
começou como uma boa promessa e terminou como uma grande decepção.
Eles o consideravam sangue novo no Supremo. Era alguém que poderia levar adiante causas importantes e, muitas vezes, esquecidas.
Barbosa saiu do STF virando as costas para essas grandes causas. Nem
mesmo aquelas que seriam óbvias para alguém com sua origem tiveram seu
entusiasmo.
A demarcação de terras quilombolas e indígenas, por exemplo, continua
intocada. É uma obra inacabada sobre a qual Barbosa não moveu uma
palha.
A demarcação da reserva Raposa Serra do Sol, objeto de uma decisão do
STF em 2009, só teve seu acórdão publicado quatro anos depois - mesmo
assim, sem que fosse considerada como regra geral a ser aplicada a
outros casos.
Tribunais de todo o país aguardam, há anos, decisões sobre um número
recorde de processos que dependem do STF. Um legado da gestão Barbosa
foi o de transformar o STF no gargalo supremo da Justiça brasileira.
A AP 470, considerada por alguns como seu "grande legado" e, por ele
mesmo, como ponto alto da história do STF, sequer estabeleceu critérios
para se tratar casos homólogos, como o mensalão do PSDB e o do DEM.
O legado da AP 470 se resume a meia dúzia de presos, e não a qualquer
avanço no combate à corrupção. Sequer firmou-se um critério de
julgamento para casos futuros. Portanto, não é exemplo de nada.
Barbosa tratou seus pares a pontapés; generalizou acusações contra
advogados e juízes, como se todos fossem maçãs podres; mandou
jornalistas chafurdarem no lixo.
Tudo isso atraiu a atenção e até o entusiasmo de quem não gosta de
advogados, juízes, jornalistas e políticos. Mas o que trouxe de
construtivo para o País? O que gerou de mudança? Absolutamente nada.
Barbosa é tão importante para a história do País quanto um Jânio
Quadros. Arrogância, destempero verbal e o gosto por tratar quem quer
que seja como corrupto podem até angariar simpatia, mas até hoje não
trouxeram qualquer contribuição efetiva para mudar a política.
Pouco importa o destino de Barbosa. A única dúvida relevante que fica
é a mesma que Marx expressou em "O 18 Brumário de Luís Bonaparte": é
preciso refletir sobre as "circunstâncias e condições que possibilitaram
a um personagem medíocre e grotesco desempenhar um papel de herói".
Artigo publicado no portal Carta Maior
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