- Divulgação
Foto
do documento de identidade do aposentado e ex-morador do Pinheirinho
Ivo Teles dos Santos, 70, morto no último dia 9; a Polícia Civil
investiga se a morte tem relação com supostas agressões que ele teria
sofrido de PMs durante a reintegração
O aposentado e ex-morador do Pinheirinho, Ivo Teles dos Santos, 70,
que ficou dois meses hospitalizado após a ação de reintegração de posse
da comunidade de São José dos Campos (97 km de São Paulo), morreu no
último dia 9, vítima de falência múltipla de órgãos.
Ele deu entrada no hospital municipal Dr. José Carvalho de Florence
no dia 22 de janeiro, em São José, horas depois do despejo. Lá, ficou
internado em coma até 22 de março, quando sua filha Ivanilda Jesus dos
Santos, 34, chegou da Bahia para retirá-lo. Até a morte, diz Ivanilda, o
aposentado permaneceu em estado vegetativo, sem se movimentar, nem
responder a qualquer estímulo.
A causa da morte do aposentado está sendo investigada pela delegacia
seccional de São José e é motivo de controvérsia: segundo o Condepe
(Conselho Estadual de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana), testemunhas
afirmaram a conselheiros do órgão que Santos foi hospitalizado após ser
agredido por policiais militares, com golpes de cassetetes na cabeça.
O defensor público Jairo Salvador diz que outras testemunhas
relataram a mesma versão em depoimento à Polícia Civil. Já segundo a
administração do hospital, Santos deu entrada na unidade com “quadro
confusional” e “crise hipertensiva” após sofrer um AVC hemorrágico,
diagnosticado após a realização de uma tomografia do crânio.
No dia da ação no Pinheirinho, o aposentado foi entrevistado por uma
repórter do jornal “O Vale”, de São José dos Campos, e afirmou: “Eles
vieram com muita violência para tirar a gente de casa. Eu reagi e eles
partiram para cima. Caí no chão e os três policiais continuaram a bater
com o cassetete em mim. Olha só como estou agora? Não consigo nem
andar.”
Santos morava sozinho em uma das áreas mais pobres do Pinheirinho,
conhecida como Cracolândia. A única pessoa próxima do aposentado no
município era a ex-mulher, Osorina Ferreira de Souza, também moradora da
comunidade, com quem Santos viveu por 20 anos.
Depois da reintegração, Osorina saiu à procura do ex-marido.
Encontrou-o apenas dias depois. Em 4 de fevereiro, acompanhada de
deputados estaduais e conselheiros do Condepe, solicitou ao hospital o
Boletim de Atendimento de Urgência (BAU), documento médico que atesta as
condições em que o paciente deu entrada no hospital.
Muitas barricadas foram levantadas no local e a população espera a
qualquer momento a chegada da tropa de choque para efetuar a
reintegração de posse. Segundo a prefeitura, são pelo menos 1.600
famílias em situação irregular, que já foram avisadas para deixar a área
invadida do bairro. A ordem da juíza da 6ª Vara Cível da cidade
revoltou os moradores. O bairro existe desde 2004 e reúne 5.500 pessoas
Mais Nilton Cardin/AE
A direção da unidade negou o documento, alegando que informações
sobre o paciente são sigilosas e só podem ser repassadas a familiares.
De acordo com o relatório do Condepe, integrantes do corpo de enfermagem
do hospital teriam informado à Osorina que a causa primária de
internação de seu ex-marido seriam as agressões que ele teria sofrido, e
não o AVC.
A filha do aposentado afirma que, quando o retirou do hospital, ele
estava com vários hematomas, cicatrizes e escoriações pelo corpo, além
de pontos na cabeça. A ela o hospital entregou a tomografia do crânio de
Santos e outros documentos, mas não forneceu o BAU. “Não me entregaram,
mas estou disposta a viajar para retirar. Esse documento é
fundamental”, afirma Ivanilda.
No dia 6 de fevereiro, segundo o Condepe, a versão do hospital e da
Secretaria Municipal de Saúde sobre o motivo da entrada do aposentado na
unidade foi registrada em boletim de ocorrência lavrado no 5º DP de São
José.
A PM nega que tenham ocorrido as agressões. A filha de Santos diz que
entregará todos os documentos médicos que recebeu para a defensoria.
O defensor público Jairo Salvador afirmou que, em posse dos
documentos, irá pedir um laudo do Instituto de Medicina de São Paulo. A
defensoria recebeu 586 ações individuais de moradores que sofreram
violência física e psicológicas ou perderam bens na ação. “É incrível a
simetria dos relatos. Ou houve uma histeria coletiva ou o que eles dizem
realmente aconteceu”, afirma o defensor.
A reportagem do
UOL não conseguiu localizar na seccional os responsáveis pela investigação.
História de Ivo Teles dos Santos
Após retirar o pai do hospital, Ivanilda ficou por uma semana na casa
de uma irmã no Itaim Paulista, no extremo leste da capital paulista. De
lá, foram para Ilhéus, no litoral sul baiano, onde ela trabalha como
camareira e vive com dois filhos. Ela conta que teve de abandonar o
emprego para cuidar do pai.
“Abandonei o trabalho para ficar em casa cuidando dele. Meu pai ficou
sem uma peça de roupa sequer, só com o roupão do hospital. Tive que
comprar. Ele usava fraldas, medicamentos… E não consegui retirar a
aposentadoria dele. Foi tudo com o meu dinheiro.”
Segundo Ivanilda, seu pai deixou Ilhéus no início da década de 80,
quando ela tinha apenas sete anos, para procurar emprego em São Paulo.
Antes de se aposentar, Santos fez vários bicos, trabalhou em uma empresa
que produzia antenas parabólicas e foi carpinteiro. Além de Ivanilda, o
aposentado têm outro filho, de 49 anos, que não foi registrado como seu
filho e mora no Rio de Janeiro.
A mãe de Santos ainda é viva. Ela tem 87 anos e também mora em
Ilhéus. A família tentou esconder dela o estado de saúde do aposentado,
mas foi inevitável. “Ela viu a situação que o filho ficou. Foi muito
dolorido para ela e para a família toda.”
Morre morador do Pinheirinho espancado pela polícia durante despejo
É a segunda morte causada diretamente pela ação da Polícia Militar durante desocupação em São José dos Campos (SP)
Da redação |
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O aposentado Ivo Teles dos Santos, morto no último dia 10
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• Morreu no dia 10 de abril em Ilhéus (BA) o ex-morador do
Pinheirinho, Ivo Teles dos Santos, de 70 anos, brutalmente espancado
durante o despejo realizado pela Polícia Militar na ocupação de São José
dos Campos (SP), no dia 22 de janeiro.
A agressão a Ivo, que era aposentado e morava sozinho em um barraco,
foi testemunhada por vários moradores. A própria vítima chegou a
denunciar o fato a um jornal local.
“Eles vieram com muita violência
para tirar a gente de casa. Eu reagi e eles partiram para cima. Caí no
chão e os três policiais continuaram a bater com o cacetete em mim, olha
só como estou agora? Não consigo nem andar”declarou Ivo ao jornal Bom Dia São José.
Algumas horas depois da agressão, o aposentado sumiu e foi dado como
desaparecido. Na ocasião, a Secretaria de Segurança Pública de São Paulo
chegou a emitir nota afirmando que ‘Santos está bem e já deu até
entrevistas depois da desocupação”.
Descobriu-mais tarde que, no mesmo dia da desocupação, Ivo Teles foi
hospitalizado. Após dias negando qualquer informação sobre o real estado
do paciente, a UTI do Hospital Municipal divulgou um sucinto relatório
afirmando que a razão da internação teria sido um “AVC”. Nada sobre os
hematomas das agressões.
Ivo Teles permaneceu internado até o dia 22 de março. No dia 28,
viajou a Ilheus, na Bahia, sua cidade natal, onde permaneceu sob os
cuidados da filha.
“A filha do senhor Ivo nos informou que lá em Ilheus ele já não falava, nem andava, e tinha dois grandes ferimentos na cabeça” , informa o advogado dos moradores, Toninho Ferreira.
“No
atestado de óbito consta apenas falência múltipla dos órgãos, mas não
temos dúvida de que a real causa de sua morte foi o espancamento que ele
sofreu da polícia“”, afirma
Segundo o advogado, essa foi a segunda morte causada diretamente pela
ação da PM durante a desocupação. “No dia do despejo, Antonio Dutra foi
atropelado por um carro que fugia do gás lacrimogêneo e os tiros de
borracha disparados pela polícia”, explica.
Situação caótica
Apesar de todas as promessas realizadas pelo governo, tanto municipal
quanto estadual ou Federal, os moradores do Pinheirinho continuam
sobrevivendo em condições precárias. Dependendo do parco aluguel social
da prefeitura, as famílias são obrigadas a se juntarem para conseguir
pagar o aluguel de uma casa, e vivem amontoadas. O caso de uma família
que vive em uma Brasília velha foi destaque recente na imprensa.
O movimento em defesa da moradia, porém, não terminou. Nesse dia 20
ocorre uma manifestação pública, às 9h em frente ao terreno do
Pinheirinho. Às 11h, as famílias se deslocam para a prefeitura, para
exigir o cumprimento das promessas, moradia e a desapropriação do
terreno do especulador Naji Nahas.
*DARdesentorpecendoarazão