“Precisamos resistir à vigilância digital”, diz fundador do movimento pelo software livre
Samir Oliveira no SUL21
O Palácio Piratini recebeu nesta segunda-feira (4) um convidado
totalmente diferente das autoridades afeitas a formalismos que costumam
frequentar a sede do governo gaúcho. O norte-americano Richard
Stallmann, liderança histórica do movimento em defesa do software livre,
estava bem à vontade com uma calça jeans bastante surrada e uma
camiseta vermelha de mangas curtas em pleno inverno.
Fundador da Free Software Foundation,
Stallman falou durante mais de 1h30min sobre a luta que empreende há
mais de de 30 anos, quando inventou o GNU, que mais tarde se agregaria
aos componentes criados por Linus Torvalds, originando o Linux – sistema
operacional desenvolvido e distribuído de forma totalmente livre e
gratuita.
Stallman se mostrou extremamente preocupado com a vigilância exercida
por governos e corporações através da internet. Na verdade, a crítica
de Richard é direcionada para qualquer equipamento eletrônico que opere
com aplicativos fornecidos pelas corporações tradicionais do ramo, como a
Microsoft e a Apple.
“A sociedade digital vive sob a ameaça da vigilância. Nem Stálin
tinha como vigiar o que todos faziam o tempo inteiro, mas hoje isso é
possível”, disse o ativista. Ele não poupou nem as redes sociais e pediu
ao público que não colocasse fotos suas no Facebook. “Não deem ao
Facebook mais uma oportunidade para me vigiar”, apelou.
Ele fez questão de manifestar que o receio de ter informações sobre a
sua vida rastreadas por equipamentos eletrônicos fará com que nunca
mais vá à Argentina. “Amanhã à noite visitarei a Argentina pela última
vez. Eles estão desenvolvendo um sistema de vigilância que recolhe a
impressão digital de todos os que entram no país. No momento, está
operando apenas em Buenos Aires, e eu consegui achar uma maneira de
entrar por outra cidade, sem precisar ser tratado como se fosse um
criminoso. Algumas coisas não devem ser toleradas, é nosso dever não
tolerá-las”, indignou-se.
Ele considera necessária a utilização das ferramentas tecnológicas no
combate ao crime, por exemplo, mas questiona a facilidade com que as
informações podem ser acessadas hoje em dia. “Um cidadão europeu
resolveu exigir do Facebook todas as informações que a empresa tinha
sobre ele. Foram mais de 200 páginas. Durante o império soviético, a
polícia secreta não poderia reunir essa quantidade de informações sobre
uma pessoa comum, sem nenhuma importância política”, comparou.
Stallman atenta para o perigo de as informações compartilhadas na
rede serem utilizadas contra os próprios usuários. “Na Inglaterra,
prenderam manifestantes antes que eles chegassem a um protesto. A
vigilância digital é utilizada para atacar os direitos humanos e a
democracia”, alertou.
“As escolas e os governos devem trabalhar somente com software livre”, defende
Richard Stallman acredita que os softwares patenteados restringem a
liberdade das pessoas, já que seus códigos de produção são fechados e
não permitem que sejam feitas modificações. Por isso, ele defende que as
escolas e os governos utilizem somente sistemas livres.
“As escolas têm a missão de educar bons cidadãos para uma sociedade
livre, forte, independente e cooperativa. Jamais deveriam ensinar seus
alunos a mexer em programas pagos, pois estariam ensinando dependência.
Por que as corporações distribuem sistemas operacionais de graça para as
escolas? Querem que as crianças fiquem dependentes de seus produtos. É
como dar agulhas com drogas para que os alunos fiquem viciados. A
primeira dose é de graça. Mas depois será preciso pagar”, comparou.
Stallman considera que os programas desenvolvidos de maneira fechada e
paga colocam o indivíduo a mercê dos caprichos da empresa que detém os
direitos sobre o produto. “Ou o usuario controla o programa, ou o
programa controla o usuário. E por trás desse programa, há uma
corporação que o controla. É por isso que os aplicativos pagos são um
instrumento para subjugar as pessoas e sua própria existência é um
problema social a ser enfrentado”, opinou.
Ele disse que é preciso fazer a defesa do software livre “como um
direito humano” e atacou as duas principais empresas que produzem
sistema operacionais e aplicativos de forma paga e fechada: a Microsoft e
a Apple. Stallmann observou que o Windows possui sistemas de vigilância
e interfere na autonomia dos usuários ao modificar os programas sem
permissão “de quem deveria, teoricamente, ser o dono do computador”.
E fez questão de dizer que “a Apple não é melhor”, apesar de as duas
companhias serem rivais no mercado. “Os computadores da Apple foram
fabricados para serem jaulas. A genialidade de Steve Jobs foi fabricar
uma jaula tão confortável que milhões de idiotas desejam viver nela”,
disparou.
*Turquinho
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