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Ser de esquerda é não aceitar as injustiças, sejam elas quais forem, como um fato natural. É não calar diante da violação dos Direitos Humanos, em qualquer país e em qualquer momento. É questionar determinadas leis – porque a Justiça, muitas vezes, não anda de mãos dadas com o Direito; e entre um e outro, o homem de esquerda escolhe a justiça.
É ser guiado por uma permanente capacidade de se estarrecer e, com ela e por causa dela, não se acomodar, não se vender, não se deixar manipular ou seduzir pelo poder. É escolher o caminho mais justo, mesmo que seja cansativo demais, arriscado demais, distante demais. O homem de esquerda acredita que a vida pode e deve ser melhor e é isso, no fundo, que o move. Porque o homem de esquerda sabe que não é culpa do destino ou da vontade divina que um bilhão de pessoas, segundo dados da ONU, passe fome no mundo.
É caminhar junto aos marginalizados; é repartir aquilo que se tem e até mesmo aquilo que falta, sem sacrifício e sem estardalhaço. À direita, cabe a tarefa de dar o que sobra, em forma de esmola e de assistencialismo, com barulho e holofotes. Ser de esquerda é reconhecer no outro sua própria humanidade, principalmente quando o outro for completamente diferente. Os homens e mulheres de esquerda sabem que o destino de uma pessoa não deveria ser determinado por causa da raça, do gênero ou da religião.
Ser de esquerda é não se deixar seduzir pelo consumismo; é entender, como ensinou Milton Santos, que a felicidade está ancorada nos bens infinitos. É mergulhar, com alegria e inteireza, na luta por um mundo melhor e neste mergulho não se deixar contaminar pela arrogância, pelo rancor ou pela vaidade. É manter a coerência entre a palavra e a ação. É alimentar as dúvidas, para não cair no poço escuro das respostas fáceis, das certezas cômodas e caducas. Porém, o homem de esquerda não faz da dúvida o álibi para a indiferença. Ele nunca é indiferente. Ser de esquerda é saber que este “mundo melhor e possível” não se fará de punhos cerrados nem com gritos de guerra, mas será construído no dia-a-dia, nas pequenas e grandes obras e que, muitas vezes, é preciso comprar batalhas longas e desgastantes. Ser de esquerda é, na batalha, não usar os métodos do inimigo.
Fernando Evangelista

terça-feira, abril 09, 2013

Repressão de Pinochet era “propaganda comunista”, defendeu o Vaticano

 

 




“Propaganda comunista” e uma “mentira descarada”. Foi nestes termos que o Vaticano rotulou as notícias, que então corriam mundo, sobre os massacres cometidos durante o período que se seguiu ao golpe militar que levou Pinochet ao poder no Chile, em 1973. A compreensão para com os golpistas é evidente na documentação agora revelada pela Wikileaks.

Repressão de Pinochet era “propaganda comunista”, defendeu o Vaticano
João Paulo II visitou, em 1987, o Chile, reunindo-se com Pinochet. O encontro foi encarado universalmente como um apoio explícito à sangrenta ditadura militar.
"Como é natural, infelizmente, após um golpe de Estado é preciso admitir que houve derramamento de sangue nas operações de limpeza no Chile", afirmou na época o monsenhor Giovanni Benelli. Um mês após o golpe, em Outubro de 1973, este alto representante do Vaticano expressava a "sua profunda preocupação, assim como a do Papa, sobre uma campanha internacional esquerdista que distorce completamente, e com êxito, a realidade da situação chilena".
Nos relatórios enviados pela embaixada dos Estados Unidos no Vaticano, divulgados pela Wikileaks e publicados na revista italiana L'Espresso e no jornal La Repubblica, pode ler-se que "Benelli rotulou a cobertura dos acontecimentos como a de maior sucesso da propaganda comunista" e como o prelado se mostrava preocupado com a forma "como os comunistas poderão influenciar os meios de comunicação do mundo livre no futuro".
"As histórias dos meios de comunicação internacionais que falam de uma repressão brutal no Chile não têm fundamento", afirmou o diplomata do Vaticano, apelidando mesmo de “mentira descarada” as notícias que davam conta de uma onda de detenções ilegais um pouco por todo o Chile.
A eleição do mais recente Papa fez saltar para as primeiras páginas dos jornais a relação da hierarquia católica com as sangrentas ditaduras militares que tomaram conta dos países da América latina nos anos 70 e 80 do século passado.
Giovanni Benelli, que nos anos seguintes ao golpe chileno chegou a cardeal e foi mesmo apontado publicamente como um dos possíveis nomes para suceder a Paulo VI, garantia aos Estados Unidos da América que a junta militar "estava a fazer tudo o que é possível para que a situação se normalize".
Correspondência posterior sustenta que, três anos passados sobre o golpe militar, o cardeal já forneceu ao Papa "uma visão bastante pessimista" da situação no Chile e advertiu que Pinochet costumava acusar outros membros da junta militar pela violência e repressão.
"O cardeal e o Vaticano acreditam que se trata de um estratagema cínico para se livrar da própria culpa”, pode ler-se. Certo é que a Igreja Católica nunca criticou, nem implicitamente, a sangrenta ditadura militar nem o Vaticano cortou as suas relações diplomáticas com o Chile.
Na fase final do regime de Pinochet, em Abril de 1987, João Paulo II efetuou uma visita ao Chile, durante a qual se reuniu com o ditador. Encarada como um apoio explícito e a bênção do Vaticano ao regime ditatorial,  esta visita oficial foi duramente criticada por vários setores católicos.
A Igreja Católica chilena respondeu, esta segunda-feira, defendendo que o Vaticano  sempre defendeu e apoiou as vítimas da ditadura e que a correspondência agora revelada foi enviada nos primeiros momentos da ditadura, quando ainda não era possível aferir a real dimensão e extensão da repressão.
*cappacete

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