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Ser de esquerda é não aceitar as injustiças, sejam elas quais forem, como um fato natural. É não calar diante da violação dos Direitos Humanos, em qualquer país e em qualquer momento. É questionar determinadas leis – porque a Justiça, muitas vezes, não anda de mãos dadas com o Direito; e entre um e outro, o homem de esquerda escolhe a justiça.
É ser guiado por uma permanente capacidade de se estarrecer e, com ela e por causa dela, não se acomodar, não se vender, não se deixar manipular ou seduzir pelo poder. É escolher o caminho mais justo, mesmo que seja cansativo demais, arriscado demais, distante demais. O homem de esquerda acredita que a vida pode e deve ser melhor e é isso, no fundo, que o move. Porque o homem de esquerda sabe que não é culpa do destino ou da vontade divina que um bilhão de pessoas, segundo dados da ONU, passe fome no mundo.
É caminhar junto aos marginalizados; é repartir aquilo que se tem e até mesmo aquilo que falta, sem sacrifício e sem estardalhaço. À direita, cabe a tarefa de dar o que sobra, em forma de esmola e de assistencialismo, com barulho e holofotes. Ser de esquerda é reconhecer no outro sua própria humanidade, principalmente quando o outro for completamente diferente. Os homens e mulheres de esquerda sabem que o destino de uma pessoa não deveria ser determinado por causa da raça, do gênero ou da religião.
Ser de esquerda é não se deixar seduzir pelo consumismo; é entender, como ensinou Milton Santos, que a felicidade está ancorada nos bens infinitos. É mergulhar, com alegria e inteireza, na luta por um mundo melhor e neste mergulho não se deixar contaminar pela arrogância, pelo rancor ou pela vaidade. É manter a coerência entre a palavra e a ação. É alimentar as dúvidas, para não cair no poço escuro das respostas fáceis, das certezas cômodas e caducas. Porém, o homem de esquerda não faz da dúvida o álibi para a indiferença. Ele nunca é indiferente. Ser de esquerda é saber que este “mundo melhor e possível” não se fará de punhos cerrados nem com gritos de guerra, mas será construído no dia-a-dia, nas pequenas e grandes obras e que, muitas vezes, é preciso comprar batalhas longas e desgastantes. Ser de esquerda é, na batalha, não usar os métodos do inimigo.
Fernando Evangelista

sexta-feira, março 02, 2012

Eliana Paiva revela a longa busca por respostas de quem viu o horror

 

Estranho, muito estranho essa publicação no jornal que foi porta-voz da ditadura e a partir dela construiu um império midiático.
Via Globo
Pela primeira vez, filha de Rubens Paiva conta o que passou
Miriam Leitão e Claudio Renato


Eliana Paiva, filha do deputado Rubens Paiva, desaparecido durante a ditadura militar

Foto: Reprodução TV
Eliana Paiva, filha do deputado Rubens Paiva, desaparecido durante a ditadura militar
RIO - Há muitas histórias perdidas e famílias sem respostas no Brasil. Os pedaços de informação que se tem sobre os desaparecidos políticos exibem a face de um regime que torturou, matou e ocultou cadáveres. A democracia, em 27 anos, não conseguiu romper o impedimento dos militares às investigações. No caso Rubens Paiva, fica clara a culpa das Forças Armadas.
Feriado no Rio, dia ensolarado aquele 20 de janeiro de 1971. Rubens Paiva viu a filha Eliana, de 15 anos, descer as escadas do sobrado à beira-mar, no número 80 da Delfim Moreira, no Leblon, enquanto conversava com o amigo Raul Riff. Pediu à filha um beijo.
Eliana viveria o próprio horror. Quando voltou da praia, a casa já havia sido invadida, e o pai estava preso. Foi ameaçada por um militar com um cabo elétrico. No dia seguinte, foi levada presa, encapuzada, junto com sua mãe, para o DOI-Codi. Ela falou pela primeira vez depois de 40 anos para a GloboNews.
O GLOBO - Eliana, o que você lembra do seu pai?
ELIANA PAIVA - Meu pai era uma figura muito alegre, muito viva, muito feliz. Ele tinha sido cassado em 1964. A partir daí, sofreu nove meses no exílio. Quer dizer, ele ficaria mais, mas, em determinado momento, ele chegou em casa, em São Paulo. Ele tinha pego um avião via Buenos Aires ou Uruguai, não me lembro direito, e conseguiu sair com o passaporte de diplomata ou diplomático, que é um passaporte vermelho. Então, dessa maneira, ele foi passando pelos aeroportos, até chegar em São Paulo. Eu me lembro no final de 64... quer dizer, a cassação dele foi na primeira ou na segunda listas de cassação de deputados federais. O exílio dele foi a partir de junho. Depois de 31 de março, da intentona revolucionária ou golpe militar, ele ficou na embaixa iuguslava até junho, julho... Ele foi para Iuguslávia, a partir daí ele foi para outros países da Europa. Nove meses depois ele chega em casa pela porta dos fundos, as empregadas tomaram o maior susto e era o jeito dele. De repente, ele decidiu "vou voltar pra casa. Chega, já fiquei no exílio muito tempo, ninguém vai fazer nada pra mim. Eu estou livre de processos, enfim."
O GLOBO - Até porque ele não tinha nenhuma atuação assim...
ELIANA- Tinha. Ela tinha tido uma atuação na época do processo contra o Ibad..
O GLOBO - Uma atuação parlamentar...
ELIANA - Parlamentar. Mas atuação política, de esquerda, que realmente agredisse os militares, a não ser isso, que foi uma coisa séria, denuciar o Ibad. Aquilo era uma coisa muito séria dentro do governo militar, que provava uma série de verbas mal utilizadas por gente que depois assumiu o regime. Mas, a partir disso, ele não tinha tantos problemas. A personalidade dele era vivar. "Não estou conseguindo ficar longe da minha família na Europa, tá tudo muito chato aqui, eu vou voltar pra casa". E foi assim que aconteceu
O GLOBO - E em casa, como ele era como pai?
ELIANA - Paipai trabalhava muito. Ele era uma pessoa participante de todo tipo de grupo social em que ele estava envolvido, inclusive na própria profissão de engenheiro civil. Ele tinha uma firma de engenharia. E quando se tornou deputado federal, ele tinha um grupo de amigos, de deputados bastante ativos, E como pai ele estava presente, junto conosco, os cinco irmãos. A vida pública, todo mundo sabe disso, qualquer político, qualquer deputado principalmente na década de 60, tinha uma vida muito intensa. A geração dele era muito exigente em relação a discussões, a conversas, a debates. Apesar da pouca idade de todo mundo. Foi uma geração muito importante para o Brasil. Geração dos anos 50, do Celso Furtado, do Fernando Henrique Cardoso e, enfim, de todas essas pessoas...
O GLOBO - Você viu a prisão do seu pai?
ELIANA - Pois é. Antes, você me perguntou sobre a personalidade dele...Exatamente por ser uma pessoa muito viva, ele começou a se sentir cerceado em São Paulo. Papai não podia trabalhar mais do jeito que estava trabalhando, aí ele conseguiu um emprego no Rio de Janeiro, como engenheiro civil, mas, mesmo assim, não podia assinar porque ele era um deputado cassado. Todas as contas dele como engenheiro civil eram ligadas ao governo, porque ele fazia pontes e estradas. As obras envolviam verbas federais, então ele não podia aparecer. Ele conseguiu um emprego no Rio, entrou como sócio de uma empresa lá. Nós mudamos pro Rio. A primeira coisa que ele fez foi alugar uma casinha em frente à praia do Leblon, um sobradinho e mudamos pra lá. De novo volta essa personalidade da alegria, da vontade de viver, da praia, do Rio de Janeiro. O Rio de Janeiro de 65 em diante foi uma cidade muito especial. Aconteciam muitas coisas no Rio de Janeiro que não aconteciam em São Paulo. Pra ele, era muito importante. Tanto que ele foi preso no Rio de Janeiro. Isso é que estou tentando chegar. Como foi essa prisão? Raul Ryff, jornalista e assessor de imprensa de João Goulart, também cassado, já morava, já tinha voltado pro Rio de Janeiro, depois de ficar um tempo na Europa. Raul Ryff morava perto, no condomínio dos Jornalistas, que existe até hoje no Leblon. Quer dizer: uns jornalistas, uma série de jornalistas moram ali, compraram apartamento nesse lugar. E ficava a três quarteirões de casa. Então, Raul Ryff de manhã saia da casa dele, passava em casa, pegava papai e iam pra praia andar, conversar, encontrar gente. Era o que mais eles gostavam de fazer. Então, quando acordei e levantei, era feriado, estavam os dois sentados numa poltrona, numa espécie de jardinzinho que a gente tinha. O Ryff e meu pai, os dois conversando. Então botei biquini, botei saída de praia, peguei minhas coisas. Eu tinha uma turma de praia, como todo mundo tinha na adolescência, eu tinha 14, 15 anos de idade. Eu me lembro de estar saindo correndo e ele me disse: "ué, você não vai me dar um beijo?". Eu disse: “vou, claro”. Dei um beijo nele e o Raul pediu um beijo. Dei um beijo no Ryff e fui embora pra praia. Fui embora pra praia, com minha turma, fiquei um tempo lá, e quando eu voltei...isso devia ser o quê? Dez horas, onze horas da manhã...Quando voltei uma, duas horas da tarde, eu entro em casa e mamãe, até hoje vem muito essa memória, estava com olho muito arregalado, quer dizer, uma coisa que eu nunca tinha visto nela. Ela estava muito arregalada, falando muito baixo, muito contida. Perguntei: O que aconteceu? Ela me falou: "Teu pai foi preso". Chamou de lado. Eu não tinha visto os militares à paisana, que estavam lá. Quando.tinha entrado na casa, mamãe parecia estar me esperando. Porque minha irmã mais velha estava em Londres, quer dizer, eu era a segunda mais velha. Eu acho que pela idade. Ela disse: "seu pai foi preso, você vai tentar sair e avisar ao seu tio". Era o cunhado do meu pai, casado com uma irmã da minha mãe, Cássio Mesquita Barros, que é um advogado, ainda é advogado até hoje. "Você vai tentar telefonar pra ele e avisar à família que seu pai foi preso." Eu jogava vôlei pelo Botafogo, na equipe do juvenil. Então, o que eu fiz: me vesti de Botafogo, peguei minha mochila, tomei banho, aí que eu vi, quando fui entrando, vi que tinha uns três ou quatro homens dentro de casa. Me vesti inteirinha, a caráter, de jogadora de vôlei, desci. Disse: "estou indo pro clube, tenho compromisso, não posso deixar. E fui saindo, quer dizer, não vão me impedir de sair. .E fui exatamente até o condomínio dos Jornalistas onde estava a maioria da minha turma, na casa do Ronaldo Pacheco e pedi para telefonar. O Ronaldo Pacheco é um amigo meu até hoje. O Ronaldo deixou eu telefonar. Telefonei pro meu tio, consegui falar com ele. Depois não sabia se voltava pra casa, mas tinha que fazer uma hora pelo menos pra dizer que tinha ido até o Botafogo, jogar e voltar. Fiz uma hora, uma hora e meia, mais ou menos. Não sei se o Ronaldo ficou comigo, mas a gente ficou andando um pouco. Eu pedi para ele pra não aparecer, inclusive. Eu falei um pouco pra ele do que eu sabia. Voltei pra casa, e aí que comecei a perceber que a barra era muito pesada. Quando eu cheguei em casa, um deles, o mais fortão, estava com um cabo elétrico na mão e perguntou: "o que você foi fazer na rua?" Eu olhei pra ele e falei assim: "Eu fui jogar". "Não, você não foi jogar, você foi avisar às pessoas que teu pai foi preso. Ou seja, meu tio, ingenuamente, tinha ligado pra casa da minha mãe, pra perguntar o que tinha acontecido. E o telefone estava grampeado. Como é que grampeavam o telefone naquela época? Havia várias extensões na casa. Cada um ficava numa extensão. Na hora que tocava, alguém atendia, alguém ouvia na extensão. Ainda era uma coisa rudimentar. Não sei se eram realmente grampos. Foi muito difícil, porque eu consegui sentar na sala com este sujeito que estava completamente transtornado - eu nem vi minha mãe na sala - e tentei acalmar o cara. Falei: "olha, eu fui avisar ao meu tio porque a gente não sabe o que está acontecendo, e o senhor, por favor, abaixe esse cabo elétrico, porque o senhor não vai fazer nada com isso." E aí a sensação que eu tive foi que ele se acalmou. Eu acho que esse ambiente familiar é absolutamente isento dessa culpabilidade de militância. Mamãe com empregadas, enfim, meu pai era um burguês, um empresário bem sucedido. E a coisa acalmou. Então, nós pudemos dormir. Eu tenho a impressão de que os meus três irmãos Marcelo, pela ordem, Ana Lúcia, que é a do meio, e Beatriz. Ana Lúcia tinha ido pra casa de uns amigos, eu acho. Marcelo e a caçula Beatriz, a Babiu, estavam em casa.
O GLOBO - Você chegou a ser presa. Como foi esse episódio?
ELIANA - Pois é. Nos dias 20 e 21, a gente ficou em casa. Prisão domiciliar. Ninguém mais entrava, ninguém mais saía. Dois amigos nossos, jovens, Nelson Prado, filho da dona Yolanda Secchin Prado, mais o namorado da minha irmã mais velha, passaram em casa e foram presos e levados. Não aconteceu muita coisa com eles. Parece que só foram interrogados. Eu não sei se foi nesse dia, é um testemunho que gostaria de dar, porque já houve uma série de consequências: o Ronaldo Pacheco, que me acolheu na casa dele, também foi levado. Tinha minha idade, tinha 15 anos. Parece que foi bastante maltratado, foi muito torturado. Aos 15 anos. Fiquei sabendo disso muito tempo depois, porque, enfim, uma série de ciircustâncias fez com que a gente não se encontrasse ou ele não contasse. Fiquei sabendo disso há pouco tempo, quando ele me pediu um documento pra ver se ele não conseguia entrar com um processo. Tive que documentar que ele realmente tinha sido preso, porque não havia testemunhas. Só não sei por que o Ronaldo exatamente. Talvez pela circunstâncias de ser um meninão. Ele chegou lá em casa preocupado comigo, e o pegaram. Nem vi ele ser pego. Acho que ele foi pego na entrada de casa. E eu soube o que aconteceu. Isso foi no dia 21. Do dia 20 pro dia 21. No dia seguinte, minha mãe acorda, eu dormi normalmente, não me lembro do clima ter ficado tenso, enfim....eu era uma garota, não conseguia encaixar muito as coisas...e no dia seguinte, minha mãe me acorda e me diz: "se veste, que a gente vai ter que dar depoimento." Eu falei assim; "Eu?"...É...Eu me vesti, me lembro de ter colocado uma túnica bem preta, uma calça bem discreta. Aí, de novo, mamãe começou a ficar muito nervosa. Isso mais ou menos às 11h, 11h30 nos colocaram num fusca. Depois, se soube que eles andavam de fuscas pra cá e pra lá, os fusquinhas. Nos colocaram num fusca e nos levaram pra Tijuca, pra Barão de Mesquita, na Tijuca, onde funcionava o Doi-Codi no Rio de Janeiro. Nessa ida para a Tijuca, eles pararam em frente ao Maracanã e nos encapuzaram. Um capuz que vinha daqui até aqui, na altura do peito. A gente estava sentada atrás nesse fusca, um fusca azul, e o rádio o tempo todo passando todas as conversas entre os militares, o código, enfim, a guerra para eles, que eles mesmo falam que a guerra era uma guerra, né? Que eles venciam ou não venciam.
O GLOBO - Você se lembra do que eles falavam no rádio?
ELIANA - Falavam em código. Sempre em código. Havia uma movimentação paralela ao que estava acontecendo em casa, havia um controle dentro de casa. Eles por fora já viam uma movimentação. Mas sempre me pareceu uma coisa muito ingênua. Você dentro de um fusca, encapuzada, parece um teatro, né? Bom, aí nós paramos na Barão de Mesquita, fomos levados para o Doi-Codi, e me separaram da minha mãe. Nós fomos separadas. Eu fui revistada de alto a baixo, em todos os sentidos, uma coisa desagradabilíssima. Fui revistada por um homem inclusive.
O GLOBO - Ele pegou no seu corpo?
ELIANA - Inteirinho, em todos os cantos possíveis. Eu estava ainda encapuzada. Tinha um cheiro muito ruim esse capuz. A partir daí, fomos separadas, eu e minha mãe. Eu vi uma vez só minha mãe durante 24 horas em que eu fiquei presa. A gente foi colocada numa espécie de corredor. Esse corredor, aos poucos, foi se tornando um corredor polonês. Então, passavam os guardinhas e, ou davam um choque na minha cabeça, e me chamavam de comunista, ou tentavam abusar de mim. E eu não sabia onde estava a minha mãe. Mas o mais terríivel desse momento foi quando comecei a ouvir as torturas horríveis que aconteceram nesse país. As pessoas pediam pelo amor de Deus que parassem de bater.
O GLOBO - Você estava de capuz?
ELIANA - Estava de capuz...
O GLOBO - Mas estava ouvindo...
ELIANA - Estava ouvindo. Ouvindo tudo. E eram torturas, assim, monstruosas...As pessoas berravam....
O GLOBO - O que você ouvia?
ELIANA - Berros. "Pelo amor de Deus parem com isso", `Pelo amor de Deus, não façam mais isso".E berros, berros, berros.. Issoera intermitente... Mas a coisa que mais me chocou, isso me chocou também, mas a coisa que me dexou mais anestesiada foi a violência que vi na frente. Havia pessoas sentadas no chão, acho que meninos universitários. Toda vez que passavam um militar dava um chute neles. Eu não sei em que região, mas davam um belo dum chute, ao ponto de eles berrarem ou tentarem se controlar, mas berravam. E eu comecei a ver esse castigo do meu lado, quer dizer, já não era um castigo na sala ao lado. Então, fui levada para o interrogatório. O primeiro interrogatório foi bastante cruel. O interrogador era um sujeito que se chamava "o Cirurgião". Nesse momento, tinha pau de arara do lado, sangue no chão. Eu não conseguia saber, era uma sala pequena, fechada, sem janelas. Havia uma mesa entre mim e ele. Ele tinha uma grande planilha na frente, onde ele organizava, talvez, a vida de todas as pessoas amigas de papai e de mamãe. Então, ele foi me perguntando de algumas pessoas amigas de papai, entre elas Waldir Pires, Raul Riff, o grupo do papai no Rio de Janeir, o.Bocayuva Cunha, se não me falha a memória,,,esses três eram mais ligados a papai:.Waldir, Bocayuva e o Ryff. Havia mais algumas outras pessoas. "Quem são essas pessoas?", perguntou. Eu falei: "São amigos de meu pai".."São terroristas?" "Não.não são terroristas", respondi..".Você sabe que seu pai era comunista?" Não sei se meu pai é comunista, mas ele devia conhecer alguma coisa de Marx" . Eu me lembro que o interrogatório foi nesse nível..Até que surgiu nesse lugar, na minha frente, uma coisa absolutamente absurda, que foi um trabalho. Eu tinha uma professora de História, eu estudava no Notre Dame de Sion, que é um colégio bastante careta, no Rio de Janeiro, bastante tradicional..E a gente tinha uma professora de História bárbara..e nessa época,..era a revolução tcheca.. Eu tinha feito um trabalho imenso sobre a revolução da Tchecoslováquia ,sobre a liberação ou a tentativa de liberação da Tchecoslováquia, que alíás foi uma coiisa muito linda, a Primavera de Praga.. Fizz junto com o Raul Ryff no departamento de pesquisa do JB..O Ryff me abriu muita coisa..Eles pegaram esse trabalho e viraram pra mim e falaram assim: "Então você também é comunista". Primeiro, perguntaram se meu pai era comunista. Puseram o trabalho na minha frente e falaram isso
O GLOBO - Um trabalho escolar?
ELIANA - Um trabalho de 15 anos de idade para o primeiro colegial. Isso. Sobre a Primavera de Praga, que na verdade é até uma coisa muito romântica, mas muito interessante, que todos os jornais noticiaram. Não havia segredo em relação à Primavera de Praga. Eu olhei para o interrogador. Lembro-me que eu fiquei realmente muito brava, muito humilhada, foi uma série de sensações que, enquanto eu estava me anestesiando naquele corredor, nesse momento a coisa me atingiu pessoalmente, porque estava mexendo num trabalho que tinha feito.
O GLOBO - Você se sentiu ameaçada pessoalmente?
ELIANA - .Não chegou a isso nesse momento. Ainda era uma ameaça em relação à minha professora, ao conhecimento que eu estava adquirindo e às coisas que eu estava aprendendo. Foi a primeira vez que comecei a ver o que era a realidade da prisão, da tortura, enfim de cerceamento de expressão. Eles estavam pegando o meu trabalho escolar, bonito, muito bem feito. Por que não poderia falar disso se havia saido em todos os jornais?
O GLOBO - Eles trataram um trabalho escolar como uma prova contra você
ELIANA - Contra mim. Eu fiquei quieta. Tudo o que estou falando era meu pensamento de menina na época mesmo. Pensei: como vou responder a isso? Era uma sensação que vinha direto na tua expressão. Vinha aqui na garganta. Na hora que ele botou o trabalho, a coisa vinha aqui. Como é que eu vou responder uma coisa que faz parte da minha vida? Uma coisa absolutamente natural na minha vida. A segunda reação foi imaginar o que aconteceria coma Ilma, a minha professora. Fiquei preocupada e me calei. Quer dizer, não falei mais nada, resolvi não falar mais nada, porque não sabia quais seriam as consequências. E o clima foi ficando pior até o momento em que alguém entrou na sala e falou para o interrogador: "Doutor Cirurgião, estamos precisando do senhor na outra sala..." Aí, ele olhou pra mim e falou: "É, vai embora..." Fui embora de novo. Eles me encapuzaram. Aí o tal de Cirurgião acho que atuou, porque os berros, os gritos dessa sala ficaram enlouquecedores...
O GLOBO - E você perto da sala?
ELIANA - Não era tão perto. Mas eram tão fortes os berros que eu ouvia.
O GLOBO - Eram gritos de voz masculina ou feminina?
ELIANA- Masculina. Voz feminina, não ouvi, Nem um momento. A não ser a minha. Depois houve um segundo interrogatório, e comecei a chorar. Começaram a escorrer lágrimas. Ficou violento demais. Ou porque eu já tinha entendido onde estava, não sei...
O GLOBO - Mas você sabia onde estava, que seu pai estava lá, que sua mãe estava lá...
ELIANA - Uma menina de 15 anos queria entender onde estava. De mamãe e de papai, eu não sabia. Os meus pais teriam discernimento para saber onde estavam. Eu, não.
O GLOBO - Mas você não os viu lá?
ELIANA - Encontrei minha mãe uma vez, vou te contar. Mas durante esse primeiro instante, até ser levada para uma cela, eu não sabia onde estava, o que estava acontecendo comigo. Por que eu tô tomando choque na cabeça? Quando você está encapuzada, fica atentando para outros sentindos que funcionam. Então, você faz com que teus outros sentidos funcionem e fica em função deles. Eu comecei a chorar. Uma certa hora depois, acho que durou uma hora e meia ou duas, teve um segundo interrogatório. Fui levada de novo. Então cruzei com a minha mãe encapuzada, e ela encapuzada, na porta dessa sala, me disse.."filhinha, tudo bem?" "Tudo bem, mamãe, e você?" "Tudo bem, filhinha..." E aí ela saiu quando entrei. Eu não vivi mamãe, porque estava encapuzada...E não sei se ela me viu. Ela não chegou nem a me tocar...Foi uma voz de mãe..."filhinha"...tudo bem? Uma voz muito doce e aí eu entrei e sentei na mesa já com uma segunda pessoa, uma segunda pessoa bastante mais tranquila, agradável, mais madura., cabelos mais brancos. Eles não tinham identificação, eles tinham uma placa de metal branca.
O GLOBO - Para poder tapar o nome, será?
ELIANA - Ele estava à paisana e a insígnia sugeria uma patente, alguma coisa. Ou seja, que eles teriam uma patente de interrogador. Não sei, é até bom saber que tipo de patente tinha um interrogador. Era uma curiosidade. Bom, enfim... Aí, nessa hora falei pro sujeito: "Escuta, eu tenho 15 anos de idade, a única coisa que eu sei dessa história é que vocês não têm direito de me prender e,.não sei como sabia disso, e vocês podem me prender até 24 horas. A partir daí não existe essa prisão. Gostaria que você tirasse esse capuz, porque está me incomodando, reclamei. Reclamei durante 15 minutos e o sujeito me ouviu. Ele era bem mais manso do que o anterior. Contei que estavam passando a mão em mim, me dando choques. Ele prometeu que daria um jeito. E me ouviu. O meu trabalho escolar continuava em cima da mesa. De novo me assustei, por mim e pela minha professora. Então rolou uma conversa: "Quem é seu pai? Quem são os amigos do seu pai? Quem é que ele recebe em casa?" A coisa foi bem mais amena. E fui contando pra ele. Não podia dizer quem não era amigo e quem não frequentava a minha casa. Aí, era uma loucura
O GLOBO - Aí era uma questão pública também...
ELIANA - Era uma loucura. Não pude esconder, Tanto que depois que sai da prisão, avisei a todas as pessoas que eu tinha falado os nomes. Eu falei de vocês, porque foi perguntado e eu tinha que lembrar quem era..Voltei pro corredor. Ele tirou o capuz, e me colocou uma venda. Foi a maior felicidade do mundo, porque eu pude respirar melhor e pude entender melhor onde eu estava. Eu já via as botas ou sapatos passando, eu já via as fardas, quem estava fardado, quem não estava...Eu já via o tamanho do corredor...Eu já via as pernas dos meninos,dos universiitários, jovens que estavam sentados e relaxados.;E já pude ter uma sensação de que a vida tinha voltado um pouco...Quer dizer, eu não estava numa situação de morte. Se você anda com aquele capuz, anda com uma sensação de morte. Aí, de novo nesse corredor, até às seis horas da tarde, mais ou menos, começaram os berros de novo. Pela terceira vez e com bastante violência. Cada vez mais violento..
O GLOBO - O que você sentia ouvindo estes berros?
ELIANA - Horrível. Eu não sei a sensação...Não conseguia entender que berros eram..Mas eu conseguia sentir que eram coisas muito ruins. Que era uma coisa muito ruim. Eu nunca tinha visto alguém...A sensação de que..eu não coinsigo ver filme de tortura, nada, acho que em função desses berros...Eu..Se eu não vi, todos os meus sentidores sentiram aquilo...E aí, eu entrei num choro convulsivo. Essa hora realmente eu comecei a chorar e me pegaram, alguém passou e avisou que eu estava chorando...Uma criança chorando aos prantos, menina, né? loira, vida da praia, apesar de,,,,acho que alguém percebeu que tinha alguma coisa errada. Aí, me pegaram e me levaram pra uma cela...Me tiraram a venda, fiquei dentro de uma cela. Eram várias celas...Todas meio abertas, só tinha em cima um pouco fechado com uma coisinha...Tinha um banheiro e um colchãozinho nojento na cama...E eu fiquei nessa cela das seis horas da manhã até o dia seguinte, não fui interrogada. E durante a noite se tornou uma espécie de depositário, em frente...não dava pra ver porque estava escuro, mas tinha a impressão de que as pessoas estavam com as mãos amarradas, de capuzes e colocadas nessa espécie de dispensário. Como não havia cela pra todo mundo, eu graças a Deus estava sozinha nessa cela...Não sei se graças a Deus ou não, mas ali na frente era um despensáro d de pessoas que tinham sido presas naquele dia. Não sei se dormi, não me lembro...sei que de amanhã acordo também com uma coisa muito simbólica, porque começaram a cantar aquela música do Roberto Carlos...Jesus Cristo eu estou aqui,..começaram a acordar todo mundo com isso...o quartel acordou com essa música...Aquele meu setor acordou com essa música...Loucura, total e absoluta. E nesse momento comecei a ver...acho que levaram as pessoas que estavam em frente a cela, ficou claro quando o dia clareou um pouco, e eu pude ver os guardinhas, e aí eu estava sem capuz, sem nada...os guardinhas que estavam patrulhando...eu não sei se celas...eu nunca mais voltei lá pra saber. não sei se ainda existem,...mas essas celas estavam sendo patrulhadas por jovens todos loiros, de olhos azuis. Inclusive me falaram depois que eram todos recrutas do Paraná e de Santa Catrarina. Todos loiros de olhos azuis...Alguém me falou isso depois que sai da prisão...que os recrutas que ficavam no DOI-Codi eram de outros estados...pra evitar confusão. E esses guardinhas...eu era menina...eles deviam ter 18, 19 anos, sei lá...a gente começou a conversar e eu disse: "escuta, você consegue saber onde está minha mãe?" aí, ele: "peraí, vou ver." E foi e disse que mamãe estava estendida no colchão. Ela não se mexia. Isso, a minha mãe. Minha mãe quando está em perigo ou quando tem alguém da família..ou uma mãe quando tem alguém da família...você é mãe;;;você não se mexe. Eu falei: "ela não se mexe?"...É..."Ela não se mexe, tá muito estranha a sua mãe, tá completamente imóvel..." Bom, você sabe do meu pai? "Ah, teu pai não sei, não" Mas você tem ideia de onde ele esteve? "Olha vou tentar perguntar, mas acho que ele já foi..." Eu falei...ele já foi"..Nesse momento me veio a sensação de que meu pai estava morto. Quer dizer: a sennsação de que ele não estava mais com vida. As pessoas já me perguntaram...parece uma coisa meio esotérica, meio mística...A sensação que eu tenho é que não sentia mais a vida dele. E que a partir daí minha grande preocupação passou a ser minha mãe. Quer dizer: eu meio que já estava apagando a figura do meu pai...E muito preocupada com a minha mãe., porque apesar de depois ter se tornado uma pessoa muito forte, ela tinha a fragilidade de uma mãe de família, de cinco filhos, que se dedicava ao marido. .Apesar de mamãe já ter diploma universitário, de, ser uma pessoa estudada, enfim, de ser uma pessoa bastante relacionada ao seu marido e vivendo a vida dele, quer dizer, era uma mãe de família. E eu estava presa, eu tinha 15 anos. Nessas horas, depois você fica imaginando o que pode ter passado pela cabeça dela. Tudo, né? Aí, chegou exatamente ao meio-dia, que foi a hora em que eu entrei no Doi-Codi, me levaram encapuzada pra uma outra sala, uma sala que não era uma sala de interrogatório...uma sala...me fizeram sentar e foram muito sarcáticos...Aí que comecei a ter a sensação de que papai não estava mais vivo, ou tinha alguma coisa com ele..porque a sensação que eles tinham é que a coisa foi...
Eles falavam sobre seu pai mas falavam como?
ELIANA - Não, comigo é como se pronto, acabou, pode embora não tem mais nada aqui pra você;;;Como quem diz: acabou a história...A sensação de que papai tinha morrido foi ficando cada vez mais forte, porque uns guardinhas falaram que houve alguma coisa durante a noite;;;de manhã, parece que foi transportado...Eu ouvia pedaços do que eles conseguiam colocar....Bom aí, também, foi uma cena muito ruim. Quer dizer, foi nessa cena que , dando meu depoimento pro doutor Bravo de ter parado e chorado, porque é uma cena...pode ser que eu venha chorar agora de novo..Eles pegaram a bolsa da minha mãe, bolsa de mulher, com tudo dentrro. mamãe fumava, cigarro, documento, entregaram pra mim e falaram assim. Você vai...Eu falei: "Nao vou". Abraçada na bolsa da minha mãe, eu falei eu não vou. Pelo menos, o cigarro vocês deixam pra ela. Não vou sair com essa bolsa aqui de dentro. .Eu não tinha aquela bolsa. Aquela bolsa era branca, bege, eu nã me lembro. Tudo dela: óculos, protetor de sol, cigarro.....
Você acha que eles queria dizer com isso que ele tinha morrido?
ELIANA - Pois é. Você percebe a sequência de fatos? Quer dizer, a sequência de fatos tá muito clara.
Tortura psicológica.
ELIANA - Também. Mas a sensação de que me dá a bolsa da mamãe,,,e de que "você não tem mais nada aqui dentro, acabou...O que a gente tinha que pegar a gente pegoi..." Agora, o que a gente tá tentando resolver é o que ficou. E realmente foi essa a cronologia de fatos que depois aconteceu, foi essa...A tentativa o tempo todo de despistar..ou seja, entrega a bolsa da sua mãe, você leva a bolsa da sua mãe e já começa a despistar por aí, entendeu? Eu me lembro que eu sentava e falava...Louca de vontade de sair daquele lugar...e eu disse assim: "Eu não saio", "A bolsa da minha mãe não vai comigo". Ela fica essa bolsa. Ele disse: "Não, você vai levar essa bolsa." Eu disse: "Mas nem o cigarro? A mamãe fuma"...Não, nem o cigarro. Dinheiro? Não, não pode. Aí, vem a coisa da menina de 15 anois. Eu disse: "Tá bom. Aí, falei, Vou embora, porque não aguentava mais ficar ali. Mais meia hora, eu ia enlouquecer ali. Não sei o que ia acontecer. Queria que levasse embora a tal da bolsa da mamãe, que me levasse embora, que fosse embora...Eu saí e me puseram de novo a facha. A facha se tornou minha, inclusive. Eu saí e assinei qualquer coisa. Tirei a faixa, e eles mandaram assinar qualquer coisa, no mesmo galpão onde eu tinha sido revistada, né? .Entrei de novo dentro do fusca. E alguem virou pros dois, que sempre era uma dupla, o motorista e o carona, e deixem ela em algum lugar. E me deixaram na prala Saens Peña, na Tijuca,. Eu me lembro que olhei prum lado, olhei pro outro e tinha uma padaria na minha frente. Entrei na padaria.
Nesse momento você sentiu desamparo? O que você sentiu?
ELIANA - Não, eu me senti muito...Eu não me senti desamparada em momento nenhum...Gozado...Desde o começo até hoje...Eu me sentia forte. Porque eu tinha tido um pai e uma mãe muito fortes. Eles eram, essa exposição que teve aqui. você pode ver, eles eram um casal bastante feliz, bastante unido e acho que isso...já era uma estrutura que eu tinha e usei essa estrutura. Tanto que eu entro nessa padaria, nesse bar, telefonei para o Bocayuva Cunha pra ele vir me buscar, porque era o melhor amigo do meu pai. Sentei no balcão e pedi um milk shake. Um sundae, pedi um sundae...Adorava sorvete...Sundae é uma coisa...Eu estava com a bolsa da minha mãe, com o dinheiro dela, podia comer um sundae...Entendeu? Me lembro que comi esse...Comi nada, lembro que chegou o sundae, dei uma colher, mas estava assim..De repente eu tinha saido de um lugar horrúvel, horrível, do inferno...e com a bolsa da minha mãe, agarrada nela, continuava agarrada na bolsa da mamãe e tinha ligado pra um amigo do meu pai, que estava vindo me buscar...aí, que vi que alguma coisa já sabia, quer dizer as coiisas estavam caminhando ...quer dizer, ele estava vindo me buscar, eu estava solta, estava comendo um sundae, estava me alimentando, que eu não tinha comido o tempo todo...e estava agarrada na bolsa dela, quer dizer, alguma coisa eu tinha, né? a[i chegou o Bocayuva com um médico, que era um médico de família...eu me esqueci o nome dele, acho que já é falecido também....
Aí você chega em casa e não tinha nem pai nem mãe.
ELIANA - Aí, o Bocayuva foi me pegar. Era um carrinho pequeninho do Baby...E nessa hora, também, tive uma crise de choro. Ele me perguntou você está bem? Eles viram que eu estava bem e me levou direto, não me lembroi se ele me levou direto pra casa dele. A casa do Bocayuva, o apartamento do Bocayuva, ficava a alguns quarteirões na mesma praia do Leblon, na frente, mais pra perto...do final da praia do Leblon. Eu acho que ele me levou pra casa. Meus avós maternos estavam em casa,,,Eu não estava entendendo absolutamente nada, mas algum devia ter avisado, porque eu estava com dois irmãos menores dentro de casa. O Marcelo tinha 10 anos e a Beatriz tinha 9 anos, a Babiu. E estava minha avó materna, que é deliciosa, e meu avô também estava lá. Fui pra casa e entrei, assustada, com aquela bolsa da mamãe agarrada...
E o que eles falaram para você?
ELIANA - Eu não posso...Sabe que eu não tenho...Acho que é por isso que a coisa aí bloqueia entre irmãos, porque eu não tenhoi lembranças nenhuma de conversa com os dois,
Mas os policiais te disseram alguma coisa do que aconteceu com seu pai?
ELIANA - Não. Só me falaram: "leva embora a bolsa da sua mãe"...A partir daí, aconteceram...Mamãe ficou 12 dias presa....e eu dentro da cadeia consegui fazer com que o guardinha mandasse recado pra ela de que eu estava bem. Parece que aí ela deu uma relaxadinha.. Quando ela saiu da prisão, fiquei. sabendo que ela ficou sabendo dois dias depois que eu tinha sido solta. Então durante dois dias mamãe ficou, deve ter ficado completamente imobilizada.
Sem saber o que tinha contecido com a filha dela, de 15 anos... aí veio uma longa espera
ELIANA - Aí vieram doze dias, em que gostaria de contar essa parte, que gostaria de agradecer essas pessoas...apesar de todos eles, a não ser Waldir Pires, que está vivo...ex-governador da Bahia, que está vivo...Mas esse grupo de papai se reunia na casa do Bocayuva Cunha, que também tinha sido deputado federal, e pra tentar tirar papai da cadeia e mamãe também...A primeira ação foi através de uma ação na imprensa internacional, onde o Raul Riff comigo escrevemos uma carta..essa carta está na exposição Rubens Paiva...eu vi essa carta depois de muito tempo..eu escrevi três ou quatro vezes...O Ryff foi lendo e me dando...Não, aqui você precisa explicar melhor...Eu fui explicando melhor o que era, o que tinha acontecido...Essa carta foi publicada na imprensa internacional inteira...muito legal, a ação que eles queriam fazer foi feita...Raul Ryff foi um herói o tempo todo...Waldir Pires e Bocayuva Cunha tentaram mobilizar embaixadores americanos e o pessoal no exterior. Então, era a única forma de tentar do exterior saber o que estava acontecendo, porque por dentro a experiência que eles tinham pe que, através das informações internas, não se conseguia nada. O que era importante, e foi a estratégia deles que foi muito boa, tentar liberar os dois o mais rápido possível, porque tudo poderia acontecer. Mamãe e papai presos. Eu continuo a dizer que a partir desse momento eu não me preocupava mais com papai, não sei por quê. Minha grande preocupação era mamãe. Eu durante esses doze dias fiquei em suspensão...Eu não me lembro de dormir, não me lembro de conversar com meus irmãos...Eu lembro de todos os dias eu punha meu maiô, era férias e ia pela praia até a casa do Bocayuva, nós tinhamos uma reunião e eu voltava, E não saía quase de casa...com meus avós...Até um dia que mamãe aparece na porta de casa, muito magra, eu senti aquele cheiro de prisão nela, você sente de novo aquele cheiro, Subiu, tomou banho e eu relaxei. Virei uma adolescente de 15 anos de novo e, a partir daí, sim começou a longa espera,,,começou a longa espera mais para os pais do meu pai, que perceberam que a coisa era grave, que eles poderiam estar perdendo um filho, e pra eles foi muito triste, foi muito duro...E eles começaram a mobilizar tanto que acho que seis meses depois a gente se muda para Santos, onde moravam os pais dos meus pais e meus avós me receberam numa espécie de palácio, eles alugaram, compraram uma casa imensa...E esse meu avô se chama Jayme de Almeida Paiva...Ele tentou de todas as maneiras comprar informantes de dentro do Exército, o que ele podia, o que ele conseguia,.,O que ele conseguia, eu sei que ele dava muita grana, porque ele era rico...Era bem sucedido....A reposta era espera...O teu filho vai ser solto, não se preocupe .E via minha avó. Minha avó era uma pessoa muito alegre também, muito parecida com meu pai. Vovó Cici...Uaraci Beyruth...era de origem alemã, muito alegre, muito esperta, muito feliz...era bem meu pai...quando via minha vó chorando, pra mim era uma coisa rara...e voltou a vida de famíla, só que com meu avô...o que não era desconhecido, porque meu avô tinha uma fazenda no Vale do Ribeira e a gente passava as férias inteiras com ele. Minha avó e meu avô, então era fácil
O que era, o que foi... chegavam essas informações desencontradas... você em algum momento teve esperança de ver seu pai de novo?
ELIANA- Sim, sim. Porque eles tinham muita esperança. Eu não sabia muito bem, na verdade eu estava muito confusa. Essa sensação de que meu pai tinha morrido era uma coisa muito minha , muito pessoal, muito intransferível. Não podia contar para as pessoas. Eu conto hoje em dia. Já contei para alguns amigos, mas eu nunca contei pros meus irmãos. Pra minha mãe, eu nunca contei isso. Tanto que na hora que vinha as informações eu pensava, cá comigo, isso é inútil, isso é inútil....mas é uma coisa de sensação. Não tinha realidade, não tinha nenhuma realidade. A relidade se construiu com meu avô, quer dizer, quanto mais ele tentava penetrar nesse mundo, mais ele tinha contra-informação, informação cruzada, informação que não era verdadeira....Houve um certo abuso, mas o próprio Exército tentou tanto esconder isso, esse fato, que as próprias pessoas que estavam tentando informar o meu avô, acabavam se afastando...a impressão é essa...eles tentavam informar o meu avô, um ou outro levava dinheiro e imediatamente eles se afastavam
Nessa história em suspense, quando é que você realizou o luto pleo seu pai?
ELIANA - Eu nunca realizei...Eu fui realizar no inicio desse ano, quando o Vladimir Sacheta cria uma exposição chamada...nome muitobonito até...aqui nesse lugar onde a gente está fazendo esa entrevista, que é o antigo Deops de São Paulo..E que todas as imagens do meu pai, da minha mãe e todas as coisas que rinham acontecido estavam pelos muros e pelas paredes desse lugar...Aí foi muito dificil...Tanto que não vim na inauguração, eu chorava muito,,,Eu estava no Rio de Janeiro e chorava muito. E os meus irmãos, meus tios, todos me ligavam..venha, venha, venha...eu não tive coragem de vir...porque eu chorava muito, no Rio de Janeiro, eu chorava 24 horas por dia, sem ainda ter visto a exposição, mas foi exatamente quando houve...acho que tudo, a partir dos 15 anos, uma resistência que fui adquirindo...a resistência se rompeu aí, em um dique de choro de menina...não consegui...só conseguir vir no último dia da exposição...continuei de mão dada com a minha irmã e chorava muito. Mas o Vladmir, que é o curador da exposição, sujeito muito sério, estava presente e foi me mostrando algumas coisas. Coisas, inclusive, documentos bastante importantes, que ele conseguiu reunir e eu fui entendendo o histórico...aí, o histórico contado de uma maneira objetiva, e aí eu fui acalmando...Foi aí que,,,,Não é que eu realizei o luto...Foi aí que realizei o que tinha acontecido...O luto eu nunca vous saber o que é, do meu pai,. Como a gente não tem o corpo dele, a gente nunca teve o corpo dele, nem informação, é uma coisa que não sei, não vi meu pai morto. Nenhum de nós viu o pai morto, meus avós não viram o filho morto. Então, nenhum de nós realizou o luto até hoje. O luto pra cada um foi sendo realizado de uma maneira muito particular. A minha foi na exposição, quando veio à tona a carta que eu escrevi...e a minha madrinha, que foi...tem uma história muito sutil.....A gente só conseguiu provar que papai tinha sido preso, porque a minha madrinha, que foi ao Rio de Janeiro...papai foi com o próprio carro pro Doi-Codi e o carro estava no estacionamento do Doi-Codi. A minha madrinha, Reneé Paiva Guimarães, irmã mais velha dele, foi buscar o carro e ao buscar o carro ela teve que assinar um recibo de que ela tinha pego o carro...E com essa cópia de recibo conseguiu se provar que papai tinha sido preso. É a única prova que existe. Isso tudo, o Vladimir, como curador colocou nessa exposição Epitáfio, que teve um nome muito bonito...Até esse recibo tava...nas paredes do...Aí a gente começa a contar a história, que vira linear, vira objetiva, vira concreta, quer dizer papai, mamãe, os filhos, os avõs, a prisão, a minha carta, o recibo da minha tia, isso aí deu pra realizar...Ou pelo menos, o que aconteceu, não se se a gente pode chamar de luto, mas luto acho que a gente só realiza na hora que a gente vê, não sei...Mas na hora que a gente vê a pessoa morta e enterra essa pessoa...É uma coisa que nunca me questionei muito...´É o que eu falo...Já sabia que ele estava morto, isso sempre foi de certa forma pra mim já era revelado...
*GilsonSampaio

Procurador reabre casos de desaparecidos na ditadura

Procurador reabre casos de desaparecidos na ditadura

Ministério Público Militar usa artifício jurídico para driblar Lei da Anistia



O deputado cassado e desaparecido durante a ditadura militar, Rubens Paiva, ao lado da mulher e dos filhos
Foto: Álbum de família
O deputado cassado e desaparecido durante a ditadura militar, Rubens Paiva, ao lado da mulher e dos filhos Álbum de família
RIO - Rubens Paiva, Mário Alves de Souza, Stuart Angel Jones e Carlos Alberto Soares de Freitas foram presos pelos órgãos de segurança em 1971 e desapareceram. Os dois primeiros, segundo testemunhas, foram torturados e mortos no DOI-Codi, na Rua Barão de Mesquita. Stuart Angel foi espancado e arrastado por um carro com a boca no cano de escape na Base Aérea do Galeão. Carlos Alberto, o Beto, morreu na Casa da Morte, centro de tortura clandestino das Forças Armadas em Petrópolis, na Região Serrana do Rio. Os corpos nunca apareceram. Os quatro casos estão entre os 39 do Rio e do Espírito Santo reabertos no Rio pelo promotor da Justiça Militar Otávio Bravo. Ele achou um novo caminho jurídico.
*aposentadoinvocado

A Comissão da Verdade e os brasileiros

 

Urariano Mota
Recife (PE) - A mais recente indisciplina de militares reformados contra a Comissão da Verdade, em manifesto onde tentam intimidar com as palavras "a aprovação da Comissão da Verdade foi um ato inconsequente, de revanchismo explícito e de afronta à Lei da Anistia com o beneplácito, inaceitável, do atual governo" acende na gente duas observações.
Na primeira delas, chama a atenção que se dirigem mais aos colegas de farda, na ativa, que aos de fora dos quartéis. O que vale dizer, os generais e coronéis reformados clamam por uma quartelada, por um novo golpe de “31 de março”, mais conhecido adiante por revolução de primeiro de abril. Isso é claro porque em mais de um ponto escrevem – ou gritam, à sua maneira de escrever – que não reconhecem autoridade no atual Ministro da Defesa, nas Ministras de Direitos Humanos e de Política para as Mulheres. E, por extensão, desconhecem o poder legítimo da  Presidenta Dilma.
Na segunda observação, notamos que eles -  os amotinados no manifesto – fazem uma chamada geral, à Nação, aos colegas armados, gritam falar em nome de todos, mas falam em seus próprios, exclusivos e antigos interesses. A saber, quem assim reclama contra a  Comissão da Verdade, teme a justiça e a punição por crimes e acobertamento de homicídios cometidos. E não é preciso muito Sherlock Holmes para essa conclusão. Três dos assinantes são ex-torturadores reconhecidos por ex-presos políticos: os coronéis Carlos Alberto Brilhante Ustra, Pedro Moezia de Lima e Carlos Sergio Maia Mondaini.
Deste último, o ex-preso político e jornalista Ivan Seixas conta que “esse torturador, oficial médico psiquiatra, era conhecido na OBAN pelo vulgo de Doutor José. Entre outras proezas gozava nas calças ao ver as companheiras nuas se retorcendo com os choques elétricos aplicados por ele”. Daí podemos entender o tamanho da urgência desses militares reformados contra a volta do conhecimento da História em uma Comissão da Verdade. Invocam os nomes do Exército, da Marinha e da Aeronáutica para melhor abrigo da pessoa criminosa. Mas todos sabemos, por delegação expressa do povo as forças armadas jamais abrigarão ou abrigariam o crime e a perversão.  
Ou viveríamos então em uma democracia sob tutela, onde os comandos militares fingem que não têm poder político, como se fossem pais benevolentes.  Seriam crianças, ou incapazes, o poder civil, a República, a Presidenta, os Ministros, o Congresso, a Justiça? Quer esses amotinados desejem ou não, vem chegando a hora do esclarecimento e da recuperação histórica de homens e mulheres, que viveram em condições-limite. Personagens como estes voltarão:
Odijas Carvalho de Souza (1945-1971)
Odijas foi levado para o Hospital da Polícia Militar de Pernambuco em estado de coma, morrendo dois dias depois, aos 25 anos... ‘No dia 30 de janeiro de 1971 fui acordado cedo por uma grande movimentação. Por volta das 7 horas, Odijas passou diante da cela, conduzido por policiais. Apesar da existência da porta de madeira isolando a sala do corredor, chegaram até nós os gritos de Odijas, os ruídos das pancadas e das perguntas cada vez mais histéricas dos torturadores. Durante esse período, Odijas foi trazido algumas vezes até o banheiro, colocado sob o chuveiro para em seguida retornar ao suplício. Em uma dessas vezes ele chegou até a minha cela e pediu-me uma calça emprestada, porque a parte posterior de suas coxas estava em carne viva. Os torturadores animalizados se excitavam ainda mais, redobrando os golpes exatamente ali”.
Ou deste jornalista, intelectual, frágil de corpo e gigante de espírito:
“ – Teu nome completo é Mário Alves de Souza Vieira? -  Vocês já sabem.
-  Você é o secretário-geral do comitê central do PCBR?
-  Vocês já sabem.
-  Será que você vai dar uma de herói? ...
Horas de espancamentos com cassetetes de borracha, pau-de-arara, choques elétricos, afogamentos. Mário recusou dar a mínima informação e, naquela vivência da agonia, ainda extravasou o temperamento através de respostas desafiadoras e sarcásticas. Impotentes para quebrar a vontade de um homem de físico débil, os algozes o empalaram usando um cassetete de madeira com estrias de aço. A perfuração dos intestinos e, provavelmente, da úlcera duodenal, que suportava há anos, deve ter provocado hemorragia interna”.
Para essas vidas vem de longe um voz coletiva que se ouvirá: presente.
*GilsonSampaio

O MUNDO “GLOBALITARIZADO” – A NOVA CONFIGURAÇÃO DA ORDEM POLÍTICA E ECONÔMICA


 

Via Juntos Somos Fortes
Laerte Braga
A definição simples e precisa de Darcy Ribeiro sobre o surgimento do Estado como instituição nunca deixou de ser simples e precisa, por isso válida. O mais inteligente da tribo chamou o mais esperto e combinaram que um seria o rei, outro o sacerdote. O sacerdote receberia as “instruções divinas” determinando obediência ao rei, pagamento de tributos, o rei governaria pelo “bem comum” e, por via das dúvidas, chamaram o mais boçal e forte e deram-lhe uma borduna para garantir a aplicação da “lei e da ordem”.
Milhares de ogivas nucleares capazes de destruir o mundo cem vezes se necessário for fazem parte do arsenal dos Estados Unidos e seus principais aliados. É a borduna que garante a aplicação da “lei e da ordem” capitalista na Grécia por exemplo.
Ou que destrói a Líbia e infiltra mercenários na Síria para forçar uma guerra civil que a mídia veicula como protestos de opositores do presidente Bashar Al Assad (cento e sessenta soldados franceses foram presos pelas autoridades sírias e a mídia nem toca no assunto).
Que mantém palestinos acuados e aterrorizados numa política de extermínio praticada pelo estado sionista, Israel, mesmo à revelia de grande parte de seu povo.
A mesma força que queima páginas do Corão e as joga num lixo como se fossem superiores a uma cultura milenar com legados de extrema importância em todos os campos para toda a humanidade.
O governo de George Bush arrematou o processo que transforma os EUA em uma grande corporação. Já não bastava um banco central privado, mas todo o Estado norte-americano é hoje um grande conglomerado terrorista e que se volta para impor uma ordem que chamam de globalização e o geógrafo brasileiro Milton Santos definiu com singeleza –“globalitarização”.
A ordem política e econômica imposta ou pela mídia venal e disseminada por todos os cantos, ou pelas armas quando entenderem ser necessário que assim o seja.
É só olhar os acontecimentos no mundo desde o fim da União Soviética e a construção que eles próprio chamam de “nova ordem mundial”.
O capitalismo se exaure na ficção do cassino financeiro, submete trabalhadores a um momento de barbárie em todo o mundo e faz aflorar a configuração dessa nova ordem. O sistema financeiro, as grandes corporações e o latifúndio.
A Idade Média do horror nuclear, dos bombardeios devastadores sobre “inimigos”, os assassinatos seletivos, as tropas marchando com a suástica reformatada, mas o mesmo nível de crueldade, de estupidez.
O site WIKILEAKS começou a publicar os ARQUIVOS DA INTELIGÊNCIA/ESPIONAGEM/GLOBAL. Mais de cinco milhões de e-mails da empresa STRAFFOR com escritórios no Texas. Os e-mails referem-se ao período de julho de 2004 a dezembro de 2011 e mostram que a empresa sob a fachada de “editor-publisher” de artigos, estudos sobre inteligência e coisa e tal, vende serviços confidenciais de inteligência, espionagem privada a grandes empresas dentre elas a DOW CHEMICAL CO. DE BHOPAL, a LOCHHEED MARTIN, a NORTHROP GRUMMAM RAYTHEON e a agências estatais dos Estados Unidos.
Os e-mails mostram a rede de informantes da STRATFOR, a estrutura de pagamento, técnicas para lavagem de dinheiro para pagamentos ilegais e formas para obter controle visando o domínio pleno e absoluto dos “negócios” em todo o mundo. Esse controle inclui intimidação, controle financeiro, sexual ou psicológico.
Um dos exemplos citados é o e-mail enviado pelo presidente da STRATFORD, George Friedman a um dos analistas da empresa, em seis de dezembro de 2011, com instruções sobre como explorar um informante israelense sobre o estado de saúde do presidente Hugo Chávez da Venezuela.
Outros revelam as tentativas de corromper Julian Assange, fundador do WIKILEAKS e a interligação de empresas privadas de inteligência, fontes governamentais e agências governamentais norte-americanas para oferecerem em todo o mundo informações privilegiadas sobre política, eventos globais, etc, tudo devidamente remunerado.
Há uma rede de informantes em todo o mundo que são pagos através de contas em bancos suíços, cartões de crédito pré-pagos e essa rede inclui jornalistas, empresas jornalísticas, funcionários públicos, pessoal da diplomacia, num impressionante império de informações da “nova ordem”.
No Brasil as principais ligações são com o grupo Marinho (jornal O GLOBO, rede rádios GLOBO e rede GLOBO de tevê, além de jornalistas como William Waack – já citado em documentos anteriores do WIKILEAKS, Caio Blinder, Merval Pereira e outros.
Um caso específico dentre vários citado nos documentos revelados pelo WIKILEAKS o do processo de monitoramento dos ativistas ambientais que buscavam e buscam reparação pelos danos ecológicos causados pela empresa DOW CHEMICAL em Bhopal, fato acontecido em 1984 na Índia, que provocou milhares de mortes e atingiu mais de meio milhão de pessoas, além de ser causa de dano ambiental de longo prazo.
O que o conjunto de documentos liberados pelo WIKILEAKS mostra é maneira como grupos privados do sistema financeiro, grandes corporações e latifúndio, assumem o controle do Estado e transformam nações em conglomerados em função dos seus interesses e nas redes que tecem por todos os cantos moldando essa ordem política e econômica num processo que envolve toda a elite econômica em qualquer lugar e controla a maioria dos políticos.
O Brasil é um exemplo claro disso. Boa parte dos deputados federais e estaduais, senadores, governadores, prefeitos e vereadores é eleito a partir de financiamento de empresas privadas e nessa condição acabam sendo mero porta-vozes dos interesses dos que financiam, na prática, literalmente, empregados. Agentes recrutados.
De um lado a alienação vendida num bombardeio incessante – televisão principalmente – e de outro o poder militar, dos arsenais destruidores.
Quando Bush começou a mostrar o que já era realidade faz tempo, o complexo empresarial e militar norte-americano através de contratos de terceirização e privatização de serviços de inteligência, de recrutamento, treinamento e operações de guerra por soldados de empresas vestindo a farda dos EUA, estava tão somente exibindo essa nova configuração do seu país, que se impõe ao mundo no conglomerado ISRAEL/EUA TERRORISMO S/A.
A guerra virou um negócio de lucros extraordinários.
Não foi por outro motivo que Ângela Merkel, chanceler alemã, sugeriu ao governo do primeiro ministro grego que suspendesse ou adiasse as eleições legislativas na Grécia temerosa de uma vitória de forças contrárias ao acordo celebrado/imposto pelas colônias européias que formam a chamada Zona do Euro e atentam apenas à realidade do sistema financeiro, das grandes empresas e do latifúndio.
A democracia é só um detalhe, um show televisivo. Cada vez mais governos representam menos os interesses de seus povos. As nações deixam de existir como tal para ganharem essa forma, essa configuração.
É a ordem definida por Darcy Ribeiro e os “inteligentes”, os “espertos” e principalmente, os da borduna, geram um mundo em que a classe trabalhadora, fragmentada e fragilizada, se vê presa de uma ordem política e econômica terrorista e disfarçada de capitalismo na sua fase mais brutal, a crise da ficção financeira que preside as extintas nações do mundo.
A luta popular é nas ruas e é por sobrevivência.
É a nova ordem que gera assassinatos como os acontecidos na segunda-feira numa cidade do estado de Ohio, numa sociedade com 40 milhões de indigentes, sufocada pela barbárie e que transforma jovens estudantes em autores de massacres com freqüência assustadora.
Não poderia ser de outra forma, é uma sociedade doente.
*Gilsonsampaio

quinta-feira, março 01, 2012

Monteiro Lobato e o Partido Comunista do Brasil


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Quando Luis Carlos Prestes foi preso, após liderar a insurreição de 1935 à frente da Aliança Nacional Libertadora (ANL), Monteiro Lobato estava em franca pregação pretolífera, mostrando que os males brasileiros poderiam ser sanados com o enriquecimento do país. Nutria pelo “Cavaleiro da Esperança" grande admiração, embora não o conhecesse pessoalmente. Lobato via em Prestes alguém que poderia materializar as suas idéias. Para ele, o Brasil precisava de um líder como Prestes para salvar a sua principal riqueza.
Osvaldo Bertolino, no Grabois.org.br
Na década de 1930, Monteiro Lobato já era famoso pela produção literária e pela luta para provar que o Brasil era rico em petróleo. Segundo ele, no livro O escândalo do petróleo, escrito em 1836, até então o Brasil vivia em regime de compartimentos estanques. A imensa extensão territorial do país e a falta de bons transportes fizeram os brasileiros serem regionais. Nasciam e morriam em um desses compartimentos e quando alguém desejava viajar corria para a Europa. As coisas começavam a mudar graça ao petróleo. O brasileiro já circulava mais, de automóvel ou de avião, e estava descobrindo o Brasil rapidamente. O país estava se transformando em uma grande coisa. Mas, dizia Lobato, existiam duas visões geológicas: uma paga para “engazopar” o público, outra para o uso interno dos trustes.
Aquele homenzinho de grossas sobrancelhas percorria o país, de Norte a Sul e de Leste a Oeste, pregando patriotismo. “Não temos petróleo? Falta-lhe (ao governo) em olhos o que lhe sobra em traidores vendidos aos interesses estrangeiros”, escreveu. Mas, afirmou Lobato, “havemos de dar olhos ao Brasil”. “Havemos de obrigá-lo a ver, a convencer-se da existência do gigantesco lençol subterrâneo. Se a fé move montanhas, a convicção rompe o seio da terra e arranca de lá os seus tesouros. Não sei, concluí em uma das minhas pregações, que sacrifício eu não faça para ver meu país arrancado à miséria crônica e elevado ao poder e à riqueza pela força mágica do maravilhoso sangue negro da terra”, asseverou.
Sem papas na língua
Impulsionado por essa idéia, em 5 de maio de 1940 ele escreveu uma carta ao presidente Getúlio Vargas expondo o que considerava a verdade sobre o problema do petróleo no Brasil. “O petróleo! Nunca o problema teve tanta importância; e se com a maior energia e urgência, o senhor não toma a si a solução do caso, arrepender-se-á amargamente um dia, e deixará de assinalar a sua passagem pelo governo com a realização da Grande Coisa. Eu vivi demais esse assunto. No livro O escândalo do petróleo denunciei à nação o crime que se cometia contra ela — e com a maior dor de coração vejo hoje que o oficialismo persiste neste crime, e agora armado de uma arma que não existia antes: o monstruoso tanque chamado ‘Conselho Nacional do Petróleo’. Doutor Getúlio, pelo amor de Deus, ponha de lado a sua displicência e ouça a voz de Jeremias. Medite por si mesmo no que está se passando. Tenho certeza de que se assim o fizer, tudo mudará e o pobre Brasil não será crucificado mais uma vez”, escreveu no início da carta.
Três meses depois, Lobato recebeu um emissário do presidente com um convite para que ele dirigisse um “Ministério de Propaganda”, que substituiria o “Departamento de Imprensa e Propaganda”, o famoso DIP. “Qual a finalidade do Ministério?”, indagou. “Ora, fazer propaganda do Brasil lá fora, a fim de atrairmos capitais estrangeiros”, respondeu o enviado de Getúlio. “Mas para isso não é preciso criar-se um Ministério. Basta constitucionalizar o país. Você acha que o capitalista estrangeiro, homem sabido, conhecedor profundo do mundo de negócios e de todas as nossas mazelas, irá inverter o seu dinheiro aqui, em nossa terra, unicamente por ter lido uns artigos meus de propaganda? Vamos mudar de assunto porque este não resiste nem sequer a uma pequena discussão”, retrucou.
Getúlio insistiu na idéia e chegou a convidar Lobato para um banquete na cidade de Campinas. Havia um lugar para ele ao lado do presidente da República, disse o emissário de Getúlio. O escritor respondeu que não era homem para banquete. Em 20 de março de 1940, às 14h30, Lobato foi procurado por dois investigadores de polícia, que lhe entregaram em mãos um mandado de prisão preventiva. Dali saiu escoltado como um criminoso vulgar para o velho casarão da Avenida Tiradentes, em São Paulo, Casa de Detenção e presídio político, onde ficou preso e incomunicável. Em 8 de abril, ocorreu o julgamento da prisão preventiva.
Lobato encarou a prisão como um grave sinal do que ocorria no país. Aos que o visitavam, deixava mensagens sarcásticas e irônicas. “Como tenho pena de vocês lá fora! Enquanto inúmeras preocupações os atormentam, eu aqui não tenho nenhuma. Tudo pago! Não tenho medo de ladrões, nem de assassinos, e o que mais importa: não tenho receio de ser preso”, disse certa vez. Quando lhe falavam em anistia, reagia com protesto. Não queria a anistia para ele, e sim para os presos políticos que ali, e nas inúmeras prisões do país, vegetavam pelo crime único de terem idéias e de por elas terem combatido. Dizia que quando saísse da prisão daria petróleo “a essa infame terra”. “Precisamos de muito petróleo para fazer uma imensa fogueira e assar esses tribunais de exceção”, protestou.
Sem papas na língua, dirigiu ao interventor paulista Fernando Costa um pedido de emprego para um ex-presidiário. Depois de enumerar todo o rol de crimes de que o candidato era acusado, tascou: “Vê o amigo que ele poderá ser muito útil ao Estado Novo.”  O saci endiabrado que havia em Monteiro Lobato fez ele escrever uma carta ao general Júlio Horta Medrado Dias, presidente do “Conselho Nacional do Petróleo” — segundo o escritor o mandante da sua prisão —, repleta de passagens hilárias. “Bendito seja esse benemérito general, murmurei comigo ao ter conhecimento de que fora por sugestão dele que o Tribunal me prendia, isto é, me proporcionava a realização do velho sonho”, escreveu.
Má pontaria
A ironia atingiu um alto grau de acidez. “Passei nesta prisão, general, dias inolvidáveis, dos quais sempre me lembrarei com a maior saudade. Tive ensejo de observar que a maioria dos detentos é gente de alma mais limpa e nobre do que muita gente de alto bordo que anda solta. E também tive ocasião de receber inúmeras provas de amizade e solidariedade de excelentes amigos que nunca imaginei tivessem por mim tal estima. Fui leal. A todos fiz ver que a realização do meu sonho eu devia a uma pessoa apenas: o general Horta Barbosa, comandante superior do benemérito ‘Conselho Nacional do Petróleo”, provocou. Finalizou com um post-scriptum genial, dizendo que tomava a liberdade de enviar pelo correio “uma caixinha de bombons”, sobrados dos muitos com os que os amigos o obsequiaram. Os sentimentos que o animavam para com seu general benfeitor, disse Lobato, “são doces como esses bombons".
Quatro dias depois de deixar a prisão, Lobato enviou outra carta a Getúlio. “Atirei no petróleo e acertei na cadeia, o que prova bem má pontaria”, ironizou. Em seguida, mandou nova carta ao presidente, na véspera do aniversário dele. “Amanhã é dia de seus anos. Quero dar-lhe um presente. Esse presente é uma idéia. Essa idéia é a seguinte. Assim como o governo formou a Companhia Nacional Siderúrgica com 500 mil contos de capital, por que não funda também a Companhia Nacional de Petróleo, com outros 500 mil contos de capital? Era o meio de ao mesmo tempo resolver os problemas do ferro e do petróleo, de igual importância”, escreveu. Ao contrário da primeira carta, escrita em caráter sigiloso, as demais Lobato mandou mimeografá-las e distribuí-las.
Aos que lhe pediam cautela, respondia: “Sou visceralmente imprudente e os anos não têm me modificado nisso. Os homens prudentes não sabem as delícias da imprudência.” Por motivos políticos ou pessoais, o Tribunal de Segurança Nacional (TSN) condenou Lobato a seis meses de prisão e ele voltou para a cadeia.
Idéias comunistas
Na prisão, ficou na mesma cela com o comunista José Maria Crispim. “Conheci Monteiro Lobato na prisão. Estava eu recolhido a um cubículo do ‘presídio especial’, na Casa de Detenção de São Paulo, sob um odioso regime de incomunicabilidade, quando foi mandado para o mesmo cubículo um homenzinho já grisalho, de face magra e ternosa. Era o grande escritor patrício que ali também estava pagando o crime de ser patriota e amigo do povo”, escreveu Crispim no jornal A Classe Operária. Segundo ele, Lobato havia enviado uma cópia de uma das cartas ao ministro da Guerra do Estado Novo, Góis Monteiro.
O dirigente do Partido Comunista do Brasil, então PCB, disse que Monteiro Lobato já conhecia as idéias comunistas. “Já estou velho, doente, cansado. Encontrei vocês muito tarde. Se eu fosse mais moço...”, disse o escritor. Assim mesmo, ele trabalhava exaustivamente. De vez em quando, voltava-se para Crispim indagando sobre problemas de interesse nacional e social. Queria conhecer bem as idéias do PCB. Os assuntos giravam sempre em torno do petróleo, da siderurgia, da reforma agrária e da democracia.
À medida que ia se inteirando das linhas gerais da luta dos comunistas, repetia com acenos de aprovação: “Isso mesmo. Vocês têm razão.” Crispim narra que Lobato andava no interior do cubículo, como se falasse consigo mesmo, a meia voz: “A desgraça deste país são os trustes estrangeiros. É incrível como mandam neste Brasil de fazendeiros abastados e reacionários. Fui fazendeiro, filho e neto de fazendeiros. Nunca vi gente tão inimiga do progresso. Para salvar seus domínios, essa gente é capaz de entregar o país aos monopólios estrangeiros. É o que já estão fazendo.”
Admiração pela União Soviética
No começo de 1945, quando a ditadura já andava enfraquecida, Lobato falou ao repórter Tulman Neto, do jornal Diário de São Paulo. A entrevista foi por escrito — Lobato não confiava nos jornais, que insistiam em publicar “asneiras” atribuídas a ele. Só dava entrevistas redigidas de próprio punho. Certa vez, enviou a seguinte carta ao diretor da Folha da Manhã:
“Por acaso me chegou às mãos um recorte da Folha da Manhã, de 15 do corrente, com um tal telegrama do Rio no qual se transmite uma ‘entrevista’ minha. Li e corei. Desnaturações do pensamento, vulgaridades, chatices. E esta coisa me assombrou: ‘Finalizando, disse Monteiro Lobato: vai melhorar o Brasil. Antigamente só elegiam esses sujeitos ossudos, soturnos, ou bojudos, indivíduos horríveis, mal-encarados, convencidos etc.’ Por mais que eu lesse e relesse o recorte inteiro, fiquei na dúvida sobre a substância que enche a cabeça desse repórter. Venho, pois, declarar que a tolice não é minha; e a tal entrevista desnaturada, é tão chata e vulgar, que a idéia que me vem é a seguinte: o que acima de tudo precisa melhorar no Brasil é a qualidade dos repórteres de seus jornais. Peço ao senhor diretor a inserção desta nota a fim de que meus amigos não fiquem a supor que já estou completamente gagá.”
Na entrevista ao Diário de São Paulo, o escritor foi fundo em suas análises. Depois de criticar a ditadura, ele discorreu sobre o socialismo. Segundo Lobato, Prestes, ainda preso, era um dos maiores brasileiros. “É graças aos comunistas que hoje apodrecem nas cadeias que a realização do sonho socialista se aproxima”, afirmou. Lênin seria o maior reformador de todos tempos, o homem que daria “o seu nome ao século”. Sua admiração pela União Soviética era grande. Afirmou:
“O que a Rússia fez nesta guerra (a Segunda Guerra Mundial), e o que está fazendo na ciência, na educação e em todos os setores da vida humana é o maior dos milagres modernos e essa vitória da experiência russa, meu caro, não pode mais ser oculta aos olhos de todos os países; está aí a crise do mundo. Não há país que vagamente não queira experimentar em sua carne a experiência que o russo fez, a princípio com dor, finalmente com pleno sucesso. E como hão de os privilegiados do mundo — 1% — conter os desejos, os ímpetos, a avalanche dos 99% da humanidade?”, afirmou. Segundo Lobato, a vitória do socialismo era inevitável no mundo inteiro. E acentuou, grifando as palavras, que “idéia perseguida é idéia propagada: perpétua lei do mundo moral, perpetuamente esquecida pelo poder.” Mostrou o exemplo de Prestes, o único homem que no Brasil seduzia milhões de almas.
Estátua para Prestes
A entrevista foi um sucesso. O jornal foi reimpresso uma semana depois para atender aos milhares de pedidos. “Deve ter sido um fato inédito na história da imprensa brasileira. Vários outros jornais reproduziram-na. Em diversas cidades do interior, foi também impressa em folhetos, como resultado de coletas populares, feitas espontaneamente, em demonstrações de entusiasmo pelas palavras corajosas que continha”, disse o repórter Tulman Neto. Com a evolução dos acontecimentos — liberdade para Prestes, fim da guerra e campanhas pela redemocratização do país —, Lobato passou a ser insistentemente procurado para entrevistas. E sempre enaltecia Prestes.
Segundo ele, o principal dirigente comunista brasileiro estava entre os trinta grandes homens do Brasil. No livro Mister Slang e o Brasil — colóquios com o inglês da Tijuca, diz Lobato: “Tomei um bonde e remergulhei-me na cidade dos monumentos e revoltosos, calculando de mim para mim onde iria erguer-se em anos futuros a estátua do Marechal Prestes.” No artigo O padrão, publicado em 1928, ele havia lamentado que o presidente Washington Luis não contemplou seu grandioso plano, pondo no Ministério da Guerra o famoso comandante da “Coluna Invicta”. Em A cegueira naval, ele escreveu que o capitão Prestes, mesmo “nu”, era general.
Ao saber dos suplícios de Prestes na prisão, Lobato protestou em uma entrevista dizendo que o líder comunista deveria ser candidato a presidente da República. Segundo ele, a grande coisa que a ditadura fez, e pela qual o povo brasileiro devia ser-lhe gratíssimo, fora preparar Prestes “para a sua grande missão por meio de um longuíssimo martírio”.
Silêncio no Pacaembu
Já doente, Lobato não pôde comparecer ao comício do Pacaembu, em 15 de julho de 1945, que homenageou Prestes. Mas fez, de sua residência, por telefone, uma saudação ao líder comunista. Quando sua fala foi anunciada, pediu-se silêncio máximo. A voz grave do escritor foi ouvida no mais absoluto silêncio:
“Tenho como dever saudar Luis Carlos Prestes porque sinceramente vejo nele uma grande esperança para o Brasil. Vejo nele um homem nitidamente marcado pelo destino. Vejo nele o único dos nossos homens que pelos seus atos e pelo amor ao próximo conseguiu elevar-se à altura de símbolo. Símbolo de quê? De uma mudança social. A nossa ordem social é um enorme canteiro em que as classes privilegiadas são as flores, e a imensa massa da maioria é apenas o esterco que engorda essas flores. Esterco doloroso e gemebundo. Nasci na classe privilegiada e nela vivi até hoje, mas o que vi de miséria silenciosa nos campos e cidades me força a repudiar uma ordem social que está contente com isso e arma-se até com armas celestes contra qualquer mudança. A nossa ordem social me é pessoalmente muito agradável, mas eu penso em mim mesmo se acaso houvesse nascido esterco. Essa visão da realidade brasileira sempre me preocupou e sempre me estragou a vida. Nada mais lógico, pois, do que meu grande interesse pelo homem que não conheço, mas acompanho desde os tempos em que um punhado de loucos lutava contra todo o poder do governo. E lutava por quê? Com que fim? Pela conquista do poder? Fácil seria isso, como foi para os companheiros que desandaram. Prestes não lutava por. Lutava contra. Contra quê? Contra a nossa ordem social tão conformada com o sistema do mundo dividido em flores e esterco. E pelo fato de sonhar com a grande mudança foi condenado a trinta anos de prisão, como pelo fato de sonhar um sonho semelhante, Jesus foi condenado a morrer na tortura. Os acontecimentos do mundo vieram libertar o nosso homem-símbolo e ei-lo hoje na mais alta posição a que um homem pode erguer-se em um país. Ei-lo na posição de força de amanhã. Na posição do homem que fatalmente será elevado ao poder e lá agirá para que o regime de flores e esterco se transforme em algo mais equitativo e humano.”
Poucos dias depois, Prestes e o dirigente comunista Pedro Pomar acompanharam o poeta chileno Pablo Neruda, que viera ao Brasil especialmente para o comício do Pacaembu, em uma visita a Monteiro Lobato em sua residência. O jornal Tribuna Popular registrou um trecho da conversa de Prestes e Lobato:
Lobato - Capitão, que de melhor e mais útil o senhor viu na União Soviética? Que mais lhe impressionou?
Prestes - Vi muita coisa, mas de uma coisa me convenci: o quanto é difícil construir o socialismo. E mais, que isso só é possível com um poderoso instrumento — o Partido Comunista Bolchevista.
Lobato - Capitão, será que nós podemos construir esse instrumento em nosso país?
Prestes - Temos todas as condições para construir em nosso país um poderoso Partido Comunista.
Lobato - É preciso, é preciso, capitão!
Além da cortesia, a visita teve o propósito de sondar a disposição do escritor brasileiro para se candidatar a deputado federal. Poucos dias depois, seu nome foi anunciado na chapa apresentada pelo Comitê Estadual paulista do PCB.
Conversar de espacio
Lobato desistiria da candidatura por discordar do apoio do Partido ao governo, que ele chamou de “perdão a Getúlio”. Segundo o escritor, existia também um drama de consciência. Diante da insistência da imprensa em carimbá-lo como comunista, respondeu: “Se tenho tal ou tal idéia, isso é coisa que só diz respeito a mim próprio. Tenho as idéias que quero ou posso ter. Mas serei comunista? Infelizmente, não. Apesar das minhas imensas simpatias pelo comunismo russo, uma questão de consciência me vem impedindo que eu transformasse essa imensa simpatia em adesão perfeita.”
O problema era a sua admiração pelas idéias do economista Henry George. “É que sou georgista. Convenci-me de tal forma da verdade das teorias econômicas de Henry George, que por mais que me esforce não consigo substituí-las pelas de Karl Marx. Admiro a lógica tremenda de Marx, mas minha intuição é que a verdade está com Henry George. E por causa disso não tive a honra de alistar-me ao Partido Comunista, nem pude aceitar o convite de Prestes para figurar na chapa dos candidatos a deputado federal. Não entrei para o Partido, nem para a Câmara, porque seria trair as minhas idéias georgistas. De que maneira ser um perfeito deputado comunista, se eu ponho Henry George acima de Marx? Seria deslealdade acima das minhas forças”, explicou.
Mas confirmou que continuava admirando Prestes. “Sim. Admiro esse homem desde os tempos da Coluna, quando era perseguido pelas tropas de Bernardes. Acho-o admirável, um grande chefe de homens, uma grande força social, perfeito como caráter e de insuperável energia. Fiz dele, desde a ditadura Bernardes, um dos meus poucos ídolos, mas não pude estar com ele quando começou a agir politicamente. Não pude compreendê-lo quando perdoou a Getúlio, o imperdoável. Nem quando mandou o seu eleitorado apoiar Cirilo Júnior, em vez de Plínio Barreto, que era o candidato de honra de São Paulo. Sei que nessas emergências Prestes sufocou o coração para seguir uma linha política ‘realista’ — mas como não aceito o ‘realismo’, não pude estar com ele. Fiquei com o meu velho amigo Henry George”, disse.
Lobato tentaria convencer Prestes a aderir às idéias de Henry George, segundo ele “indispensáveis pontes de transição para futuros ideológicos como que os sonha o comunismo”, mas o "Cavaleiro da Esperança" desconversava. Seria melhor esperar para um encontro em que pudessem “conversar de espacio”, como duas criaturas simples. Ele se lembraria das palavras de Prestes, tempos depois, quando fez autocrítica. Mas manteve a posição contra Getúlio. A sua prisão jamais seria perdoada. “Ora, veja: umas cartinhas sem importância, que poderiam ter ficado sepultadas nas gavetas das secretárias do governo, agora andam por aí fazendo um furor. Eu não pretendia tanto. São uns imbecis, uns idiotas!”, disse Lobato.
Trauma moral
Ele lamentou ter encontrado o PCB já em idade provecta e ressaltou a importância dos comunistas. Disse ter encontrado nos comunistas um mundo novo, que não acreditava poder existir. “Vocês resgataram minha confiança no futuro da humanidade. Vocês estão certos. Por isso são invencíveis. De nada valerão as perseguições e violências dos poderosos. Vocês constituem um movimento vitorioso pela força dos princípios. Nada poderá impedir a transformação do mundo. E vocês são o artífice dessa transformação”, afirmou, completando que se tornara “admirador do único partido honesto que já vi”.
Apesar dos apelos de Prestes, Pedro Pomar, Jorge Amado, Caio Prado Júnior e Artur Neves para que mantivesse a candidatura, Lobato foi irredutível. Na tarde do dia 9 de setembro de 1945, quando Prestes concedeu entrevista coletiva na sede paulista do PCB, na Rua da Glória, o escritor Edgard Cavalheiro — que escreveu uma farta biografia do escritor — entregou-lhe uma carta. Nela estavam as razões da irredutibilidade de Lobato. “Venho pedir a eliminação do meu nome da lista dos candidatos a deputado pelo PCB. O meu precário estado de saúde impede-me ser, nessa falange, o que cumpre a todos: capaz, ativo, militante. Um Partido tão novo e saudável não pode começar a sua vida de parlamento com uma deficiência na primeira linha de combate. Para as grandes lutas requerem-se guerreiros em perfeita forma. Com a maior cordialidade, abraça-o o amigo e companheiro de ideais”, escreveu.
Depois da prisão, Lobato começou a adoecer rapidamente. Sentia cólicas de fígado, segundo um médico que o atendeu consequência de “trauma moral”. Passou a desenvolver também uma espécie de asma. Foi diagnosticado um cisto no pulmão. A solução seria uma intervenção cirúrgica. No leito do hospital, escreveu a carta para Prestes pedindo a eliminação do seu nome da lista de candidatos do PCB. Datada de 7 de setembro de 1945, foi escrita em duas vias para que uma fosse entregue à imprensa. Com a divulgação da sua posição, a desistência estaria consumada, evitando que seus amigos voltassem a insistir para que a revisse. “Não sirvo para deputado e não quero debater com tão bons amigos”, disse.
Cartas de Lobato e Prestes
Na autocrítica sobre a posição do PCB de se aproximar de Getúlio, em carta de 2 de fevereiro de 1947 enviada a Prestes da Argentina, Lobato disse:
“Permita que me dirija ao grande chefe com a mesma simplicidade com que a ele me dirigia quando cá esteve exilado, ao tempo da perseguição. Nunca tivemos (nem espero que tenhamos) ensejo de conversar ‘de espacio’ como duas simples criaturas humanas capazes de idealismo. Mas estou perto do fim e não quero ir-me sem falar com quem me encontrei na vida e o mais corajoso de todos. Quando depois de oito anos de incomunicabilidade carcerária o amigo saiu e, dentro da apoteose com que o recebemos, cometeu o erro de aceitar Getúlio — malandro que realizou a mais enervante e cansativa ditadura da América — um véu de melancolia desceu sobre os corações sinceros. E eu, mero contemplador da vida, estranhei que o grande general brasileiro, ‘o único que mesmo nu continuava general’, cometesse na política semelhante erro estratégico. Tomar em consideração uma fruta bichada e já em início de apodrecimento, foi fato que a mim mesmo só pude explicar como a momentânea cegueira de um enterrado vivo que súbito emerge da escuridão para a plena luz do sol. Mas fiquei na dúvida. Ter-me-ia iludido com meu herói? As águas correm. O incidente ‘Brasil-Rússia’ sobrevém e Prestes se afirma como um homem de coragem sobre-humana. Ainda ontem, recordando em conversa com Roger Pla a façanha, escabichamos na história um exemplo de coragem moral daquele vulto — e não o encontramos (...). Entre manter-se fiel a si mesmo e cortejar a avalanche esmagadora que podia desabar sobre ele, Prestes não vacilou, a avalanche despeja — mas vai pelo mesmo caminho se transformando em espanto e admiração. E Prestes emerge do incidente maior do que nunca. As águas continuam a correr. Chega o dia das novas eleições. Até o céu e o inferno são mobilizados pelos cardeais contra os seguidores de Prestes — mas o antigo estrategista militar se revela estrategista político de igual valor, e vence. E conquista uma vitória tríplice: 1) enterra o ditador que tentava ressuscitar, 2) dá xeque-mate na intromissão do clero na política, 3) desvanece para sempre o fantasma PRP. Minha velha admiração por Prestes ressurge — aumentada. Era bem o homem que eu queria. De coragem moral absoluta e capaz na política de vencer o número por meio de hábeis golpes estratégicos. Sinto-me hoje grandemente feliz com a volta de meu ídolo ao velho nicho; e mais feliz ainda sentirei, se o grande líder der apoio ao Adhemar para a implantação em São Paulo das idéias de Henry George — essa indispensável ponta de transição para futuros avanços ideológicos como os sonham os comunistas. Eis explicado, meu caro capitão, o motivo desta carta e do abraço de parabéns que aqui deste repouso manda o seu amigo Monteiro Lobato.”
Prestes respondeu:
“Sua carta de 2 do corrente trouxe-me grande satisfação, não só pelo carinho e bondade de suas expressões, como também pela explicação que me dá da atitude sua para conosco — pobres políticos de carne e osso, que nem sempre podem fazer o que desejariam seus impulsos e sentimentos pessoais, obrigados que somos por convicção, profunda e científica, de que muito acima de nossos sentimentos e paixões estão os  interesses do proletariado, da classe historicamente destinada a enterrar para todo o sempre esta fase da pré-história da humanidade em que vivemos, da exploração do homem pelo homem. Compreendo, agora, que não foi propriamente por culpa nossa que você nos abandonou e folgo imensamente por vê-lo a nos aplaudir num momento como este, em que tão necessário para prosseguirmos vencendo os obstáculos que se sucedem em nossa marcha é o seu aplauso de patriota, sincero, de homem independente e de artista de verdade. Suas palavras sobre o que denomina de incidente ‘Brasil-Rússia’, sobre a nossa posição diante da guerra imperialista, servirão — e muito — para desmascarar os lacaios do imperialismo aqui em nossa terra, e ajudarão, sem dúvida, aos intelectuais honestos, mas em geral ainda tão atrasados e equivocados, a encontrar o verdadeiro caminho do patriotismo, o caminho de Lênin, de Barbusse e Romain Rolland. Quanto às idéias de Henry George, que lhe poderei dizer? Será melhor esperarmos pelo encontro em que possamos ‘conversar de espacio como duas simples criaturas’. Afirmo-lhe somente que apoiaremos com entusiasmo todas as medidas efetivamente progressistas que venham a ser tomadas pelo senhor Adhemar de Barros no governo de São Paulo. Se entre elas estiver a implantação das idéias de Henry George, tanto melhor, porque será satisfeito o seu apelo. Assusta-me somente essa situação de ídolo, e que se prolongue por muito tempo. A residência incômoda no nicho a que me destina.”
História do Rei Vesgo
Prestes divulgou a carta de Lobato como instrumento da luta política contra os golpes que os comunistas sofriam. Em uma carta ao amigo Artur Neves, Lobato declarou: “Se eu admitisse a hipótese de que o Prestes iria tornar pública a minha carta, teria escrito coisa mais decente. Enfim...” O PCB já estava com seu registro cassado e começava a campanha contra a cassação dos mandatos comunistas. Em comício realizado em São Paulo, em junho de 1947, quando os dirigentes comunistas Pedro Pomar e João Amazonas discursaram, foi lida a parábola “História do Rei Vesgo”, escrita por Lobato especialmente para o evento.
O povo ouviu:
“Na frente do palácio de certo Rei do Oriente havia um morro que lhe estragava o prazer. Esse Rei, apesar de ser vesgo, tinha uma grande vontade de "dominar a paisagem"; vontade tão grande que ele não pôde resistir, e lá um belo dia resolveu secretamente arrasar o morro. Tratava-se, porém, de um morro sagrado, chamado o Morro da Democracia, e defendido pelas leis básicas do reino. Nem essas leis, nem o povo jamais consentiriam em sua demolição, porque era justamente o obstáculo que limitava o poder do Rei. Sem ele o Rei dominaria ditatorialmente a paisagem, o que todos tinham como um grande mal. Mas aquele Rei, que além de vesgo era malandro, tanto espremeu os miolos que teve uma ideia. Piscou e chamou uns cavouqueiros, aos quais disse:
— Tirem-me um pouco de terra desse morro, ali há umas touceiras de craguatá espinhento. Se o povo protestar contra a minha mexida no morro, direi que é para destruir o craguatá espinhento; e que se tirei um pouco de terra foi para que não ficasse no chão nem uma raiz ou semente.
Os cavouqueiros arrancaram os pés de craguatá e removeram várias carroças de terra. O povo não protestou; não achou que fosse caso disso. Só alguns ranzinzas murmuraram, ao que os apaziguadores responderam: "Foi muito pequena a quantidade de terra tirada; não fará falta nenhuma".
Vendo que não houve protesto, o Rei, logo depois, deu nova ordem aos cavouqueiros para que arrancassem outro pé de qualquer coisa, mas com terra - ele fazia muita questão de que a planta condenada saísse sempre com um bocadinho de terra... Continuando o povo a não protestar, prosseguiu o Rei por muito tempo naquela política de "extirpação das plantas daninhas do morro", e as foi arrancando, sempre "com terra", até que um dia...
— Que é do morro?
Já não havia morro nenhum no reino. Desaparecera o Morro da Democracia, e o rei pôde, afinal, estender o seu olhar vesgo por todo o país e governá-lo despoticamente - não pelo breve espaço de apenas quinze anos, mas pelo de trinta e tantos, segundo rezam as crônicas históricas.
Isso foi no Oriente. Mas nada impede que aqui aconteça o mesmo, porque também temos o nosso morrinho da Democracia, cheio dessas plantas más que costumam nascer em tais morros. É preciso, pois, que o povo se mantenha sempre vigilante, para que os nossos Reis vesgos não as arranquem "com terra". Do contrário o morro se acaba - e... como é? Ditadura outra vez? Tribunalzinho de Segurança outra vez? Paizinho dos pobres outra vez?
Este comício tem essa significação. É um protesto do povo contra as primeiras carroçadas de terra que o nosso Rei, sob o pretexto de arrancar o craguatá espinhento do Comunismo, tirou do nosso Morro da Democracia. Cesteiro que faz um cesto faz cem. Quem tira uma carroçada de terra tira mil. Se não reagirmos energicamente, um dia estaremos privados do nosso morro e com um terrível soba dominando toda a planície.
E se tal acontecer e esse soba instituir o Relho como instrumento de convicção, será muitíssimo bem feito, porque outra coisa não merece um povo que deixa seus governantes despojarem-se pouco a pouco das suas mais belas conquistas liberais.
O preço da liberdade é uma vigilância barulhenta como a dos gansos do Capitólio.”
Discurso de Pedro Pomar
Logo depois, Caio Prado Júnior foi preso por assinar um manifesto em defesa da autonomia de São Paulo. Em carta ao amigo intelectual comunista de longa data, Lobato escreveu: “Cada ato teu, o eleva mais — e agora vem a maravilha da prisão: preso por ser digno, sincero, honesto, nesta hora de desonestidade, corajoso neste tempo de covardia, limpo neste século de sujeiras.”
Foi um dos seus últimos atos políticos. Lobato morreu no começo de julho de 1948. “Foi um fato doloroso para o povo”, registrou Crispim no jornal A Classe Operária. “Sim, escritor, o homem bom, o amigo do povo morreu. Seu desaparecimento se dá no momento em que crescem as manobras imperialistas visando assaltar nossas reservas petrolíferas”, afirmou. “Os jornais da reação, noticiando o fato doloroso, como velhas carpideiras, apressaram-se em derramar lágrimas de crocodilo. Essa imprensa de aluguel que silenciou na ocasião em que Lobato foi preso e condenado pelo tribunal fascista do Estado Novo e que não protestou quando, recentemente, uma edição de seu último livro, de combate ao latifúndio, ‘Zé Brasil’, foi apreendido pela polícia de São Paulo e de outros Estados, procura falsear o sentido da obra e da vida do grande escritor. Não diz uma palavra sequer sobre a atitude do grande patriota em defesa do nosso petróleo ameaçado pelos trustes imperialistas”, escreveu. “Morreu Lobato em plena batalha antiimperialista. Tombou como um soldado da boa causa, como um guerrilheiro que jamais se rendeu”, completou.
O mesmo jornal publicou a seguinte nota:
Com a morte de MONTEIRO LOBATO, ocorrida nesta semana, não é somente a cultura que perde a sua mais forte e mais autêntica expressão nos dias de hoje. É também o povo brasileiro que se vê desfalcado de uma das mais corajosas figuras do movimento patriótico de libertação nacional. De fato, o que caracterizava MONTEIRO LOBATO, apurando o seu talento e dando uma verdadeira popularidade à sua obra, era o patriotismo conseqüente, a preocupação honesta e constante pelos problemas de nosso povo, pelo progresso de nossa gente. Esse patriotismo é que fez de LOBATO um revolucionário de nossa cultura e, depois, um revolucionário militante, aproximando-o cada vez mais de Prestes e dos comunistas, a cujo partido se filiou com orgulho nos últimos anos de sua existência. E é isso, sem dúvida, o melhor de seu exemplo e a razão de sua grandeza. O seu exemplo é o de que, nos dias de hoje, é impossível se ser patriota, lutar pelo progresso e pela felicidade de nosso povo, pela independência nacional, sem se marchar junto dos comunistas, ao lado dos comunistas, quando não seja dentro de suas fileiras. Lutando contra o atraso semi-feudal de nossa terra, pela exploração de nosso petróleo, pela industrialização nacional, pela liberdade e pela democracia, MONTEIRO LOBATO, filho das classes dominantes, com a sua inteligência, sua cultura e sua corajosa honestidade, teve de encontrar-se com a vanguarda do proletariado, com o Partido de Prestes — aprendendo a admirá-lo e compreendendo-o dentro das próprias prisões. Este encontro com o proletariado e seu Partido deu a LOBATO novos horizontes, libertando-o do ceticismo, do desespero ou do cinismo apodrecido em que se afundam os intelectuais que se confinam no ambiente mesquinho das classes dominantes. Compreendendo isso é que o povo paulista, representando o povo brasileiro, soube prestar no enterro de MONTEIRO LOBATO uma vigorosa consagração à sua memória.”
O dirigente comunista Pedro Pomar também era um admirador de Lobato, para ele um brasileiro de grande valor. Como deputado, quando ele visitou João Saldanha, que se recuperava de uma doença pulmonar no Sanatório Vicente Aranha, na cidade de São José dos Campos, fez questão de levar Lobato, por quem o famoso jornalista e militante comunista nutria grande admiração. “Estivemos juntos por pouco tempo, mas guardei para sempre a melancolia e a infinita doçura daquele homem”, disse Saldanha. Quando Lobato morreu, Pedro Pomar fez um vibrante discurso sobre sua campa em nome dos comunistas brasileiros e de Prestes.
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Editor do Grabois.org.br
*ooutroladodanoticia

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