Repressão de Pinochet era “propaganda comunista”, defendeu o Vaticano
“Propaganda comunista” e uma “mentira
descarada”. Foi nestes termos que o Vaticano rotulou as notícias, que
então corriam mundo, sobre os massacres cometidos durante o período que
se seguiu ao golpe militar que levou Pinochet ao poder no Chile, em
1973. A compreensão para com os golpistas é evidente na documentação
agora revelada pela Wikileaks.
João
Paulo II visitou, em 1987, o Chile, reunindo-se com Pinochet. O
encontro foi encarado universalmente como um apoio explícito à sangrenta
ditadura militar.
"Como é natural, infelizmente, após um
golpe de Estado é preciso admitir que houve derramamento de sangue nas
operações de limpeza no Chile", afirmou na época o monsenhor Giovanni
Benelli. Um mês após o golpe, em Outubro de 1973, este alto
representante do Vaticano expressava a "sua profunda preocupação, assim
como a do Papa, sobre uma campanha internacional esquerdista que
distorce completamente, e com êxito, a realidade da situação chilena".
Nos relatórios enviados pela embaixada
dos Estados Unidos no Vaticano, divulgados pela Wikileaks e publicados
na revista italiana L'Espresso e no jornal La Repubblica, pode ler-se
que "Benelli rotulou a cobertura dos acontecimentos como a de maior
sucesso da propaganda comunista" e como o prelado se mostrava preocupado
com a forma "como os comunistas poderão influenciar os meios de
comunicação do mundo livre no futuro".
"As histórias dos meios de comunicação
internacionais que falam de uma repressão brutal no Chile não têm
fundamento", afirmou o diplomata do Vaticano, apelidando mesmo de
“mentira descarada” as notícias que davam conta de uma onda de detenções
ilegais um pouco por todo o Chile.
A eleição do mais recente Papa fez
saltar para as primeiras páginas dos jornais a relação da hierarquia
católica com as sangrentas ditaduras militares que tomaram conta dos
países da América latina nos anos 70 e 80 do século passado.
Giovanni Benelli, que nos anos seguintes
ao golpe chileno chegou a cardeal e foi mesmo apontado publicamente
como um dos possíveis nomes para suceder a Paulo VI, garantia aos
Estados Unidos da América que a junta militar "estava a fazer tudo o que
é possível para que a situação se normalize".
Correspondência posterior sustenta que,
três anos passados sobre o golpe militar, o cardeal já forneceu ao Papa
"uma visão bastante pessimista" da situação no Chile e advertiu que
Pinochet costumava acusar outros membros da junta militar pela violência
e repressão.
"O cardeal e o Vaticano acreditam que se
trata de um estratagema cínico para se livrar da própria culpa”, pode
ler-se. Certo é que a Igreja Católica nunca criticou, nem
implicitamente, a sangrenta ditadura militar nem o Vaticano cortou as
suas relações diplomáticas com o Chile.
Na fase final do regime de Pinochet, em
Abril de 1987, João Paulo II efetuou uma visita ao Chile, durante a qual
se reuniu com o ditador. Encarada como um apoio explícito e a bênção
do Vaticano ao regime ditatorial, esta visita oficial foi duramente criticada por vários setores católicos.
A Igreja Católica chilena respondeu,
esta segunda-feira, defendendo que o Vaticano sempre defendeu e apoiou
as vítimas da ditadura e que a correspondência agora revelada foi
enviada nos primeiros momentos da ditadura, quando ainda não era
possível aferir a real dimensão e extensão da repressão.
*cappacete
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