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Ser de esquerda é não aceitar as injustiças, sejam elas quais forem, como um fato natural. É não calar diante da violação dos Direitos Humanos, em qualquer país e em qualquer momento. É questionar determinadas leis – porque a Justiça, muitas vezes, não anda de mãos dadas com o Direito; e entre um e outro, o homem de esquerda escolhe a justiça.
É ser guiado por uma permanente capacidade de se estarrecer e, com ela e por causa dela, não se acomodar, não se vender, não se deixar manipular ou seduzir pelo poder. É escolher o caminho mais justo, mesmo que seja cansativo demais, arriscado demais, distante demais. O homem de esquerda acredita que a vida pode e deve ser melhor e é isso, no fundo, que o move. Porque o homem de esquerda sabe que não é culpa do destino ou da vontade divina que um bilhão de pessoas, segundo dados da ONU, passe fome no mundo.
É caminhar junto aos marginalizados; é repartir aquilo que se tem e até mesmo aquilo que falta, sem sacrifício e sem estardalhaço. À direita, cabe a tarefa de dar o que sobra, em forma de esmola e de assistencialismo, com barulho e holofotes. Ser de esquerda é reconhecer no outro sua própria humanidade, principalmente quando o outro for completamente diferente. Os homens e mulheres de esquerda sabem que o destino de uma pessoa não deveria ser determinado por causa da raça, do gênero ou da religião.
Ser de esquerda é não se deixar seduzir pelo consumismo; é entender, como ensinou Milton Santos, que a felicidade está ancorada nos bens infinitos. É mergulhar, com alegria e inteireza, na luta por um mundo melhor e neste mergulho não se deixar contaminar pela arrogância, pelo rancor ou pela vaidade. É manter a coerência entre a palavra e a ação. É alimentar as dúvidas, para não cair no poço escuro das respostas fáceis, das certezas cômodas e caducas. Porém, o homem de esquerda não faz da dúvida o álibi para a indiferença. Ele nunca é indiferente. Ser de esquerda é saber que este “mundo melhor e possível” não se fará de punhos cerrados nem com gritos de guerra, mas será construído no dia-a-dia, nas pequenas e grandes obras e que, muitas vezes, é preciso comprar batalhas longas e desgastantes. Ser de esquerda é, na batalha, não usar os métodos do inimigo.
Fernando Evangelista

sábado, dezembro 05, 2015

Na origem dessa situação, que levou o país à recessão, está o senador Aécio Neves

Um tiro que pode sair pela culatra

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Parece surreal: um corrupto, com dinheiro suspeito em bancos suíços, acusado de receber propinas e sob investigação da Justiça ameaça uma pessoa trabalhadora, honesta, contra quem não existe nenhuma acusação. E, mais grave ainda, ele ameaça a própria democracia, com os aplausos e o apoio de uma oposição e uma mídia sem escrúpulos, sem dignidade e sem vergonha, descomprometidas com os interesses maiores do país. Apesar de ilógico, porém, isso não é ficção – é real mesmo. E está acontecendo no Brasil, onde o presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha, aceitou o pedido de impeachment da presidenta Dilma Roussef, sem qualquer base legal, movido apenas por vingança.
Na origem dessa situação, que levou o país à recessão, está o senador Aécio Neves e sua turma que, inconformados com a derrota nas eleições presidenciais de 2014, desde a divulgação do resultado do pleito vem criando toda sorte de dificuldades para o governo. “Não daremos trégua a Dilma” e “Vamos faze-la sangrar”, foram algumas das ameaças públicas que fizeram. E é precisamente esse senador, presidente nacional do PSDB, que tanto mal tem feito ao Brasil, que pretende governa-lo. Em recente encontro promovido pelo Democratas, aliás, ele já se apresentou, cinicamente, como o próximo Presidente da República, considerando que as eleições previstas para 2018 poderão ser antecipadas, em razão do eventual afastamento de Dilma.
A maior responsável por essa situação, no entanto, sem dúvida é a grande mídia, que não apenas deu a mais ampla cobertura às declarações e ações danosas do senador tucano e companhia como, também, manipulou e distorceu informações para desgastar o governo, ao mesmo tempo em que envenenou os brasileiros mais fracos do juízo contra a Presidenta e o PT, objetivando impedir o ex-presidente Lula de voltar ao Planalto. Esse clima de ódio, em que se movimenta a oposição e parte da população, se reflete nas redes sociais, onde são postados os mais absurdos comentários, além de mentiras que só merecem crédito dos tolos e rola-bostas, que as repassam como verdades, para alegria dos que estão empenhados em derrubar o governo.
Causa espanto o cinismo com que algumas figuras acusadas de corrupção e sob investigação fazem críticas à Presidenta e aplaudem o comportamento do presidente da Câmara dos Deputados, manifestando apoio ao impeachment, a começar pelos tucanos, que fingiram romper com ele para iludir os trouxas e agora comemoram a sua decisão. Tudo farinha do mesmo saco. Do ponto de vista legal a Presidenta está tranquila, conforme se observou no seu pronunciamento após a decisão de Cunha, pois é evidente que o Supremo Tribunal Federal, que é o guardião da Constituição, recolocará as coisas em seus devidos lugares. Resta saber, no entanto, qual será o parecer do ministro Gilmar Mendes, para quem foi distribuído o mandado de segurança impetrado por deputados petistas contra o impeachment. Ao que parece, colocaram-no numa tremenda saia justa, pois se manifestar-se politicamente e não juridicamente corre o risco de ser, mais uma vez, contrariado pelo plenário.
De qualquer modo, embora a muitos a admissibilidade do pedido de impeachment possa parecer um risco para o mandato de Dilma, na verdade foi a melhor coisa que poderia acontecer ao governo neste final de ano. Primeiro porque acabou aquele clima de tensão criado pela chantagem de Cunha, que há algum tempo deixou o país em suspenso, e, segundo, porque ele e os fingidores tucanos agora escancararam a trama, que vinha sendo urdida nos subterrâneos da Câmara. A partir desse episódio a posição de cada um dos participantes desta ópera bufa ficará bem clara para a população, com seus efeitos já sendo sentido nas eleições municipais do próximo ano. E o brasileiro sério e patriota, que não compactua com golpes, cerrará fileiras ao lado de Dilma.
Tudo leva a crer que, ao contrário do que supunham a oposição e a mídia, a Presidenta sairá fortalecida do episódio. As manifestações em defesa do seu mandato, que lhe foi outorgado legalmente por mais de 54 milhões de brasileiros, já começaram a eclodir em todo o território nacional, a começar pelos governadores nordestinos e pela CNBB. Entidades de classe de estudantes e trabalhadores também já se mobilizam para defender Dilma e a Nação dessa tentativa de golpe, cujas consequências são imprevisíveis. O tiro disparado por Cunha, portanto, com o dedo da oposição e da mídia também apertando o gatilho, deverá sair pela culatra. E as instituições também serão fortalecidas, o que significa que quem quiserconquistar o poder terá de fazê-lo dentro da Lei, através das urnas, em eleições livres e limpas.

E muita gente já se pergunta: e Cunha? Vai continuar presidindo o Poder Legislativo com todas as acusações que pesam sobre ele ou será cassado? Afinal, o que está faltando para defenestrar da Câmara dos Deputados figura tão cínica e maléfica ao país e ao seu povo? Resposta: vergonha na cara dos integrantes do Conselho de Ética. Se não tomarem rapidamente a decisão que o povo brasileiro espera aquela Casa de Leis, de tão caras tradições, estará desmoralizada. Neste caso, melhor seria “impichar” os seus membros e eleger pessoas realmente sérias, capazes de representar, efetivamente, os interesses do nosso povo.
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