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Ser de esquerda é não aceitar as injustiças, sejam elas quais forem, como um fato natural. É não calar diante da violação dos Direitos Humanos, em qualquer país e em qualquer momento. É questionar determinadas leis – porque a Justiça, muitas vezes, não anda de mãos dadas com o Direito; e entre um e outro, o homem de esquerda escolhe a justiça.
É ser guiado por uma permanente capacidade de se estarrecer e, com ela e por causa dela, não se acomodar, não se vender, não se deixar manipular ou seduzir pelo poder. É escolher o caminho mais justo, mesmo que seja cansativo demais, arriscado demais, distante demais. O homem de esquerda acredita que a vida pode e deve ser melhor e é isso, no fundo, que o move. Porque o homem de esquerda sabe que não é culpa do destino ou da vontade divina que um bilhão de pessoas, segundo dados da ONU, passe fome no mundo.
É caminhar junto aos marginalizados; é repartir aquilo que se tem e até mesmo aquilo que falta, sem sacrifício e sem estardalhaço. À direita, cabe a tarefa de dar o que sobra, em forma de esmola e de assistencialismo, com barulho e holofotes. Ser de esquerda é reconhecer no outro sua própria humanidade, principalmente quando o outro for completamente diferente. Os homens e mulheres de esquerda sabem que o destino de uma pessoa não deveria ser determinado por causa da raça, do gênero ou da religião.
Ser de esquerda é não se deixar seduzir pelo consumismo; é entender, como ensinou Milton Santos, que a felicidade está ancorada nos bens infinitos. É mergulhar, com alegria e inteireza, na luta por um mundo melhor e neste mergulho não se deixar contaminar pela arrogância, pelo rancor ou pela vaidade. É manter a coerência entre a palavra e a ação. É alimentar as dúvidas, para não cair no poço escuro das respostas fáceis, das certezas cômodas e caducas. Porém, o homem de esquerda não faz da dúvida o álibi para a indiferença. Ele nunca é indiferente. Ser de esquerda é saber que este “mundo melhor e possível” não se fará de punhos cerrados nem com gritos de guerra, mas será construído no dia-a-dia, nas pequenas e grandes obras e que, muitas vezes, é preciso comprar batalhas longas e desgastantes. Ser de esquerda é, na batalha, não usar os métodos do inimigo.
Fernando Evangelista
sábado, outubro 12, 2013
Israel e Brasil são os países que menos respeitam os professores
Foram bons alunos?...
Brasil
está em penúltimo ligar entre os 21 países mais ricos.
Só
ganha de Israel que ficou em último. AQUI
(em ingles)
Repito,
Brasil em penúltimo e Israel em último.
Na
minha infância, quando um professor entrava na classe todos se levantavam em
respeito.
Agora,
o que se vê é professor levando facada, tiros, apanhando no recreio e por aí
vai.
Fico
a imaginar como é em Israel.
E
eu que pensava que no estado sionista só se matava professores e alunos palestinos.
Mas
voltando à terra de Santa Cruz, só posso lamentar os pobres professores.
Em
classe apanham e quando protestam na rua apanham mais ainda.
Definitivamente
é preciso tomar providências.
Um
país que não respeita seus professores é um país sem futuro.
Dramático!
*bourdokan
Noam Chomsky e o labirinto americano
Ele sustenta: na Síria, Washington adotou lógica da Máfia, e perdeu; no
Congresso, Obama é vitima da ultradireita, que age como os nazistas
A América do Sul praticamente se libertou, na última década. Isso é um
evento de relevância histórica. A região simplesmente não segue mais as
ordens dos EUA. Imagem: HikingArtist
[Este é o blog do site Outras Palavras em CartaCapital. Aquivocê vê o site completo]
Noam Chomsky é, aos 84 anos, um dos maiores intelectuais no mundo. Seu
trabalho e suas realizações são bem conhecidos – ele é linguista
norte-americano, professor emérito no Massachussets Institute of
Technology (MIT) há mais de 60 anos, analista e ativista político
constante, crítico original do capitalismo e da ordem mundial que tem
como centro os Estados Unidos
Nesse entrevista, Chomsky debate a paralisação do governo
norte-americano, por disputas incessantes no sistema político e, em
especial, chantagem das forças de direita mais primitivas. Também aborda
os sinais de perda de influência de Washington na Síria e da emegência,
na América do Sul, de um conjunto de governos que afasta-se dos EUA,
pela primeira vez em dois séculos.
Gostaria de começar com a paralisação recente do governo dos EUA. Por que ela é diferente dessa vez, se já aconteceu no passado?
Noam Chomsky: Paul Krugman fez há dias, no New York Times, um ótimo comentárioa respeito. Lembra que o partido republicano é minoritário entre a opinião pública. Controla a Câmara [House of Representatives, que
junto do Senado representa o Legislativo nos EUA]. Está levando o
governo à paralisação e talvez ao calote de suas dívidas. Conseguiu a
maioria por conta de inúmeras artimanhas. Obteve uma minoria de
votos, mas a maioria das cadeiras. Está se utilizando disso para impor
uma agenda extremamente nociva para a sociedade. Foca particularmente a
questão do sistema de saúde público.
Os EUA são o único, entre os países ricos e desenvolvidos, que não
possue um sistema nacional de saúde pública. O sistema norte-americano é
escandaloso. Gasta o dobro de recursos de países comparáveis, para
obter um dos piores resultados. E a razão para isso é ser altamente
privatizado e não-regulado, tornando-se extremamente ineficiente e caro.
Aquilo que alguns chamam de “Obamacare” é uma tentativa de mudar esse
sistema de forma suave – não tão radicalmente como seria desejável –
para torná-lo um pouco melhor e mais acessível.
O Partido Republicano escolheu o sistema de saúde como alavanca para
conquistar alguma força política. Quer destruir o Obamacare. Essa
posição não é unânime entre os republicanos, é de uma ala do partido –
chamada de “conservadora”, de fato, profundamente reacionária. Norman
Orstein, um dos principais comentaristas conservadores, descreve o
movimento, corretamente, como uma “insurgência radical”.
Então, há uma insurgência radical, que implica grande parte da base
republicana, disposta a tudo – destruir o país, ou qualquer coisa, com o
intuito de acabar com a Lei de Assistência Acessível (o Obamacare). É a
única coisa a que foram capazes de se agarrar. Se falharem nisso, terão
de dizer a sua base que mentiram para ela, ao longo dos últimos cinco
anos. Por isso, estão dispostos a ir até onde for necessário. É um fato
incomum – penso que único – na história dos sistemas parlamentaristas
modernos. É muito perigoso para o país e para o mundo.
Como a paralisação poderia terminar?
Bem, a paralisação por si só é ruim – mas não devastadora. O perigo real
surgirá nas próximas semanas. Há, nos Estados Unidos, uma legislação
rotineira – aprovada todo ano – que permite ao governo tomar dinheiro
emprestado. Do contrário, ele não funciona. Se o Congresso não autorizar
a continuação da tomada de empréstimos, talvez o governo peça
moratória. Isso nunca aconteceu e um calote do governo norte-americano
não seria muito prejudicial apenas aos EUA. Ele provavelmente afundaria o
país, de novo, numa profunda recessão – mas talvez também quebre o
sistema financeiro internacional. É possível que encontrem maneiras para
contornar a situação, mas o sistema financeiro mundial depende muito da
credibilidade do Departamento do Tesouro dos EUA. A credibilidade dos
títulos de dívida emitidos pelos EUA é vista como “tão boa quanto ouro”:
esses papéis são a base das finanças internacionais. Se o governo não
conseguir honrá-los, eles não possuirão mais valor, e o efeito no
sistema financeiro internacional poderá ser muito severo. Mas para
destruir uma lei de saúde limitada, a extrema direita republicana, os
reacionários, estão dispostos a fazer isso.
No momento, os EUA estão divididos sobre como o tema será resolvido. O
ponto principal a observar é a divisão no Partido Republicano. O establishment republicano,
junto com Wall Street, os banqueiros, os executivos de corporações não
querem isso – de maneira nenhuma. É parte da base que deseja, e tem sido
muito difícil controlá-la. Há uma razão para terem um grande grupo de
delirantes em sua base. Nos últimos 30 ou 40 anos, ambos os partidos que
comandam a política institucional dos EUA inclinaram-se para a direita.
Os democratas de hoje são, basicamente, aquilo que se costumava chamar,
há tempos, de republicanos moderados. E os republicanos foram tanto
para a direita que simplesmente não conseguem votos, na forma
tradicional.
Tornaram-se um partido dedicado aos muito ricos e ao setor corporativo –
e você simplesmente não consegue votos dessa maneira. Por isso, têm
sido compelidos a mobilizar eleitores que sempre estiveram presentes no
sistema político, mas eram marginais. Por exemplo, os extremistas
religiosos. Os EUA são um dos expoentes no que se refere ao extremismo
religioso no mundo. Mais ou menos metade da população acredita que o
mundo foi criado há alguns milhares de anos; dois terços da população
está aguardando a segunda vinda de Cristo. A direita também teve de
recorrer aos nativistas. A cultura das armas, que está fora de controle,
é incentivada pelos republicanos. Tenta-se convencer as pessoas de que
devem se armar, para nos proteger. Nos proteger de quem? Das Nações
Unidas? Do governo? Dos alienígenas?
Uma enorme parcela da sociedade é extremamente irracional e agora foi mobilizada politicamente pelo establishment republicano.
Os líderes presumem que podem controlar este setor, mas a tarefa está
se mostrando difícil. Foi possível perceber isso nas primárias
republicanas para a presidência, em 2012. O candidato do establishment era
Romney, um advogado e investidor em Wall Street – mas a base não o
queria. Toda vez que a base surgia com um possível candidato, o establishment fazia
de tudo para destruí-lo, recorrendo, por exemplo, a ataques maciços de
propaganda. Foram muitos, um mais louco que o outro. O establishment republicano não os quer, tem medo deles, conseguiu nomear seu candidato. Mas agora está perdendo controle sobre a base.
Sinto dizer que isso tem algumas analogias históricas. É mais ou menos
parecido com o que aconteceu na Alemanha, nos últimos anos da República
de Weimar. Os industriais alemães queriam usar os nazistas, que eram um
grupo relativamente pequeno, como um animal de combate contra o
movimento trabalhista e a esquerda. Acharam que podiam controlá-los, mas
descobriram que estavam errados. Não estou dizendo que o fenômeno vai
se repetir aqui, é um cenário bem diferente, mas algo similar está
ocorrendo. O establishment republicano,
o bastião corporativo e financeiro dos ricos, está chegando em um ponto
em que não consegue mais controlar a base que mobilizou.
Na
política externa, as notícias sobre a Síria sumiram da mídia
convencional, desde a aprovação do acordo para confiscar as armas
químicas do arsenal de Assad. Você pode comentar esse silêncio?
Nos EUA, há pouco interesse sobre o que acontece fora das fronteiras. A
sociedade é bem insular. A maioria das pessoas sabe bem pouco sobre o
que acontece no mundo e não liga tanto para isso. Está preocupada com
seus próprios problemas, não têm o conhecimento ou o compreensão sobre o
mundo ou sobre História. Quando algo, no exterior, não é constantemente
martelado pela mídia, esta maioria simplesmente não sabe nada a
respeito.
A Síria vive uma situação muito ruim, atrocidades realmente terríveis,
mas há lugares muito piores no mundo. As maiores atrocidades das últimas
décadas têm ocorrido no Congo – na região oriental –, onde mais ou
menos 5 milhões de pessoas foram mortas. Nós – os EUA – estamos
envolvidos, indiretamente. O principal mineral em seu celular é o
coltan, que vem daquela região. Corporações internacionais estão lá,
explorando os ricos recursos naturais Muitas delas bancam milícias, que
estão lutando umas contra as outras pelo controle dos recursos, ou de
parte deles. O governo de Ruanda, que é um cliente dos EUA, está
intervindo maciçamente, assim como Uganda. É praticamente uma guerra
mundial na África. Bem, quantas pessoas sabem disso? Mal chega à mídia e
as pessoas simplesmente não sabem nada a respeito.
Na Síria, o presidente Obama fez um discurso sobre o que chamou de sua
“linha vermelha”: não se pode usar armas químicas; pode-se fazer de
tudo, exceto utilizar armas químicas. Surgiram relatórios credíveis,
afirmando que a Síria utilizou essas armas. Se é verdade, ainda está em
aberto, mas muito provavelmente é. Nesse ponto, o que estava em jogo é o
que se chama de credibilidade.
A liderança política e os comentaristas de política externa indicavam,
corretamente, que a credibilidade norte-americana estava em jogo. Algo
precisava ser feito para mostrar que nossas ordens não podem ser
violadas. Planejou-se um bombardeio, que provavelmente tornaria a
situação ainda pior, mas manteria a credibilidade dos EUA.
O que é “credibilidade”? É uma noção bem familiar – basicamente, a noção
principal para organizações como a Máfia. Suponha que o Poderoso Chefão
decida que você terá que pagá-lo, para ter proteção. Ele tem de
“bancar” essa afirmação. Não importa se precisa ou não do dinheiro. Se
algum pequeno lojista, em algum lugar, decidir que não irá pagá-lo, o
Poderoso Chefão não deixa a ousadia impune. Manda seus capangas
espancá-lo sem piedade, ainda que o dinheiro não signifique nada para
ele. É preciso estabelecer credibilidade: do contrário, o cumprimento de
suas ordens tenderá a erodir. As relações exteriores funcionam quase da
mesma maneira. Os EUA representam o Poderoso Chefão, quando dão essas
ordens. Os outros que cumpram, ou sofram as consequências. Era isso que o
bombardeio na Síria demonstraria.
Obama estava chegando a um ponto do qual, possivelmente, não seria capaz
de escapar. Não havia quase apoio internacional nenhum – sequer da
Inglaterra, algo incrível. A Casa Branca estava perdendo apoio
internamente e foi compelida a colocar o tema em votação no Congresso.
Parecia que seria derrotada, num terrível golpe para a presidência de
Obama e sua autoridade. Para a sorte do presidente, os russos apareceram
e o resgataram com a proposta de confiscar as armas químicas, que ele
prontamente aceitou. Foi uma saída para a humilhação de encarar uma
provável derrota.
Faço comentário adicional. Você perceberá que este é um ótimo momento
para impor a Convenção sobre Proibição de Armas Químicas no Oriente
Médio. A verdadeira convenção, não a versão que Obama apresentou em seu
discurso, e que os comentaristas repetiram. Ele disse o básico, mas
poderia ter feito melhor, assim como os comentaristas. A Convenção sobre
Proibição de Armas Químicas exige que sejam banidas a produção,
estocagem e uso delas – não apenas o uso.
Por que omitir produção e estocagem? Razão: Israel produz e estoca
armas químicas. Consequentemente, os EUA irão evitar que tal convenção
seja imposta no Oriente Médio. É um assunto importante: na realidade, as
armas químicas da Síria foram desenvolvidas para se contrapor às armas
nucleares de Israel, o que também não foi mencionado.
Você afirmou recentemente que o poder norte-americano no mundo está em declínio. Para citar sua frase em Velhas e Novas Ordens Mundiais, de 1994, isso limitará a capacidade dos EUA para “suprimir o desenvolvimento independente” de nações estrangeiras? A Doutrina Monroe está completamente extinta?
Bem, isso não é uma previsão, isso já aconteceu. E aconteceu nas
Américas, muito dramaticamente. O que a Doutrina Monroe dizia, de fato, é
que os EUA deviam dominar o continente. No último século isso de fato
foi verdade, mas está declinando – o que é muito significativo. A
América do Sul praticamente se libertou, na última década. Isso é um
evento de relevância histórica. A América do Sul simplesmente não segue
mais as ordens dos EUA. Não restou uma única base militar
norte-americana no continente. A América do Sul caminha por si só, nas
relações exteriores. Ocorreu uma conferência regional, cerca de dois
anos atrás, na Colômbia. Não se chegou a um consenso, nenhuma declaração
oficial foi feita. Mas nos assuntos cruciais, Canadá e EUA isolaram-se
totalmente. Os demais países americanos votaram num sentido e os dois
foram contra – por isso, não houve consenso. Os dois temas eram admitir
Cuba no sistema americano e caminhar na direção da descriminalização das
drogas. Todos os países eram a favor; EUA e Canadá, não.
O mesmo se dá em outros tópicos. Lembre-se de que, algumas semanas
atrás, vários países na Europa, incluindo França e Itália, negaram
permissão para sobrevoo do avião presidencial do boliviano Evo Morales.
Os países sul-americanos condenaram veementemente isso. A Organização
dos Estados Americanos, que costumava ser controlada pelos EUA, redigiu
uma condenação ácida, mas com um rodapé: os EUA e o Canadá recusaram-se a
subscrever. Estão agora cada vez mais isolados e, mais cedo ou mais
tarde, penso que os dois serão, simplesmente, excluídos do continente. É
uma brusca mudança em relação ao que ocorria há pouco tempo.
A América Latina é o atual centro da reforma capitalista. Esse movimento poderá ganhar força no Ocidente?
Você está certo. A América Latina foi quem seguiu com maior obediência
as políticas neoliberais instituídas pelos EUA, seus aliados e as
instituições financeiras internacionais. Quase todos os países que se
orientaram por aquelas regras, incluindo nações ocidentais, sofreram –
mas a América Latina padeceu particularmente. Seus países viveram
décadas perdidas, marcadas por inúmeras dificuldades.
Parte do levante da América Latina, particularmente nos últimos dez a
quinze anos, é uma reação a isso. Reverteram muitas daquelas medidas e
se moveram para outra direção. Em outra época, os EUA teriam deposto os
governos ou, de uma maneira ou de outra, interrompido seu movimento.
Agora, não podem fazer isso.
Recentemente,
os EUA testemunharam o surgimento de seus primeiros refugiados
climáticos – os esquimós Yup’ ik – na costa sul na ponta do Alaska. Isso
coloca em mórbida perspectiva o impacto humano no meio ambiente. Qual é
sua posição acerca dos impostos sobre emissões carbono e quão popular
pode ser tal medida nos EUA ou em outro país?
Acho que é basicamente uma boa ideia. Medidas muito urgentes têm de ser
tomadas, para frear a contínua destruição do meio ambiente. Um imposto
sobre carbono é uma maneira de fazer isso. Se isso se tornasse uma
proposta séria nos EUA, haveria uma imensa propaganda
contrária, desencadeada pelas corporações – as empresas de energia e
muitas outras –, para tentar aterrorizar a população. Diriam que, em
caso de criação do tributo, todo tipo de coisa terrível aconteceria. Por
exemplo, “você não será mais capaz de aquecer sua casa”… Se isso terá
sucesso ou não, dependerá da capacidade de organização dos movimentos
populares.*
*blogturquinho
A aliança da ultraesquerda com a esquerda ressentida, com a esquerda oportunista e com a pior direita contra Dilma e os dez anos que melhoraram o Brasil
Todos contra a Dilma
por Emir Sader
O fenômeno tem se repetido – na Bolívia, na Argentina, no Equador, no
Brasil. Setores que saem dos governos – ou que sempre tinham se oposto –
supostamente pela esquerda, percorrem uma trajetória que os leva a se
situarem como oposições de direita.
Evo Morales, Rafael Correa, os Kirchner, Lula e Dilma – teriam “traído”.
E seriam piores que outros contendores, porque seguiriam fingindo que
defendem as mesmas posições que os projetaram como grandes líderes
nacionais. Por isso tem que ser frontalmente combatidos, derrotados,
destruídos, sem o que os processos políticos seguiriam retrocedendo e
não poderia avançar.
Foi assim que setores que eram parte integrante do governo de Evo
Morales declararam que ele é o inimigo fundamental a combater, porque
teria “traído” o movimento indígena. Daí a proposta de uma frente
nacional contra ele, que incorporaria a todos os setores opositores, não
importa quão de direita sejam.
A mesma coisa com Rafael Correa. Teria “traído” a defesa da natureza e
se passado a um modelo extrativista, tornando-se o inimigo fundamental a
combater. Daí que setores que se reivindicam porta-vozes dos interesses
dos movimentos indignas e ecologistas, se aliam expressamente à
direita, para combater a Correa.
Na Argentina, os Kirchner teriam “traído” o peronismo, daí setores que
faziam uma critica de esquerda ao governo – expressados, por exemplo, no
peronista Pino Solanas – se aliam a setores de direita – como Elisa
Carrió, entre outros -, para combater ao governo de Cristina Kirchner.
Poderíamos seguir com a Venezuela, com o Uruguai, porque o fenômeno se
repete. Para poder operar essa transição de uma oposição de esquerda a
uma de direita, é preciso demonizar os lideres desses processos, que
seriam, piores do que a direita, daí a liberação para alianças com esses
setores contra os governos.
No Brasil o fenômeno se deu, inicialmente, com o PSol e Heloisa Helena,
que abertamente fizeram aliança com toda a oposição contra o governo
Lula. Com a Globo, com os tucanos, com todos os candidatos opositores,
na ação desenfreada e desesperada para tentar impedir a reeleição do
Lula.
Abandonaram as críticas de esquerda – sobre o modelo econômico e outros
aspectos do governo – para se somarem à ofensiva do “mensalão”, sem
diferenciar-se do tom da campanha da direita.
O fenômeno teve continuidade com a Marina, que repetiu de forma mecânica
a trajetória da Heloisa Helena na volúpia contra o governo Lula e a
Dilma, quatro anos mais tarde. O destempero faz parte do processo de
diabolização, que se caracteriza sempre, também, pela ausência de
qualquer tipo de critica à direita – à mídia monopolista, ao sistema
bancário, aos tucanos, aos EUA.
A relação desses setores com a direita tradicional é explicita: a essa
ausência de criticas à direita corresponde uma promoção explícita dos
candidatos que se dispõem a esse papel: Heloisa Helena, Marina, agora
Eduardo Campos.
Todos contra o Evo, todos contra o Rafael Correa, todos contra a
Cristina, e assim por diante. Aqui, agora, todos contra a Dilma.
Não há nenhuma duvida que o campo opositor está composto pelas
candidaturas do Aecio, do Eduardo Campos, ao que se soma agora a Marina.
As reuniões de Eduardo Campos com Aecio, a entrada do Bornhausen, do
Heraclito Fortes, entre outros, para o PSB e o discurso “anti-chavista”
da Marina, completam o quadro. Vale tudo para tentar impedir que o PT
siga apropriando-se do Estado brasileiro para seus fins particulares,
impedindo que o Brasil se desenvolva livremente.
Nenhuma palavra sobre o tipo de modelo econômico e social que
desenvolveria caso ganhassem. Nenhuma palavra sobre o tipo de inserção
internacional do Brasil. Nada sobre o papel do Estado. Silêncio sobre
tudo o que é essencial, porque do que se trata é de tentar derrotar a
Dilma.
Na verdade hoje a direita – seus segmentos empresariais, midiáticos,
partidários – já se contentaria em conseguir que a Dilma não triunfasse
no primeiro turno. O que vier depois disso, será lucro.
Em todos os países, esses setores tem sido derrotados fragorosamente.
Suas operações politicas não tem dado resultados, por falta de
plataforma, de lideranças e de apoio popular.
Aqui também tem acontecido isso. O PSol foi ferido de morte por suas
atitudes em 2006. Marina abandona a plataforma ecológica para assumir o
anti-comunismo de hoje (o anti-chavismo) e se somar à politica mais
tradicional, sem sequer ter conseguido as assinaturas para registrar seu
partido.
Termina no Todos contra a Dilma, cada um do seu jeito, mas com o
objetivo comum. Esse cenário politico tem Evo, Correa, Cristina, como
teve a Lula e agora tem a Dilma, como referência central. Os outros são
os outros, sem plataforma, sem lideranças e sem apoio popular.
Construindo Marina
A novela midiática em torno da tal Rede ajudou a
popularizar a candidatura de Marina Silva com uma eficácia de fazer inveja a muitos
publicitários espertos.
Talvez não houvesse mesmo outro interesse por trás
da mal encenada esquizofrenia dos analistas, que ora condenavam o oportunismo
dos novos partidos, ora lamentavam o rigor legal imposto à honrosa exceção “sustentável”.
A própria tentativa de criação da legenda soa demasiado amadora e inocente para
os personagens envolvidos.
A construção de Marina sobressaiu nos argumentos
usados para incensá-la. Seu grupo obscuro, de plataforma desconhecida e métodos
esquisitos, se transformou na esperança de renovação política nacional. Menos
de 500 mil assinaturas, num total de 140 milhões de eleitores, ganharam dimensões
messiânicas. Um distante segundo lugar (estimulado) nas pesquisas de opinião passou
a representar uma força capaz de impedir a vitória petista no primeiro turno.
A astúcia da manobra é inegável. As maiores
fragilidades eleitorais de Marina sempre foram o baixo índice de reconhecimento
popular e o escasso tempo de propaganda a seu dispor. Fatais para qualquer pré-candidato
sem grandes recursos financeiros, essas limitações sumiram durante a contínua
exposição da ex-senadora, nos horários e espaços nobres dos grandes veículos de
comunicação do país, em plena fase de alianças partidárias visando 2014.
Há poucas semanas, Marina Silva era uma figura política tristonha, ameaçada pela irrelevância, atolada num confuso esboço de
partido que não conseguia sequer legalizar-se. Hoje ela ocupa o centro das
atenções, esbanja triunfalismo e encabeça um projeto de respeitável estrutura
administrativa. Missão cumprida.
*guilhermescalzilli
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