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Ser de esquerda é não aceitar as injustiças, sejam elas quais forem, como um fato natural. É não calar diante da violação dos Direitos Humanos, em qualquer país e em qualquer momento. É questionar determinadas leis – porque a Justiça, muitas vezes, não anda de mãos dadas com o Direito; e entre um e outro, o homem de esquerda escolhe a justiça.
É ser guiado por uma permanente capacidade de se estarrecer e, com ela e por causa dela, não se acomodar, não se vender, não se deixar manipular ou seduzir pelo poder. É escolher o caminho mais justo, mesmo que seja cansativo demais, arriscado demais, distante demais. O homem de esquerda acredita que a vida pode e deve ser melhor e é isso, no fundo, que o move. Porque o homem de esquerda sabe que não é culpa do destino ou da vontade divina que um bilhão de pessoas, segundo dados da ONU, passe fome no mundo.
É caminhar junto aos marginalizados; é repartir aquilo que se tem e até mesmo aquilo que falta, sem sacrifício e sem estardalhaço. À direita, cabe a tarefa de dar o que sobra, em forma de esmola e de assistencialismo, com barulho e holofotes. Ser de esquerda é reconhecer no outro sua própria humanidade, principalmente quando o outro for completamente diferente. Os homens e mulheres de esquerda sabem que o destino de uma pessoa não deveria ser determinado por causa da raça, do gênero ou da religião.
Ser de esquerda é não se deixar seduzir pelo consumismo; é entender, como ensinou Milton Santos, que a felicidade está ancorada nos bens infinitos. É mergulhar, com alegria e inteireza, na luta por um mundo melhor e neste mergulho não se deixar contaminar pela arrogância, pelo rancor ou pela vaidade. É manter a coerência entre a palavra e a ação. É alimentar as dúvidas, para não cair no poço escuro das respostas fáceis, das certezas cômodas e caducas. Porém, o homem de esquerda não faz da dúvida o álibi para a indiferença. Ele nunca é indiferente. Ser de esquerda é saber que este “mundo melhor e possível” não se fará de punhos cerrados nem com gritos de guerra, mas será construído no dia-a-dia, nas pequenas e grandes obras e que, muitas vezes, é preciso comprar batalhas longas e desgastantes. Ser de esquerda é, na batalha, não usar os métodos do inimigo.
Fernando Evangelista

sábado, novembro 10, 2012

As drogas e a direita causam dependência - Por Izaías Almada

Bandeira dos Estados Unidos da América pintada por Jaspen Johns em 1966 

O que poderá revelar uma foto tirada neste exato momento da situação política brasileira? 


Política, sim, porque a econômica não está a perigo e a social, ainda que com inúmeros problemas a resolver, vai sendo enfrentada pelo governo nos últimos dez anos com relativo sucesso. 


Os três poderes da república, interdependentes e autônomos, apresentam uma característica fundamental: dois deles, executivo e legislativo, têm seus representantes eleitos pelo povo. 


O outro, o judiciário, seus representantes são indicados por notório saber, escolhidos pelo poder executivo e aprovados pelo poder legislativo. 


Numa democracia participativa ou mesmo representativa essa característica pode ser relevante na solução ou na criação de problemas concretos e do dia a dia de uma nação. 


Politicamente, tudo indica que o atual poder executivo encontra-se paralisado em relação ao julgamento da AP 470, pelo menos diante da opinião pública, em particular aquela que o elegeu, quando apenas acompanha – em nome da liberdade de opinião e de expressão – os principais órgãos de informação do país estimularem e apoiarem sem qualquer escrúpulo as decisões da mais alta instância do Poder Judiciário, sejam elas baseadas na verdade dos fatos ou não. 


Com provas nos autos ou na falta delas. 


Homens como José Dirceu e José Genoíno são tidos como quadrilheiros e o Partido dos Trabalhadores é comparado ao PCC e ao Comando Vermelho por juízes do Superior Tribunal Federal. 


Opiniões dessa natureza, proferidas com ódio de quem se espera comedimento, configuram partidarismo e politização de um julgamento que entrou em pauta com objetivos até agora não muito bem esclarecidos. 


A não ser que sejamos obrigados a acreditar em duendes e gnomos… 


Muito embora parte da esquerda brasileira, e nela alguns petistas históricos que deixaram o partido e outros de filiação mais recente, venha se comportando nesse episódio como Poncio Pilatos e lavando as mãos quanto às denúncias da imprensa, sobretudo agora com o julgamento do Superior Tribunal Federal, será sempre prudente levar em consideração que uma escalada conservadora e moralista nesse momento poderá, com o desgaste que provoca, levar a pique muitas das conquistas dos governos Lula/Dilma em favor dos mais necessitados. 


Curioso, insisto, observar o comportamento de uma parte da esquerda diante das provocações e arreganhos da direita, qualquer coisa assim como “bem feito, quem mandou o PT fazer alianças espúrias?” 


Contudo, só quem não conhece a estrutura do poder político no Brasil pode imaginar que se governa apenas com boas intenções e pureza ideológica. 


Política é guerra e para enfrentá-la é preciso ter estômago e, por vezes, engolir sapos. 


Historicamente, a esquerda brasileira sempre se dividiu diante dos momentos mais delicados a enfrentar e diante das ciladas e arreganhos do capitalismo. 


Poderia lembrar aqui os exemplos de 1935, 1954, 1964. 


Estamos enveredando pelo mesmo caminho de outras derrotas históricas? 


Quando ouço ou leio determinadas opiniões e penso que um dia homens como José Serra, Fernando Henrique Cardoso, Roberto Freire, Alberto Goldman, Aloysio Nunes Ferreira, apenas para citar alguns, já se disseram homens de esquerda, temo pelo que possa acontecer nos próximos dois anos. 


Não comungo, ainda, com a paranóia golpista, muito embora em política é quase sempre arriscado não prever os lances do adversário como faz o bom enxadrista. 


E os melhores momentos para se tirar o pulso do inimigo é com avanços e vitórias democráticas como essas das recentes eleições municipais. 


Há doze anos afastada do poder político, a direita brasileira não anda nada satisfeita, ainda mais quando percebe que o governo vai conquistando novos espaços que lhe pertenciam. 


Como na canção de Fagner o “meu olhar está armando um bote sem futuro”, ou – em outras palavras – um eventual “desinteresse” do governo, do PT e dos partidos da base aliada, com o retorno do látego negro da Alemanha e o início da fase de dosimetria das penas da AP 470, será reiniciada através das redações de VEJA, REDE GLOBO, FOLHA, ESTADÃO, o maior “espetáculo da corrupção no Brasil”, desta vez tentando levar o “coadjuvante” Lula para o papel de protagonista. 


Não há indícios, pelo menos aparentes, de que as “forças produtivas” estejam preocupadas com alguma quebra da institucionalidade ou insatisfação entre militares, alguns sintomas clássicos de golpes de estado na América Latina. 


O mundo é outro, a América Latina é outra, o Brasil é outro. 


O que há é uma movimentação exagerada de algumas figurinhas carimbadas no poder legislativo e que, de mãos dadas com outras beladonas alçadas ao estrelato midiático no poder judiciário, dão ao país um deprimente espetáculo antidemocrático. 


Assim como existem diferentes concepções na esquerda, também as há na direita. 


Essa direita que busca os holofotes no atual momento, cuja cabeça pensante (peço desculpas pela força de expressão) tem sua origem em homens outrora de esquerda descobriu finalmente seu lugar na sociedade brasileira. 


As drogas e a direita causam dependência química e de decência. 


*** Izaías Almada, mineiro de Belo Horizonte, escritor, dramaturgo e roteirista, é autor de Teatro de Arena (Coleção Pauliceia da Boitempo) e dos romances A metade arrancada de mim, O medo por trás das janelas e Florão da América. 


Fonte: http://boitempoeditorial.wordpress.com/


do blog Provos Brasil

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