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Ser de esquerda é não aceitar as injustiças, sejam elas quais forem, como um fato natural. É não calar diante da violação dos Direitos Humanos, em qualquer país e em qualquer momento. É questionar determinadas leis – porque a Justiça, muitas vezes, não anda de mãos dadas com o Direito; e entre um e outro, o homem de esquerda escolhe a justiça.
É ser guiado por uma permanente capacidade de se estarrecer e, com ela e por causa dela, não se acomodar, não se vender, não se deixar manipular ou seduzir pelo poder. É escolher o caminho mais justo, mesmo que seja cansativo demais, arriscado demais, distante demais. O homem de esquerda acredita que a vida pode e deve ser melhor e é isso, no fundo, que o move. Porque o homem de esquerda sabe que não é culpa do destino ou da vontade divina que um bilhão de pessoas, segundo dados da ONU, passe fome no mundo.
É caminhar junto aos marginalizados; é repartir aquilo que se tem e até mesmo aquilo que falta, sem sacrifício e sem estardalhaço. À direita, cabe a tarefa de dar o que sobra, em forma de esmola e de assistencialismo, com barulho e holofotes. Ser de esquerda é reconhecer no outro sua própria humanidade, principalmente quando o outro for completamente diferente. Os homens e mulheres de esquerda sabem que o destino de uma pessoa não deveria ser determinado por causa da raça, do gênero ou da religião.
Ser de esquerda é não se deixar seduzir pelo consumismo; é entender, como ensinou Milton Santos, que a felicidade está ancorada nos bens infinitos. É mergulhar, com alegria e inteireza, na luta por um mundo melhor e neste mergulho não se deixar contaminar pela arrogância, pelo rancor ou pela vaidade. É manter a coerência entre a palavra e a ação. É alimentar as dúvidas, para não cair no poço escuro das respostas fáceis, das certezas cômodas e caducas. Porém, o homem de esquerda não faz da dúvida o álibi para a indiferença. Ele nunca é indiferente. Ser de esquerda é saber que este “mundo melhor e possível” não se fará de punhos cerrados nem com gritos de guerra, mas será construído no dia-a-dia, nas pequenas e grandes obras e que, muitas vezes, é preciso comprar batalhas longas e desgastantes. Ser de esquerda é, na batalha, não usar os métodos do inimigo.
Fernando Evangelista
domingo, janeiro 03, 2016
Felizmente, eles não passaram, nem passarão em 2016.
No Blog Altamiro BorgesPor Vinicius Wu, na revista Fórum:
Se os brasileiros se habituaram a chamar os anos oitenta de “a década perdida”, nada mais justo do que, doravante, lembrarmos de 2015 como “o ano perdido”. Seria a melhor síntese do que vivemos nos últimos doze meses. Afinal, pelo menos do ponto de vista político, o ano que se encerra não passou de uma caricata extensão de 2014.
A polarização política e o resultado apertado nas últimas eleições presidenciais foram o ponto de partida para que a oposição assumisse, deliberadamente, uma postura de relativização, ou mesmo questionamento, do resultado das urnas. Não houve a tradicional trégua dos meses iniciais de governo e os principais partidos políticos seguiram em clima de campanha, bloqueando acordos e mediações indispensáveis ao enfrentamento da atual crise econômica.
A fragilidade da articulação política do governo, os erros cometidos nos meses iniciais de 2015 e o isolamento do PT no Congresso, associado à inércia de sua direção, levaram o bloco governista a uma posição defensiva, que evoluiu para a dispersão, selando derrotas importantíssimas no Parlamento, dentre elas, a eleição de Eduardo Cunha à Presidência da Câmara.
O uso político da Operação Lava Jato foi outro fator decisivo para a manutenção de um clima de acirramento e confronto. À medida em que a operação evoluía, ficava evidente que o monumental esquema de corrupção na estatal havia começado bem antes da chegada do PT ao poder, dado sistematicamente negligenciado e relativizado por setores da mídia e do Judiciário.
A Lava Jato, que inicialmente parecia ser uma oportunidade para a “republicanização” do país, ao submeter “gente grande” ao escrutínio da lei, se tornou mero instrumento de disputa política, empregado por setores interessados em derrotar a esquerda e o PT.
Em relação aos movimentos da sociedade, 2015 consolida o “pós-junho” de 2013, marcado pela consolidação da presença da direita nas ruas, pela reação dos movimentos sociais tradicionais e pelo desaparecimento dos tais “black blocs”, que muitos julgavam o supra-sumo do novo protagonismo juvenil no Brasil pós-Lula.
Mas, o fato é que a situação política levou o Congresso, o Governo, os partidos e uma significativa parcela da sociedade civil a terem como pauta, quase que exclusiva, a continuidade, ou não, de um governo que mal iniciou seu mandato. Os prejuízos dessa paralisia ainda estão por ser medidos, mas é evidente que o ambiente político contribuiu para agravar o já conturbado cenário econômico.
Se quiserem evitar que 2016 seja uma extensão de 2015, o PT e o governo deverão agir. O final do ano trouxe boas notícias, em especial, a indicação de Nelson Barbosa para a Fazenda e o sucesso das mobilizações de rua contra o impeachment, realizadas recentemente.
Mas, ainda há muito chão até que a possibilidade do impedimento da Presidente Dilma seja descartada. A situação econômica não é nada confortável. Os níveis de desemprego dirão muito sobre o desfecho da crise. No Congresso Nacional, o clima deve esquentar, acirrando os ânimos. E, ainda temos as eleições municipais, que tendem a reproduzir o clima de 2014.
Talvez seja hora da esquerda agir enquanto esquerda, disputando consciências e realizando o bom debate político sobre os grandes temas nacionais. O PT segue devedor de uma resposta efetiva ao tema da corrupção. Terá de se reinventar se não quiser perecer enquanto projeto viável de transformação da sociedade brasileira. Já passa da hora do partido buscar seus aliados, incluindo PSOL e Rede, para repensar sua estratégia.
Tudo indica que o próximo ano será decisivo para o futuro da esquerda brasileira. A situação do governo é central, mas não é o único vetor de um processo de reorganização que parece se insinuar, lentamente, mobilizando amplos setores sociais. O PT pode pagar um alto preço pela inércia de sua direção. Pelo menos, em termos de agitação político-partidária, o ano que vem promete. Agora é aguardar e ver no que vai dar.
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E A DEMOCRACIA RESISTIU AO GOLPE E À INTOLERÂNCIA
Em 2015, a democracia brasileira passou por uma dura prova de fogo; de um lado, a oposição, liderada pelo senador Aécio Neves (PSDB-MG), se aliou ao deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ) para promover um impeachment sem fundamentos jurídicos – ou seja, um golpe; de outro, grupos sociais disseminaram ódio nas redes sociais, revelando uma faceta nova da sociedade brasileira: a da intolerância, que atingiu diversas personalidades, como o ex-ministro Guido Mantega; o episódio mais recente, que revelou o quanto o Brasil adoeceu, foi a agressão ao cantor e compositor Chico Buarque; no entanto, apesar de tudo, a presidente Dilma Rousseff resistiu e inicia 2016 bem mais forte do que seus adversários gostariam
247 – Eis que 2015 chega ao fim de um modo bem diferente daquele que foi sonhado pela oposição. Apesar de todas as dificuldades políticas e econômicas, a presidente Dilma Rousseff se mantém no cargo e o impeachment se tornou uma miragem distante depois que o Supremo Tribunal Federal invalidou o rito traçado pelo deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ).
Pode parecer pouco, mas é um grande feito quando se leva em conta a intensidade da agressão que se tramou contra a democracia brasileira. De um lado, a oposição, aliada à mídia familiar, buscou, desde a derrota nas eleições presidenciais de 2014, um atalho para retornar ao poder. Tentou-se de tudo: desde a recontagem das urnas até o pedido de impeachment ancorado na extravagante tese das pedaladas fiscais, acolhido por Cunha.
Em paralelo, ao mesmo tempo em que envenenava o ambiente político com seu terceiro turno sem fim, a oposição patrocinava as pautas-bomba no Congresso, apostando na tese do 'quanto pior, melhor'. E isso sem falar nas demissões provocadas no setor de engenharia pelo fator Lava Jato.
O Brasil foi rebaixado por duas agências de risco, o desemprego cresceu fortemente, mas, apesar disso, a presidente Dilma conseguiu, no fim do ano, ver a seu lado um batalhão de pessoas dispostas a lutar pela democracia. A seu lado, perfilaram-se artistas, professores, juristas, sindicalistas e intelectuais – mesmo aqueles que não estão satisfeitos com a sua gestão.
Tudo isso demonstrou que, em 2015, a democracia foi colocada como um bem maior, a despeito de todos os seus inimigos – tanto na política como nas franjas mais radicais da sociedade. O ano que chega ao fim foi marcado por vários episódios de intolerância. Ex-ministros, como Guido Mantega e Alexandre Padilha, foram agredidos em locais públicos. Chico Buarque, o maior artista brasileiro, foi insultado por um grupo de intolerantes no Leblon, demonstrando a que ponto a sociedade brasileira adoeceu.
No entanto, 2015 teve ainda o mérito de mostrar a natureza do golpe. Uma articulação sinistra, que uniu derrotados nas urnas, políticos corruptos que temem o avanço das investigações em curso e grupos fascistas que disseminam ódio e intolerância.
Felizmente, eles não passaram, nem passarão em 2016.
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