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Ser de esquerda é não aceitar as injustiças, sejam elas quais forem, como um fato natural. É não calar diante da violação dos Direitos Humanos, em qualquer país e em qualquer momento. É questionar determinadas leis – porque a Justiça, muitas vezes, não anda de mãos dadas com o Direito; e entre um e outro, o homem de esquerda escolhe a justiça.
É ser guiado por uma permanente capacidade de se estarrecer e, com ela e por causa dela, não se acomodar, não se vender, não se deixar manipular ou seduzir pelo poder. É escolher o caminho mais justo, mesmo que seja cansativo demais, arriscado demais, distante demais. O homem de esquerda acredita que a vida pode e deve ser melhor e é isso, no fundo, que o move. Porque o homem de esquerda sabe que não é culpa do destino ou da vontade divina que um bilhão de pessoas, segundo dados da ONU, passe fome no mundo.
É caminhar junto aos marginalizados; é repartir aquilo que se tem e até mesmo aquilo que falta, sem sacrifício e sem estardalhaço. À direita, cabe a tarefa de dar o que sobra, em forma de esmola e de assistencialismo, com barulho e holofotes. Ser de esquerda é reconhecer no outro sua própria humanidade, principalmente quando o outro for completamente diferente. Os homens e mulheres de esquerda sabem que o destino de uma pessoa não deveria ser determinado por causa da raça, do gênero ou da religião.
Ser de esquerda é não se deixar seduzir pelo consumismo; é entender, como ensinou Milton Santos, que a felicidade está ancorada nos bens infinitos. É mergulhar, com alegria e inteireza, na luta por um mundo melhor e neste mergulho não se deixar contaminar pela arrogância, pelo rancor ou pela vaidade. É manter a coerência entre a palavra e a ação. É alimentar as dúvidas, para não cair no poço escuro das respostas fáceis, das certezas cômodas e caducas. Porém, o homem de esquerda não faz da dúvida o álibi para a indiferença. Ele nunca é indiferente. Ser de esquerda é saber que este “mundo melhor e possível” não se fará de punhos cerrados nem com gritos de guerra, mas será construído no dia-a-dia, nas pequenas e grandes obras e que, muitas vezes, é preciso comprar batalhas longas e desgastantes. Ser de esquerda é, na batalha, não usar os métodos do inimigo.
Fernando Evangelista

sexta-feira, julho 01, 2011

BRASIL SERÁ NOTIFICADO EM JULHO POR MAIS 2 CRIMES DA DITADURA

DO PORTAL CARTA MAIOR
Por André Barrocal
BRASÍLIA – O Brasil deve ser notificado em julho, pela Corte Interamericana de Direitos Humanos, como réu em mais dois casos de crimes praticados na ditadura militar que não foram investigados no país e que parentes das vítimas levaram até o tribunal para tentar esclarecer e punir os culpados.
Os processos referem-se às mortes de Luiz José da Cunha, o Crioulo, militante da Aliança Libertadora Nacional (ALN), e do jornalista Vladimir Herzog, o Vlado. A notificação marca, na prática, o início do julgamento, pois abre espaço para o acusado exercer o direito de se defender.

“Acredito numa decisão em no máximo um ano após a notificação”, disse a diretora do Centro pela Justiça e o Direito Internacional (Cejil) no Brasil, Beatriz Estela de Azevedo Affonso.


Cejil é uma organização latino-americana defensora dos direitos humanos que representa uma série de parentes de vítimas da ditadura perante a Corte Interamericana, ao lado de duas instituições brasileiras: a Comissão de Familiares de Mortos e Desaparecidos de São Paulo e o Grupo Tortura Nunca Mais do Rio de Janeiro.


A trinca foi responsável por acusar o Brasil na Corte pelo assassinato de militantes comunistas da Guerrilha do Araguaia. O país foi condenado no fim de 2010, depois de quase dois anos de julgamento. Beatriz acredita que os processos de Vlado e Crioulo serão bem mais rápidos, porque agora a Corte já está mais familizarizada com o contexto histórico brasileiro em que as mortes aconteceram.


Alguns pontos da sentença pelos assassinatos na Guerrilha do Araguaia vem sendo cumpridos, mas aquele que os familiares mais desejam, a revogação da Lei de Anistia e a punição a torturadores e criminosos da ditadura, não.


O cumprimento da sentença foi debatido em audiência pública realizada pela Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados nesta quinta-feira (30/06).


Segundo Beatriz, a sentença favorável aos familiares no caso do Araguaia serve de estímulo para que outros processos sejam levados à Corte Interamericana. O objetivo, disse, é criar um volume grande de condencações ao Brasil para tentar constranger o Supremo Tribunal Federal (STF) a revogar a Lei de Anistia.


“Novos casos vão chegar à Corte Interamericana, vão se acumular lá, esse problema para o Brasil vai durar muito tempo ainda”, afirmou Beatriz.


Lei de Anistia

Também no fim do ano passado, o Supremo julgou que o estado brasileiro não estava obrigado a cumprir sentenças da Corte Interamericana de Direitos Humanos. Primeiro, porque não teria ratificado internamente, com aprovação do Congresso e a assinatura presidencial, convenções da Corte.

Segundo, porque os fatos julgados na Corte teriam sido cobertos pela Lei de Anistia.

Um dos elementos levados em conta no julgamento do STF foi um parecer da Advocacia Geral da União (AGU), que defende o governo na suprema corte brasileira. O parecer também sustentava que o Brasil estava desobrigado de seguir a sentença.


Presente à audiência pública no Congresso, o jurista Fabio Konder Comparato, que tem defendido com insistência a revogação da Lei de Anistia, criticou mais uma vez a posição do estado brasileiro (governo, Congresso e Justiça). “Continuarei lutando pelo cumprimento integral da sentença. O Estado brasileiro será apontado como responsável pelo eventual não cumprimento”, disse.


No debate, Comparato expôs raciocício que culpa a Presidência da República pela não revisão da Lei de Anistia. Comparato destacou que a lei orgânica da AGU diz que o advogado-geral da União é “submetido à direta, pessoal e imediata supervisão do Presidente da República”. Ou seja, quando a AGU deu um parecer ao STF contrário ao cumprimento da sentença da Corte Interamericana, teria sido o próprio presidente da República o responsável último pela “ruptura com a ordem jurídica internacional”.


Ao apontar o dedo para o presidente, o raciocíonio de Comparato tenta constranger a presidenta Dilma Rousseff, que foi militante política e perseguida pela ditadura. Embora o parecer da AGU seja do tempo do ex-presidente Lula, a preservação dele hoje seria responsabilidade de Dilma. Ainda que o advogado-geral da União também seja o mesmo, Luiz Inácio Adams.


Cumprimento Parcial

Na audiência pública, representantes dos ministérios dos Direitos Humanos, da Justiça e das Relações Exteriores disseram que, ao menos na parte que cabe ao poder Executivo, a sentença da OEA estaria sendo cumprida.


Segundo Nadine Borges, representante da ministra dos Direitos Humanos, Maria do Rosário, as buscas por restos mortais de guerrilheiros do Araguaia, por exemplo, continua, como determinou a Corte Interamericana. E estaria em
andamento “com o que o Brasil tem de melhor em termos de peritos”.

Além disso, houve uma revisão, em maio, de uma portaria que define quem faz parte, e com quais poderes, do grupo de autoridades responsável por procurar e identificar restos dos guerrilheiros. A nova portaria, disse Nadine, bota os Direitos Humanos e o ministério da Justiça, em pé de igualdade com o ministério da Defesa.


Ela afirmou ainda que os familiares das vítimas vão acompanhar todas as buscas, embora isso não esteja escrito na portaria. E que será prestada toda asssistência psiquiátrica e psicológica a elas, como mandou a Corte Interamericana. “O estado está realmente empenhado em cumprir a sentença”, declarou.

A sentença também fez determinações aos outros dois poderes, Judiciário e Legislativo. No primeiro caso, o mais importante seria a revisão da Lei de Anistia para punir os criminosos da ditadura. Ao segundo, foi determinado, por exemplo, que aprove uma lei que tipifique o delito de desaparecimento forçado de pessoas. “Todo o continente tem essa lei, menos o Brasil”, disse Beatriz, da Cejil.

No início do ano que vem, haverá uma reunião da Corte Interamericana com autoridades brasileiras para avaliar o andamento do cumpimento da sentença.

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