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Ser de esquerda é não aceitar as injustiças, sejam elas quais forem, como um fato natural. É não calar diante da violação dos Direitos Humanos, em qualquer país e em qualquer momento. É questionar determinadas leis – porque a Justiça, muitas vezes, não anda de mãos dadas com o Direito; e entre um e outro, o homem de esquerda escolhe a justiça.
É ser guiado por uma permanente capacidade de se estarrecer e, com ela e por causa dela, não se acomodar, não se vender, não se deixar manipular ou seduzir pelo poder. É escolher o caminho mais justo, mesmo que seja cansativo demais, arriscado demais, distante demais. O homem de esquerda acredita que a vida pode e deve ser melhor e é isso, no fundo, que o move. Porque o homem de esquerda sabe que não é culpa do destino ou da vontade divina que um bilhão de pessoas, segundo dados da ONU, passe fome no mundo.
É caminhar junto aos marginalizados; é repartir aquilo que se tem e até mesmo aquilo que falta, sem sacrifício e sem estardalhaço. À direita, cabe a tarefa de dar o que sobra, em forma de esmola e de assistencialismo, com barulho e holofotes. Ser de esquerda é reconhecer no outro sua própria humanidade, principalmente quando o outro for completamente diferente. Os homens e mulheres de esquerda sabem que o destino de uma pessoa não deveria ser determinado por causa da raça, do gênero ou da religião.
Ser de esquerda é não se deixar seduzir pelo consumismo; é entender, como ensinou Milton Santos, que a felicidade está ancorada nos bens infinitos. É mergulhar, com alegria e inteireza, na luta por um mundo melhor e neste mergulho não se deixar contaminar pela arrogância, pelo rancor ou pela vaidade. É manter a coerência entre a palavra e a ação. É alimentar as dúvidas, para não cair no poço escuro das respostas fáceis, das certezas cômodas e caducas. Porém, o homem de esquerda não faz da dúvida o álibi para a indiferença. Ele nunca é indiferente. Ser de esquerda é saber que este “mundo melhor e possível” não se fará de punhos cerrados nem com gritos de guerra, mas será construído no dia-a-dia, nas pequenas e grandes obras e que, muitas vezes, é preciso comprar batalhas longas e desgastantes. Ser de esquerda é, na batalha, não usar os métodos do inimigo.
Fernando Evangelista

sábado, junho 14, 2014

Ao contrário do que dizem os abutres, a cerimônia de abertura foi fantástica

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Foi lindo. Vou repetir: foi lindo.
Foi quase tudo certo, mas houve dois problemas. Um, o principal, é o olho atento dos abutres. Há pessoas que querem que dê errado, e isso nós já sabemos.
A Veja, descubro pelo Facebook, disse que a “imprensa internacional” detonou o espetáculo. Mesmo? BBC: “Copa começa com cerimônia colorida”; Guardian: “Torneio abre com música, paixão e J-Lo”; CNN: “exoesqueleto dá o primeiro chute na Copa do Mundo”.
Nem uma menção negativa nos melhores e mais relevantes sites do mundo. Mas não se poderia esperar outra coisa da Veja, claro.
Um outro olho de abutre se deu, como esperado, na Globo. E já quero deixar registrado que assistimos num local onde eu não tinha domínio sobre o canal que transmitiria.
Um estardalhaço diante de uma série de refletores que não acendeu. O que não disseram é que foram ligados com antecedência, antes de acabar a luz, justamente para prevenir um possível problema. Não houve absolutamente nenhuma interferência na partida.
A BBC, na cerimônia das Olimpíadas de Londres, não teria mostrado um defeito semelhante. Teria feito o oposto, em nome da festa.
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Mas sigamos.
O segundo problema foi o horário do espetáculo. A atmosfera é criada pela iluminação. Nina Dutra, que fez o design de luz do musical O Rei Leão, em São Paulo, usou exatamente essa frase hoje.
Quem já viu a diferença entre um desfile de carnaval durante a noite e depois, de manhã, sabe do que estou falando. Mesmo quem já assistiu a festivais de música em que a parte visual é muito menos importante do que num desfile ou num espetáculo desses, sabe.
A luz dá profundidade e foco. Você direciona os olhos, esconde cantos do palco sem uso.
Sem a luz, perdeu-se muito da emoção que o espetáculo poderia transmitir.
Eu, pessoalmente, achei uma aberração fazer a cerimônia de dia. Tinha que ser de noite de qualquer jeito.
Mas quanto ao espetáculo em si? Foi lindo. A parte mais fraca foi Pitbull, Jennifer Lopez e Claudia Leitte, basicamente porque a música é muito fraca. De resto, tudo lindo.
A maioria dos elementos mais relevantes da cultura brasileira estavam lá. O frevo, o samba, o axé.
A ciência e a tecnologia também estavam lá, representados no exoesqueleto que deu o chute inicial.
Mas isso a TV perdeu.
Bom, o problema da festa não foi a festa. Foram os infelizes que tentaram estragá-la – e que, ainda bem, não conseguiram.
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Sobre o Autor
Emir Ruivo é músico e produtor formado em Projeto Para Indústria Fonográfica na Point Blank London. Produziu algumas dezenas de álbuns e algumas centenas de singles. Com sua banda, Aurélios, possui dois álbuns lançados pela gravadora Atração. Seu último trabalho pode ser visto no seguinte endereço: http://www.youtube.com/watch?v=dFjmeJKiaWQ
*DCM

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