Páginas

Ser de esquerda é não aceitar as injustiças, sejam elas quais forem, como um fato natural. É não calar diante da violação dos Direitos Humanos, em qualquer país e em qualquer momento. É questionar determinadas leis – porque a Justiça, muitas vezes, não anda de mãos dadas com o Direito; e entre um e outro, o homem de esquerda escolhe a justiça.
É ser guiado por uma permanente capacidade de se estarrecer e, com ela e por causa dela, não se acomodar, não se vender, não se deixar manipular ou seduzir pelo poder. É escolher o caminho mais justo, mesmo que seja cansativo demais, arriscado demais, distante demais. O homem de esquerda acredita que a vida pode e deve ser melhor e é isso, no fundo, que o move. Porque o homem de esquerda sabe que não é culpa do destino ou da vontade divina que um bilhão de pessoas, segundo dados da ONU, passe fome no mundo.
É caminhar junto aos marginalizados; é repartir aquilo que se tem e até mesmo aquilo que falta, sem sacrifício e sem estardalhaço. À direita, cabe a tarefa de dar o que sobra, em forma de esmola e de assistencialismo, com barulho e holofotes. Ser de esquerda é reconhecer no outro sua própria humanidade, principalmente quando o outro for completamente diferente. Os homens e mulheres de esquerda sabem que o destino de uma pessoa não deveria ser determinado por causa da raça, do gênero ou da religião.
Ser de esquerda é não se deixar seduzir pelo consumismo; é entender, como ensinou Milton Santos, que a felicidade está ancorada nos bens infinitos. É mergulhar, com alegria e inteireza, na luta por um mundo melhor e neste mergulho não se deixar contaminar pela arrogância, pelo rancor ou pela vaidade. É manter a coerência entre a palavra e a ação. É alimentar as dúvidas, para não cair no poço escuro das respostas fáceis, das certezas cômodas e caducas. Porém, o homem de esquerda não faz da dúvida o álibi para a indiferença. Ele nunca é indiferente. Ser de esquerda é saber que este “mundo melhor e possível” não se fará de punhos cerrados nem com gritos de guerra, mas será construído no dia-a-dia, nas pequenas e grandes obras e que, muitas vezes, é preciso comprar batalhas longas e desgastantes. Ser de esquerda é, na batalha, não usar os métodos do inimigo.
Fernando Evangelista

sexta-feira, julho 18, 2014

Qual o papel do chCChefão da CBF no assassinato de Vladimir Herzog?
por  | 


repórter investigativo britânico Andrew Jennings relembra os pecados do atual presidente da CBF, José Maria Marin, durante a ditadura brasileira.
Brasília, 11 de dezembro de 2012: O deputado Romário chega de mansinho na sala da Comissão. Uma centena de pares de olhos seguem o icônico Baixinho que se dirige primeiro à imprensa. “Andrew Jennings, meu amigo, como vai”, diz, enquanto aperta minha mão entre as suas.
Ele parece estar em grande forma, leve, relaxado, sorridente, e um brilho no olhar que promete: um dos maiores goleadores do mundo está prestes a marcar mais um tento. Sem fazer alarde, como sempre. Romario simplesmente marca: Gol!
“Melhor agora que encontrei você, companheiro”, respondo. Ele dá risada e vai embora, driblando as mesas para tomar assento na Comissão de Esporte e Turismo da Câmara, da qual faz parte.
Romario aguarda pacientemente por alguns minutos.  Então, o presidente da mesa lhe passa a bola: é sua vez de falar. Ele não sorri agora.
Sobre Isso, Leia Também
“As pessoas me param na rua para dizer: ‘Traga o Teixeira de volta, o novo presidente da CBF é pior’”.
Pronto. Com apenas uma frase ele agarrou a bola e: gol!
Durante 23 anos Ricardo Teixeira desviou dinheiro da FIFA e da CBF. O peso da corrupção finalmente o forçou a renunciar nove meses atrás e os torcedores puderam recolher as faixas “Fora Teixeira” que estendiam nos estádios.
Como o cara que assumiu a CBF, o octogenário José Maria Marin, poderia ser pior que o antecessor? Certamente ele vai fundo saqueando o futebol brasileiro, mas Marin não tem como superar as décadas de roubo de Ricky Vigarista.
A resposta está fora do campo do futebol, em uma história sórdida que vem do tempo da ditadura militar. Por isso a indignação em São Paulo – onde manifestantes protestaram diante de sua casa-  nas colunas dos jornais, no Congresso, onde foi acusado de ter “as mãos sujas de sangue”
* * * * * * * *
Brasília, 13 de dezembro de 1968: Quatro anos depois do golpe militar que implantou a ditadura no Brasil veio uma lei – o famigerado AI-5 – que dava ao milico que estivesse na cadeira da presidência o poder de fazer o que lhe desse na telha. O Congresso estava amordaçado, os partidos políticos, banidos e os direitos humanos, extintos. A censura corria solta nos jornais, na música, no teatro, no cinema.
Sabendo-se ilegítimos e odiados pelo povo, os generais declararam a guerra suja contra os opositores. Torturava-se e matava-se na Operação Bandeirantes – a OBAN – executada por policiais civis e militares e secretamente financiada por empresários brasileiros e corporações americanas – que pagavam bônus para tirar os sindicalistas de suas fábricas.
Em 1970, entre os milhares de presos estava uma jovem estudante, Dilma Rousseff, que se juntara a um grupo clandestino de guerrilha urbana. Ela descreveu, em uma entrevista de 2011, as pancadas que recebia nua e amarrada, entremeadas por choque elétricos nos pontos mais sensíveis do corpo, que chegaram a provocar hemorragia uterina.
São Paulo, 15 de março de 1971: Enquanto os torturadores da OBAN davam choques em Dilma, José Maria Marin – que muito depois se tornaria o chefão do futebol – assumia o mandato de deputado estadual. Se quisesse, Marin teria ouvido os gritos dela. Ele tinha conhecimento da tortura mas isso não o incomodava. Os militares não faziam segredo da sua brutalidade; eles precisavam de uma população acuada, intimidada para se impor.
O senhor Marin aderira à ARENA, o partido criado para os políticos da ditadura. Ele gostava dos militares porque eles o deixavam pertinho do caixa-forte; e os militares o apreciavam porque era a caixinha de música deles. Bastava apertar o botão, e lá ia Marin discursar na Assembléia, denunciando os comunistas ou qualquer um que a OBAN quisesse, dando o pretexto para prender e torturar.
De vez em quando Marin se encontrava com Sérgio Fleury nos bastidores políticos ou nos restaurantes da moda em São Paulo. Fleury era um sádico de primeira, um artista da tortura. O Príncipe da Dor supervisionava inquéritos e operava uma rede de cativeiros privados – em casas, chácaras – onde clandestinamente os presos políticos eram torturados dias a fio. Muitos morreram – ou simplesmente desapareceram.
Seus gângsters em trajes civis invadiam qualquer casa a qualquer hora e quando queriam se divertir, espancavam o suspeito. As crianças assistiam, aterrorizadas. Os revólveres disparavam. Marin tinha Fleury em alta conta.
São Paulo, janeiro de 2013: “Depois que a ditadura se instalou, ser jornalista se tornou uma ocupação prejudicial à saúde. Eu tinha saído do país seis meses antes e estava em Londres, trabalhando para o serviço brasileiro da BBC”, lembra o jornalista Nemércio Nogueira.
“Eu e um colega fizemos um lobby para que a BBC oferecesse  um emprego ao amigo e jornalista Vladimir Herzog. Em 1965 eles contrataram o Vlado, que veio com a mulher, Clarice; eles tiveram os dois filhos em Londres, Ivo e André”.
Depois de três anos na BBC, em agosto de 1975, ele voltou com a família para o Brasil, e foi nomeado editor-chefe da TV Cultura, uma emissora do governo do Estado. Agora ele estava na esfera de influência do deputado José Maria Marin, porta-voz de Fleury e dos generais.
A ditadura começava a rachar. A luta armada tinha sido sufocada, os guerrilheiros eliminados. Alguns generais pregavam um retorno gradual e cauteloso à democracia. Mas os linha-dura não queriam ouvir falar nisso; para continuar nos negócios precisavam da “ameaça vermelha”. Os soldados da tortura concordavam do fundo do coração.
Eles conseguiram ajuda externa. Os serviços de segurança da Argentina, Bolívia, Chile, Paraguai e Uruguai lançaram a Operação Condor, sincronizada através de uma base da CIA no Panamá, prendendo e assassinando lideranças de esquerda e opositores da ditadura em toda a América Latina.
Vlado era mais do que um respeitado ex-repórter e produtor da BBC. Graduado em Filosofia, era um documentarista bem sucedido e professor de jornalismo na Universidade de São Paulo.
Outros colegas jornalistas recordam: “Vlado tinha um estilo direto e despojado de falar e escrever, e não era dado à retórica. Uma frase que usava com frequência, que resume o pensamento dele – e está gravada em sua lápide – era: “Quando perdemos a capacidade de nos indignarmos com as atrocidades praticadas contra outros, perdemos também o direito de nos considerarmos seres humanos civilizados”.
Sua família conhecia o medo, o medo das atrocidades. Judeus, eles fugiram da Croácia quando ele era menino por causa dos nazistas.
Ivo Herzog me disse: “Sim, meu pai era membro do Partido Comunista Brasileiro. Mas não era um grupo armado. Era mais como um grupo de debates.”
As denúncias serviam ao que Fleury e seus sádicos queriam.  Eles começaram a prender os suspeitos de serem comunistas e torturá-los para obter mais nomes.
* * * * * * *
São Paulo, Setembro de 1975: Claudio Marques era um provocador barato, um porta-voz dos torturadores que entrava nos lares da cidade pela TV.
“Conheci o Claudio pessoalmente, como jornalista, e ele me parecia um canalha. Acho que ele não era mais do que um oportunista que viu na ditadura uma forma de obter favores, patrocínio para sua coluna, seu programa de TV, um emprego, qualquer coisa”, lembra o jornalista Nemércio Nogueira, amigo e colega de Vlado na BBC.
Claudio fazia tudo que podia para conseguir a gratidão dos generais. Fleury queria vermelhos? Claudio proveria. Ele começou a escrever sua “Coluna Um”.
“Viram o noticiário de ontem na TV Cultura? Falando do esquerdista vietnamita Ho Chi Min?”
Não interessava que a materia tivesse vindo da BBC Visnews, ali estava a prova de que o canal estatal tinha sido tomado pelos vermelhos! E o governo vai ficar parado assistindo a isso?
Isso foi na primeira semana de setembro. Dois dias depois, a coluna de Claudio espalharia o veneno pela segunda vez.
As prisões dos comunistas suspeitos começou na última semana de setembro. Amarrados na Cadeira de Dragão, com eletrodos no nariz e no pênis, e afogados em baldes de água, eles estavam gritando nomes.
A campanha se mudou para o Congresso.
* * * * * * *
São Paulo, 9 de outubro, 1975: O fantoche escolhido para fazer o aquecimento era o deputado Wadih Helu, outra criatura da ditadura. Ele tomou assento nas fileiras da Arena enquanto providenciava lugares discretos para os interrogatórios dos torturadores de Fleury.
Helu trazia “denúncias graves” a seus colegas na Assembléia.
Veja só: o governo tinha acabado de inaugurar um novo sistema de esgoto e quem assiste à TV Cultura não ficou sabendo disso. Eles não mandaram equipe! (controle sua vontade de rir, o fim da história é funesto).
Fingindo tremer de raiva, o deputado Helu prosseguiu: “A ausência da equipe da TV Cultura nas inaugurações do governo não é novidade para quem tem acompanhado a coluna de Cláudio Marques, denunciando a infiltração de elementos comunistas na TV do estado”.
Helu subiu o tom: “Eles só mostram notícias negativas, nada de positivo. Estão fazendo proselitismo do comunismo subserviente, tornando-se, como diz Claudio Marques, ‘a TV Cultura vietnamita de São Paulo’, usando  dinheiro do povo para prestar um desserviço ao governo e à Pátria”.
Helu sentou. Era a vez do deputado arenista José Maria Marin.
“Acho estranho que apesar da imprensa estar levantando o problema há tempos, pedindo providências aos órgãos competentes em relação ao que está acontecendo no canal 2, não tenha acontecido nada até agora”.
“Não é só uma questão daquilo que eles publicam mas o desconforto que provocam não apenas aqui, nem apenas nos círculos políticos, mas que se comenta em quase todos os lares paulistas”.
Alguma coisa tinha que ser feita.
“Gostaria de chamar a atenção da Secretaria de Cultura de São Paulo, do governador do Estado que devem definitivamente apurar as denúncias publicadas na imprensa de São Paulo, em especial, pelo corajoso jornalista Claudio Marques”.
“Faço um apelo ao governador do Estado: ou jornalista está errado ou está certo. Essa omissão por parte da Secretaria do Estado e do governador não pode persistir. Mais do que nunca  é necessário agir para que a tranquilidade reine novamente nesta Casa e, principalmente, nos lares de São Paulo”.
Sérgio Fleury e seus gorilas agora tinham carta branca para trabalhar. Essa era a mensagem do discurso de Marin. O relógio estava correndo depressa no sentido de abreviar a vida de Herzog.
“Naquele tempo a gente vivia no olho do furacão”, lembra o amigo e colega de Vlado, Paulo Markun. Oito dias depois, Markun foi preso. “Fui torturado e confessei que era membro do Partido Comunista”, disse.
Na noite de 24 de outubro, 15 dias depois dos discursos raivosos de Helu e Marin na Assembléia, os policiais chegaram na TV Cultura querendo levar Vlado. Os colegas de redação argumentaram que ele estava fechando o jornal da noite e que, se o levassem naquele momento, o programa não iria ao ar. Vlado se ofereceu para ir voluntariamente à polícia no dia seguinte.
Vlado foi incauto? Era ingênuo? Um colega e amigo dele me disse: “Minha interpretação é que, morando em endereço bem conhecido, sendo um jornalista renomado, com um cargo alto na TV estatal, e sem envolvimento na luta armada, ele não tinha muito o que temer”.
* * * * * * * * *
São Paulo, 25 de Outubro de 1975: Vladimir Herzog, 38 anos, acordou mais cedo do que de costume na manhã de sábado. Fez a barba, tomou banho e deu um beijo de despedida em Clarice, que ainda estava na cama.
Ela queria levantar e fazer o café da manhã, mas ele lhe disse que não se preocupasse, que no caminho pararia em uma padaria para tomar um café com leite.
No fundo, no fundo, todos os que não eram aliados do regime tinham medo de “desaparecer”. Afinal, naquela época isso acontecia mesmo. Vlado combinou de encontrar um colega que o acompanhou até o número 921 da rua Tutóia, no bairro do Paraíso, hoje o 36o distrito policial. Eles chegaram por volta das 8 horas da manhã.
Por trás dos muros altos guardados por sentinelas funcionava a OBAN. Vlado cruzou o portão de entrada e disse ao recepcionista seu nome completo, profissão, número de RG.
E esperou sentado em um dos bancos de madeira no amplo hall que conduzia a um vidro e uma porta de ferro. Minutos depois, foi levado para interrogatório.
Vlado recebeu a ordem de tirar as roupas e colocar os trajes de prisioneiro. Na sala de interrogatório já estavam dois prisioneiros com os rostos cobertos por capuzes pretos.
Um deles, Rodolfo Konder, reconheceu o amigo: “Consegui erguer um pouco o capuz e reconheci seus sapatos, os mocassins pretos do Vlado”.
Vlado negou ser membro do Partido Comunista. Konder e o outro prisioneiro foram levados. Pouco tempo depois, eles ouviram os gritos de Vlado quando os choques elétricos começaram.
Os gritos duraram boa parte da manhã. “Os choques eram tão violentos, que Vlado uivava de dor”, diz Konder. “Eles ligaram um rádio para abafar o som”.
“Cerca de uma hora depois, eles me levaram para outra sala onde pude tirar o capuz e eu vi o Vlado. O homem que fazia o interrogatório, aparentava uns 35 anos, era magro, musculoso, com uma tatuagem de âncora no braço, disse-me para falar para ele que era inútil resistir”, lembra Konder.
“Vlado estava com o capuz enfiado na cabeça, tremendo, desfigurado. Tive que ajudá-lo a escrever uma confissão dizendo que ele tinha sido convencido por mim a entrar no PCB e listar outros membros do partido”.
Sobre isso, Ivo Herzog me disse: “Eles interromperam os choques e ditaram uma nota para ele escrever. Ele obedeceu, escreveu, então refletiu e rasgou a nota. Eles aumentaram a voltagem, os gritos dele voltaram a ser ouvidos e os choques o mataram”.
Ele hesita um pouco e para de falar. “Minha família não gosta de recordar a tortura. Eles não tinha necessidade de matar meu pai – foi sem intenção”.
Fleury estava na sala? – perguntei.
“Não sabemos”, diz Ivo. “Mas  sei que o Marin estava bem preparado para colocar a vida do meu pai em perigo e assim ficar bem com os militares”.
Tarde da noite, Clarice Herzog recebeu as notícias da morte do marido.
* * * * * * * *
25 de outubro de 1975, horas mais tarde:  Os torturadores vestiram Vlado apressadamente com as suas roupas, passaram o cinto da calça em volta do pescoço, penduraram o corpo na cela e o fotografaram de novo, dessa vez alegando que ele havia se matado. A foto não era nada convincente: os pés dele tocavam o chão e seus joelhos estavam dobrados.
Seu corpo foi entregue às autoridades religiosas esperando que  fosse enterrado – e as evidências do crime também. A tradição judaica não permite que os suicidas sejam interrados em seus cemitérios. Mas quando o Shevra Kaddish – o comitê  fúnebre judaico – estava preparando o corpo para o funeral, o rabino Henry Sobel reparou nas marcas de tortura. Ele ordenou que Vlado fosse enterrado no centro do cemitério. A versão do suicídio tinha sido desmentida.
As notícias da morte de Vlado se espalharam à medida que os jornalistas e opositores gradualmente ocupavam as ruas. A tragédia havia levado para a classe média os fatos que ocorriam em todo o país. Lentamente – foi preciso outra década para restabelecer algo que parecesse mais com a democracia –, o golpe militar arrefecia. Sobel diria depois: “O assassinato de Herzog foi o catalisador da volta da democracia”.
* * * * * * * *
São Paulo, 7 de outubro de 1976: Um ano e dois dias depois de “salvar” a TV Cultura – e incitado a prisão que terminou com o assassinato de Herzog – Marin mais uma vez discursava na Assembléia Legislativa de São Paulo.
E novamente, o deputado reclamava. Não sobre os vermelhos. Dessa vez, estava aborrecido com a falta de reconhecimento público a Sérgio Fleury, o delegado. Um homem que recentemente tinha emboscado e matado os guerrilheiros corajosos o bastante para enfrentar a ditadura.
Isso foi tirado da gravação oficial do discurso de Marin: “Aqueles que o conhecem de perto, sabem que ele é um chefe de família exemplar, mas, mais do que tudo, ele cumpre seus deveres como policial da maneira mais louvável possível”.
“Não conseguimos entender como um policial desse calibre, um homem que dedicou sua vida inteiramente ao combate do crime, um homem que muitas vezes pôs em risco não apenas a sua vida mas a de seus familiares não está recebendo o reconhecimento que merece”.
“Conhecendo seu caráter como eu conheço, não há dúvida de que Sérgio Fleury ama sua profissão; de que Sergio Fleury se dedica ao máximo, sem medir esforços nem sacrifícios para honrar não apenas a polícia de São Paulo, mas acima de tudo seu título de delegado de polícia. Ele deveria ser uma fonte de orgulho para a população de nossa cidade”.
“Por isso, senhor relator, na certeza de refletir o pensamento dos moradores de São Paulo, queremos expressar o orgulho que sentimos por ter em nossa polícia o delegado Sérgio Fleury”.
* * * * * * *
St Helier, Jersey,17 de novembro de 2012: Antigo amigo dos militares, ainda amigo de José Maria Marin e ainda procurado pela Interpol por lavagem de dinheiro, Paulo Maluf dá risada diante da decisão judicial de que ele é um ladrão que desviou 10,5 milhões de dólares da obra de uma estrada em São Paulo.
Por que ele deveria se importar? Tem 81 anos agora, o governo nunca conseguirá o dinheiro de volta enquanto ele estiver vivo nem conseguirá obter provas suficientes para recuperar os estimados 1,7 bilhões de dólares desviados por ele no decorrer de anos.
Maluf se aproximou dos cofres públicos pela primeira vez quando os generais o nomearam prefeito de São Paulo em 1969. Três anos depois ascendeu ao governo do estado de São Paulo, fez de José Maria Marin seu deputado, e lhe passou as chaves do tesouro estadual em 1982.
O acontecimento mais memorável durante os dez meses de governo de Marin em São Paulo foi ser vaiado na Assembléia Legislativa depois que veio à tona empréstimos suspeitos feitos por um banco federal. Os amigos o indicaram para dirigir a seção São Paulo da CBF.
O desempenho de Marin foi suficiente para impressionar Ricardo Teixeira que o nomeou vice-presidente da CBF em 2008. Quando as revelações que fiz a respeito das propinas de Teixeira o forçaram a sair da FIFA e da CBF, Marin era o substituto conveniente. Ele havia provado que compartilhava dos pontos de vista de Teixeira sobre o futebol; se pode ser roubado, roube. Marin foi flagrado na TV afanando uma medalha do campeonato juvenil.
Três meses depois, o brilhante jornalista esportivo Juca Kfouri desenterrou o discurso de Marin na Assembléia em outubro de 1975, denegrindo Vlado Herzog. Juca culpou Marin pela prisão e morte do journalista. Juca também apresentou aos leitores o discurso inacreditáve de Marin elogiando o torturador Sérgio Fleury.
Um jornalista de São Paulo, que acompanha a carreira de Marin, diz, “Marin não é nem um rato, é um camondongo”.
* * * * * * * * * *
São Paulo, domingo, 11 de Novembro de 2012: Um grupo de manifestantes está na frente da casa de José Maria Marin, nos Jardins. Carregando faixas, tambores, tamborins, microfones e um carro de som, os que protestam cantam músicas compostas especialmente compostas para a ocasião. Uma delas pergunta: “Olha a ficha suja do Marin, será que ele é? Será que ele é? Será que ele é dedo-duro?”
Entre eles está Adriano Diogo, do PT, 63 anos que também foi preso e torturado pela OBAN em 1971 e ficou na cadeia alguns anos.
* * * * * * * * *
São Paulo, Quinta-feira, 27 de Novembro de 2012: Adriano Diogo está discursando novamente mas agora como parte de seu trabalho cotidiano. Ele é deputado da Assembléia Legislativa de São Paulo como era José Maria Marin 37 anos antes quando ele atacou a TV Cultura.
“Senhores e senhoras, primeiro eu quero congratular-me com essa nova geração que faz escrachos (nomeando e envergonhando) na porta dos torturadores pela ideia brilhante de ir à casa de José Maria Marin”.
“O senhor José Maria Marin, o delator da ditadura, é responsável pela prisão e assassinato de Vladimir Herzog.” said Diogo. “Ele tem as mãos sujas de sangue, não pode ser o  president da CBF.”
* * * * * * * * * *
Quarta-feira, 23 de janeiro de 2013: Mensagem oficial. “A Comissão da Organização dos Estados Americanos (OEA) vai investigar a responsabilidade do Estado pela morte do jornalista Vladimir Herzog em 1975, durante a ditadura militar (1964-1985).
“De acordo com a petição, o Brasil não cumpriu ainda sua obrigação de investigar, perseguir e punir os responsáveis pela morte de Vladimir Herzog.
“O caso Herzog ilustra o fracasso do judiciário durante a ditadura militar brasileira e na democracia”, diz Viviana Krsticevic, diretora executiva do Center for Justice and International Law, sediado em Washington, que veio ao Brasil anunciar a aceitação da petição.
“Queremos saber quem é responsável pelo que aconteceu com o meu pai”, diz Ivo Herzog.
Ninguém vai chamar José Maria Marin para testemunhar? Ele ignorou o convite para comparecer ao encontro do Comitê de Esporte e Turismo em Brasília, deixando o gol livre para Romario.
Port Louis, Maurício, 30 de maio de 2013: Será o início do 63o Congresso da FIFA’s; espera-se dos delegados que endossem as “reformas” do  presidente Sepp Blatter. Será que José Maria Marin do Brasil será o único acusado de cumplicidade em um crime de assassinato?

*apublica.org

a história que Israel não conta


Pois bem, na tarde da última sexta-feira o saldo de mortos estava 110 a 0 a favor de Israel. Mas passemos para a história de Gaza que, a esta altura, ninguém vai contar. Trata-se da terra. Os israelenses de Sderot estão recebendo tiros de rojões dos palestinos de Gaza, e agora os palestinos estão sendo bombardeados com bombas de fósforo e bombas de fragmentação pelos israelenses. É. Mas e como e por que, para início de conversa, há, atualmente, um milhão e meio de palestinos apertados naquela estreita Faixa de Gaza?
As famílias deles, sim, viveram ali, não eles, no que hoje há quem chame de Israel. E foram expulsas – e tiveram de fugir para não serem todos mortos – quando foi criado o Estado de Israel.
(Foto: Reprodução)
(Foto: Reprodução)
E – aqui, talvez, melhor respirar fundo antes de ler – o povo que vivia em Sederot, no início de 1948, não era israelense, mas árabe palestino. A vila palestina chamava-se Huj. Nunca foram inimigos de Israel. Dois anos antes de 1948, os árabes de Huj até deram abrigo e esconderam ali terroristas judeus do Haganah, perseguidos pelo exército britânico. Mas, quando o exército israelense voltou a Huj, em 31 de maio de 1948, expulsaram todos os árabes das vilas… para a Faixa de Gaza! Tornaram-se refugiados. David Ben Gurion (primeiro premiê de Israel) chamou a expulsão de “ação injusta e injustificada”. Pior, impossível. Os palestinos de Huj, hoje Sderot, nunca mais puderam voltar à terra deles.
E hoje, bem mais de 6 mil descendentes dos palestinos de Huj – atual Sderot – vivem na miséria de Gaza, entre os “terroristas” que Israel mente que estaria caçando, e os quais continuam a atirar contra o que foi Huj.
A história do direito de autodefesa de Israel é a história de sempre. Hoje, foi repetida e a ouvimos mais uma vez. E se a população de Londres estivesse sendo atacada como o povo de Israel? Não responderia? Ora, sim. Mas não há mais de um milhão de ex-moradores de Londres expulsos de suas casas e metidos em campos de refugiados, logo ali, numas poucas milhas quadradas cercadas, perto de Hastings!
A última vez em que se usou esse falso argumento foi em 2008, quando Israel invadiu Gaza e assassinou pelo menos 1.100 palestinos (1.100 mortos palestinos, 13 mortos israelenses). E se Dublin fosse atacada por foguetes – perguntou então o embaixador israelense? Mas, nos anos 1970, a cidade britânica de Crossmaglen, no norte da Irlanda, estava sendo atacada por foguetes da República da Irlanda – e nem por isso a Real Força Aérea britânica começou a bombardear Dublin em retaliação, matando mulheres e crianças irlandesas.
No Canadá em 2008, apoiadores de Israel repetiram esse argumento fraudulento: e se o povo de Vancouver ou Toronto ou Montreal fosse atacado com foguetes lançados dos subúrbios de suas próprias cidades? Como se sentiriam? Não. Os canadenses nunca expulsaram para campos de refugiados os habitantes originais dos bairros onde hoje vivem.
Passemos então para a Cisjordânia. Primeiro, Benjamin Netanyahu disse que não negociaria com o ‘presidente’ palestino Mahmoud Abbas, porque Abbas não representava também o Hamas. Depois, quando Abbas formou um governo de unidade, Netanyahu disse que não negociaria com Abbas, porque ‘unificara’ seu governo com o “terrorista” Hamas. Agora, está dizendo que só falará com Abbas se romper com o Hamas – quando, então, rompido, Abbas não representará o Hamas…
Enquanto isto, o grande filósofo da esquerda israelense, Uri Avnery – 90 anos e, felizmente, cheio de energia – ataca a mais recente obsessão de seu país: a ameaça de que o ISIS se mova para oeste, lá do seu ‘califato’ iraquiano-sírio, e aporte à margem leste do rio Jordão.
“E Netanyahu disse”, segundo Avnery, que “se não forem detidos por uma guarnição permanente de Israel no local (no rio Jordão), logo mostrarão a cara nos portões de Tel Aviv”. A verdade, claro, é que a força aérea de Israel esmagaria qualquer ‘ISIS’, no momento em que começasse a cruzar a fronteira da Jordânia, vindo do Iraque ou da Síria.
A importância da “guarnição permanente”, contudo, é que se Israel mantém seu exército na Jordânia (para proteger Israel contra o ISIS), um futuro estado “palestino” não terá fronteiras e ficará como enclave dentro de Israel, cercado por território israelense por todos os lados. “Em tudo semelhante aos bantustões sul-africanos” – diz Avnery.
Em outras palavras: nenhum estado “viável” da Palestina jamais existirá. Afinal, o ISIS não é a mesma coisa que o Hamas? É claro que não é.
Mas Mark Regev, porta-voz de Netanyahu, diz que é! Regev disse à Al Jazeera que o Hamas seria uma “organização terrorista extremista não muito diferente do ISIS no Iraque, do Hezbollah no Líbano, do Boko Haram…” Sandices. O Hezbollah é exército xiita que está lutando dentro da Síria contra os terroristas do ISIS. E Boko Haram – a milhares de quilômetros de Israel – não ameaça Tel Aviv.
Vocês entenderam o ‘espírito’ da fala de Regev. Os palestinos de Gaza – e esqueçam as 6 mil famílias palestinas cujas famílias foram expulsas pelos sionistas das terras onde hoje está Sederot – são aliados das dezenas de milhares de islamistas que ameaçam Maliki de Bagdá, Assad de Damasco ou o presidente Goodluck Jonathan em Abuja.
Sim, mas… Se o ISIS está a caminho para tomar a Cisjordânia, por que o governo sionista de Israel continua a construir colônias ali?! Colônias ilegais, em terra árabe, para civis israelenses… na trilha do ISIS?! Como assim?!
Nada do que se vê hoje na Palestina tem a ver com o assassinato de três israelenses na Cisjordânia ocupada, nem com o assassinato de um palestino na Jerusalém Leste ocupada. Tampouco tem algo a ver com a prisão de militantes e políticos do Hamas na Cisjordânia. E nem o que se vê hoje na Palestina tem algo a ver com foguetes. Tudo, ali, sempre, é disputa por terra dos árabes.
_______________
Robert Fisk é jornalista e escritor britânico premiado diversas vezes com textos sobre o Oriente Médio. É um dos poucos repórteres ocidentais que fala árabe fluentemente.
*CartaMaior

Nutricionistas defendem a semente de cânhamo, usada por Yasmin Brunet

Especialistas dizem que ela não tem a substância psicoativa da maconha e que é altamente nutritivas. Legislação proíbe importação.

Eliane Santosdo EGO, no Rio
Yasmin Bruent (Foto: Reprodução/Instagram)Yasmin Brunet (Foto: Reprodução/Instagram) pegou muita gente de surpresa ao declarar que faz uso de sementes de maconha em sua dieta.“Uso como se fosse uma semente de chia, misturo com frutas ou iogurte. Adoro! Não consigo entender por que não legalizam aqui”, disse ela nos bastidores do desfileda estilista Lethicia Bronstein à coluna "Gente Boa", do jornal "O Globo", e contando ainda que conheceu o produto nos Estados Unidos, onde ele é vendido livremente.

Depois, Yasmin veio a público, através de sua conta noTwitter, explicar como fazia tal uso e que ele não tinha nada a ver com o efeito psicoativo da maconha, proveniente do THC, principal componente da planta e responsável por seus efeitos alucinógenos.
"Gente, queria esclarecer uma coisa: a semente de maconha que eu como é a semente de cânhamo ou hemp ou maconha. É a semente própria para comer. Ela tem milhões de benefícios, muita proteína, óleos. Lógico que muita gente gosta de aumentar, mas é isso. Infelizmente, não vende no Brasil, não sei por quê. Mas vale a pena trazer porque faz superbem”, escreveu.

“O que se usa na
 alimentação é o cânhamo, que acaba levando uma má reputação por causa de sua associação com a maconha. A confusão entre os dois surge do fato de que ambos provêm da espécie cannabis sativa, porém o cânhamo é geralmente colhido de uma subespécie da cannabis, e não tem propriedades psicoativas. O cânhamo é cultivado devido ao seu valor nutricional e são utilizados suas sementes, óleo e fibra”, explicou Patrícia, que atende famosas como Fátima Bernardes, Fernanda Souza e Tania Khalill.EGO conversou com alguns nutricionistas para saber mais a respeito da tal dieta e de seus possíveis benefícios. A resposta é que Yasmin está certa e antenada ao fazer uso das tais sementes de cânhamo, como esclarece a nutricionista Patrícia Davidson Haiat, que é pós-graduada em nutrição clínica funcional e fitoterapia pela UNIB/VP e diplomada pelo Institute for Functional Medicine, dos Estados Unidos.
Fabiano Serfaty, endocrinologista (Foto: Reprodução/Reprodução)Fabiano Serfaty, endocrinologista: "Não é droga"
Cânhamo faz bem ao coração
O endocrinologista e professor do Instituto Estadual de Diabetes Fabiano Serfaty – que tem entre suas clientes Fernanda Paes Leme e Renata Dominguez - também defende.
“As sementes de cânhamo contêm todos os aminoácidos essenciais, sendo portanto uma ótima fonte de proteínas, uma boa opção, por exemplo, para veganos. Como outras sementes, as de cânhamo apresentam uma quantidade substancial de ácidos graxos ômega-3, saudáveis para o coração. A semente do cânhamo não é uma droga! Pelo contrário. É uma semente que  apresenta 2% de carboidratos, 73% de gorduras e 25% de proteínas, portanto um alimento de ótimo valor nutritivo e baixa quantidade de  carboidratos, ou seja, mais uma opção de dieta saudável”, explicou Serfaty ao EGO.

Outra que também entra no coro dos benefícios das sementes de cânhamo é a nutricionistaAndrea Santa Rosa, que atende as atrizes Juliana Paes e Cleo Pires. “É um alimento muito indicado para os vegetarianos, pela quantidade de proteína que contém, além da composição de aminoácidos. Não tem nada a ver com alucinógeno. Tem uma composição nutricional rica e é prática, já que pode ser consumido através de leite, óleos e sementes, em qualquer horário”, disse ela.
Patrícia Davidson (Foto: Reprodução/Instagram)Patrícia Davidson: cânhamo é melhor que soja
Cânhamo melhor que soja
O cânhamo ainda tem outra vantagem para os vegetarianos que costumam fazer uso da soja para compensar a falta de proteína obtida na carne. Segundo a nutricionista Patrícia Davidson, ele não contém ácido fítico, que impede a absolvição de minerais:

“Ao contrário da soja, que tem quantidades elevadas de ácido fítico (que é um antinutriente que nos impede de absorver minerais), as sementes de cânhamo estão livres dele, portanto, seu aproveitamento pelo organismo é melhor”.

E o cânhamo pode ser encarado como segredo debeleza, como também declarou Yasmin? “Sim. É uma fonte rica em fitonutrientes, que é o que traz proteção às plantas e, na saúde humana, oferecem  benefícios que protegem a imunidade, qualidade do sangue, tecidos, células, pele, órgãos e mitocôndrias”, atesta Patrícia Davidson.
Legislação brasileira proíbe a importação
Apesar de ser festejada por nutricionistas, pela legislação brasileira ainda há controvérsias sobre o uso do cânhamo. De acordo com a Lei sobre drogas no Brasil que remete à Portaria nº 344-SVS/MS da ANVISA, de 12/05/1998, a cannabis sativa e, portanto, o cânhamo, é proscrito (proibido) no Brasil por encontrar-se na “Lista de plantas proscritas que podem originar substâncias entorpecentes e/ou psicotrópicas” (Lista E)  da referida portaria.
EGO entrou em contato com a Polícia Federal para saber se não seria possível importar as sementes de cânhamo, uma vez que as mesmas não tem efeito psicoativo. De acordo com o órgão, o Brasil não possui uma legislação que regulamenta a quantidade de THC nesses suprodutos da cannabis, o que levaria cada caso a ser analisado isoladamente.
"O cânhamo é uma das denominações populares da cannabis sativa. Mas esta denominação também é aplicada a fibra, sementes, óleo, cera, resina, cordas, tecidos, papel e etc, obtidos a partir desta planta. Diversos países possuem legislação específica que regulamenta a quantidade de THC máxima permitida nestes produtos. Há  decisões na Justiça que divergem desse entendimento, razão pela qual cada caso deve ser analisado isoladamente", informou a Polícia Federal.