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Ser de esquerda é não aceitar as injustiças, sejam elas quais forem, como um fato natural. É não calar diante da violação dos Direitos Humanos, em qualquer país e em qualquer momento. É questionar determinadas leis – porque a Justiça, muitas vezes, não anda de mãos dadas com o Direito; e entre um e outro, o homem de esquerda escolhe a justiça.
É ser guiado por uma permanente capacidade de se estarrecer e, com ela e por causa dela, não se acomodar, não se vender, não se deixar manipular ou seduzir pelo poder. É escolher o caminho mais justo, mesmo que seja cansativo demais, arriscado demais, distante demais. O homem de esquerda acredita que a vida pode e deve ser melhor e é isso, no fundo, que o move. Porque o homem de esquerda sabe que não é culpa do destino ou da vontade divina que um bilhão de pessoas, segundo dados da ONU, passe fome no mundo.
É caminhar junto aos marginalizados; é repartir aquilo que se tem e até mesmo aquilo que falta, sem sacrifício e sem estardalhaço. À direita, cabe a tarefa de dar o que sobra, em forma de esmola e de assistencialismo, com barulho e holofotes. Ser de esquerda é reconhecer no outro sua própria humanidade, principalmente quando o outro for completamente diferente. Os homens e mulheres de esquerda sabem que o destino de uma pessoa não deveria ser determinado por causa da raça, do gênero ou da religião.
Ser de esquerda é não se deixar seduzir pelo consumismo; é entender, como ensinou Milton Santos, que a felicidade está ancorada nos bens infinitos. É mergulhar, com alegria e inteireza, na luta por um mundo melhor e neste mergulho não se deixar contaminar pela arrogância, pelo rancor ou pela vaidade. É manter a coerência entre a palavra e a ação. É alimentar as dúvidas, para não cair no poço escuro das respostas fáceis, das certezas cômodas e caducas. Porém, o homem de esquerda não faz da dúvida o álibi para a indiferença. Ele nunca é indiferente. Ser de esquerda é saber que este “mundo melhor e possível” não se fará de punhos cerrados nem com gritos de guerra, mas será construído no dia-a-dia, nas pequenas e grandes obras e que, muitas vezes, é preciso comprar batalhas longas e desgastantes. Ser de esquerda é, na batalha, não usar os métodos do inimigo.
Fernando Evangelista

terça-feira, novembro 06, 2012

A crítica à religião como exercício democrático

por Paulo Jonas de Lima Piva

Discordo de Marx e me aproximo de Michel Onfray no seguinte ponto: discutir religião é importante, como é importante também posicionar-se criticamente em face da política, da economia, dos costumes e de tudo o que compõe o nosso cotidiano e, de modo direto e indireto, afeta nossas vidas. E discutir franca e abertamente, sem blindagens de temas ou censura de assuntos, afinal, por mais problemas que tenham, nossa sociedade norteia-se pelas luzes da racionalidade. Assim sendo, crítica à religião não é sinônimo de intolerância, tampouco faz do seu crítico necessariamente um fanático ou um religioso às avessas, como querem alguns religiosos incomodados com a discussão. A crítica à religião, ao contrário, é um exercício democrático, num certo sentido, uma necessidade da democracia, e, sobretudo, um direito dos que se interessam pela questão, uma vez que a democracia é o regime que tem na liberdade de pensamento e na garantia da pluralidade de crenças e descrenças as suas principais virtudes civilizatórias. E a ferramenta, terreno e limite para esse exercício é a argumentação, nem sempre agradável para um lado do debate. Já o valor nuclear desse debate será a capacidade de ouvir e conviver com a sua antítese, ou seja, ter estrutura psicológica para dialogar com o diferente, outro nome para "tolerância".

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