Gestão Kassab: Virada Cultural seria operada por esquema de empresas
Esse não perde uma boquinha...
Denúncia
desmantela suposto esquema de favorecimento a algumas empresas para
trabalhar no evento. José Mauro Gnaspini, diretor de programação da
Virada Cultural e assessor do secretário de Cultura Carlos Augusto
Calil, é um dos nomes citados
Por Mario Henrique de Oliveira
A
Virada Cultural é um evento que entrou de vez para o calendário dos
paulistanos. Realizada desde 2005, ela teve um público estimado de
quatro milhões de pessoas no último ano, gente que passa pelos inúmeros
palcos montados na cidade, com diversos shows gratuitos. Ou não tão
gratuitos, já que os custos estimados para a realização do evento em
2012 devem chegar a R$ 8 milhões. E é a estruturação desses espetáculos
que pode esconder negociações nebulosas.
Segundo apuração do SpressoSP, muitas das empresas mencionadas por um denunciante, identificado como V de Virada (confira a entrevista aqui),
contam com os mesmos sócios e estão localizadas em endereços que vão
desde condomínios residenciais de luxo até locais inexistentes.
A
Entre Produções é, segundo palavras de um dos seus sócios, Luciano
Daoud , uma das principais empresas responsáveis pela montagem dos
palcos da Virada Cultural desde seu início. “Trabalhamos com a Virada desde o início, no começo uma parte mais light no
sentido de produção e organização do evento e, de três, quatro anos
para cá, com essa parte mais de estrutura e montagem. Além disso a gente
coordena toda a produção do evento”, diz ele em vídeo encontrado no
Youtube. Nos
vídeos, seus sócios, Ricardo de Paula Eduardo e Luciano Daoud, falam
sobre a participação da empresa durante todos estes anos. Daoud conta
que para facilitar o trabalho a Entre se dividiu em duas. A Entre
produções e a Entre Montagens, ficando ele responsável pela parte de
montagem e Ricardo pela de produção.
De
acordo com V de Virada, “a Entre Produções montou outras empresas
fantasmas para disfarçar a presença deles na Virada Cultural e o fato
dela sair como vencedora na maioria dos processos relativos ao evento”.
Para tanto, eles contariam com a ajuda de José Mauro Gnaspini, diretor
de programação da Virada Cultural.
A Entre Produções recebeu da prefeitura, segundo pesquisa feita no sistema orçamentário, mais de R$1,2 milhão desde 2005.A
Entre Montagens não aparece no sistema orçamentário da Prefeitura, fato
que pode ter ocorrido por conta do sistema ainda ser novo e de que nem
todos os dados já migraram para ele.
Em um contrato para a realização de um show na Virada de 2008 ao qual a reportagem do SpressoSP teve
acesso, Daoud também aparece como representante de uma terceira
empresa, a LR Eventos e Produções Cinematográficas, que não consta nas
buscas na Junta Comercial. Somente a LR recebeu mais de R$ 1,5 milhão da
prefeitura desde 2005. Documentos apontam para outras ligações de
empresas que trabalham na Virada como a Entre.
Essa
não seria a única “coincidência”. Segundo V de Virada, tanto a LR como
outras empresas serviriam de “laranjas” em concorrências e licitações,
sendo todas dos mesmos donos da Entre. Ainda de acordo com V, o telefone
de todas elas estão localizadas na sede da Entre. “Você
quer o telefone da WilWill, liga lá e toca lá na Entre. Aliás esse é o
esquema de todas essas empresas. Se ligar no telefone delas, vai tocar
lá na Entre, algumas delas tem até o mesmo telefone”, conta.
A
reportagem ligou para o número que seria da WilWill hoje (02) pela
manhã. O funcionário que atendeu, conforme afirmou V de Virada, falou
“alô” e só depois do repórter perguntar sobre a WilWill disse se tratar
da empresa. Esse áudio pode ser acessado aqui. O telefone da WilWill
seria o mesmo da Brunilu, segundo V de Virada. A reportagem ligou para o
mesmo telefone, que foi atendido com um “alô” novamente. Perguntada se o
número era da Brunilu, a atendente respondeu que não. Questionada
novamente se aquele número pertencia a uma empresa de produção cultural,
a atendente novamente respondeu que não. Ou seja, minutos antes, o
atendente anterior, no mesmo número, havia dito que aquele era o
telefone da WilWill e que quem respondia pela empresa era uma pessoa de
nome Tatiana.
Em
contato com a Entre, Luciano Daoud nos atendeu e negou qualquer
envolvimento no esquema. Disse desconhecer a existência da empresa
WilWill e afirmou, que nas licitações que participaram este ano, saíram
perdedores. No entanto, em outra ligação, quando informado por e-mail
que a Entre constava como vencedora do processo de compras N° 0341/12,
Pregão Eletrônico-
n°032/12, que tratava da contratação de empresa para prestação de
serviço de apoio operacional para eventos, atendendo à virada Cultural
2012, pelo valor de R$ 172.900,00, Luciano afirmou que a empresa
declinou da proposta. “Gostaria de informar que nesta edição, não
estamos montando absolutamente nada pois perdemos todas as licitações
das quais participamos. Em relação ao contrato de produção (apoio
operacional), chegamos a ser contemplados entretanto declinamos da
proposta no dia 26/04”, responde, por e-mail. “Se tivéssemos
envolvimento com todo esse ‘esquema’, como afirma a sua fonte, não acha
que estaríamos bastante envolvidos com a execução?”, questiona. Confira a
resposta na íntegra de Daoud aqui.
Admitiu,
no entanto, que é sócio da LR, empresa que disse funcionar
paralelamente da Entre, não tendo nenhuma relação com a Entre. Disse
também que participou de licitações com a empresa, mas que também
perderam. Questionado se a Entre e a LR teriam participado alguma vez de
uma mesma licitação, Daoud negou, dizendo que a LR participa para a
produção, enquanto a Entre de licitação para montagem de palcos, mesmo
dizendo que a Entre Produções é a única a participar de licitações.
Empresas irmãs?
Duas
outras empresas que fariam parte do esquema, a Esfera Pesquisas e
Eventos e a WK Produções Cinematográficas, por exemplo, ficam no mesmo
endereço. Segundo apuração do SpressoSP,
em um endereço que não existe, já que não há o número 30 na rua
indicada pelo registro. Em buscas na internet, o telefone de ambas
aparece como pertencendo a Ricardo de Paula Eduardo. Os números de
quanto a WK teria recebido da Prefeitura não foram encontrados em
pesquisa ao sistema orçamentário. A Esfera, porém, recebeu da prefeitura
mais de R$ 440 mil desde 2005.
A
ficha cadastral destas duas empresas leva à investigação de uma outra
denunciada, a Transcasa Eventos e Produções. Um de seus sócios, José
Joaquim Neto, já foi sócio tanto da WK quanto da Esfera, mas já se
retirou de ambas, segundo dados da Junta Comercial.
Outras
empresas também apresentam ligações. A Solasi Produção, que recebeu da
prefeitura mais de R$ 700 mil desde 2005 e não consta em buscas na Junta
Comercial, divide o mesmo número de telefone com a WilWill Produções
Artísticas, que no mesmo período já recebeu mais de R$ 1 milhão em
contratos. A Solasi fica em Santana do Parnaíba, enquanto a WilWill está
localizada em um luxuoso condomínio residencial no Jabaquara.
O
objeto social da WilWill, ou seja, o que empresa declara fazer, é
edição de livros, diferente do que o próprio nome da empresa diz e pelo
que recebeu da prefeitura. Em contratos que o SpressoSP teve
acesso e em buscas no Diário Oficial, a empresa aparece como
intermediária entre a Secretaria de Cultura e alguns artistas, sendo ela
responsável pela apresentação dos mesmos na Virada Cultural.
A
empresa também já foi objeto de uma ação do Ministério Público por
fraudes em licitações na cidade de Bom Jesus dos Perdões (SP). Na ação,
que continua em andamento, a sócia da empresa Edivania do Nascimento
Sousa foi ouvida pela Polícia Federal da Bahia e disse nunca ter
participado e muito menos ouvido falar em nada relacionado com a
WilWill, o que pode caracterizar o uso indevido de seu nome como
laranja, sem o seu consentimento. O prefeito da cidade do interior de
São Paulo, do PSDB, teve seu mandato cassado pela Câmara Municipal.
Mesmo assim a prefeitura de São Paulo continuou a fazer negócios com a
WilWill.
No
Diário Oficial da cidade do dia 26/04/2012 é possível observar que José
mauro Gnaspini autorizou diretamente a contratação da empresa para
realizar apresentações musicais com artistas. São dois extratos de termo
de contrato, um no valor de R$ 118 mil e outro de R$ 88 mil.
O
mesmo número de telefone ainda aparece como sendo da Brunilu Cine,
Vídeo. Uma empresa que já recebeu da prefeitura mais de R$ 1,2 milhão e
tem um sócio em comum com a Fazi Cine Vídeo, que já abocanhou mais de R$
1,5 milhão. O sócio comum é Marcos Fabiano Felix França, na Brunilu sua
sociedade é com Jefferson Fernando Oliveira, que mora no mesmo endereço
da sede da Fazi, mas, de acordo com a ficha da empresa, não tem nenhuma
relação formal com ela.
O
endereço da Brunilu é aparentemente uma casa residencial, aliás, que é o
que foi relatado pelos vizinhos. Assim como o número 390 da Fazi,
endereço que consta na ficha cadastral da empresa e que aparece como
sendo residência de Oliveira. No entanto, o SpressoSP teve
acesso a documentos que apontam outro número da mesma rua como sendo
sua sede, o 339. O local foi recentemente reformado e está à venda,
nunca tendo sido ocupado, de acordo com vizinhos.
Seguindo
a lista de empresas denunciadas, a reportagem encontrou também a Ictus
Produções Artísticas. Localizada na rua Serra do Japi em um número
inexistente, a empresa, que recebeu mais de R$ 480 mil da prefeitura
entre 2005 e 2011, também está ligada à Entre. O número de contato da
Ictus é um dos números da Entre, o que pode ser confirmado inclusive em seu site.
Como funciona
“A Entre é uma empresa de produção de eventos, às vezes,
ao invés de remunerar o Zé Mauro com dinheiro, ele mesmo pedia uma contrapartida a produção de algum evento, o custo era abatido na conta corrente depois. O casamento do Zé Mauro foi produzido pela Entre, que não cobrou nada, mas descontou depois do saldo a pagar para ele”, relata V de Virada.
ao invés de remunerar o Zé Mauro com dinheiro, ele mesmo pedia uma contrapartida a produção de algum evento, o custo era abatido na conta corrente depois. O casamento do Zé Mauro foi produzido pela Entre, que não cobrou nada, mas descontou depois do saldo a pagar para ele”, relata V de Virada.
Ainda
de acordo com V, a Entre mantém com Zé Mauro uma espécie de conta
corrente. “É quase como um banco, tem saldo e tudo, que eu saiba só não
tem cartão nem talão de cheque”, revela.
V
de Virada também explica como se dão as fraudes nos processos
licitatórios, até em casos de pregão eletrônico, e também como funciona o
esquema de contratação de artistas, que, de acordo com ele, recebem
menos do que o declarado. “O
que acontece é o seguinte, no caso do pregão eletrônico, o Zé Mauro
coloca que vai precisar mil metros quadrados de piso, quando ele sabe na
verdade que vai precisar de 200 metros quadrados, ai todo mundo que
participa da licitação que não tem o acerto com ele, coloca o preço de
mil metros e ai o que tem a informação bota o preço de 200, de 300”,
diz.
Outra fraude relatada é a licitação de um produto que é sabido previamente que só pode ser encontrada em uma empresa. “A
empresa tem lá 20 mil cadeiras de plástico vermelha, ninguém mais tem
cadeira vermelha na cidade só ela, ai coloca na licitação pedindo só
cadeira vermelha, porque sabe que só determinada empresa vai ter aquele
item. Então são essas duas formas que usam para fraudar a licitação,
mesmo quando é edital eletrônico”, continua.
Em
relação à contratação de artistas, V conta que o acerto se dá
previamente com o empresário do músico, fato que só acontece porque,
segundo ele, a Entre já conhece a programação antes do anúncio oficial.
“O artista
não passa por licitação. Então o Lalau (Ricardo de Paula, dono da
Entre), vai lá e se acerta com o empresário. Se o artista cobra 50, ele
coloca lá que é 100 e a prefeitura paga, porque essa daí não passa por
licitação, não tem outro artista que vem e fala não eu faço por menos ou
faço por mais. O Zé Mauro determina qual vai ser, o Ricardo se acerta e
quando sai a programação o esquema já está todo montado” conta V.
Procurado pela reportagem do SPressoSP, José Mauro Gnaspini não foi encontrado para dar sua versão dos fatos até o fechamento desta matéria.
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