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Ser de esquerda é não aceitar as injustiças, sejam elas quais forem, como um fato natural. É não calar diante da violação dos Direitos Humanos, em qualquer país e em qualquer momento. É questionar determinadas leis – porque a Justiça, muitas vezes, não anda de mãos dadas com o Direito; e entre um e outro, o homem de esquerda escolhe a justiça.
É ser guiado por uma permanente capacidade de se estarrecer e, com ela e por causa dela, não se acomodar, não se vender, não se deixar manipular ou seduzir pelo poder. É escolher o caminho mais justo, mesmo que seja cansativo demais, arriscado demais, distante demais. O homem de esquerda acredita que a vida pode e deve ser melhor e é isso, no fundo, que o move. Porque o homem de esquerda sabe que não é culpa do destino ou da vontade divina que um bilhão de pessoas, segundo dados da ONU, passe fome no mundo.
É caminhar junto aos marginalizados; é repartir aquilo que se tem e até mesmo aquilo que falta, sem sacrifício e sem estardalhaço. À direita, cabe a tarefa de dar o que sobra, em forma de esmola e de assistencialismo, com barulho e holofotes. Ser de esquerda é reconhecer no outro sua própria humanidade, principalmente quando o outro for completamente diferente. Os homens e mulheres de esquerda sabem que o destino de uma pessoa não deveria ser determinado por causa da raça, do gênero ou da religião.
Ser de esquerda é não se deixar seduzir pelo consumismo; é entender, como ensinou Milton Santos, que a felicidade está ancorada nos bens infinitos. É mergulhar, com alegria e inteireza, na luta por um mundo melhor e neste mergulho não se deixar contaminar pela arrogância, pelo rancor ou pela vaidade. É manter a coerência entre a palavra e a ação. É alimentar as dúvidas, para não cair no poço escuro das respostas fáceis, das certezas cômodas e caducas. Porém, o homem de esquerda não faz da dúvida o álibi para a indiferença. Ele nunca é indiferente. Ser de esquerda é saber que este “mundo melhor e possível” não se fará de punhos cerrados nem com gritos de guerra, mas será construído no dia-a-dia, nas pequenas e grandes obras e que, muitas vezes, é preciso comprar batalhas longas e desgastantes. Ser de esquerda é, na batalha, não usar os métodos do inimigo.
Fernando Evangelista

quarta-feira, dezembro 31, 2014


agente da ditaduraO Ministério Público Federal (MPF) de São Paulo denunciou à Justiça Federal quatro agentes da ditadura militar pela tortura e assassinato do jornalista Luiz Eduardo da Rocha Merlino, em 19 de julho de 1971, nas dependências do DOI-Codi da capital paulista.
Os acusados são o ex-comandante do DOI, o famigerado coronel reformado do Exército Carlos Alberto Brilhante Ustra, o delegado aposentado Aparecido Laertes Calandra e o delegado da Polícia Civil de São Paulo Dirceu Gravina. Todos são denunciados por homicídio doloso qualificado (quando há intenção de matar). Segundo o MPF, os três, “com outras pessoas até agora não totalmente identificadas, mataram a vítima Luiz Eduardo da Rocha Merlino, por motivo torpe, com o emprego de tortura e por meio de recurso que impossibilitou a defesa do ofendido”. Além deles, o médico legista Abeylard de Queiroz Orsini é acusado de falsificar o laudo necroscópico de Merlino, que afirmava que o jornalista havia morrido vítima de atropelamento.
Além da prisão dos acusados, o Ministério Público também pede o cancelamento de suas aposentadorias, o afastamento imediato de Dirceu Gravina de suas funções na Polícia Civil e a suspensão da licença médica de Abeylard de Queiroz Orsini.
Crimes contra a humanidade
Segundo o MPF, o assassinato de Luiz Eduardo Merlino é caracterizado como um crime contra a humanidade e, por isso, não prescreve nem pode ser anistiado.
Para Ângela Mendes de Almeida, ex-companheira de Merlino, “o significado dessa ação para a família é importantíssimo. Na verdade, era esse tipo de ação, uma denúncia criminal, que queríamos desde o início, quando movemos o primeiro processo na área cível, em 2008. Um crime, um homicídio, ainda mais decorrente de tortura até a morte, tem que ser punido criminalmente”.
Luiz Eduardo da Rocha Merlino tinha 23 anos quando foi assassinado. Nascido em Santos (SP), em 18 de outubro de 1948, era estudante de história na USP e militante do Partido Operário Comunista (POC). Preso em 15 de julho de 1971, Merlino foi levado ao DOI-Codi de São Paulo, onde foi barbaramente torturado, vindo a morrer em decorrência dos graves ferimentos.
Revisão da Lei de Anistia
Mais de 200 investigações já foram abertas pelo MPF para apurar casos de crimes políticos cometidos contra opositores da ditadura e, desde 2011, foram ajuizadas nove ações penais contra 22 agentes da repressão acusados de sequestros, torturas, assassinatos e desaparecimentos de presos políticos.
Porém, devido à interpretação de que a Lei da Anistia se estende também aos agentes do Estado, até hoje nenhum torturador foi punido, apesar de a Corte Interamericana de Direitos Humanos ter condenado o Brasil a investigar e punir as violações cometidas durante o período, as quais não seriam passíveis nem de anistia nem de prescrição.
Além disso, mesmo após a criação da Comissão Nacional da Verdade (CNV), uma série de dificuldades são impostas pelas Forças Armadas para que a verdade sobre os crimes cometidos durante a ditadura seja revelada, como prova a ordem do comandante do Exército, general Enzo Peri, que proíbe, na prática, os quartéis de colaborar com as investigações
Essa resistência por parte do Exército, e também da mídia burguesa, legitima a prática da tortura existente até hoje nos presídios e delegacias de nosso país e reforça a impunidade.
A menos de três meses do fim dos trabalhos da Comissão Nacional da Verdade, previsto para dezembro deste ano, é preciso aumentar a pressão pela revisão da Lei da Anistia, o apoio às ações do MPF no sentido de levar a julgamento os responsáveis pelas torturas, assassinatos e desaparecimentos durante a ditadura militar, além de promover movimentos e ações de massa pela memória, verdade e justiça.
Redação Rio
*AVerdade

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