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Ser de esquerda é não aceitar as injustiças, sejam elas quais forem, como um fato natural. É não calar diante da violação dos Direitos Humanos, em qualquer país e em qualquer momento. É questionar determinadas leis – porque a Justiça, muitas vezes, não anda de mãos dadas com o Direito; e entre um e outro, o homem de esquerda escolhe a justiça.
É ser guiado por uma permanente capacidade de se estarrecer e, com ela e por causa dela, não se acomodar, não se vender, não se deixar manipular ou seduzir pelo poder. É escolher o caminho mais justo, mesmo que seja cansativo demais, arriscado demais, distante demais. O homem de esquerda acredita que a vida pode e deve ser melhor e é isso, no fundo, que o move. Porque o homem de esquerda sabe que não é culpa do destino ou da vontade divina que um bilhão de pessoas, segundo dados da ONU, passe fome no mundo.
É caminhar junto aos marginalizados; é repartir aquilo que se tem e até mesmo aquilo que falta, sem sacrifício e sem estardalhaço. À direita, cabe a tarefa de dar o que sobra, em forma de esmola e de assistencialismo, com barulho e holofotes. Ser de esquerda é reconhecer no outro sua própria humanidade, principalmente quando o outro for completamente diferente. Os homens e mulheres de esquerda sabem que o destino de uma pessoa não deveria ser determinado por causa da raça, do gênero ou da religião.
Ser de esquerda é não se deixar seduzir pelo consumismo; é entender, como ensinou Milton Santos, que a felicidade está ancorada nos bens infinitos. É mergulhar, com alegria e inteireza, na luta por um mundo melhor e neste mergulho não se deixar contaminar pela arrogância, pelo rancor ou pela vaidade. É manter a coerência entre a palavra e a ação. É alimentar as dúvidas, para não cair no poço escuro das respostas fáceis, das certezas cômodas e caducas. Porém, o homem de esquerda não faz da dúvida o álibi para a indiferença. Ele nunca é indiferente. Ser de esquerda é saber que este “mundo melhor e possível” não se fará de punhos cerrados nem com gritos de guerra, mas será construído no dia-a-dia, nas pequenas e grandes obras e que, muitas vezes, é preciso comprar batalhas longas e desgastantes. Ser de esquerda é, na batalha, não usar os métodos do inimigo.
Fernando Evangelista

quarta-feira, maio 30, 2012

Argentina está fazendo na marra o que Keynes propôs em teoria

 

Via CartaMaior
A decisão da Argentina de condicionar as importações do país a um valor igual de exportações, que segundo a reclamação da União Europeia junto à OMC configura um protecionismo retrógrado, sinaliza, ao contrário, a regra fundamental do comércio internacional justo que deve vigir num futuro que se espera não muito distante. Era esse equilíbrio que Keynes tinha em vista na discussão dos acordos de Bretton Woods em 1944.  artigo é de J.Carlos de Assis.
J. Carlos de Assis (*)
A decisão da Argentina de condicionar as importações do país a um valor igual de exportações, que segundo a reclamação da União Europeia junto à Organização Mundial do Comércio configura um protecionismo retrógrado, sinaliza, ao contrário, a regra fundamental do comércio internacional justo que deve vigir num futuro que se espera não muito distante. De fato, igualdade entre importações e exportações deveria ser uma condição necessária da estabilidade entre os países.
Era esse equilíbrio que Keynes, o maior economista do século XX, tinha em vista na discussão dos acordos de Bretton Woods em 1944, quando se estabeleceram os princípios e as bases da ordem financeira internacional do pós-guerra. Keynes propunha uma simetria entre exportações e importações que seria assegurada por mecanismos de estímulo aos países deficitários e de punições financeiras aos superavitários de forma a impedir desequilíbrio econômicos oriundos do comércio.
Esse equilíbrio supunha a utilização de uma moeda contábil, o bancor, na qual se contabilizariam déficits e superávits. Os superávits seriam transferidos automaticamente dos países superavitários para os deficitários mediante um esquema financeiro que estimulasse a redução dos superávits assim como dos déficits, convergindo ao equilíbrio, na forma de igualdade entre exportações e importações. Era um sistema “neutro” demais para agradar os Estados Unidos, então largamente superavitários em relação ao resto do mundo.
Na prática, o que prevaleceu em Bretton Woods foi a absoluta hegemonia do dólar num momento em que os Estado Unidos representavam 60% da manufatura mundial e quase 100% das relações financeiras. Diante disso, alguns países, para se protegerem de desequilíbrio oriundos do comércio assimétrico, decidiram partir para uma estratégia mercantilista de exportação a qualquer custo. Assim garantiam uma capacidade de importação a longo prazo. Foi o caso, sobretudo, do Japão e da Alemanha, hoje seguidos pela China e outros tigres asiáticos.
Acontece que, em termos globais, as exportações são iguais as importações. É um jogo de soma zero. Se um pais faz grandes superávits comerciais, outros países terão de compensar esses superávits com déficits. No caso presente, os Estados Unidos são uma espécie de país deficitário de último recurso pois absorve grande parte das exportações do resto do mundo, notadamente da China, fazendo um gigantesco déficit. Acontece que os Estados Unidos podem fazer isso porque imprimem e usam a moeda que compra as mercadorias do resto do mundo. É um equilíbrio comercial espúrio, baseado na chama receita de senhoriagem (moeda).
Em termos práticos, os Estados Unidos se tornaram grandes parasitas do sistema econômico global aproveitando-se dessa assimetria comercial. Para eles é muito confortável ser deficitários. Para outros países que não emitem dólar, a única forma de assegurar a própria estabilidade é recorrer à estratégia mercantilista, como fizeram, acompanhando a China, os países asiáticos depois da crise financeira de final dos anos 90. Entretanto, temos aí um problema: o sistema mundial, como dito, é um jogo de soma zero. É impossível que todos os países sejam superavitários ao mesmo tempo. Alguém tem que carregar o déficit correspondente.
A Argentina está apenas colocando em termos racionais um fenômeno que teria que estar na pauta da comunidade internacional diante da crise atual, em grande parte devida aos desequilíbrios comerciais e financeiros. Ou seja, é necessário equilibrar o comércio internacional de uma forma que reduza a instabilidade proveniente da assimetria do comércio. O livre-cambismo, por óbvio, não pode dar conta disso. Teríamos que voltar ao sistema de Keynes. Como isso será muito difícil, dado o peso dos interesses nacionais, sobretudo norte-americanos, envolvidos, é bom que a Argentina tome a dianteira. Afinal, se a corrente tende a romper pelo lado mais fraco, como queria Lênin, não é mau que um pequeno país do Sul decida escandalizar o centro do sistema financeiro mundial apontando suas óbvias contradições.
(*) Economista, professor de Economia Internacional da UEPB, co-autor com Francisco Antonio Doria do recém-lançado “O Universo Neoliberal em Desencanto”, Civilização Brasileira. Este artigo é publicado também no site Rumos do Brasil e, às terças, no jornal carioca Monitor Mercantil.

terça-feira, maio 29, 2012

Ataque da Veja a Lula é tática para desviar a atenção da opinião pública do caso Cachoeira-Veja. Presidente do PT alerta a sociedade para manobra


*opensadordaaldeia

O contraste entre as esquerdas


Por Boaventura de Sousa Santos 

Historicamente, as esquerdas dividiram-se sobre os modelos de socialismo e as vias para os realizar. Não estando o socialismo, por agora, na agenda política — mesmo na América Latina a discussão sobre o socialismo do século XXI perde fôlego — as esquerdas parecem dividir-se sobre os modelos de capitalismo. À primeira vista, esta divisão faz pouco sentido pois, por um lado, há neste momento um modelo global de capitalismo, de longe hegemónico, dominado pela lógica do capital financeiro, assente na busca do máximo lucro no mais curto espaço de tempo, quaisquer que sejam os custos sociais ou o grau de destruição da natureza. Por outro lado, a disputa por modelos de capitalismo deveria ser mais uma disputa entre as direitas do que entre as esquerdas.

De fato, assim não é. Apesar da sua globalidade, o modelo de capitalismo agora dominante assume características distintas em diferentes países e regiões do mundo e as esquerdas têm um interesse vital em discuti-las, não só porque estão em causa as condições de vida, aqui e agora, das classes populares que são o suporte político das esquerdas, como também porque a luta por horizontes pós-capitalistas — de que algumas esquerdas ainda não desistiram, e bem — dependerá muito do capitalismo real de que se partir.

Sendo global o capitalismo, a análise dos diferentes contextos deve ter em mente que eles, apesar das suas diferenças, são parte do mesmo texto. Assim sendo, é perturbadora a disjunção atual entre as esquerdas europeias e as esquerdas de outros continentes, nomeadamente as esquerdas latino-americanas. Enquanto as esquerdas europeias parecem estar de acordo em que o crescimento é a solução para todos os males da Europa, as esquerdas latino-americanas estão profundamente divididas sobre o crescimento e o modelo de desenvolvimento em que este assenta.

Vejamos o contraste. As esquerdas europeias parecem ter descoberto que a aposta no crescimento econômico é o que as distingue das direitas, apostadas na consolidação orçamental e na austeridade. O crescimento significa emprego e este, a melhoria das condições de vida das maiorias.

Não problematizar o crescimento implica a ideia de que qualquer crescimento é bom. É uma ideia suicida para as esquerdas. Por um lado, as direitas facilmente a aceitam (como já estão a aceitar, por estarem convencidas de que será o seu tipo de crescimento a prevalecer). Por outro lado, significa um retrocesso histórico grave em relação aos avanços das lutas ecológicas das últimas décadas, em que algumas esquerdas tiveram um papel determinante. Ou seja, omite-se que o modelo de crescimento dominante é insustentável. Em pleno período preparatório da Conferência da ONU Rio+20, não se fala de sustentabilidade, não se questiona o conceito de economia verde mesmo que, para além da cor das notas de dólar, seja difícil imaginar um capitalismo verde.

Em contraste, na América Latina as esquerdas estão polarizadas como
nunca sobre o modelo de crescimento e de desenvolvimento. A voracidade da China, o consumo digital sedento de metais raros e a especulação financeira sobre a terra, as matérias-primas e os bens alimentares estão a provocar uma corrida sem precedentes aos recursos naturais: exploração mineira de larga escala e a céu aberto, exploração petrolífera, expansão da fronteira agrícola. O crescimento econômico que esta corrida propicia choca com o aumento exponencial da dívida socio-ambiental: apropriação e contaminação da água, expulsão de muitos milhares de camponeses pobres e de povos indígenas das suas terras ancestrais, deflorestação, destruição da biodiversidade, ruina de modos de vida e de economias que até agora garantiram a sustentabilidade.

Confrontadas com esta contradição, uma parte das esquerdas opta pela oportunidade extrativista desde que os rendimentos que ela gera sejam canalizados para reduzir a pobreza e construir infraestruturas. A outra parte vê no novo extrativismo a fase mais recente da condenação colonial da América Latina a ser exportadora de natureza para os centros imperiais que saqueiam as imensas riquezas e destroem os modos de vida e as culturas dos povos. A confrontação é tão intensa que põe em causa a estabilidade política de países como a Bolívia ou o Equador.

O contraste entre as esquerdas europeias e latino-americanas reside em que só as primeiras subscreveram incondicionalmente o “pacto colonial” segundo o qual os avanços do capitalismo valem por si, mesmo que tenham sido (e continuem a ser) obtidos à custa da opressão colonial dos povos extraeuropeus. Nada de novo na frente ocidental enquanto for possível fazer ooutsourcing da miséria humana e da destruição da natureza.

Para superar este contraste e iniciar a construção de alianças transcontinentais seriam necessárias duas condições. As esquerdas europeias deveriam pôr em causa o consenso do crescimento que, ou é falso, ou significa uma cumplicidade repugnante com uma demasiado longa injustiça histórica. Deveriam discutir a questão da insustentabilidade, pôr em causa o mito do crescimento infinito e a ideia da inesgotável disponibilidade da natureza em que assenta, assumir que os crescentes custos socio-ambientais do capitalismo não são superáveis com imaginárias economias verdes, defender que a prosperidade e a felicidade da sociedade depende menos do crescimento do que da justiça social e da racionalidade ambiental, ter a coragem de afirmar que a luta pela redução da pobreza é uma burla para disfarçar a luta que não se quer travar contra a concentração da riqueza.

Por sua vez, as esquerdas latino-americanas deveriam discutir as antinomias entre o curto e o longo prazo, ter em mente que o futuro das rendas diferenciais geradas atualmente pela exploração dos recursos naturais está nas mãos de umas poucas empresas multinacionais e que, no final deste ciclo extrativista, os países podem estar mais pobres e dependentes do que nunca, reconhecer que o nacionalismo extractivista garante ao Estado receitas que podem ter uma importante utilidade social se, em parte pelo menos, forem utilizadas para financiar uma política da transição, que deve começar desde já, do extrativismo predador para uma economia plural em que o extrativismo só seja útil na medida em que for indispensável.

As condições para políticas de convergência global são exigentes mas não são impossíveis e apontam para opções que não devem ser descartadas sob pretexto de serem políticas do impossível. A questão não está em ter de optar pela política do possível contra a política do impossível. Está em saber estar sempre no lado esquerdo do possível.

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Boaventura de Sousa Santos é sociólogo e professor catedrático da Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra (Portugal).
*Tecedora
O silêncio de Cachoeira e seus comparsas: Garantia legal ou deboche nacional?


É preciso rever o conceito sobre "direito de ficar calado" para que o povo brasileiro não seja obrigado a assistir ladrões do erário público, cinicamente, fazendo pouco da nossa cara.




Romeu Prisco

São Paulo (SP) - Essa é a grande dúvida que resulta da presença de Carlos Cahoeira e de seus cupinchas na CPI, acompanhados do advogado Marcio Thomaz Bastos e equipe, para prestar declarações sobre participação em atos de corrupção no setor público, envolvendo políticos e empresas de projeção.
Seguindo orientação dos seus patronos, mantiveram-se calados, recusando-se a responder perguntas dos parlamentares, para não correrem o risco de "produzir prova contra si próprios", antes do processo legal.
Embora não exista impedimento estatutário, é de se estranhar a defesa do bicheiro por um ex-Ministro da Justiça, do primeiro mandato do Governo Lula, fato que o meu Colega de Redação, Mair Pena Neto, já abordou, no artigo "Os complexos meandros do direito", com sua costumeira categoria. Porém, aqui, permito-me ir além do aspecto meramente profissional dessa defesa, porque o mais estranho consiste em se tratar de antigo colaborador de um Governo dito inovador, que se propunha a eliminar a praga da corrupção, como a encabeçada por Carlos Cachoeira.

Sabidamente, o advogado Marcio Thomaz Bastos tem livre trânsito nos três Poderes. Sabidamente, o cidadão Marcio Thomaz Bastos é ligado à esquerda, mais precisamente, ao PT. Sabidamente, os atos de corrupção patrocinados por Carlos Cachoeira não se relacionam apenas com políticos da direita, como o Senador Demóstenes Torres (DEM) e o Governador Marconi Perilo (PSDB), mas, também com políticos da esquerda e aliados da Presidência da República, como os Governadores Agnelo Queiroz (PT) e Sergio Cabral (PMDB). Sabidamente, o mesmo relacionamento de Carlos Cahoeira ainda alcança outros nomes, até agora desconhecidos, de todas colorações políticas.
Então, é aí que entra mais o político do que o advogado Marcio Thomaz Bastos, embora exercendo as duas funções. Impõe-se impedir que a CPI atinja proporções indesejadas, algo que esta de Carlos Cachoeira parece ter de sobra. Deve ser de porte inimaginável. Assim, nada melhor que Marcio Thomaz Bastos para defender a direita em benefício da esquerda. Por isso, parodiando Mair Pena Neto, é possível afirmar, tranqüilamente, quão "obscuros são os meandros da política".
É preciso rever, com urgência, o conceito sobre "direito de ficar calado", assegurado ao preso comum, previsto no artigo 5º., inciso LXIII, da Constituição Federal, para aplicação diferenciada nos processos de apuração de atos de corrupção, através de Comissões Parlamentares de Inquérito. Ainda que os envolvidos estejam presos, como Carlos Cahoeira e seus cúmplices, esse direito não pode ser o mesmo, tal como assegurado aos marginais, autores de delitos tipo roubo a mão armada, assaltos a bancos, latrocínios, seqüestros e estupros. Certamente, o legislador constitucional não estava pensando nos corruptores da coisa pública, antes chamados de criminosos de colarinho branco.
Uma vez revisto o conceito daquele direito, sob pena de rigorosa sanção a quem dele pretender fazer uso perante CPIs, quem sabe ponha-se fim ao deboche nacional, que o povo brasileiro é obrigado a assistir pelas emissoras de televisão, com cínicos ladrões do erário, sorriso de canto de boca, fazendo pouco da nossa cara.

No Direto da Redação
*MariadaPenhaNeles

*(O advogado conseguirá provar que recebe dinheiro honesto?)

Machista: Prefeito  de Barra dos Bugres aperta o pescoço da repórter
 


Autoestima - II

Diário de uma ciclista urbana

Xô tucanada golpista. Amanhã tem Lula palestrando em Brasília

 

Enquanto a tucanada dorme e acorda com gente como Carlinhos Cachoeira, pensando em armar arapucas para dar golpes, amanhã (30), o presidente Lula, voltará a dar palestras.

Em Brasília, ele falará no V Fórum Ministerial de Desenvolvimento, às 17hs.

O Fórum reúne representantes de governos de 30 nações da América e da África, para debater os desafios sociais e econômicos deste início de século.

Em pauta, soluções sustentáveis para enfrentar desafios como a pobreza, a exclusão social, o déficit de educação e saúde e o desemprego.

O Brasil foi escolhido como sede da quinta edição do fórum em razão da visibilidade mundial alcançada pelo Programa Bolsa Família, pelo Plano Brasil Sem Miséria e pela cooperação técnica em políticas sociais com outra nações.

O Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS) é responsável pela organização do encontro, em parceria com o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud) e com a Agência Espanhola de Cooperação Internacional para o Desenvolvimento.
*osamigosdoprsidentelula

Comparato: 'Precisamos enxergar nosso passado criminoso'

 

Via RedeBrasilAtual
Professor emérito da Faculdade de Direito da USP vê resquícios da ditadura na universidade e cobra apuração dos elos entre o regime e a instituição
Leandro Melito, da Rádio Brasil Atual
São Paulo – O crescente debate da sociedade brasileira sobre a apuração dos crimes ocorridos durante a ditadura (1964-85) vai aos poucos tomando formato na maior instituição de ensino superior do país, a Universidade de São Paulo (USP). Esta semana, sob as arcadas da Faculdade de Direito do Largo São Francisco, um ato reuniu professores e juristas para cobrar a investigação dos elos entre a USP e o regime, e um abaixo-assinado passou a circular pela internet para pressionar o reitor, João Grandino Rodas, a autorizar o funcionamento de um colegiado.
Durante o evento, o professor emérito Fábio Konder Comparato recordou as conexões dos 21 anos de repressão com um passado de escravidão legal e todo poder aos detentores da propriedade privada. Depois, conversou rapidamente com os jornalistas, voltando a cobrar a instalação de uma comissão da verdade na USP. “ É preciso que todos nós, brasileiros, enxerguemos o passado criminoso que nós tivemos em vários períodos de nossa história, como, por exemplo, a escravidão. É preciso que nós saibamos enfrentar essa verdade difícil”, afirmou, tecendo ainda críticas ao funcionamento da Comissão Nacional da Verdade, instalada este mês pela presidenta Dilma Rousseff.
Confira a seguir a entrevista.
Como o senhor avalia as possibilidades da Comissão Nacional da Verdade?
A Comissão da Verdade criada pelo governo federal tem um âmbito de atribuições muito amplo, de modo que não caberia simplesmente reunir informações e solicitações em Brasília. Aliás, a Comissão da Verdade nacional só funcionará bem se ela puder contar com o apoio de outras comissões da verdade nos planos estadual e municipal – ou, então, setorial, como é o caso da comissão da verdade da Universidade de São Paulo, que se propõe agora.
Como a comissão na USP deverá trabalhar?
Ela deverá trabalhar com total independência. Os professores, estudantes e funcionários da Universidade de São Paulo devem abrir o passado e verificar tudo aquilo que ocorreu durante o período empresarial militar. É preciso que todos nós, brasileiros, enxerguemos o passado criminoso que nós tivemos em vários períodos de nossa história, como, por exemplo, a escravidão. É preciso que nós saibamos enfrentar essa verdade difícil, que é a verdade do desrespeito sistemático à dignidade da pessoa humana. Quero mais uma vez repetir aquele pensamento de um grande pensador norte-americano: “Aqueles que se recusam a relembrar o passado estão condenados a repeti-lo”.
Quais pontos o senhor destaca que ainda o senhor vê como resquício da ditadura e no que a comissão poderia contribuir para a própria reformulação da gestão da USP?
Um resquício do regime empresarial militar foi indicado no próprio manifesto de criação da Comissão da Verdade na USP. O regime disciplinar da universidade, que continua em vigor, foi estabelecido em 1972. Para os jovens, isso não significa nada; para nós, que vivemos aquele período, significa o período mais sangrento do regime empresarial militar.  Era o governo do presidente Garrastazu Médici.
*GilsonSampaio

Maierovitch:Gilmar Mendes, além do tiro no pé, pode ser processado criminalmente

 

Numa linguagem futebolística, tão a gosto do ex-presidente Lula, pode-se concluir ter o jogo terminado 2×1. 


O desmentido de Lula encontra apoio no testemunho de Nelson Jobim, único presente ao encontro. 


A propósito, um encontro ocorrido, a pedido de Lula, no escritório de Jobim, no dia 26 de abril deste ano. 


O ministro Gilmar Mendes, além de a sua versão ter ficado isolada, conta com a desvantagem de ter esperado um mês para denunciar, pela imprensa, a “pressão” e a “chantagem” que atribuiu ao presidente Lula. 


O perfil mercurial de Mendes, que é bem conhecido, não se adéqua a um mês de espera. Segundo Mendes declarou à revista Veja e confirmou em entrevistas, Lula teria ofertado-lhe “blindagem” na Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) que apura o escândalo Cachoeira-Demóstenes-Delta. 


O motivo da proteção na CPMI teria sido o financiamento feito por Cachoeira de uma viagem a Berlim feita por Mendes em companhia de Demóstenes. É inexplicável não tenha Mendes, diante da supracitada “chantagem” (na última entrevista Mendes usa o termo “insinuações”), levado o fato, por ser criminoso, ao conhecimento imediato de seus pares e da Procuradoria-Geral da República. 


Antes de ingressar no Supremo Tribunal Federal (STF), Mendes era membro do Ministério Público Federal, cujo chefe institucional é o procurador-geral da República. Ou seja, Mendes conhece bem o mecanismo a ser acionado para encaminhamento de uma “notitia criminis”. 


No STF, já presidido por Mendes, são realizadas sessões administrativas reservadas. Em nenhuma delas Mendes apresentou o fato que, conforme afirmou, deixou-o indignado.


Como se percebe sem esforço, o relato de Mendes, sem qualquer prova da veracidade da afirmação, ofende a honra objetiva e subjetiva do ex-presidente. Em resumo, Mendes atentou à dignidade e ao decoro de Lula. 


Assim, pode virar réu em ação por crime contra honra e objeto de ação de iniciativa privada da vítima (Lula). Não se deve olvidar os antecedentes de Gilmar. Ele já mentiu ao denunciar, de forma escandalosa (“vou chamar o presidente às falas” ou “vivemos num Estado policial”), uma interceptação telefônica que não aconteceu. 


Nesse lamentável e triste episódio, Mendes contou com o apoio do senador Demóstenes Torres, que confirmou em diálogo publicado pela revista Veja o teor da conversa mantida com Mendes. 


Logo depois de desmentido por perícia e por conclusão da Polícia Federal em relatório de encerramento de apuração, Mendes passou a dizer que denunciou o fato porque era verossímil. Em outras palavras, promoveu, à época, um grande escândalo, na condição de presidente do STF, com base na verossimilhança. 


Por aí já se percebe a leviandade de Mendes. 


Lula não tem o perfil de quem vai aos finalmente quando ofendido. Mas, desta vez, renunciar em defender sua honra em juízo tem um componente maior. Não atende ao interesse público manter, na mais alta corte de Justiça do país, um ministro-julgador de tal calibre. 


Lógico, em sua defesa Gilmar, como regra, pode ofertar exceção da verdade. 


Só que não terá o testemunho de Jobim a seu favor. Esse ex-ministro, amigo de Lula e de Mendes, é testemunha única. Na nossa legislação não vigora a antiga regra do “testis unus testis nullus! (testemunho único é testemunho nenhum). 


Portanto, o testemunho de Jobim poderá ser aceito. 


Mendes, que demorou para denunciar, bem sabe que “dormientibus non sucurrit jus” (o Direito não protege os que dormem). 


Além disso, nenhum ministro do STF afirmou sofrer pressões ou insinuações de Lula no sentido de adiar o julgamento do Mensalão para depois das eleições municipais. O STF é um órgão colegiado. Isso quer dizer que não adiantaria — e Lula não é nenhum estulto — só convencer Mendes. 


Portanto, os próprios pares de Gilmar desmentiram sua afirmação de que lula estaria pressionando por adiamento do Mensalão. 


Por outro lado, a ministra Cármen Lúcia, mencionada por Mendes na Veja, não teve contato com o ex-ministro Sepúlveda Pertence. E Lewandowski, que como se sabe foi sugerido para o STF pela esposa de Lula, também disse não ter sofrido pressões. 


O “Mensalão”, que Mendes sustenta haver Lula pedido-lhe para adiar, já foi objeto de sessões administrativas (com participação de Mendes), quando se acertou até o tempo para manifestação das partes. 


Pela mídia, o revisor desse processo, Ricardo Lewandowski, já informou que brevemente o colocará à disposição do presidente Ayres Britto. E Britto, num compromisso público, frisou que o colocaria em pauta tão logo recebesse os autos. 


Mendes, trocando em miúdos, até por não ser presidente, como poderia mudar o quadro, em especial diante do compromisso de Britto, que é quem marca a pauta, perante os jurisdicionados (cidadãos brasileiros). 


Pano rápido. 


O ministro Gilmar Mendes coloca-se, pela segunda vez, numa camisa de sete varas. Até quando? 


Wálter Fanganiello Maierovitch


do Blog OLHOS DO SERTÃO
*cutucandodeleve