As ditaduras são abomináveis, mas a impunidade é insuportável, diz Ramonet
Via SUL 21
Ramonet:
""Precisamos mostrar os horrores da ditadura em museus, nos manuais de
escola, em solenidades" | Foto: André Carvalho/Sul21
Vivian Virissimo
O ex-editor do jornal Le Monde Diplomatique, Ignacio Ramonet, falou no Fórum Sócial Temático (FST) no início da tarde desta sexta-feira (29), no debate Os direitos humanos e a memória das Lutas.
“Precisamos mostrar os horrores da ditadura em museus, nos manuais de
escola, em solenidades, definir datas nos calendários para lembrar as
vítimas. Isso ajuda tanto os familiares quanto a coletividade nacional
para que o trauma dessa violência seja superado”, disse Ramonet.
“Ditaduras são abomináveis, mas a impunidade é insuportável”. Proposta
pela Faculdade Latino-Americana de Ciências Sociais (Flacso), a abertura
e coordenação da atividade ficou a cargo da ministra da secretaria de
Direitos Humanos da Presidência da República, Maria do Rosário Nunes.
Dentro do ciclo de debates Direitos Humanos, Justiça e Memória,
Ramonet enfatizou que o direito coletivo à memória é consolidado quando
se mostra as atrocidades cometidas durante períodos ditatorias. Na sua
intervenção, ele traçou um panorama das cerca de 30 comissões da verdade
existentes em diferentes partes do mundo. “São organismos oficiais com
um tempo determinado de tempo para investigar violações sistemáticas de
direitos humanos. Com o inventário dos crimes cometidos, essas comissões
publicam informes que contém recomendações e conclusões”, contou
Ramonet.
O jornalista destacou a importância do
direito à verdade para as sociedades e para as vítimas de genocídios e
ditaduras. “Mais da metade das comissões da verdade foram estabelecidas
nos últimos 10 anos e muitas outras estão atualmente constituindo-se. O
direito à verdade é o novo direito humano que devemos defender. É um
direito ao mesmo tempo coletivo e individual. Tanto a vítima ou família
quanto a sociedade têm o direito inalienável de saber sobre
acontecimentos passados de crimes de ódio”, disse.
Ramonet
relatou que o direito à memória começou a ganhar força após o fim dos
campos de extermínio de judeus organizados por integrantes do nazismo.
“Para que a história não volte a se repetir, comissões da verdade
começaram a se multiplicar pelo mundos nos últimos vinte anos. E tudo
começou com o campo de extermínio de Auschwitz, um projeto que pretendeu
acabar com a comunidade judia na Europa. Nós somos obrigados a recordar
aquele genocídio. Honrar a memória é entender o dever que temos que
recordar cada vez que haja um extermínio no mundo”, defendeu Ramonet.
"A sociedade não pode seguir como se nada tivesse acontecido. Os assassinatos exigem justiça" | Foto: André Carvalho / Sul21
Depois
deste episódio na 2a Guerra Mundial estes tipos de crime de Estado
passaram a ser reconhecidos como crimes contra a humanidade. “Os
partidários do ocultamento da verdade alegam que comissões da verdade
estão abrindo a caixa de pandora, estão confrontando cidadãos de
esquerda e de direita. Também afirmam que as vítimas eram terroristas,
fizeram atentados. Aqueles que dizem isso não entendem a especificidade
dos crimes contra a humanidade”, argumentou Ramonet.
Ramonet
também falou do Apartheid na África do Sul e como a reconstituição dos
fatos com depoimentos de vítimas foi importante para a transição
democrática naquele país. “Muitas vítimas de preconceito deram
depoimentos em audiências públicas sobre a situação vivida naquele país.
Uma frase de Desmond Tutu que liderou o movimento de transição diz que:
‘Sem perdão não há futuro, sem confissão não pode haver perdão’. A
confissão dos que haviam praticado tortura facilitou a reconciliação e a
transição democrática neste país. Esse processo foi exemplar e único”,
classificou.
Segundo Ramonet, os horrores das
ditaduras não são uma mera constatação política, mas sim histórica e a
memória, por sua, não é só sentimento é sobretudo o conhecimento de um
período histórico. “A memória afeta as vítimas e a sociedade que não
pode seguir como se nada tivesse acontecido. Os assassinatos pairam
sobre a sociedade e exigem justiça”.
*GilsonSampaio