A falência do nosso sistema judiciário: Supremas razões
Por Wálter Maierovitch
O Supremo Tribunal Federal (STF) continua a surpreender a sociedade civil e a mostrar a falência do nosso sistema de Justiça. Um sistema a favorecer poderosos e potentes e a criar o caldo multiplicador da burguesia mafiosa. Nesta semana, dois fatos chamaram a atenção e foram protagonizados pelos ministros Cezar Peluso e Ricardo Lewandowski, ambos do STF.
Por iniciativa de 2 milhões de cidadãos votantes logrou-se chegar à Lei da Ficha Limpa. Por essa lei, não podem concorrer às eleições os condenados criminalmente por órgão judiciário colegiado e os que renunciaram a mandato parlamentar para arquivar, por perda de objeto, processo de cassação por conduta indecorosa. Antes da Ficha Limpa, existia a norma constitucional, Art. 15, III, a estabelecer a perda de direitos políticos aos definitivamente condenados criminalmente e enquanto durassem os efeitos da decisão. Com a Ficha Limpa criou-se um mecanismo complementar e salutar à luz do interesse social.
Medidas cautelares são bem conhecidas no Direito positivo de Estados democráticos: prisão preventiva, separação de corpos, alimentos provisionais, afastamento jurisdicional de magistrados etc. Jader Barbalho, em 2001, renunciou ao mandato de senador para evitar a cassação e futura inelegibilidade. Em 2010, Barbalho concorreu, pelo PMDB, ao Senado pelo Pará e, com 1,8 milhão de votos, encabeçou a lista dos eleitos. Diante da Lei da Ficha Limpa, não teve a posse deferida e foi ao STF.
Como se sabe, o julgamento, com o ministro Joaquim Barbosa sorteado como relator, terminou empatado. À época, a Corte estava desfalcada em razão de vaga aberta pela aposentadoria da ministra Ellen Gracie. O ministro Cezar Peluso, consoante entendimento externado quando de anterior e célebre julgamento do ex-governador Joaquim Roriz, não quis, com relação a Barbalho, votar duas vezes. Voltou a entender inconstitucional prerrogativa do Regime Interno do STF que contempla o “voto de qualidade”, espécie de voto de Minerva. Em resumo, o processo de Barbalho ficou suspenso até a posse da nova ministra, a completar a composição do STF. Como o primeiro suplente de senador também estava impedido, assumiu Marinor Brito, do PSOL.
Poucos dias atrás, uma cúpula de caciques do PMDB marcou audiência com Peluso. Uma audiência precedida de telefonemas do vice-presidente Michel Temer e do presidente José Sarney, como revelou a Folha de S.Paulo. Temer e Sarney apoiaram a reivindicação a ser transmitida a Peluso no encontro com os senadores Renan Calheiros, Romero Jucá, Valdir Raupp e o deputado federal Henrique Eduardo Alves. Além do caso Jader Barbalho, foi tratada a questão do reajuste dos vencimentos dos ministros do STF e do funcionalismo do Judiciário, cujos processos legislativos estão em curso.
Na sessão de julgamento da quarta-feira 14, o ministro Peluso, com a ausência do relator Joaquim Barbosa em razão do seu crônico mal na coluna vertebral e ainda com a cadeira deixada vaga por Ellen Gracie, colocou em julgamento o caso de Barbalho, que não estava em pauta e se encontra suspenso. Peluso, quando da reunião com o vértice do PMDB, sugeriu a apresentação de uma petição com pedido de voto de qualidade (desempate).
O voto de qualidade de Peluso determinou a posse de Barbalho, com entendimento, já sufragado em outro caso, de inaplicável a Lei da Ficha Limpa às eleições de 2010. Quando se negou a dar voto de desempate nos autos do caso Roriz, o ministro Peluso afirmou, pela televisão e urbi et urbe, que só um déspota usaria do tal voto de qualidade.
A pressão do PMDB, a ameaça de atraso na aprovação da ministra indicada, a questão dos reajustes e o precedente de não se aplicar a Lei da Ficha Limpa às eleições de 2010 levaram, ao que parece, o ministro Peluso a praticar um ato despótico. E como um déspota esclarecido deu as costas para 2 milhões de cidadãos votantes que tomaram a iniciativa de propor cláusulas de barreira a candidatos. Não se sabe qual seria o voto de Rosa Maria Weber, escolhida pela presidenta Dilma. Na Comissão de Justiça, ela não soube responder a questões sobre Direito Civil e Criminal, pois é especializada em Direito do Trabalho. Mas, comoprometeu que ia estudar e apreender (a esta altura do campeonato!), poderia chegar a uma conclusão diversa da posta por Peluso e em favor de Barbalho.
Por outro lado, coube ao ministro Lewandowski, em entrevista, alertar que o chamado “processo do mensalão” poderá findar sem julgamento do mérito, pela extinção de punibilidades em razão de prescrições de pretensões punitivas. Num sistema adequado de Justiça, jamais, em caso tão polêmico, se deixaria de apreciar o mérito, absolvendo-se ou condenando-se. O atraso, pelo decurso do tempo, leva à prescrição, pois não é justo a eternização de processos criminais. Mas o apelidado mensalão gerou processo de instância única, por força do princípio do foro privilegiado. Assim mesmo vai prescrever, como vaticinou Lewandowski. Para lembrar o canto de Moraes Moreira, “la vem o Brasil descendo a ladeira”.
Biliscado no Terra Brasilis.
O mau exemplo vem de cima:Ministro do Supremo teria se beneficiado ao paralisar inspeção do CNJ
Da Redação Sul 21
O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Ricardo Lewandowski, suspendeu inspeção feita pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) na folha de pagamento do Tribunal de Justiça de São Paulo. De acordo com matéria divulgada no jornal Folha de S. Paulo, a motivação da decisão pode ser viciada, já que o próprio Lewandowski recebeu os pagamentos sob investigação, feitos a todos os desembargadores na década de 90. Depois da divulgação da suspensão, até o presidente do STF, Cezar Peluso, emitiu uma nota para defender a decisão de Lewandowski.
O CNJ iniciou em novembro uma inspeção no TJ paulista para investigar pagamentos que magistrados teriam recebido indevidamente junto com seus salários e examinar a evolução patrimonial de alguns deles, que seria incompatível com sua renda. Um dos pagamentos que estão sendo examinados é associado à pendência salarial da década de 90, quando o auxílio moradia, que então era pago apenas a deputados e senadores, foi estendido a magistrados de todo o país.
Em São Paulo, 17 desembargadores receberam pagamentos individuais de quase R$ 1 milhão de uma só vez, e na frente de outros juízes que também tinham direito a diferenças. Tanto Peluso quanto Lewandowski afirmam ter recebido menos do que esse valor.
O próprio ministro Peluso — que, como Lewandowski, foi desembargador do TJ paulista — recebeu recursos no valor de R$ 700 mil. Peluso considera que, apesar dos recebimentos, nem ele nem Lewandowski estão impedidos de julgar ações sobre o tema porque os ministros do STF não se sujeitam ao CNJ.
Lewandowski afirmou, por meio de sua assessoria, que se lembra de ter recebido seu dinheiro em parcelas, como todos os outros. Ele também ressaltou que o próprio STF reconheceu que os desembargadores tinham direito à verba, que é declarada no Imposto de Renda.
A corregedoria tem deixado claro desde o início das inspeções que não está investigando ministros do STF, e sim procedimentos dos tribunais no pagamento dos passivos da década de 90. Ou seja, quem está sob investigação são os tribunais, e não os magistrados.
O órgão afirmou nesta terça-feira (20) ainda, por meio de nota, que não quebrou o sigilo dos juízes e informou que em suas inspeções “deve ter acesso aos dados relativos à declarações de bens e à folha de pagamento, como órgão de controle, assim como tem acesso o próprio tribunal”.
Liminar concedida na segunda-feira (19) pelo ministro Marco Aurélio Mello impede que o conselho investigue juízes antes que os tribunais onde eles atuam analisem sua conduta –o que, na prática, suspendeu todas as apurações abertas por iniciativa do CNJ.
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