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Ser de esquerda é não aceitar as injustiças, sejam elas quais forem, como um fato natural. É não calar diante da violação dos Direitos Humanos, em qualquer país e em qualquer momento. É questionar determinadas leis – porque a Justiça, muitas vezes, não anda de mãos dadas com o Direito; e entre um e outro, o homem de esquerda escolhe a justiça.
É ser guiado por uma permanente capacidade de se estarrecer e, com ela e por causa dela, não se acomodar, não se vender, não se deixar manipular ou seduzir pelo poder. É escolher o caminho mais justo, mesmo que seja cansativo demais, arriscado demais, distante demais. O homem de esquerda acredita que a vida pode e deve ser melhor e é isso, no fundo, que o move. Porque o homem de esquerda sabe que não é culpa do destino ou da vontade divina que um bilhão de pessoas, segundo dados da ONU, passe fome no mundo.
É caminhar junto aos marginalizados; é repartir aquilo que se tem e até mesmo aquilo que falta, sem sacrifício e sem estardalhaço. À direita, cabe a tarefa de dar o que sobra, em forma de esmola e de assistencialismo, com barulho e holofotes. Ser de esquerda é reconhecer no outro sua própria humanidade, principalmente quando o outro for completamente diferente. Os homens e mulheres de esquerda sabem que o destino de uma pessoa não deveria ser determinado por causa da raça, do gênero ou da religião.
Ser de esquerda é não se deixar seduzir pelo consumismo; é entender, como ensinou Milton Santos, que a felicidade está ancorada nos bens infinitos. É mergulhar, com alegria e inteireza, na luta por um mundo melhor e neste mergulho não se deixar contaminar pela arrogância, pelo rancor ou pela vaidade. É manter a coerência entre a palavra e a ação. É alimentar as dúvidas, para não cair no poço escuro das respostas fáceis, das certezas cômodas e caducas. Porém, o homem de esquerda não faz da dúvida o álibi para a indiferença. Ele nunca é indiferente. Ser de esquerda é saber que este “mundo melhor e possível” não se fará de punhos cerrados nem com gritos de guerra, mas será construído no dia-a-dia, nas pequenas e grandes obras e que, muitas vezes, é preciso comprar batalhas longas e desgastantes. Ser de esquerda é, na batalha, não usar os métodos do inimigo.
Fernando Evangelista

domingo, dezembro 23, 2012

Bancadas religiosas: Quando o pior é possível!

Nossos Tons

Por: Julio Marinho

O casamento entre pessoas do mesmo sexo é uma questão de direitos humanos e direitos civis, ponto. Ou somos todos iguais ou não somos. Entretanto, as bancadas religiosas do Congresso nacional fazem todo o possível para nos fazer acreditar que existe um "meio-termo" de igualdade. Assim, essa horda de desqualificados políticos e pseudo-detentores da moral e dos bons costumes alheios, continua sua saga obscurantista e fundamentalista, já que, a única coisa que pretendem é obrigar toda a sociedade a viver segundo seus dogmas, crenças e regras. Aliás, regras essas que eles mesmos não seguem. Mas isso nem chega a ser uma novidade, afinal de contas, fundamentalistas têm horror às diferenças, temem a liberdade e parecem não compreender o mundo lá fora.


A imposição de uma fé como oficial e a consequente exclusão das outras (inclusive com perseguições declaradas) deixou seu rastro perverso no passado. No presente, muitos conflitos continuam sendo alimentados a partir de convicções ou sob a justificativa de crença. Mas, um Estado Democrático de Direito não pode permitir que se perpetue em seu seio uma voz exclusiva da moral de qualquer religião, pelo menos não em um país que se diz LAICO.

Então como explicar a luta ferrenha e constante desses setores religiosos na negação dos direitos civis (principalmente o casamento igualitário) dos cidadãos LGBT's? Não vemos tanto empenho em questões como o trabalho escravo, o trabalho infantil, a exploração sexual de crianças e adolescentes, a falta de infraestrutura na educação e saúde, a falta de saneamento básico em TODOS os Municípios brasileiros, o caos do transporte público etc. A sensação que fica é de que, a única coisa importante para a trupe dos farsantes da fé, é se certificar de que os homossexuais jamais conquistem o direito ao casamento civil e, consequentemente, tenham assegurados os seus direitos como qualquer outro cidadão. Aliás, esses cidadãos, que veem diariamente seus direitos sendo vilipendiados, pagam seus impostos e, já que têm os mesmos deveres, deveriam, teoricamente, gozar dos mesmos direitos.

O discurso implícito é algo como: o mundo tal como existe, normal e regular, é um mundo de homens e mulheres heterossexuais, pontilhado por alguns que não o são, e em relação aos quais se deve promover um arremedo de "aceitação" e "tolerância", ou seja: aceitamos e toleramos que existam, qualquer coisa a partir dai já se constituí em um "privilégio". Tudo isso acontece sob o olhar pachorrento e complacente do Estado. Uma interiorizada e inconsciente(?) miopia típica de quem, mesmo sendo "laico", se situa, afinal de contas, na heteronormatividade. E por quê? Por causa da pressão do lobby católico/evangélico versão fundamentalista?

Já vimos esse filme antes e sabemos muito bem qual é o trágico final. Num passado, não muito remoto, essas religiões impuseram um estado de terror e perseguição que agora se repete. A diferença fica apenas por conta dos personagens. Se antes também perseguiam índios, negros, mulheres e infiéis, agora o foco são os LGBT's. Exemplos é que não nos faltam. 

O documento oficial "Dum Diversas" (publicado em 18 de Junho de 1452 pelo Papa Nicolau V), é um belo exemplo de como os religiosos "amavam" seus semelhantes. "[...] nós lhe concedemos, por estes documentos, com nossa Autoridade Apostólica, plena e livre permissão de invadir, buscar, capturar e subjugar os sarracenos e pagãos e quaisquer outros incrédulos e inimigos de Cristo, onde quer que estejam, como também seus reinos, ducados, condados, principados e outras propriedades [...] e reduzir suas pessoas à perpétua escravidão [...]."
Lembrem-se que essas declarações pareciam bem razoáveis na época e, mesmo que a igreja tenha vindo a público pedir desculpas por essas barbaridades, hoje o Papa Bento XVI é capaz de dizer, sem o menor constrangimento, que o casamento entre pessoas do mesmo sexo é capaz de ameaçar a paz mundial. "[...] as tentativas de casamento entre um homem e uma mulher [...] juridicamente equivalentes a formas radicalmente diferentes de união, são um atentado contra a verdade da pessoa humana e uma ferida grave infligida à justiça e à paz. [...] O casamento deve ser protegido e reconhecido como uma união entre um homem e uma mulher", considerando que os casamentos homossexuais "prejudicam" e "contribuem para a sua desestabilização [do casamento heterossexual] obscurecendo o seu caráter especial e o seu papel social insubstituível". Essas declarações, provavelmente, serão alvo de um novo pedido de desculpas no futuro. Repetindo assim o que já fizeram em relação aos julgamentos sumários, às conversões forçadas e às fogueiras nas quais eram queimados os acusados de heresia pelos abusos sexuais cometidos por padres pedófilos, pelos abusos cometidos contra os índios durante o período colonial, pela escravidão dos povos afro-descendentes (negros) que aqui sofreram massacre e desrespeito às suas culturas, pela campanha de depreciação contra o povo judeu e, de certa forma, pelo papel ambíguo da Santa Sé durante a perseguição nazista aos judeushomossexuaisnegrosciganos, doentes mentais, deficientes motores, comunistas etc., na II Guerra Mundial, só para citar alguns exemplos.

E por falar em nazismo, aqui temos um ótimo exemplo de até que ponto pode chegar o fanatismo  religioso. Esse trecho, retirado do Discurso no Reichstag, 1936, de Adolf Hitler, é bem revelador: "Por isso, estou convencido de que estou agindo como o agente do nosso Criador. Lutando contra os judeus, eu estou fazendo o trabalho do Senhor. [...] Eu acredito, hoje, que estou agindo em harmonia com o todo poderoso Criador. Exterminando os judeus, estou lutando pelo trabalho do Senhor". As palavras de Adolf Hitler ficaram gravadas na história. Ele fez o que fez porque acreditava que a fé era mais forte do que a razão, acreditava que a aceitação cega de um crença ou dogma tinha mais valor do que uma investigação baseada na razão e na lógica. Exatamente como ainda fazem hoje, outros fanáticos religiosos.

"Os caras na Parada Gay ridicularizaram símbolos da Igreja Católica e ninguém fala nada. É pra Igreja Católica 'entrar de pau' em cima desses caras, sabe? 'Baixar o porrete' em cima pra esses caras aprender (sic). É uma vergonha". (Pastor silas malafaia)
Já imaginou uma bancada cristã publicando algo assim? Pois o que pretendem fazer hoje é exatamente o mesmo que já fizeram no passado, ou seja, a imposição de seus dogmas e crenças. Levando-se em conta, é claro, a ótica da perseguição e o controle perverso das liberdades, existem muitas semelhanças entre o que era dito no passado, e o que dizem hoje nossos congressistas.

"Todos os dias da minha vida pregarei o que diz a Palavra, que a prática do ato íntimo entre dois homens ou duas mulheres é e continuará sendo pecado e ponto. Não discuto o que é pregado no púlpito fora do momento da pregação". "Me apavora chegar em Brasília toda terça-feira [...] e saber como o diabo está infiltrado no governo brasileiro. E não é só no governo brasileiro, é no governo do mundo. Satanás tem levantado homens e mulheres e a Igreja não tem se atinado a isso [...] satanás levantou seu ativismo neste país. Senhoras e senhores, existe um ativismo de satanás contra a santidade da família brasileira [...] Eu fui prestar agora um serviço à nação brasileira, levantei um plebiscito e precisava do apoiamento de 1/3 da casa [...] Queremos saber se a nação brasileira aprova a união de dois homens e de duas mulheres que estão aí à torto e a direito difamando aquilo que é sagrado e santo. Imaginem vocês -  a causa é boa, sim ou não?". "A AIDS é uma doença gay. A AIDS é uma doença que veio desse povo, mas se você falar, vai colocar eles numa situação constrangedora não vão conseguir verba". "Vamos agarrar o diabo pelos chifres e esfregar a cara dele no chão. É hora de se levantar". (Marcos Feliciano, pastor e deputado federal)

"Estou me lixando para esse pessoal aí [do movimento gay]. O que esse pessoal tem a oferecer para a sociedade? Casamento gay? Adoção de filhos? Dizer para vocês que são jovens que, no dia em que vocês tiverem um filho, se for gay, é legal e vai ser o 'uhuhu' da família? Esse pessoal não tem nada a oferecer". (Deputado federal Jair Bolsonaro)

"Não sou preconceituosa e não discrimino. Só que eu tenho que ter o direito de não querer um homossexual como meu empregado, eventualmente". "Digamos que eu tenha duas meninas em casa e a minha babá é lésbica. Se a minha orientação sexual for contrária e eu quiser demiti-la, eu não posso". (Deputada estadual Myrian Rios)

"o projeto é um protesto contra os privilégios dados aos gays" (Vereador Carlos Apolinário ao aprovar a criação do Dia do Orgulho Heterossexual).

Enfim, a pergunta que fica é: Como o reconhecimento legal de um relacionamento amoroso de uma pessoa, que está comprometida com um parceiro do mesmo sexo, pode, de alguma forma, diminuir, comprometer ou ameaçar o casamento de outras pessoas de sexo diferente? 

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