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Ser de esquerda é não aceitar as injustiças, sejam elas quais forem, como um fato natural. É não calar diante da violação dos Direitos Humanos, em qualquer país e em qualquer momento. É questionar determinadas leis – porque a Justiça, muitas vezes, não anda de mãos dadas com o Direito; e entre um e outro, o homem de esquerda escolhe a justiça.
É ser guiado por uma permanente capacidade de se estarrecer e, com ela e por causa dela, não se acomodar, não se vender, não se deixar manipular ou seduzir pelo poder. É escolher o caminho mais justo, mesmo que seja cansativo demais, arriscado demais, distante demais. O homem de esquerda acredita que a vida pode e deve ser melhor e é isso, no fundo, que o move. Porque o homem de esquerda sabe que não é culpa do destino ou da vontade divina que um bilhão de pessoas, segundo dados da ONU, passe fome no mundo.
É caminhar junto aos marginalizados; é repartir aquilo que se tem e até mesmo aquilo que falta, sem sacrifício e sem estardalhaço. À direita, cabe a tarefa de dar o que sobra, em forma de esmola e de assistencialismo, com barulho e holofotes. Ser de esquerda é reconhecer no outro sua própria humanidade, principalmente quando o outro for completamente diferente. Os homens e mulheres de esquerda sabem que o destino de uma pessoa não deveria ser determinado por causa da raça, do gênero ou da religião.
Ser de esquerda é não se deixar seduzir pelo consumismo; é entender, como ensinou Milton Santos, que a felicidade está ancorada nos bens infinitos. É mergulhar, com alegria e inteireza, na luta por um mundo melhor e neste mergulho não se deixar contaminar pela arrogância, pelo rancor ou pela vaidade. É manter a coerência entre a palavra e a ação. É alimentar as dúvidas, para não cair no poço escuro das respostas fáceis, das certezas cômodas e caducas. Porém, o homem de esquerda não faz da dúvida o álibi para a indiferença. Ele nunca é indiferente. Ser de esquerda é saber que este “mundo melhor e possível” não se fará de punhos cerrados nem com gritos de guerra, mas será construído no dia-a-dia, nas pequenas e grandes obras e que, muitas vezes, é preciso comprar batalhas longas e desgastantes. Ser de esquerda é, na batalha, não usar os métodos do inimigo.
Fernando Evangelista

sexta-feira, julho 01, 2011

Os refúgios fiscais como ameaça à democracia

Deveria ser refúgio ou santuário fiscal, não “paraíso”, definição que surgiu da confusão entre haven e heaven.
Seja como for, os esconderijos de dinheiro sujo não são a exceção, mas a regra do capitalismo em que vivemos.
Diz o excelente Treasure Islands, Tax Havens and the Men that Stole de World, de Nicholas Shaxson.
Do autor eu já tinha lido Poisoned Wells: The Dirty Politics of African Oil, livro obrigatório para quem quer entender a África.
Quais são os maiores refúgios fiscais do mundo?
Caimã? Liechtenstein? Jersey?
Não. Pela ordem, Estados Unidos, Reino Unido e Suiça.
Um único escritório em Wilmington, capital do estado de Delaware, é sede de 217 mil empresas.
O Reino Unido exerce controle indireto sobre uma teia de refúgios fiscais que garantem às grandes corporações sonegação de impostos em todo o mundo.
E os países pobres pagam o preço mais caro, com o encolhimento da base fiscal: “Hoje o 1% no topo dos países em desevolvimento controla de 70 a 90% de toda a riqueza financeira e imobiliária. O Boston Consulting Group avaliou em 2003 que mais da metade de toda a riqueza controlada pelos mais ricos está offshore. ‘O problema não é que esses países não tem bens’, uma autoridade do Banco Central dos Estados Unidos afirmou. ‘O problema é que está tudo em Miami’”.
Outro trecho: “As duas maiores fontes de investimento na China em 2007 não foram o Japão, os Estados Unidos ou a Coreia do Sul, mas Hong Kong e as ilhas Virgens Britânicas. Da mesma forma, a maior fonte de investimento estrangeiro na Índia, acima dos 43%, não foram os Estados Unidos, Reino Unido ou China, mas o refúgio das ilhas Maurício, uma estrela em ascensão do sistema offshore”.
Shaxson argumenta convincentemente que os refúgios fiscais, como espaço político capturado por banqueiros, advogados e contadores, servem de ferramenta para que o mundo das finanças solape instituições democráticas e submeta o interesse público ao dos banqueiros. Como, aliás, temos visto didaticamente nos últimos dias, na Grécia.
Luiz Carlos Azenha
*Viomundo

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