”Obama, não me mate.”
do
Olhar o Mundo
Nas terças-feiras, quando Obama está em Washington, seu programa é escolher, com seus assessores, quem irá mandar matar.
Depois do New York Times,
em 29 de maio, ter publicado reportagem sobre os poderes de vida ou
morte do Presidente Obama, 1.879 americanos enviaram à Casa Branca um
curioso apelo.
“O New York Times”,
diziam, “ contou que o Presidente Obama criou, oficialmente, uma “lista
da morte” em que ele se baseia para ordenar o assassinato de cidadãos
americanos. “
E concluíam : “…nós abaixo
assinados pedimos que seja feita também uma lista de “Não matar” na qual
cidadãos americanos seriam inscritos para evitar serem colocados na “
lista da morte” e, assim, não poderem ser executados sem indiciamento,
juiz, júri, julgamento ou devido processo legal.”
Já era sabido que Obama assumia esses poderes fatais sobre cidadãos americanos ou não.
A reportagem do New York Times, porém, revelou com detalhes como a coisa se processava, o que chocou a opinião pública liberal da América.
Diz o Times
que nas reuniões de terça-feira, o Presidente Obama, a CIA e
assessores revisam a “lista da morte”. E o pessoal do presidente indica
os indivíduos perigosos que foram localizados e, portanto, estão ao
alcance do braço longo e forte de Tio Sam.
Obama,
então, decide quais serão as vítimas e ordena que seus agentes as
executem, sejam ou não americanos, em qualquer parte do mundo.
Tudo
bem no estilo das antigas republiquetas latino-americanas. Digo
“antigas” por que, atualmente, em nenhuma delas ainda se fazem coisas
assim.
Execuções de suspeitos, nas quais o
Presidente funciona como juiz e executor, sem dar chance de defesa ao
acusado, parecem estranhos ao Direito de uma nação modelo de democracia.
E são mesmo.
Como
sustenta o jurista Andrew Napolitano, “o presidente não pode legalmente
ordenar a morte de ninguém, exceto de acordo com a Constituição e a Lei
Federal.”
E ele explica que, para a
Constituição, o presidente só pode mandar matar através de militares,
quando os EUA forem atacados ou “quando um ataque for tão iminente e
certo que atrasar (a execução) custaria vidas de americanos.
Evidentemente, numa declaração de guerra, o direito de matar inimigos está implícito.
Andrew
Napolitano, que é altamente conceituado nos EUA, informa ainda que, sob
a lei federal, o Presidente só pode ordenar execuções por civis quando o
réu for condenado por uma corte federal, um júri legalmente formado e
não existirem mais possibilidades de apelação da sentença.
Para
proceder a execuções através de militares, o Presidente, segundo a lei
federal, terá de requerer ao Congresso, que tem um prazo de 180 dias
para decidir.
As “listas da morte” de Obama são
totalmente ilegais pois desrespeitam tanto a Constituição quanto a Lei
Federal, conclui Napolitano.
Depois do atentado de 11 de setembro, a sociedade americana foi tomada por um medo histérico de novos ataques.
Nesse
clima, os governos adotaram sistemas nacionais de segurança
totalitários, pois passam ao largo da Constituição, das Convenções de
Genebra, das leis de guerra e das leis federais.
As
liberdades individuais, base da Constituição dos EUA, são sacrificadas
em nome da necessidade de proteger o país e os cidadãos de atentados
terroristas.
A segurança nacional justificaria
as mais diversas infrações à lei pelo Estado e seus agentes. Crimes como
a tortura e o seqüestro de suspeitos se disseminaram largamente, com a
cobertura das mais altas autoridades civis e militares.
Quando
senador, Barack Obama distinguiu-se pela sua luta pelos direitos
humanos e o respeito à Constituição. Ele combateu as torturas, a guerra
do Iraque e exigiu o fechamento da base de Guantanamo.
Esperava-se
que na presidência cumprisse suas promessas de mudanças, de retorno aos
princípios democráticos, avalizadas que foram por sua atuação
parlamentar.
Na verdade, isso não aconteceu.
Ao invés de mudar o sistema, o sistema é que mudou Obama.
Manteve a política do governo Bush de colocar a segurança acima da lei.
É
verdade que aboliu as torturas de suspeitos e as “extraordinary
renditions”, na qual suspeitos de terrorismo eram raptados pela CIA no
estrangeiro e transportados clandestinamente para países onde poderiam
ser interrogados com torturas sem maiores complicações.
Mubarak
e Kadafi foram dos mais prestimosos colaboradores, pondo suas
instalações secretas e profissionais “especializados” à disposição da
CIA.
Obama também declarou que em 1 ano fecharia Guantanamo.
Mas cedeu à pressão do Congresso e do Pentágono e deu o dito por não dito.
Talvez
sob as mesmas pressões, ele aumentou o ataque dos drones – aviões sem
piloto – contra talibãs escondidos no Paquistão, de 1 a cada 4 meses, em
2004 (tempos de Bush) para 1 a cada 4 dias.
Apesar
do chefe de contra terrorismo de Obama, John Brennan ter rotulado como
“insignificantes “ as mortes de civis inocentes por drones, a Comissão
de Direitos Humanos do Paquistão estimou que, até 2011, esse número
chegou a 957, entre os quais dezenas de crianças.
Empolgado
com esse novo “brinquedo letal”, Obama não só aumentou os ataques de
drones no Paquistão, como também os estendeu ao Yemen, onde seus efeitos
colaterais em termos de baixas inocentes, embora constatados, ainda não
foram calculados.
Internamente, Obama não vetou a reedição do “Patriot Act” , do governo Bush, que anula diversas liberdades individuais.
E
foi mais alem, assinou a lei do Congresso que permite ao presidente
mandar militares prenderem suspeitos de apoio ao terrorismo e os
manterem encarcerados, sem direito a julgamento, por tempo indefinido.
Algo que só Hitler, Stalin e mais alguns ditadores faziam.
Sem contar que se atribui o direito de mandar quem considerar um perigo à segurança dos EUA, em qualquer parte do mundo.
Em outras palavras: excedeu George Bush.
Em sua defesa, Obama apresenta quatro justificações:
1-
A análise cuidadosa dos suspeitos a serem mortos substitui o processo
legal de que fala a Constituição. Qualquer jurista diria que isso é uma
brincadeira. Hitler e Stalin poderiam alegar o mesmo;
2-
Sua escolha das vítimas é criteriosa, só definida quando o perigo que
elas representam é grave e certo. É um argumento subjetivo, impossível
de provar;
3- Os ataques de drones são
cirúrgicos. Só atingem os culpados alvejados, raramente civis. As
estatísticas divergem, mas todas falam em pelo menos centenas de
camponeses inocentes mortos;
4- Além de
eficientes, os drones custam relativamente pouco e matam sem arriscar
vidas de americanos e sem grandes danos à política externa dos EUA. Os 3
primeiros pontos deste ítem são verdadeiros, mas não o último: 97% da
população paquistanesa repudia os drones e 69% consideram os EUA a maior
segurança à paz na região, o que prejudica muito a imagem do país na
região.
Apesar desses poderes letais,
esperava-se que Obama, tido como moralmente oposto a eles, procurasse
restringir seu uso ao máximo.
Não é o que acontece.
Segundo o New York Times, ele tem assumido decididamente sua posição de juiz e carrasco, sendo que aprova cada ataque dos drones.
Estimativas
mostram que, enquanto Bush promoveu poucas execuções sem julgamentos,
Obama foi responsável pelo assassinato de mais de 1.000 pessoas, muitos
dos quais não puderam sequer ser identificados como “suspeitos.”
Principalmente,
porque a CIA, sua fonte de informações, considera inimigos todos os
estranhos que estiverem numa zona de combates, a menos que provem sua
inocência. O que seria impossível estando mortos.
A “Lista da Morte” é um segredo cuidadosamente guardado, mas o Times revela que ela contém os nomes de diversos americanos, inclusive de uma jovem de 17 anos.
Compreensivos, os autores do artigo sugerem que Obama se sente muito mal ao ordenar os assassinatos.
Gostaria de lembrar que um governo deve ser medido por suas ações, não por suas convicções.
O apelo dos 1.879 americanos ao Presidente para que não os matassem, pode ser interpretado de muitas maneiras.
Prefiro acreditar que eles pretendiam chamar Obama à razão.
Quem sabe convencê-lo a mudar de novo, agora no sentido que lhe valera a eleição.
Não sei se dará para se contrapor ao poder anti- democrático do Congresso e do Pentágono.
*GilsonSampaio