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Ser de esquerda é não aceitar as injustiças, sejam elas quais forem, como um fato natural. É não calar diante da violação dos Direitos Humanos, em qualquer país e em qualquer momento. É questionar determinadas leis – porque a Justiça, muitas vezes, não anda de mãos dadas com o Direito; e entre um e outro, o homem de esquerda escolhe a justiça.
É ser guiado por uma permanente capacidade de se estarrecer e, com ela e por causa dela, não se acomodar, não se vender, não se deixar manipular ou seduzir pelo poder. É escolher o caminho mais justo, mesmo que seja cansativo demais, arriscado demais, distante demais. O homem de esquerda acredita que a vida pode e deve ser melhor e é isso, no fundo, que o move. Porque o homem de esquerda sabe que não é culpa do destino ou da vontade divina que um bilhão de pessoas, segundo dados da ONU, passe fome no mundo.
É caminhar junto aos marginalizados; é repartir aquilo que se tem e até mesmo aquilo que falta, sem sacrifício e sem estardalhaço. À direita, cabe a tarefa de dar o que sobra, em forma de esmola e de assistencialismo, com barulho e holofotes. Ser de esquerda é reconhecer no outro sua própria humanidade, principalmente quando o outro for completamente diferente. Os homens e mulheres de esquerda sabem que o destino de uma pessoa não deveria ser determinado por causa da raça, do gênero ou da religião.
Ser de esquerda é não se deixar seduzir pelo consumismo; é entender, como ensinou Milton Santos, que a felicidade está ancorada nos bens infinitos. É mergulhar, com alegria e inteireza, na luta por um mundo melhor e neste mergulho não se deixar contaminar pela arrogância, pelo rancor ou pela vaidade. É manter a coerência entre a palavra e a ação. É alimentar as dúvidas, para não cair no poço escuro das respostas fáceis, das certezas cômodas e caducas. Porém, o homem de esquerda não faz da dúvida o álibi para a indiferença. Ele nunca é indiferente. Ser de esquerda é saber que este “mundo melhor e possível” não se fará de punhos cerrados nem com gritos de guerra, mas será construído no dia-a-dia, nas pequenas e grandes obras e que, muitas vezes, é preciso comprar batalhas longas e desgastantes. Ser de esquerda é, na batalha, não usar os métodos do inimigo.
Fernando Evangelista

terça-feira, outubro 12, 2010

Israel declara-se estado nacionalista étnico

Onda fascista que assola o mundo


A onda fascista que assola o Brasil, pela mão do candidato de direita José Serra [PSDB-PIG], não é um "privilégio" só nosso. Outros países, na Europa "civilizada," que se tem na conta de democráticos, também abraçam, com entusiasmo, a via fascista.
E Israel, que se pretende o baluarte da democracia em meio às "ditaduras" do Oriente Médio, todas apoiadas pelos EUA, não fica atrás!



Israel declara-se estado nacionalista étnico
O gabinete de Israel aprovou projeto de lei que exige que pessoas que requeiram a cidadania israelense prestem um ‘juramento de lealdade’ a Israel definida como “estado judeu e democrático”. Atualmente, a exigência só afeta relativamente poucos, quase exclusivamente os palestinos que vivam fora de Israel, que casem com cidadãos palestino-israelenses e que desejem que a família viva do lado israelense da linha verde (hoje, podem fazê-lo). Mas o padrinho da ‘lei da lealdade’, Avigdor Lieberman (ex-crupiê de cassino, da Moldávia), deseja que o mesmo juramento, ou juramento ainda mais estrito seja imposto a todos os palestinos-israelenses – que são cerca de 20% da população de Israel.
Apoiadores do projeto, como o primeiro-ministro Binyamin Netanyahu, dizem que a definição de Israel como estado judeu democrático já existe na lei orgânica.
Mas líderes da comunidade palestino-israelense e membros do Parlamento denunciaram o projeto de lei, por racismo.
A expressão “judeu”, como marcador de identidade, tanto pode referir-se à religião quanto à etnia (em Israel, é judeu quem nasça de mãe judia). O traço de etnia é talvez o mais importante dos dois marcadores de identidade, porque um judeu praticante e cidadão israelense, se filho de mãe não judia, não terá papéis que o identifiquem como “judeu”.
O mais recente censo mostra que havia 7,2 milhões de israelenses, dos quais 5,5 milhões são judeus, 300 mil são não judeus e 1,4 milhões são árabes, ditos “palestinos-israelenses”. Os não judeus são, quase todos, filhos de famílias mistas nas quais a mãe não é judia. A maioria desses consideram-se judeus, e alguns lamentam não serem oficialmente reconhecidos como judeus. Nos 5,5 milhões de judeus, estpa incluído grande número de russos que não praticam o judaísmo, mas declaram-se ‘judeus étnicos’, por terem tido algum ancestral judeu – argumento que as autoridades israelenses aceitam sem qualquer investigação. (É ideia generalizada entre os intelectuais israelenses que bem poucos desses russos são judeus seja ‘religiosos’ seja ‘étnicos’.)
Parece bem evidente, pois, que a expressão “judeu”, no juramento de lealdade de Netanyahu não é um marcador religioso. Se fosse, muitos dos 300 mil não judeus seriam identificados como judeus nos documentos de identidade e muitos dos russos seriam definitivamente não judeus, o que facilmente se comprovaria pelo amor que manifestam a sanduíches de porco.
Não há dúvida de que alguma religião está incluída no pacote, é claro, porque em algum momento do passado as matriarcas que pariam judeus foram, sim, praticantes da religião dos judeus. No passado, a religião predominava sobre a etnia; hoje, pela lei israelense, a etnia predomina sobre a religião.
Mas exigir que alguém declare que Israel é “estado judeu democrático”, como condição para que receba a cidadania israelense, equivale a exigir que um indiano hindu que emigre para os EUA declare, para ser acolhido como cidadão, que os EUA são “estado branco, cristão e democrático”. Nessa fórmula, a etnia (brancos) estaria sendo adotada como critério privilegiado, definida em parte por haver ancestrais brancos, mesmo que fossem protestantes. (No início do século 20, juízes racistas decidiram que os indianos hindus poderiam ser considerados arianos porque falavam língua indo-europeia, mas nem por isso podiam ser considerados “brancos”.)
É óbvio que exigir que imigrantes africanos ou asiáticos, ou mesmo latinos, prestem aquele juramento, naqueles termos, como preço exigido pela cidadania israelense é discriminatório e racista, posto que o próprio juramento rouba-lhes a cidadania de primeira-classe.
Especialistas em teoria política distinguem entre o nacionalismo “cívico” – como há nos EUA e na França – e o nacionalismo “étnico”, mais comum na Europa Central no século 19. O nacionalismo cívico é baseado em ideais (respeito à Constituição dos EUA, por exemplo) e na história. Crispus Attucks, afro-americano, é considerado o primeiro mártir da independência dos EUA – o que consagra os ideais, não a etnia.
Há, contudo, algum racismo latente no nacionalismo dos EUA, pelo qual há quem creia que os “verdadeiros” norte-americanos seriam os protestantes brancos. O ideal do nacionalismo cívico, portanto, várias vezes aparece misturado com sentimentos de nacionalismo étnico. Ao longo do tempo, contudo, o nacionalismo cívico parece estar derrotando o nacionalismo étnico nas cortes de justiça – resultado, sim, de uma longa luta.
O nacionalismo étnico já produziu monstros como a Alemanha nazista e a Sérvia de Milosevic. Se a nação for definida por uma etnia dominante, cria-se a ideia de que quanto ‘mais pura’ a etnia dominante, mais direitos terá. O nacionalismo étnico também sempre gera confrontos contra outras etnias que vivam em áreas próximas (e se os casamentos interétnicos diluírem a etnia dominante?)
Em mundo global, com migração massiva de trabalhadores, o nacionalismo étnico é germe de guerras raciais.
Claro que, como historiador, rejeito completa e absolutamente a ideia de “raça”, da qual falavam os nacionalistas românticos do século 19. Brian Sykes descobriu, em pesquisa com o DNA mitocondrial dos europeus, que todas as mulheres apresentavam pelo menos um de sete pares de alelos nos cromossomas; e que os mesmos sete pares apareciam em todos os grupos nacionais e lingüísticos, inclusive, por exemplo, nos bascos, embora em diferentes proporções. Nesse sentido, os alemães são idênticos aos irlandeses e aos búlgaros. Vasta maioria de mulheres judias azquenazes têm os mesmos sete pares de alelos que se encontram nas mulheres palestinas. Todas, portanto, são descendentes de matriarcas ancestrais não judias.  
Não há raças. Todos os seres humanos são mestiços. Basta recuar 10, 12 mil anos, para encontrar um ancestral comum de todas as populações mediterrâneas. Escavações recentes em Roma, em camadas arqueológicas do tempo de Augusto, encontraram a ossada de um trabalhador chinês. Descobrir como chegou ao Império Romano é enredo para um romance. Mas, se aquele chinês algum dia deitou-se com mulher romana e nasceram-lhes filhos, praticamente todos os italianos hoje vivos são descendentes daquele casal e, pois, são primos de todos os chineses hoje vivos.
O nacionalismo étnico não é apenas intrinsecamente discriminatório: ele é sobretudo contrário a todas as evidências, é uma falsidade. Não há nem jamais houve raças.
Em Israel, o nacionalismo étnico sempre predominou, embora haja alguns traços do nacionalismo cívico na política israelense. Os palestinos-israelenses são cidadãos, votam, podem organizar-se em partidos políticos e podem eleger representantes ao Parlamento. Ao mesmo tempo, podem, também, ser sumariamente expulsos da sociedade e privados da cidadania. Seus direitos civis são frágeis e menos estáveis que os dos israelenses judeus.
Agora, Lieberman e Netanyahu, com a nova ‘lei da lealdade’, deslocaram a ênfase a favor do nacionalismo étnico, contra o nacionalismo cívico, garantindo aos judeus o posto de etnia privilegiada. Estão convencidos de que nada fizeram de extraordinário. E erram gravemente, se supõem que o que fizeram não terá consequências profundas. Sempre que, por vias políticas, se faz aumentar o peso da etnia contra o peso dos valores cívicos, as consequências são profundas.
É exatamente essa mudança de peso, a favor de uma etnia privilegiada, que políticos e líderes da comunidade dos palestinos-israelenses estão denunciando como política racista.
Vejo algum exagero em dizer que a ‘lei da lealdade’ converte Israel em estado de apartheid dentro dos limites da Linha Verde e suas 67 fronteiras. Os palestinos-israelenses são cidadãos, convivem com os judeus israelenses, frequentam as mesmas escolas, as mesmas universidades. Podem casar com judeus israelenses, em Israel ou em qualquer lugar do mundo. A ‘lei da lealdade’ não expande o apartheid para todo o estado de Israel, mas fortalece, sim, um nacionalismo étnico muito semelhante ao que se viu na Alemanha hitlerista ou na Sérvia. É escândalo e é vergonhoso que judeus, precisamente, acolham esse tipo de lei discriminatória e antidemocrática, da qual os próprios judeus foram as mais trágicas vítimas.
Há apartheid, sim, em Israel, mas contra os palestinos não-israelenses que vivem na Cisjordânia e em Gaza. Ali, sim, já se criaram bantustões, idênticos aos que se viram na África do Sul, criados pelos europeus, para manter cercados os africanos.
*Turquinho

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