A primavera brasileira
O conceito da “primavera” foi adotado para descrever países ou
comunidades em que a Internet entrou quebrando barreiras de silêncio.
Nos países de regime ditatorial, a “primavera” significou romper o
controle estatal sobre a informação. Mas em muitos países democráticos,
significou romper cortinas de silêncio impostas pela chamada velha mídia
– os grandes meios de comunicação nacionais.
Nos Estados Unidos, a blogosfera ajudou a romper o sigilo em torno das
guerras do Iraque e Afeganistão. Na Espanha, antes mesmo da explosão da
Internet, os sistemas de SMS (torpedos) telefônicos ajudaram a desarmar a
tentativa de grandes grupos midiáticos de atribuir um atentado à
oposição.
Na Argentina, há um conflito latente entre o governo Cristina Kirchner e
os grandes grupos midiáticos. No momento, passeatas tomam as ruas da
cidade do México, contra a imprensa local.
No Brasil, em pelo menos três episódios exemplares a blogosfera foi fundamental para romper barreiras de silêncio.
O primeiro foi na Operação Satiagraha, da Polícia Federal. Capitaneados
pela revista Veja, a chamada grande mídia se esmerou em demonizar os
agentes públicos, vitimizar o banqueiro Daniel Dantas e transformar
Gilmar Mendes no maior presidente da história do STF (Supremo Tribunal
Federal).
Apenas a blogosfera preocupou-se em mostrar o outro lado, o das investigações.
O episódio terminou com o Opportunity se safando junto à Justiça. Mas,
no campo da opinião pública, poder judiciário, Ministros que se aliaram
ao banqueiro, o próprio banqueiro e Gilmar Mendes saíram amplamente
derrotados. O episódio mostrou os limites da grande mídia para construir
ou destruir reputações.
Várias armações foram denunciadas pela blogosfera, como o caso do falso
grampo no STF, o grampo sem áudio da suposta conversa entre Demóstenes
Torres e Gilmar Mendes, a lista falsa de equipamentos da ABIN (Agência
Brasileira de Inteligência) brandida pelo então Ministro da Justiça
Nelson Jobim.
O segundo episódio relevante foi a promoção do livro “A Privataria
Tucana”, com indícios de enriquecimento pessoal do ex-governador José
Serra. Apesar de totalmente ignorado pela velha mídia, o livro bateu
todos os recordes de vendas do ano.
Agora, tem-se o caso do envolvimento da revista Veja com o bicheiro
Carlinhos Cachoeira. Foram quase dez anos de parceria, que transformaram
o bicheiro no mais poderoso contraventor da república.
Graças às reportagens de Veja, o senador Demóstenes Torres tornou-se
símbolo da retidão na política. Com o poder conquistado, participou de
inúmeros lobbies em favor de Cachoeira e de avalista das denúncias mais
extravagantes da revista.
Veja sempre soube das ligações de Demóstenes com Cachoeira. Mas por
quase dez anos enganou seus leitores, não só escondendo essa relação,
como difundindo a ideia de que Demóstenes era político inatacável.
Na velha mídia, não há uma linha sobre essas manobras, nada sobre as 47
conversas gravadas entre o diretor da revista em Brasília e Cachoeira,
as quase 200 dele com todos os membros da quadrilha.
Assim como no Egito, Estados Unidos, Espanha, México, França, é a Internet que está explodindo cortinas de silêncio.
Luis Nassif
No Advivo
*comtextolivre
Os resultados da entrega de Goiás ao crime organizado
Deputado estadual pelo PT de Goiás, o deputado Luis César Bueno afirma
que a discussão em torno da organização criminosa Cachoeira-Demóstenes
não está dando a ênfase correta. “A preocupação maior é o envolvimento
do poder constituído com crime organizado e as consequências na ordem
pública, especialmente na segurança pública”. Está-se repetindo em
Goiás o que ocorreu no Espírito Santo nos anos 90. E pessoas estão
morrendo por conta desse desmonte.
Com o pacto firmado com o governador Marconi Perillo, a a dupla
Cachoeira-Demóstenes passou a comandar a Secretaria de Segurança
Pública, o Detran, a Polícia Militar, a Corregedoria da Policia Civil, a
Secretaria da Indústria e do Comércio, a Procuradoria Geral do Estado,
entre outros cargos de segundo e terceiro escalão.
O crime organizado passou a atuar em contratos de construção, serviços
de vigilância, locação de veículos. Mais grave: passou a atuar dentro
das esferas da Segurança Pública. Houve o desmanche do aparelho de
segurança fazendo explodir a criminalidade em todo estado de Goiás.
Recentemente o jornal O Popular divulgou algumas das estatísticas:
- até final de abril o número de homicídios havia sido de 208, contra 211 no Rio de Janeiro;
- o número de furtos de veículos saltou de 4.800 a 5.200 por ano para 10.800;
- dos 246 municípios, 206 estão sitiados poelo crack e pela droga.
Tudo isso a partir do momento em que Cachoeira passou a tomar conta da Segurança Pública.
Representante da PM na AL, tempos atrás o deputado Major Araújo, junto
com Associação de Oficiais reuniu a imprensa e disse que cada promoção
de coronel na PM tinha que pagar R$ 100 mil para Carlos Cachoeira. A
Operação Monte Carlo mostrou gravações indicando que o Secretário de
Segurança Pública e o Procurador Geral do Estado recebiam mensalidade
de R$ 15 mil. Sem contar o envolvimento amplo de delegados e policiais
com a organização criminosa.
Recentemente o governador Marconi Perillo trocou o comando da PM, colocando pessoas do quadro. Mas o estrago já estava feito.
Cachoeira comandava desde moedinha de 1 real do desempregado, megas
fortunas de navios flutuantes no Caribe até a relação com crime
organizado encastelado na estrutura do Estado.
Inicialmente, a Segurança Pública fechou os olhos para o jogo e os
cassinos. Com isso, abriu espaço para todo tipo de crime correlato.
Explodiu o mercado de drogas e de furtos de automóveis.
Vários deputado tiveram veículos roubados à mão armada. Explodiram
furtos de caminhonetes, carros de luxo, como Corolla. As seguradoras
aumentaram significativamente valor dos prêmios em função do alto índice
de furtos.
Coincidentemente, quem controlava o Detran era um indicado de
Cachoeira, citado na Monte Carlo. Para proteger as quadrilhas de roubo
de carro, o Detran de Goiás passou a operar fora do sistema Denatran
(Departamento Nacional de Trânsito).
“A impressão que se dava é que Marconi era o laranja e Cachoeira o governador”, diz o deputado.
Para conseguir estatísticas da Secretaria de Segurança Pública, o
jornal O Popular precisou abrir uma primeira página coalhada de cruzes –
simbolizando as mortes ocorridas no período.
A situação é similar à do Espírito Santo nos anos 90, diz ele.
A parte visível da quadrilha, até agora, são os vinhos de R$ 30 mil de
Demóstenes, a casa de Marcone Perillo, as extravagâncias de Cachoeira. A
face soturna é o aumento do número de mortes em todo o estado, o fato
de pequenas comunidades, de 5 mil, 6 mil habitantes, estarem tomadas
agora pelo crack.
Luis Nassif
No Advivo