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Ser de esquerda é não aceitar as injustiças, sejam elas quais forem, como um fato natural. É não calar diante da violação dos Direitos Humanos, em qualquer país e em qualquer momento. É questionar determinadas leis – porque a Justiça, muitas vezes, não anda de mãos dadas com o Direito; e entre um e outro, o homem de esquerda escolhe a justiça.
É ser guiado por uma permanente capacidade de se estarrecer e, com ela e por causa dela, não se acomodar, não se vender, não se deixar manipular ou seduzir pelo poder. É escolher o caminho mais justo, mesmo que seja cansativo demais, arriscado demais, distante demais. O homem de esquerda acredita que a vida pode e deve ser melhor e é isso, no fundo, que o move. Porque o homem de esquerda sabe que não é culpa do destino ou da vontade divina que um bilhão de pessoas, segundo dados da ONU, passe fome no mundo.
É caminhar junto aos marginalizados; é repartir aquilo que se tem e até mesmo aquilo que falta, sem sacrifício e sem estardalhaço. À direita, cabe a tarefa de dar o que sobra, em forma de esmola e de assistencialismo, com barulho e holofotes. Ser de esquerda é reconhecer no outro sua própria humanidade, principalmente quando o outro for completamente diferente. Os homens e mulheres de esquerda sabem que o destino de uma pessoa não deveria ser determinado por causa da raça, do gênero ou da religião.
Ser de esquerda é não se deixar seduzir pelo consumismo; é entender, como ensinou Milton Santos, que a felicidade está ancorada nos bens infinitos. É mergulhar, com alegria e inteireza, na luta por um mundo melhor e neste mergulho não se deixar contaminar pela arrogância, pelo rancor ou pela vaidade. É manter a coerência entre a palavra e a ação. É alimentar as dúvidas, para não cair no poço escuro das respostas fáceis, das certezas cômodas e caducas. Porém, o homem de esquerda não faz da dúvida o álibi para a indiferença. Ele nunca é indiferente. Ser de esquerda é saber que este “mundo melhor e possível” não se fará de punhos cerrados nem com gritos de guerra, mas será construído no dia-a-dia, nas pequenas e grandes obras e que, muitas vezes, é preciso comprar batalhas longas e desgastantes. Ser de esquerda é, na batalha, não usar os métodos do inimigo.
Fernando Evangelista

sexta-feira, janeiro 03, 2014

Requião: por que a Globo sonega impostos e ainda recebe empréstimos de bancos estatais? Isso pode, Arnaldo?


 

Via Tribuna da Imprensa
REQUIÃO SURPREENDE O SENADO: APRESENTOU REQUERIMENTO DE INFORMAÇÃO, QUER SABER A QUANTO CHEGAM AS DÍVIDAS BILIONÁRIAS DA ORGANIZAÇÃO GLOBO. A SONEGAÇÃO COLOSSAL DE IMPOSTO DE RENDA. E PORQUE AINDA RECEBEM EMPRÉSTIMOS DO BNDES E OUTROS BANCOS ESTATAIS
HELIO FERNANDES
A época não foi bem escolhida, o Congresso, o Executivo e o Judiciário, estão de férias. Mas o pedido do senador Requião, é importantíssimo. Apresentado, já foi despachado para a Comissão de Constituição e Justiça. Mas pede informações ao Ministro do Desenvolvimento, Fernando Pimentel, a quem o BNDES é subordinado.
Não vou registrar números e parágrafos citados pelo bravo e corajoso senador. Mas como é relembrado um artigo meu de 11 anos, 2002, não posso deixar sem resposta. Seria deselegante e inexplicável.
Requião quer informações a respeito de tudo o que se relacione com a Organização Globo. Ressalta e deixa bem claro: “Quero saber sobre o pedido de empréstimo ao BNDES, de TODAS AS EMPRESAS DO GRUPO”. Textual e irrevogável.
AS DIVIDAS ELEVADAS (textual) das Organizações com a União
Requião exclui do pedido, “documentos que estejam acobertados pelo sigilo bancário”. Mas a seguir, entra no mérito do requerimento. Como a questão que ele chama de DÍVIDAS ELEVADAS e a SONEGAÇÃO FISCAL, (ambas BILIONÁRIAS) que é pública e notória, e nem o próprio grupo nega, apenas contorna, vou transcrever entre aspas, a justificativa. É a única parte que trato entre aspas.
“Requeiro que sejam informadas e remetidas, as respectivas copias dos documentos relativos aos benefícios fiscais e creditícios que tem sido concedidos às empresas componentes das Organizações Globo. Indicando, inclusive, se há amparo legal para a concessão de benefícios a quem esteja com elevadas dividas com a União”. Fim das aspas.
Outros órgãos serão ouvidos, sem falar na Receita Federal
Não consigo explicação para as DÍVIDAS ELEVADAS. Já tenho tratado do assunto, voltemos ligeiramente a ele. As Organizações na podem estar em dificuldade financeira. Em 2011, (referente a ganhos e lucros de 2010), os três sócios-herdeiros, receberam 1 BILHÃO E 800 MILHÕES. O que significa 600 MILHÕES para cada um, 50 MILHÕES mensais. (Em 2012 não vi. 2013 está acabando).
Esses bônus, dividendos, lucros, chamem como quiserem, foram publicados pelo próprio Globo, num canto de página interna e perdido, apenas transcrevo. Por que publicaram? Para tripudiar e ostentar? Ou uma explicação ANTECIPADA? Exorbitantes esses ganhos?
Na mesma nota, mínima, que registrava o recebimento, o complemento: “Estamos liquidando a firma coletiva, passará a ser individual”. Aí não entendi mesmo, conversei com professores de contabilidade, também ficaram surpreendidos, mas me deram varias versões ou hipóteses para essa “separação empresarial”. Apesar de professores, hesitaram: “Tudo pode ter acontecido, mas três possibilidades resistem”.
1- Pode ter havido divergência, não querem receber a mesma importância, os cargos que ocupam são diferentes em esforço, importância e faturamento.
2- É possível que não haja discordância pessoal e sim a respeito do imposto de renda. Algum dos três pode ter ganhos de outras fontes, que declarados em bloco, diminuem a restituição.
3- Pode ter sido uma decisão não hostil, legitima, a Receita Federal é complicada. Declarações individuais às vezes trazem vantagens e benefícios, não ilegais. Mas todos ressaltam: “Helio, é apenas exame, analise, de longe”.
SONEGAÇÃO DA RECEITA
Aí não existe dúvida, não confundir com dívida. SONEGAÇÃO é uma palavra que não tem tradução em nenhum idioma. (Nem mesmo em aramaico, a língua de Jesus Cristo). Qualquer coisa os lideres da China podem ser consultados, estão preocupadíssimos com a SONEGAÇÃO.
De qualquer maneira, a Organização não nega o péssimo relacionamento com a Receita e a possível SONEGAÇÃO BILIONÁRIA. Não nega, usa o mesmo que vem escrito na garrafa da Coca-Cola: “Marca de fantasia”. É possível, é possível, só não acredito que o requerimento do senador tenha sucesso no Congresso. (A “bancada da Globo” no Congresso, é poderosa, uma espécie de “bancada da bola”). 
Diante do clamor e a insistência dos acusadores sobre a importância do que não pagaram à Receita, vieram com declaração breve, mas inaceitável: “Não sonegamos coisa alguma, estamos utilizando um novo tipo de lançamento contábil, que a Receita Federal não conhece”.
Isso mesmo. Inovando em matéria de não pagar, inovam também na explicação, tentam “jogar a culpa” na incompetência da Receita Federal. Esta deve ter realmente culpa, pelo fato de não ter cobrado até agora, a parte que lhe cabe e que a Organização joga para bem longe.
Justificativa de Requião
Depois de explicar tudo, m-i-n-u-c-i-o-s-a-m-e-n-t-e, o senador, que já enfrentou adversários poderosos, governador e senador muitas vezes, sem perder nunca, (seu mandato até 2018) vai mais fundo nas referencias.
1- “Conforme divulgado por diversos meios de comunicação, as Organizações Globo tem elevadas dívidas com a União”. 2- Cita o linkhttp://www.fazendomedia.com/globo40/romero6.htm. 3- E repete, “que mesmo assim tem tentado TOMAR (textual) empréstimos de ELEVADO VULTO, junto ao BNDES”.
“Afundação Roberto Marinho”
Do próprio Requião, textual. “O citado site, noticia que o jornalista Helio Fernandes, em 14 de fevereiro de 2002, na Tribuna da Imprensa, foi categórico ao afirmar, deveriam ouvir Romero Machado, que publicou o imperdível “Afundação Roberto Marinho”.
Sou sempre categórico e publiquei esse livro em capítulos
A Tribuna da Imprensa, publicou os capítulos que Romero Machado escrevia. Quando já havia um numero razoáveis de artigos para compor o livro, aí o drama. As máquinas da Tribuna não tinham capacidade gráfica para imprimir o livro.
Romero Machado começou então a procurar editora. Mas o doutor (?) Roberto Marinho chegava sempre antes, todas se fechavam e recusavam um livro de sucesso antecipadamente garantido.
Até que o próprio Romero encontrou uma editora pequena, mas resistente, que lançou o livro. O título é dele, os capítulos do jornal, com esse título, uma bela idéia, que teve grande repercussão.
PS- Roberto Marinho exigia ser chamado de doutor, embora não tivesse completado nem o primeiro ano da Faculdade de Direito. (O Ministro Armando Falcão, amicíssimo do doutor (?) Roberto, rompeu com ele, mandou carta ESPANTOSA para a Tribuna da Imprensa. Com revelações fantásticas. É lógico que publicamos.
PS2- Durante mais de 50 anos, escrevi sobre o Globo, e seu proprietário. Sem qualquer concessão. Ainda não existiam as Organizações. O enriquecimento só veio mesmo com o apoio incondicional à ditadura arbitrária, atrabiliária, autoritária, perseguidora e torturadora.
PS3- Em 1965 surge a TV-Globo, fonte maior da fortuna que acumulou. Enganou os americanos da Time-Life, dispensou os funcionários que vieram com o equipamento, ficou apenas com Joe Wallace, que escreveu um livro indispensável. E altamente revelador. Diz que Walter Clark, “único gênio da televisão do Brasil” e sua demissão num jantar com o “presidente” Geisel.
PS4- Requião deve procurar o livro, e juntar ao requerimento, ele é sinceríssimo. Nunca falei com ele, posso até achar que Wallace, aposentado pela Organização, sabia mais do que eu.
PS5- Agora precisam de um esforço muito maior, uma espécie de salto tríplice: pagar as DÍVIDAS ELEVADAS, convencer a Receita, que NÃO SONEGARAM, apenas usaram método novo, TOMAR mais dinheiro em bancos oficiais.
*GilsonSampaio

quarta-feira, janeiro 01, 2014

Quando homens e mulheres invertem os papéis

Trocando de lugar. Estudantes produzem vídeo no qual invertem os “papéis” femininos e masculinos em anúncios para mostrar como a propaganda perpetua representações equivocadas

estereótipos homem mulher masculino feminino
Trocando de lugar – os estereótipos de gênero (Reprodução / Vídeo / Youtube)
Sarah Zelinski, Kayla Hatzel e Dylan Lambi-Raine, alunas do curso de estudos de gênero da Universidade de Saskatchewan, no Canadá, tiveram uma ideia criativa para expor a forma como a publicidade explora massivamente os estereótipos de gênero. As estudantes canadenses produziram um vídeo no qual invertem o papel de homens e mulheres em anúncios reais.

Quando acaba de apresentar os anúncios originais, o vídeo pergunta se o espectador achou os mesmos “ridículos”. Após o questionamento, são apresentados os anúncios com os “papéis” invertidos. O resultado é a sensação de que os estereótipos de gênero estão de tal forma culturalmente enraizados que o ridículo de explorá-los só se torna evidente com a inversão dos “papéis”.
O vídeo, intitulado ‘Representations of gender in advertising’ (‘Representações de gênero na propaganda’), ainda apresenta estatísticas quanto aos números da violência de gênero no Canadá e os relaciona com a representação da mulher nos anúncios publicitários.
“Algumas campanhas retratam a mulher como altamente sexual e submissa. E o homem, como dominante e agressivo”, diz Sarah Zelinsky.
Assista ao vídeo:


*pragmatismopolitico

Padre Fábio fala ‘besteiras’ a meninas em shows, diz Marcelo

Rossi pediu que Melo usasse batina
O padre Marcelo Rossi (foto), 44, disse que o seu colega também cantor, o Fábio de Melo (foto), 40,  “fala besteiras desnecessárias para algumas meninas nos shows”.
Marcelo não deu nenhum exemplo do tipo de besteiras que Melo diz, mas ficou subentendido que se trata de malícias sexuais. “Ele nos expõe.”

“Já falei disso prá ele certa vez”, diz Marcelo. “Como não tive uma resposta positiva, eu respeito, deixo que ele seja abençoado e quero que seja feliz.”

As afirmações do padre Marcelo foram feitas em entrevista ao Jornal da Tarde, de São Paulo, durante a qual falou sobre o recorde de vendas do seu livro Ágape e do santuário que está construindo em São Paulo para 100 mil pessoas.

Os padres-cantores nunca se deram bem e agora parecem mais distantes um do outro. Uma das diferenças entre eles, segundo Marcelo, é que Melo cobra cachê para cantar.

Desde o começo, quando o galã Melo começou a causar frisson nas moças, Marcelo dizia que o seu colega deveria se apresentar com batina para impor respeito. A resposta de Melo foi de que não é a batina que faz o padre.

Na entrevista, Marcelo avançou nas  insinuações ao falar sobre celibato.

“O celibato é uma oferta, tenho isso na cabeça. Eu já vivi do outro lado, sei quando uma pessoa olha com outra intenção. Eu trato bem, mas me afasto.”

Leia mais em http://www.paulopes.com.br/2011/10/padre-fabio-de-melo-diz-besteiras.html#ixzz2pBvodoXw

"Meritocracia": a lógica perversa que envenena a classe média brasileira


O texto abaixo é simplesmente sensacional. Nele, o autor explica de forma cabal porque a nossa classe média é tão individualista, perversa, reacionária, mesquinha e fascista. E também porque tem tanto ódio dos valores da esquerda. 

Infelizmente o texto é um pouco longo e sabemos que a maioria dos "classe-medianos" só lê mesmo a capa da Veja e livros de auto-ajuda, mas desafio todos vocês a lerem até o final, se tiverem coragem, é claro!

"Meritocracia": a lógica perversa que envenena a classe média brasileira

por Renato Santos de Souza (UFSM/RS) via TUDO EM CIMA

"Vamos amigo! Se a gente se esforçar e vestir a
camisa um dia a gente também chega lá sozinho!"
A primeira vez que ouvi a Marilena Chauí bradar contra a classe média, chamá-la de fascista, violenta e ignorante, tive a reação que provavelmente a maioria teve: fiquei perplexo e tendi a rejeitar a tese quase impulsivamente. Afinal, além de pertencer a ela, aprendi a saudar a classe média. Não dá para pensar em um país menos desigual sem uma classe média forte: igualdade na miséria seria retrocesso, na riqueza seria impossível.

Então, o engrossamento da classe média tem sido visto como sinal de desenvolvimento do país, de redução das desigualdades, de equilíbrio da pirâmide social, ou mais, de uma positiva mobilidade social, em que muitos têm ascendido na vida a partir da base. A classe média seria como que um ponto de convergência conveniente para uma sociedade mais igualitária. Para a esquerda, sobretudo, ela indicaria uma espécie de relação capital-trabalho com menos exploração.
 
Então, eu, que bebi da racionalidade desde as primeiras gotas de leite materno, como afirmou certa vez um filósofo, não comprei a tese assim, facilmente. Não sem uma razão. E a Marilena não me ofereceu esta razão. Ela identificou algo, um fenômeno, o reacionarismo da classe média brasileira, mas não desvendou o sentido do fenômeno. Descreveu “O QUE” estava acontecendo, mas não nos ofereceu o “PORQUE”. Por que logo a classe média? Não seria mais razoável afirmar que as elites é que são o “atraso de vida” do Brasil, como sempre foi dito? E mais, ela fala da classe média brasileira, não da classe média de maneira geral, não como categoria social. Então, para ela, a identificação deste fenômeno não tem uma fundamentação eminentemente filosófica ou sociológica, e sim empírica: é fruto da sua observação, sobretudo da classe média paulistana. E por que a classe média brasileira e não a classe média em geral? Estas indagações me perturbavam, e eu ficava reticente com as afirmações de dona Marilena.
 
Com o passar do tempo, porém, observando muitos representantes da classe média próximos de mim (coisa fácil, pois faço parte dela), bem como a postura desta mesma classe nas manifestações de junho deste ano, comecei lentamente a dar razão à filósofa. A classe média parece mesmo reacionária, talvez não toda, mas grande parte dela. Mas ainda me perguntava “por que” a classe média, e “por que” a brasileira? Havia um elo perdido neste fenômeno, algo a ser explicado, um sentido a ser desvendado.
 
Então adveio aquela abominável reação de grande parte da categoria médica – justamente uma categoria profissional com vocação para classe média - ao Programa Mais Médicos, e me sugeriu uma resposta. Aqueles episódios me ajudaram a desvendar a espuma. Mas não sem antes uma boa pergunta! Como pode uma categoria profissional pensar e agir assim, de forma tão unificada, num país tão plural e tão cheio de nuanças intelectuais e políticas como o nosso? Estudantes de medicina e médicos parecem exibir um padrão de pensamento e ação muito coesos e com desvios mínimos quando se trata da sua profissão, algo que não se vê em outros segmentos profissionais. Isto não pode ser explicado apenas pelo que se convencionou chamar de “corporativismo”. Afinal, outras categorias profissionais também tem potencial para o corporativismo, e não o são, ao menos não da mesma forma. Então deveria haver outra interpretação para isto.
 
Bem, naqueles episódios do Mais Médicos, apesar de toda a argumentação pretensamente responsável das entidades médicas buscando salvaguardar a saúde pública, o que me parecia sustentar tal coesão era uma defesa do mérito, do mérito de ser médico no Brasil. Então, este pensamento único provavelmente fora forjado pelas longas provações por que passa um estudante de medicina até se tornar um profissional: passar no vestibular mais concorrido do Brasil, fazer o curso mais longo, um dos mais difíceis, que tem mais aulas práticas e exigências de estrutura, e que está entre os mais caros do país. É um feito se formar médico no Brasil, e talvez por isto esta formação, mais do que qualquer outra, seja uma celebração do mérito. Sendo assim, supõe-se, não se pode aceitar que qualquer um que não demonstre ter tido os mesmos méritos, desfrute das mesmas prerrogativas que os profissionais formados aqui. Então, aquela reação episódica, e a meu ver descabida, da categoria médica, incompreensível até para o resto da classe média, era, na verdade, um brado pela meritocracia.
 
A minha resposta, então, ao enigma da classe média brasileira aqui colocado, começava a se desvelar: é que boa parte dela é reacionária porque é meritocrática; ou seja, a meritocracia está na base de sua ideologia conservadora.
 
Assim, boa parte da classe média é contra as cotas nas universidades, pois a etnia ou a condição social não são critérios de mérito; é contra o bolsa-família, pois ganhar dinheiro sem trabalhar além de um demérito desestimula o esforço produtivo; quer mais prisões e penas mais duras porque meritocracia também significa o contrário, pagar caro pela falta de mérito; reclama do pagamento de impostos porque o dinheiro ganho com o próprio suor não pode ser apropriado por um Governo que não produz, muito menos ser distribuído em serviços para quem não é produtivo e não gera impostos. É contra os políticos porque em uma sociedade racional, a técnica, e não a política, deveria ser a base de todas as decisões: então, deveríamos ter bons gestores e não políticos. Tudo uma questão de mérito.
 
Mas por que a classe média seria mais meritocrática que as outras? Bem, creio que isto tem a ver com a história das políticas públicas no Brasil. Nós nunca tivemos um verdadeiro Estado do Bem Estar Social por aqui, como o europeu, que forjou uma classe média a partir de políticas de garantias públicas. O nosso Estado no máximo oferecia oportunidades, vagas em universidades públicas no curso de medicina, por exemplo, mas o estudante tinha que enfrentar 90 candidatos por vaga para ingressar. O mesmo vale para a classe média empresarial, para os profissionais liberais, etc. Para estes, a burocracia do Estado foi sempre um empecilho, nunca uma aliada. Mesmo a classe média estatal atual, formada por funcionários públicos, é geralmente concursada, portanto, atingiu sua posição de forma meritocrática. Então, a classe média brasileira se constituiu por mérito próprio, e como não tem patrimônio ou grandes empresas para deixar de herança para que seus filhos vivam de renda ou de lucro, deixa para eles o estudo e uma boa formação profissional, para que possam fazer carreira também por méritos próprios. Acho que isto forjou o ethos meritocrático da nossa classe média.
 
Esta situação é bem diferente na Europa e nos EUA, por exemplo. Boa parte da classe média europeia se formou ou se sustenta das políticas de bem estar social dos seus países, estas mesmas que entraram em colapso com a atual crise econômica e tem gerado convulsões sociais em vários deles; por lá, eles vão para as ruas exatamente para defender políticas anti-meritocráticas. E a classe média americana, bem, esta convive de forma quase dramática com as ambiguidades de um país que é ao mesmo tempo das oportunidades e das incertezas; ela sabe que apenas o mérito não sustenta a sua posição, portanto, não tem muitos motivos para ser meritocrática. Se a classe média adoecer nos EUA, vai perder o seu patrimônio pagando por serviços privados de saúde pela absoluta falta de um sistema público que a suporte; se advém uma crise econômica como a de 2008, que independe do mérito individual, a classe média perde suas casas financiadas e vai dormir dentro de seus automóveis, como se via à época. Então, no mundo dos ianques, o mérito não dá segurança social alguma.
 
As classes brasileiras alta e baixa (os nossos ricos e pobres) também não são meritocráticas. A classe alta é patrimonialista; um filho de rico herda bens, empresas e dinheiro, não precisa fazer sua vida pelo mérito próprio, portanto, ser meritocrata seria um contrassenso; ao contrário, sua defesa tem que ser dos privilégios que o dinheiro pode comprar, do direito à propriedade privada e da livre iniciativa. Além disso, boa parte da elite brasileira tem consciência de que depende do Estado e que, em muitos casos, fez fortuna com favorecimentos estatais; então, antes de ser contra os governos e a política, e de se intitular apolítica, ela busca é forjar alianças no meio político.
 
Para a classe pobre o mérito nunca foi solução; ela vive travada pela falta de oportunidades, de condições ou pelo limitado potencial individual. Assim, ser meritocrata implicaria não só assumir que o seu insucesso é fruto da falta de mérito pessoal, como também relegar apenas para si a responsabilidade pela superação da sua condição. E ela sabe que não existem soluções pela via do mérito individual para as dezenas de milhões de brasileiros que vivem em condições de pobreza, e que seguramente dependem das políticas públicas para melhorar de vida. Então, nem pobres nem ricos tem razões para serem meritocratas.
 
A meritocracia é uma forma de justificação das posições sociais de poder com base no merecimento, normalmente calcado em valências individuais, como inteligência, habilidade e esforço. Supostamente, portanto, uma sociedade meritocrática se sustentaria na ética do merecimento, algo aceitável para os nossos padrões morais.
 
Aliás, tenho certeza de que todos nós educamos nossos filhos e tentamos agir no dia a dia com base na valorização do mérito. Nós valorizamos o esforço e a responsabilidade, educamos nossas crianças para serem independentes, para fazerem por merecer suas conquistas, motivamo-as para o estudo, para terem uma carreira honrosa e digna, para buscarem por méritos próprios o seu lugar na sociedade.
 
Então, o que há de errado com a meritocracia, como pode ela tornar alguém reacionário?
 
Bem, como o mérito está fundado em valências individuais, ele serve para apreciações individuais e não sociais. A menos que se pense, é claro, que uma sociedade seja apenas um agregado de pessoas. Então, uma coisa é a valorização do mérito como princípio educativo e formativo individual, e como juízo de conduta pessoal, outra bem diferente é tê-lo como plano de governo, como fundamento ético de uma organização social. Neste plano é que se situa a meritocracia, como um fundamento de organização coletiva, e aí é que ela se torna reacionária e perversa.
 
Vou gastar as últimas linhas deste texto para oferecer algumas razões para isto, para mostrar porquê a meritocracia é um fundamento perverso de organização social.
 
a) A meritocracia propõe construir uma ordem social baseada nas diferenças de predicados pessoais (habilidade, conhecimento, competência, etc.) e não em valores sociais universais (direito à vida, justiça, liberdade, solidariedade, etc.). Então, uma sociedade meritocrática pode atentar contra estes valores, ou pode obstruir o acesso de muitos a direitos fundamentais.
 
b) A meritocracia exacerba o individualismo e a intolerância social, supervalorizando o sucesso e estigmatizando o fracasso, bem como atribuindo exclusivamente ao indivíduo e às suas valências as responsabilidades por seus sucessos e fracassos.
 
c) A meritocracia esvazia o espaço público, o espaço de construção social das ordens coletivas, e tende a desprezar a atividade política, transformando-a em uma espécie de excrescência disfuncional da sociedade, uma atividade sem legitimidade para a criação destas ordens coletivas. Supondo uma sociedade isenta de jogos de interesse e de ambiguidades de valor, prevê uma ordem social que siga apenas a racionalidade técnica do merecimento e do desempenho, e não a racionalidade política das disputas, das conversações, das negociações, dos acordos, das coalisões e/ou das concertações, algo improvável em uma sociedade democrática e pluralista.
 
d) A meritocracia esconde, por trás de uma aparente e aceitável “ética do merecimento”, uma perversa “ética do desempenho”. Numa sociedade de condições desiguais, pautada por lógicas mercantis e formada por pessoas que tem não só características diferentes mas também condições diversas, merecimento e desempenho podem tomar rumos muito distantes. O Mário Quintana merecia estar na ABL, mas não teve desempenho para tal. O Paulo Coelho, o Sarney e o Roberto Marinho estão (ou estiveram) lá, embora muitos achem que não merecessem. O Quintana, pelo imenso valor literário que tem, não merecia ter morrido pobre nem ter tido que morar de favor em um hotel em Porto Alegre, mas quem amealhou fortuna com a literatura foi o Coelho. Um tem inegável valor literário, outro tem desempenho de mercado. O José, aquele menino nota 10 na escola que mora embaixo de uma ponte da BR 116 (tema de reportagem da ZH) merece ser médico, sua sonhada profissão, mas provavelmente não o será, pois não terá condições para isto (rezo para estar errado neste caso). Na música popular nem é preciso exemplificar, a distância entre merecimento e desempenho de mercado é abismal. Então, neste mudo em que vivemos, valor e resultado, merecimento e desempenho nem sempre caminham juntos, e talvez raramente convirjam.
 
Mas a meritocracia exige medidas, e o merecimento, que é um juízo de valor subjetivo, não pode ser medido; portanto, o que se mede é o desempenho supondo-se que ele seja um indicador do merecimento, o que está longe de ser. Desta forma, no mundo da meritocracia – que mais deveria se chamar “desempenhocracia” - se confunde merecimento com desempenho, com larga vantagem para este último como medida de mérito.
 
e) A meritocracia escamoteia as reais operações de poder. Como avaliação e desempenho são cruciais na meritocracia, pois dão acesso a certas posições de poder e a recursos, tanto os indicadores de avaliação como os meios que levam a bons desempenhos são moldados por relações de poder; e o são decisivamente. Seria ingênuo supor o contrário. Assim, os critérios de avaliação que ranqueiam os cursos de pós-graduação no país são pautados pelas correntes mais poderosas do meio acadêmico e científico; bons desempenhos no mercado literário são produzidos não só por uma boa literatura, mas por grandes investimentos em marketing; grandes sucessos no meio musical são conseguidos, dentre outras formas, “promovendo” as músicas nas rádios e em programas de televisão, e assim por diante. Os poderes econômico e político, não raras vezes, estão por trás dos critérios avaliativos e dos “bons” desempenhos.
 
Critérios avaliativos e medidas de desempenho são moldáveis conforme os interesses dominantes, e os interesses são a razão de ser das operações de poder; que por sua vez, são a matéria prima de toda a atividade política. Então, por trás da cortina de fumaça da meritocracia repousa toda a estrutura de poder da sociedade.
 
Até aí tudo bem, isso ocorre na maioria dos sistemas políticos, econômicos e sociais. O problema é que, sob o manto da suposta “objetividade” dos critérios de avaliação e desempenho, a meritocracia esconde estas relações de poder, sugerindo uma sociedade tecnicamente organizada e isenta da ingerência política. Nada mais ilusório e nada mais perigoso, pois a pior política é aquela que despolitiza, e o pior poder, o mais difícil de enfrentar e de combater, é aquele que nega a si mesmo, que se oculta para não ser visto.
 
e) A meritocracia é a única ideologia que institui a desigualdade social com fundamentos “racionais”, e legitima pela razão toda a forma de dominação (talvez a mais insidiosa forma de legitimação da modernidade). A dominação e o poder ganham roupagens racionais, fundamentos científicos e bases de conhecimento, o que dá a eles uma aparente naturalidade e inquestionabilidade: é como se dominados e dominadores concordassem racionalmente sobre os termos da dominação.
 
f) A meritocracia substitui a racionalidade baseada nos valores, nos fins, pela racionalidade instrumental, baseada na adequação dos meios aos resultados esperados. Para a meritocracia não vale a pena ser o Quintana, não é racional, embora seus poemas fossem a própria exacerbação de si, de sua substância, de seus valores artísticos. Vale mais a pena ser o Paulo Coelho, a E.L. James, e fazer uma literatura calibrada para vender. Da mesma forma, muitos pais acham mais racional escolher a escola dos seus filhos não pelos fundamentos de conhecimento e valores que ela contém, mas pelo índice de aprovação no vestibular que ela apresenta. Estudantes geralmente não estudam para aprender, estudam para passar em provas. Cursos de pós-graduação e professores universitários não produzem conhecimentos e publicam artigos e livros para fazerem a diferença no mundo, para terem um significado na pesquisa e na vida intelectual do país, mas sim para engrossarem o seu Lattes e para ficarem bem ranqueados na CAPES e no CNPq.
 
A meritocracia exige uma complexa rede de avaliações objetivas para distribuir e justificar as pessoas nas diferentes posições de autoridade e poder na sociedade, e estas avaliações funcionam como guiões para as decisões e ações humanas. Assim, em uma sociedade meritocrática, a racionalidade dirige a ação para a escolha dos meios necessários para se ter um bom desempenho nestes processos avaliativos, ao invés de dirigi-la para valores, princípios ou convicções pessoais e sociais.
 
g) Por fim, a meritocracia dilui toda a subjetividade e complexidade humana na ilusória e reducionista objetividade dos resultados e do desempenho. O verso “cada um de nós é um universo” do Raul Seixas – pérola da concepção subjetiva e complexa do humano - é uma verdadeira aberração para a meritocracia: para ela, cada um de nós é apenas um ponto em uma escala de valor, e a posição e o valor que cada um ocupa nesta escala depende de processos objetivos de avaliação. A posição e o valor de uma obra literária se mede pelo número de exemplares vendidos, de um aluno pela nota na prova, de uma escola pelo ranking no Ideb, de uma pessoa pelo sucesso profissional, pelo contracheque, de um curso de pós-graduação pela nota da CAPES, e assim por diante. Embora a natureza humana seja subjetiva e complexa e suas interações sociais sejam intersubjetivas, na meritocracia não há espaço para a subjetividade nem para a complexidade e, sendo assim, lamentavelmente, há muito pouco espaço para o próprio ser humano. Desta forma, a meritocracia destrói o espaço do humano na sociedade.
 
Enfim, a meritocracia é um dos fundamentos de ordenamento social mais reacionários que existe, com potencial para produzir verdadeiros abismos sociais e humanos. Assim, embora eu tenda a concordar com a tese da Marilena Chauí sobre a classe média brasileira, proponho aqui uma troca de alvo. Bradar contra a classe média, além de antipático pode parecer inútil, pois ninguém abandona a sua condição social apenas para escapar ao seu estereótipo. Não se muda a posição política de alguém atacando a sua condição de classe, e sim os conceitos que fundamentam a sua ideologia.
 

Então, prefiro combater conceitos, neste caso, provavelmente o conceito mais arraigado na classe média brasileira, e que a faz ser o que é: a meritocracia.
*Turquinho

INFLUÊNCIA GLOBAL: O MUNDO CHINÊS


O mapa mostra como a China (azul) está dominando o comércio mundial. De vermelho os países dos quais a China é o principal parceiro comercial. Isto inclui boa parte dos países da Ásia, assim como o Brasil e o Chile, que são exportadores de commodities. De laranja, os países onde a China é o segundo parceiro comercial. E amarelo os países dos quais a China não é o principal ou segundo parceiro. (Fonte: aqui).


O gráfico mostra que em 2013 o PIB da China ultrapassou o dos EUA, conforme se vê aqui. (Refiro-me ao PIB sob o critério de fluxo comercial global, não ao PIB per capita ou PIB nominal).
*dodómacedo

Snowden confirma entrevista a blogueiros


Por Miguel do Rosário, no blog O Cafezinho:

O homem-bomba do serviço secreto norte-americano, o homem que revelou ao mundo que os EUA espionam até celulares pessoais de presidentes de nações amigas, que devassava os computadores da nossa Petrobrás à procura de informações vitais à economia brasileira, aceitou dar uma entrevista a blogueiros, tuiteiros e ativistas digitais do Brasil.


E não é para qualquer blogueiro (o que incluiria Noblat e Reinaldo Azevedo), mas para o campo de esquerda, progressista, que foi quem construiu a entrevista. A abordagem foi feita através do jornalista Glenn Greenwald, que vive no Rio de Janeiro, que encaminhará as nossas perguntas.

Você também pode participar, comentando no seguinte espaço, criado por um amigo, Adriano Ribeiro, um baiano residente em Porto Alegre:http://www.noticiasdablogosfera.com.br/

A decisão de Snowden e Glenn Greenwald nasceu da constatação de que um indivíduo como Snowden não pode se comunicar com a sociedade brasileira apenas via Rede Globo, uma empresa que é praticamente um braço dos interesses norte-americanos no país, que se consolidou aqui com dinheiro norte-americano e que recebeu milhões de dólares para dar o golpe de Estado pró-americano de 1964.

Snowden está hoje asilado na Rússia. Recentemente ele deu declarações de que gostaria de receber asilo permanente na Alemanha ou no Brasil. Por se tratar de uma operação diplomática de alto risco político, é importante que o assunto seja discutido de forma ampla e transparente pela sociedade brasileira. Há o risco ainda, natural, de que uma ação desse tipo, por causa de suas fortes implicações políticas, possa ser usada eleitoralmente pela oposição, com vistas a desgastar a presidente. O que seria irônico e cínico ao mesmo tempo, visto que seus adversários estão posicionados à direita do espectro ideológico e, portanto, mais próximos dos Estados Unidos.

Em caso de vitória da oposição, Snowden, se estivesse no Brasil, sofreria risco de ser deportado para os EUA, com a colaboração – covarde, como sempre – do Supremo Tribunal Federal. Nosso STF, se pensarmos bem, é historicamente covarde. Aceitou a deportação de Olga Prestes, aceitou o golpe de Estado, e agora aceitou o golpe midiático do mensalão.

De qualquer forma, é sempre um prazer falar com alguém tão corajoso e idealista como Edward Snowden, um homem à frente de seu tempo porque pensou antes na humanidade do que em sua segurança pessoal. Vamos ouvir o que ele tem a dizer!

***

Esta semana, eu me encontrei com David Miranda, parceiro de Greenwald, num café do Leblon, e trocamos ideias sobre a sua campanha para dar asilo a Snowden no país. Procurei lhe dar um panorama político da situação e alguns conselhos. Miranda vem construindo uma rede de articulações, inclusive internacionais, para ajudar Snowden não apenas a se manter em segurança, mas para ganhar mais liberdade para participar dos debates sobre privacidade, vigilância e a suposta guerra contra o terrorismo.

De Pelé a Joaquim Barbosa, é sempre a mesma história


Pelé e Xuxa, no passado
Pelé e Xuxa, no passado
Não é um assunto fácil de tratar.
Mas, ao mesmo tempo, não posso deixar de enfrentá-lo.
Começo, então, com uma digressão.
Uma das coisas notáveis que o ativista negro Malcom X fez pelo seu povo foi, em suas pregações, elevar-lhe a auto-estima.
Malcom X, com seu poder retórico extraordinário, dizia aos que o ouviam que deviam se orgulhar de sua aparência.
Os lábios grossos de vocês são lindos, bem como o cabelo crespo, bem como as narinas dilatadas – bem como, sobretudo, a cor de sua pele.
Os negros americanos tinham sido habituados a se envergonhar de sua aparência, e a buscar tudo que fosse possível para aproximá-la da dos brancos.
O próprio Malcom X, na juventude, alisou os cabelos.
Não foi por vaidade que um dos seguidores de Malcom X, Muhammad Ali, dizia que era o homem mais bonito do mundo. Ali estava na verdade dizendo aos negros que eles eram bonitos.
Ali casou algumas vezes, sempre com negras. Era mais uma maneira de sublinhar a beleza dos negros. Se Ali, no apogeu, tivesse casado com uma loira a mensagem não poderia ser pior.
JB e namorada, no presente
JB e namorada, no presente
Pelé, no Brasil, teve uma atitude bem diferente – e não apenas ele. Era como se na ascensão dos negros no Brasil estivesse incluída a mulher branca.
Falta de consciência? Alienação? Deslumbramento? Compensação? Alpinismo social? A resposta a esse fenômeno é, provavelmente, uma mistura de todos estes fatores.
Pelé casou com uma branca, Rose, há meio século. Depois, passou para uma Xuxa adolescente. É uma bênção para as negras brasileiras que seu orgulho nunca tenha estado na dependência de estímulos de celebridades como Pelé.
Quanto mudou o cenário nestes cinquenta anos fica claro quando se olha a fotografia da namorada de Joaquim Barbosa.
Não mudou nada.
Quando, algum tempo atrás, falaram que JB fora fotografado em Trancoso numa pizzaria com uma namorada, imediatamente pensei:  branca e com idade para ser sua filha.
Ao ver a foto, ali estava ela, exatamente como eu antecipara para mim mesmo.
Não sou tão inteligente assim. Mas observo as coisas.
Seria esperar demais que JB, por tudo que já mostrou, agisse diferentemente. Que estivesse mais para Ali do que para Pelé.
Os traços de personalidade já estavam claros. Numa entrevista à Veja, ele se gabou dos ternos de marca estrangeira que estão em seu guarda-roupa. Não é uma coisa pequena senão por ser grande na definição de caráter.
A partir desse tipo de coisa, você pode montar os dados básicos do perfil  da pessoa. Ou alguém imagina, para ficar num personagem dos nossos dias, um Pepe Mujica falando de grifes a repórteres?
De Pelé a JB, o Brasil sob certos aspectos marchou para o mesmo, mesmíssimo lugar.
Racismo não faltou, neste tempo todo. Faltou foi gente do calibre de Malcom X e de Muhammad Ali.
Paulo Nogueira
Sobre o Autor
O jornalista Paulo Nogueira é fundador e diretor editorial do site de notícias e análises Diário do Centro do Mundo.