Discurso de Hassan Rouhani Presidente da República Islâmica do Irã na 69ª sessão da Assembleia Geral da ONU
25/9/2014
Tradução não oficial realizada pelo pessoal da Vila Vudu
Hassan Rouhani na ONU em 25/7/2014 |
Senhor Presidente,
Excelências,
Senhoras e Senhores,
Graças a Deus, o Senhor dos Dois Mundos e Pregador, e que a paz esteja com nosso Profeta Maomé, sua família e seus companheiros.
De início, quero estender minhas sinceras congratulações por sua muito merecida eleição à presidência dessa 69ª Sessão da Assembleia Geral. E meus cumprimentos também a Sua Excia. Sr. Ban Ki-moon, por seus esforços.
É minha esperança sincera que a Sessão dessa Assembleia Geral desse ano leve o mundo, na sua situação atual crítica, um passo mais próximo da segurança e da tranquilidade para os seres humanos – que é, claro, um dos objetivos fundamentais da ONU.
Sr. Presidente,
Venho de uma região do mundo cujas muitas partes ardem hoje no fogo do extremismo e dos excessos. A Leste e a Oeste do meu país, extremistas ameaçam nossos vizinhos, recorrem à violência e derramam sangue. Não falam todos, é claro, uma mesma língua; não têm todos a mesma cor de pele, nem a mesma nacionalidade; e chegaram àquela parte do mundo, o Oriente Médio, provenientes de todo o mundo. Mas, sim, eles têm uma mesma ideologia: “violência e extremismo”. E têm todos, também, um único objetivo: “a destruição da civilização, gerando a islamofobia e criando campo fértil para mais intervenções de exércitos estrangeiros em nossa região”.
Lamento profundamente ter de dizer que o terrorismo é hoje globalizado: “De New York a Mosul, de Damasco a Bagdá, do mais extremo oriente ao mais extremo ocidente do mundo, da Al-Qaeda ao Daesh”. Os extremistas do mundo se encontraram uns os outros e conclamam: “extremistas de todo mundo uni-vos”. Mas e nós? Estamos unidos contra os extremistas?!
O extremismo não é questão regional com a qual só as nações de nossa região tenham de lidar: o extremismo é uma questão global.
Alguns estados ajudaram a criar o extremismo e hoje já não conseguem enfrentá-lo ou controlá-lo. E atualmente os nossos povos estão pagando o preço.
O antiocidentalismo de hoje é fruto do colonialismo de ontem.
O antiocidentalismo de hoje é reação contra o racismo de ontem.
Algumas agências de inteligência puseram punhais nas mãos de possessos que hoje já não poupam ninguém. Todos os que tiveram qualquer função na criação desses grupos terroristas e no apoio que deram a eles devem reconhecer os próprios erros que levaram ao extremismo. Têm de pedir desculpas não só à geração passada, mas também à geração futura.
Para combater as causas subjacentes do terrorismo, é preciso conhecer suas raízes e fazer secar suas fontes. O terrorismo germina onde reine a miséria, o desemprego, a discriminação, a humilhação e a injustiça. E cresce com a cultura da violência. Para erradicar o extremismo é preciso distribuir desenvolvimento e justiça e corrigir as distorções dos ensinamentos divinos postos hoje para justificar brutalidade e crueldade. A dor é aumentada quando esses terroristas espalham sangue e morte em nome da religião, ou degolam em nome do Islã.
O que querem é manter ocultada a incontroversa verdade da história que se baseia nos ensinamentos de todos os profetas divinos, de Abraão e Moisés e Jesus a Maomé (que a Paz esteja com Ele), para os quais tirar uma única vida inocente equivale a assassinar toda a humanidade.
Espanta-me imensamente que esses grupos de assassinos se declarem grupo islâmico. E mais ainda me surpreende que a imprensa-empresa ocidental, alinhada com aqueles assassinos, repita essa mentira, repetição que provoca a ira de todos os muçulmanos.
O povo muçulmano que todos os dias relembra Deus como o Mais Generoso e o Mais Compassivo, e que tantas lições de bondade e empatia aprendeu de seu Profeta, toma essa difamação diária como parte de um projeto para disseminar a islamofobia.
Os fracassos e erros estratégicos do Ocidente no Oriente Médio, Ásia Central e Cáucasos converteram essas partes do mundo em abrigo seguro para terroristas e extremistas.
A agressão militar contra o Afeganistão e contra o Iraque e a interferência imprópria e indevida nos desenvolvimentos na Síria são exemplos claros da abordagem estratégica errada no Oriente Médio.
Como abordagem não pacífica, a agressão e a ocupação atacam a vida e os espaços de moradia e sobrevivência de pessoas comuns; a agressão e a ocupação resultam em consequências comportamentais e psicológicas de aversão, que hoje se manifestam sob a forma de violência e morte no Oriente Médio e no Norte da África, a ponto, mesmo, de atrair para lá cidadãos de outras partes do mundo. A violência atualmente se difunde para todos os cantos do mundo, como doença contagiosa.
Nós sempre acreditamos que a democracia não pode ser transplantada de terras distantes; democracia é resultado de desenvolvimento e crescimento; não é resultado de guerra e agressão. Democracia não é item de exportação que possa ser comercialmente exportado do ocidente para o oriente. Numa sociedade subdesenvolvida, democracia importada só gera governos fracos e vulneráveis.
Quando generais põem os coturnos numa região, que não esperem ser recebidos com afeto pelos diplomatas: quando a guerra começa, a diplomacia tende a parar. Quando a atmosfera no Oriente Médio for de confiança e segurança, a resposta será, também de confiança e segurança. Mas se se impõem sanções, começa simultaneamente a implantar-se uma ira profunda contra os sancionadores.
Os interesses dos países ocidentais em nossa região estão associados ao reconhecimento de nossas crenças, por aqueles países; e ao reconhecimento por eles, também, de que nosso povo deseja governo democrático na região.
A experiência de criação da Al-Qaeda, dos Talibã, dos modernos grupos extremistas demonstrou que é possível servir-se de grupos extremistas como instrumento contra estado não amistoso e, ao mesmo tempo, fingir que não se veem as consequências de um extremismo sempre crescente. Causa grande perplexidade que se repitam os mesmos erros, apesar das muitas dolorosas experiências.
Relembremos que o Irã convidou todos para um “diálogo” antes dos atos criminosos de 11 de setembro; e que também clamamos por “um mundo contra a violência e o extremismo” antes que eclodissem as atuais atrocidades. Talvez, no passado, pouca gente fosse capaz de prever o incêndio que arde hoje. Mas agora o extremismo e a violência absolutamente fora de controle são ameaça iminente para o mundo.
É autoevidente que sem compreensão acurada de como se geraram as condições que há hoje, jamais encontraremos as solução certas. Hoje, mais uma vez, tenho de alertar contra a disseminação do extremismo e o perigo imposto pela compreensão inadequada e por qualquer abordagem errada desse fenômeno.
O Oriente Médio anseia por desenvolvimento e está farto de guerras. É direito natural dos povos das terras férteis do Oriente Médio viver em paz e prosperidade.
No passado, o colonialismo negou esse direito a eles e, hoje, a sombra da guerra e da violência ameaça a segurança daqueles mesmos povos.
Em nossa região há políticos moderados e elites que gozam da confiança do povo. Não são nem anti-Ocidente nem pró-Ocidente. Embora não esqueçam o papel que teve o colonialismo no atrasamento de suas nações, não esquecem que suas próprias nações são capazes de, elas mesmas, alcançar o desenvolvimento pelo qual anseiam.
Não que absolvam o ocidente pelos seus muitos erros e malfeitos, mas sabem ver também os próprios fracassos. Esses homens e mulheres podem assumir posições de liderança ativa e reunir à volta deles a confiança de suas respectivas sociedades, e estabelecer as mais potentes coalizões nacionais e internacionais contra a violência.
As vozes desses homens e mulheres são as verdadeiras vozes da moderação no mundo islâmico; a fala familiar de um afegão farto de guerras; de um iraquiano vítima do extremismo; de um sírio horrorizado com a ação de terroristas; de um libanês que é atormentado pela violência e pelo sectarismo.
Entendo que há erro estratégico, se países de longe da região se autoproclamem líderes de uma ou outra coalizão, exclusivamente para tentar proteger a própria hegemonia na região.
Obviamente, porque a dor é velha conhecida dos povos do Oriente, não dos que chegam de longe, a melhor coalizão possível será a que se forme na própria região, e que assuma sobre os próprios ombros a responsabilidade por liderar a luta contra a violência e o terrorismo. E se outras nações do mundo tiverem real desejo e interesse legítimo em agir contra o terrorismo, sempre poderão acorrer e apoiar a coalizão local.
Advirto que, se não soubermos aliar nossas forças contra o extremismo e a violência hoje, e se fracassarmos no trabalho de alistar os povos da região para que resistam contra o extremismo, amanhã o mundo já não será seguro para ninguém.
Sr. Presidente,
Ano passado, tentei cumprir o papel do meu país na realização da paz nos dois níveis, regional e internacional, e ofereci uma proposta sobre “um mundo contra a Violência e o Extremismo” – que mereceu apoio geral.
Na tumultuada, caótica região que é o Oriente Médio, o Irã é uma das nações mais tranquilas, seguras e estáveis. Mas todas as nações da região têm de manter em mente que estamos no mesmo barco. Assim, precisamos de ampla cooperação para tudo que tenha a ver com nossa vida social e política, e com questões de segurança e defesa, com vistas a alcançar compreensão durável e comum a nós todos.
Se já houvesse maior cooperação e melhor coordenação no Oriente Médio, milhares de palestinos inocentes não teriam tombado em Gaza, vítimas da agressão pelo regime sionista. Entendemos que a interação e a construção de confiança entre os estados da região é fundamentalmente essencial para a resolução de conflitos. Apoiamos qualquer medida que promova cooperação entre nações islâmicas para combater o extremismo, as ameaças e a agressão e, nesse campo, estamos preparados para cumprir nosso papel construtivo e positivo permanente.
Sr. Presidente,
As opressivas sanções impostas ao Irã prosseguem, na sequência de erro estratégico contra nação independente e moderada, considerado o delicado quadro geral em nossa região. Durante o ano passado, nos engajamos no diálogo mais transparente, para construir confiança em torno do programa nuclear iraniano para finalidades pacíficas. Abrimos agenda para negociações sérias e honestas, não como resultado de sanções ou efeito de ameaças, mas porque era desejo do povo do Irã que seu governo negociasse.
Somos de opinião que a questão nuclear só pode ser resolvida mediante negociação, e quem considere qualquer outra via comete erro grave. Qualquer demora que adie um acordo final só faz aumentar os custos; não só para prejuízo do Irã, mas também para prejuízo da economia de outras partes envolvidas e das possibilidades de desenvolvimento e segurança em nossa região. Ninguém deve duvidar de que concessões e acordos, nessa questão, sempre serão feitos com vistas ao melhor interesse de todos, sobretudo das nações da região.
As negociações nucleares entre o Irã e o Grupo 5+1 prosseguiram, ano passado, com seriedade e otimismo de ambas as partes. Segundo todos os observadores internacionais, a República Islâmica do Irã cumpriu, de boa fé, todos os compromissos que assumiu. Apesar disso, algumas das observações e ações de nossos contrapartes criaram algumas dúvidas sobre a determinação deles e o realismo da posição deles. Mesmo assim esperamos ainda que as negociações em andamento levem a um acordo final, no curto período de tempo que resta para negociar.
Estamos comprometidos a perseverar em nosso programa nuclear para finalidades pacíficas, inclusive com enriquecimento de urânio, e a usufruir plenamente todos os direitos nucleares que são nossos em território iraniano, nos termos prescritos pela lei internacional.
Estamos decididos a continuar as negociações com nossos interlocutores em honestidade e boa fé, baseados no respeito e na confiança mútuos, na remoção de todas as preocupações de ambos os lados, em pés de igualdade e reconhecidos todas as normas e princípios internacionais. Creio que os dois lados devem manter-se aderidos à estrita implementação dos compromissos. Evitar demandas excessivas nas negociações, por nossos contrapartes, é pré-requisito para o sucesso das negociações. Um acordo final sobre o programa nuclear para finalidades pacíficas do Irã pode servir como primeiro movimento de uma colaboração multilateral para promover segurança, paz e desenvolvimento em nossa região e além dela.
O povo do Irã, que tem sido submetido a pressões, especialmente nos últimos três anos, como efeito de continuadas sanções, não pode confiar em nenhuma cooperação de segurança entre seu próprio governo e os que impuseram aquelas sanções e criaram tantos obstáculos contra a satisfação das mais básicas necessidades do povo do Irã, como comida e remédios. As sanções criarão impedimentos ainda adicionais, no caminho de qualquer cooperação futura de longo prazo.
O povo do Irã é devotado a alguns princípios e valores no topo dos quais estão a independência, o desenvolvimento e o orgulho nacional. Nosso povo avalia o comportamento de seu governo pelos mesmos critérios. Se esse óbvio fato nacional não é compreendidos pelos nossos parceiros negociadores e eles cometem erros ofensas graves no processo, uma oportunidade histórica e excepcional será desperdiçada.
Como os senhores sabem, durante as negociações nucleares que estão em negociação nesse ano, o governo iraniano tomou algumas iniciativas que criaram novas condições favoráveis, que resultara, naquela fase, no Plano Conjunto de Ação de Genebra. Estamos determinados a continuar na nossa abordagem de construir confiança e oferecer máxima transparência nesse processo. Se nossos interlocutores estão igualmente motivados e são igualmente flexíveis, podemos superar o problema e alcançar acordo duradouro, mesmo no curto tempo que nos resta. Nesse caso, emergirá um ambiente inteiramente novo, para cooperação nos planos regional e internacional, permitindo maior foco em algumas questões regionais muito importantes como combater a violência e o extremismo na região.
Chegar a um acordo nuclear final e compreensivo com o Irã será oportunidade histórica para que o ocidente mostre que não se opõe ao avanço e ao desenvolvimento de outros países e não discrimina no que tenha a ver com respeitar leis e regulações internacionais. Esse acordo pode levar mensagem de paz e segurança, indicando que o modo pelo qual alcançar a resolução dos conflitos é a negociação e o respeito, nunca o conflito e a sanção.
Sr. Presidente, Senhoras e senhores,
Ano passado a grande nação do Irã participou de amplas, calmas, importantes eleições presidenciais, e endossou o discurso de “Antevisão, Esperança e Moderação Prudente”. Depois das eleições, o povo do Irã apoia o seu governo eleito nos esforços para construir o país. Enquanto alguns dos países em torno do Irã caíram presa da guerra e dos tumultos, o Irã permanece em segurança, estável e calmo.
A política baseada em princípios de meu governo existe para trabalhar na direção de interações construtivas com nossos vizinhos, baseada em mútuo respeito e com ênfase em interesses comuns. A noção de que o Irã buscaria controlar outros países na região é mito reposto em circulação em anos recentes, no contexto de um projeto iranofóbico. Os que dizem que o Irã buscaria controlar outros países carecem de inimigos imaginados, para manter vivas as tensões e semear divisões e conflitos e, assim, vão trabalhando para que os recursos nacionais não sejam aplicados no desenvolvimento do nosso país. Nós trabalhamos para pôr fim a essa iranofobia delirante, preparando as condições para construir parcerias estratégicas com nossos vizinhos.
Concluindo, ano passado alertei contra a expansão da violência e do extremismo. Esse ano volto a alertar: se a abordagem correta não for adotada para enfrentar as questões que se veem à nossa volta, nos aproximamos ainda mais de ter região turbulenta e tumultuada, o que terá repercussões em todo o mundo. A solução correta para as dificuldades que há nasce dentro da região e provê regionalmente as soluções necessárias; com o apoio internacional, sim, mas não vinda de fora da região.
Deus Todo Poderoso prometeu aos que creem e cumprem bem os próprios deveres, que Ele lhes garantiria a sucessão na autoridade sobre a terra, e que todos os medos dos homens e mulheres seriam convertidos em paz e segurança.
Minha mais sincera esperança é que nossa geração cumpra o seu dever e deixe um planeta mais seguro e desenvolvido, como legado dela à próxima geração. Desejo sucesso a todos.
Obrigado.